O Holocausto – quem foram os culpados?
O sexagésimo aniversário da libertação de Auschwitz produziu uma superabundância de documentários na TV e no rádio, artigos de jornais e declarações dos principais políticos.
Todos eles expressaram, corretamente, a repulsa e a condenação do mais maléfico e bárbaro regime da história.
A questão posta nesta ocasião, como em inúmeras vezes desde 1945, é: como é que tal horror pôde ser instigado pela Alemanha, um país com ricas tradições culturais e políticas que deu ao mundo gigantes como Bach, Brahms, Marx e Hegel? Além disso, a classe trabalhadora alemã desenvolveu um poderoso movimento sindical e o Partido Social-Democrata que, em 1919, clamava ter um milhão de membros e estava comprometido na transformação socialista da sociedade, um objetivo gradualmente abandonado pela sua direção.
Num encontro de dirigentes mundiais em 25 de Janeiro deste ano, relatou-se que o Chanceler alemão Schröeder fez um reconhecimento “radical”: que os alemães comuns foram responsáveis pelo Holocausto. Isto reforça a noção advogada por alguns “historiadores especialistas” de que foi o apoio popular a Hitler que o conduziu para o poder.
Schröeder declarou: “O mal da ideologia nazista não surgiu do nada… a ideologia nazista foi querida pelo povo e levada a cabo pelo povo”. É verdade, mas que povo ele se refere? Na imprensa popular há pouca análise séria, dado o papel jogado pelos capitalistas na Alemanha entre as guerras que financiaram Hitler e aportaram a sua determinação em “esmagar” o “marxismo” (a alcunha dada pelos nazistas ao “Movimento Operário”).
Capitalismo alemão
Schroeder poderia ter mencionado Emil Kirdorf, o barão do carvão perseguidor dos sindicatos; Fritz Thyssen presidente do monopólio do aço; Alert Vogler da United Steel Works; Georg von Schnitzel do cartel IG Farben Chemical; o industrial de Colônia Otto Wolf, e um conglomerado de bancos e companhias de seguros. Mas foi o Barão Kurt von Schroeder, o banqueiro de Colônia que teve um papel fundamental na determinação do curso da história alemã e mundial.
A realidade é que, antes de Hitler tornar-se Chanceler, os nazistas nunca alcançaram mais de 36% de votos populares. O crescimento do nazismo foi auxiliado pela retirada e traição dos dirigentes social-democratas como Ebert, Scheidermann e Noske, que colaboraram com as forças da extrema-direita a partir de 1919.
A catastrófica caracterização de Stalin da social-democracia como “social-facista” que não deveria ser tratada de forma diferente dos nazistas produziu uma enorme divisão dentro da classe trabalhadora – o que Hitler pôde explorar.
Apesar da abdicação da direção das organizações dos trabalhadores, as bases continuaram a resistir aos nazistas. O ponto alto de Hitler foi a eleição presidencial de julho de 1932 quando obteve 36% dos votos populares. Nas eleições presidenciais de novembro desse mesmo ano, o voto nos nazistas caiu em 2 milhões de votos para 33% aos mesmo tempo que o Partido Comunista Alemão e os Social-Democratas obtiveram, em conjunto, um total de 37%.
Com uma direção corajosa, armada com uma estratégica e táticas corretas, não há dúvida que a classe trabalhadora seria mobilizada para esmagar os nazistas, cujas organizações estavam em cacos depois da derrota eleitoral. O futuro ministro da propaganda de Hitler, Goebbels, escreveu: “1932 trouxe-nos uma eterna má sorte… o passado tinha sido difícil e o futuro parecia negro e depressivo: todas as perspectivas e esperanças tinham desaparecido”.
Alçado ao poder
Contudo, os capitalistas apavoraram-se com a possibilidade de um aumento de votos nos partidos dos trabalhadores. Conseqüentemente, em 5 de Janeiro de 1933, Hitler foi convidado a falar numa reunião de industriais e banqueiros organizada pelo vice-presidente Barão von Papen, em casa do já referido Barão von Schroeder. Na reunião, Hitler prometeu acabar com a democracia na Alemanha e esmagar o movimento dos trabalhadores de forma que os capitalistas pudessem estar livres e em paz para ter os seus lucros. Dentro de dez dias os problemas financeiros do partido nazista desapareceram.
O anti-semitismo de Hitler nessa altura estava silencioso e, de qualquer forma, os capitalistas fechavam os olhos ao que consideravam retórica demagógica e que não devia ser levada a sério. Viam em Hitler um homem cujo principal papel seria livrá-los das organizações dos trabalhadores.
Em 30 de Janeiro de 1933 Hitler, que nunca tinha alcançado um posto eleito, foi levado ao poder, não pela aclamação popular, mas por uma cabala secreta de banqueiros, ministros capitalistas e membros do alto comando das Forças Armadas alemãs que persuadiram Hindenberg a nomeá-lo Chanceler.
Desarmados
Então, por causa da falsa estratégia da direção do Partido Social-Democrata e do Partido Comunista, a classe trabalhadora alemã foi desarmada, tornada indefesa e ficou à mercê dos camisas marrons de Hitler. Esses batalhões de criminosos, armados até os dentes e constituídos pelo que Leon Trotsky, na sua brilhante análise do fascismo alemão, descreveu como a pequena burguesia enlouquecida e o lúmpen-proletariado, estavam livres nas ruas para assassinar e mutilar.
As primeiras vítimas que encheram os campos de concentração, as câmaras de tortura e os lugares de execução foi o principal da classe trabalhadora alemã. O poderoso movimento de delegados sindicais estava fragmentado e traumatizado. Mesmo depois de Hitler ter demonstrado as suas intenções assassinas, os dirigentes da central sindical alemã pediram para serem aceitos pelo governo nazista – a resposta de Hitler foi destruir, de alto a baixo, as organizações da classe operária e prender e assassinar os seus dirigentes.
O Nazismo foi, eventualmente, esmagado com um custo de 50 milhões de mortos e o horror indescritível dos campos de morte, dos quais Auschwitz mantêm-se como o mais potente símbolo. Hoje, o movimento dos trabalhadores tem de ser rearmado com uma compreensão das forças e condições que levaram o capitalismo alemão a instalar Hitler no poder.