Congresso mundial do CIT: mulheres e opressões na sociedade de classes
1. O documento esboça de modo geral alguns pontos sobre a situação das mulheres, a perspectiva de luta, o nosso programa e abordagem. Entretanto as enormes variações entre os diferentes países significam que as perspectivas, e abordagem para a luta, também irão variar consideravelmente ao redor do mundo.
2. Movimentos contra diferentes aspectos da opressão às mulheres tem sido uma realidade presente em vários países nos últimos anos. Isso inclui manifestações de massa contra o estupro na Índia e Turquia, o movimento pela legalização do aborto na Irlanda, e a marcha de um milhão de homens e mulheres em 2011 na Itália pela legalização do aborto e contra o machismo do presidente Berlusconi.
3. Como tantas vezes antes na história, temos visto mulheres trabalhadoras iniciarem revoltas, como mostra o exemplo do distrito têxtil de Mahalla, que serviu como base para a Primavera Árabe. As brigadas femininas em defesa de Rojova têm, durante os últimos anos de contrarrevolução, constituído um importante contraste aos inimigos diretos no EI [Estado Islâmico], cujo estado está conduzindo um enorme comércio de escravas sexuais. O controle da sexualidade das mulheres tem sido central na opressão das mulheres desde que surgiu pela primeira vez. Hoje há um aumento na luta pelo direito das mulheres a seus próprios corpos. Nos EUA um movimento baseado nos estudantes tem surgido contra o estupro. Na América Latina uma série de movimentos têm ocorrido. A luta contínua dos movimentos de mulheres e trabalhadores têm levado a avanços, como o aumento do acesso à contraceptivos na África e um crescente questionamento da mutilação genital feminina. A redução pela metade da taxa de mortalidade materna nos últimos 25 anos, e a diminuição da diferença da proporção de meninas que entram na educação comparado com meninos em muitos dos países “em desenvolvimento”, também constituem uma base sobre a qual mais lutas pela igualdade pode se desenvolver. A luta contra a velha ordem também tende a impulsionar a luta LGBT, como vimos globalmente. Quinze anos atrás, a Holanda se tornou o primeiro país a permitir o casamento homossexual. Hoje é legal em treze países europeus embora acompanhado por uma crescente polarização e por retrocessos, particularmente na Europa Oriental. Muitas vezes, um crescente despertar feminista surge junto com uma crescente consciência LGBT, e esses movimentos tendem a se cruzar e se reforçar mutuamente. Nos últimos anos, transgêneros têm levantado suas vozes em uma extensão maior do que antes em alguns países.
4. Todas estas lutas refletem um aumento da confiança em lutar contra a opressão num amplo setor, particularmente entre jovens mulheres. Em muitos países as propagandas capitalistas sugerem que as mulheres tem o direito de se esperar igualdade. Entretanto, isso se contradiz com a realidade. As mulheres tem avançando na conquista de direitos em várias partes do mundo nas últimas décadas. Contudo, a opressão contra as mulheres continua existindo em todos os países.
5. A opressão das mulheres se desenvolveu paralelamente e entrelaçado ao desenvolvimento da sociedade de classes, associado ao desenvolvimento da família, a qual tem, de diferentes formas, atuado como um importante agente no controle social de todas as classes. Como Engels corretamente apontou no século XIX, a família como instituição burguesa, tem o domínio mais fraco sobre a classe trabalhadora e os oprimidos. Entretanto até hoje, enquanto muitas pessoas possuem experiências positivas com sua própria família, frequentemente sendo as pessoas mais próximas a elas no mundo, a natureza hierárquica da sociedade ecoa na estrutura da família tradicional, com os homens chefiando a casa e a mulher e crianças obedecendo-os. Isso coloca a principal responsabilidade de criar a próxima geração de trabalhadores nas famílias. Isso age para oprimir as mulheres, mas também coloca um enorme fardo sob o homem que deve prover materialmente a família. Ao mesmo tempo em que a família permanece como uma instituição vital ao capitalismo, o próprio sistema capitalista tende a miná-la. As mulheres são arrastadas para o trabalho remunerado em larga escala, aumentando a confiança e independência financeira o que significa que elas estão menos dispostas a aceitar serem tratadas mal em casa e nas relações pessoais, e tem mais possibilidades de abandonar estas relações. Entretanto, a ideia de que as mulheres são posse dos homens e que necessitam serem leais e obedientes aos seus parceiros, permanece profundamente arraigada. A sociedade como um todo é permeada de propagandas intermináveis que enfatizam o papel “apropriado” das mulheres, como – dona de casa, mãe, objeto sexual, pacificadora, dentre outros.
6. A situação em que as mulheres se encontram variam consideravelmente nos diferentes países do mundo. Em alguns países europeus as mulheres são agora mais da metade da força de trabalho (embora muito mais mulheres que homens tenham trabalho em tempo parcial). Globalmente 50% das mulheres em idade de trabalho, estão trabalhando, uma pequena queda em torno de 2% desde 1995. A queda se dá pelo aumento do desemprego entre os jovens de todos os gêneros, particularmente na Europa. Mas isso também se reflete numa queda da participação das mulheres na força de trabalho na China e Índia onde, entre 1995 e 2013, o declínio foi de 72 para 64% e de 35% para 27%, respectivamente. As Nações Unidas apresentam a mudança na China como resultado da “diminuição significativa de creches com financiamento governamental”, e pelo fato da “proporção de creches públicas ou comunitárias com preço acessível terem decaído de 86% em 1997 para 34% em 2009”. Esta é a ilustração gráfica da consequência negativa de destruição dos vestígios de uma economia planejada!
7. Mesmo onde as mulheres constituem uma menor porcentagem da força de trabalho, elas ainda têm jogado um papel central na luta de classes, assim como as mulheres trabalhadoras têxteis que iniciaram em fevereiro a Revolução Russa de 1917. Em 2013 em Bangladesh, houve lutas massivas na indústria de vestuários, composta esmagadoramente por trabalhadoras. Na Nigéria onde pouco menos da metade das mulheres em idade de trabalho exercem esta atividade, tem sido elas a linha de frente nas sucessivas greves gerais. Enquanto a dupla opressão sob quais as mulheres estão submetidas podem ser o maior obstáculo extra para iniciar o ativismo político, quando as lutas acontecem as mulheres são frequentemente as mais determinadas.
8. A diferença salarial entre os gêneros permanece global. Até onde há um alto nível de participação das mulheres na força de trabalho, apenas uma pequena elite não sente esta diferença. Em algumas economias desenvolvidas a diferença salarial tem estreitado, mas isso é causado parcialmente pela queda dos salários reais dos homens, resultado da desindustrialização, ao invés de significar um aumento do salário das mulheres. Em 2011, o Banco Mundial declarou que as mulheres globalmente ganham ainda entre 10% e 30% menos que os homens, e a diferença não é menor nos países ricos e relação aos pobres. As mulheres permanecem concentradas no setor de serviços. Na América Latina e Caribe, e no Leste e Sul da Europa mais de 70% dos empregos femininos estão no setor de serviço. Este trabalho – frequentemente relatado como tarefas domésticas de cozinhar, limpar e cuidar – é na grande maioria mal remunerado.
9. Entretanto, no geral onde as mulheres tem sido arrastadas para a força de trabalho em números crescentes tem havido melhorias nas de suas condições gerais na sociedade. Contudo o machismo permanece arraigado no capitalismo. É hoje menos aceitável socialmente em muitos países dizer de modo aberto que as mulheres são posse dos homens, mas essa ideia – e que é aceitável usar violência ou ameaça de violência para impor ela – permanece profundamente encravada e estava resguardada até o período relativamente recente. Estupro marital apenas se tornou ilegal da Grã Bretanha em 1991, Espanha em 1992 e Alemanha em 1997. Apesar de não ser mais legal ou aceitável abertamente, estupro marital continua ocorrendo e são raramente punidos. Tampouco estupro em geral. Há uma estimativa na Grã Bretanha que apenas 15% de todos os estupros são reportados a polícia, e apenas 7% destes resultam em condenação. De acordo com as Nações Unidas, de todas as mulheres assassinadas em 2012 mais da metade foi morta pelos seus parceiros ou membros da família. Em contraposição, apenas 6% dos homens assassinados foram cometidos por parceiros ou familiares.
10. Em muitos países neocoloniais a opressão das mulheres é mais brutal e severa que nos países de economia desenvolvida. Há uma onda de propaganda na Europa e EUA na tentativa de relacionar o tratamento brutal as mulheres ao islã, com o tratamento horrendo dado as mulheres pelo EI. Entretanto, enquanto não há dúvida sobre as práticas bárbaras desprendidas pelo EI em nome do Islã, é errado relacionar a degradação da mulher com o islã em particular. Historicamente, práticas como crimes de honra ou mutilação genital feminina foram realizadas por todas as religiões. Até hoje algumas destas práticas horrendas – dentre outras como forçar suicídios de viúvas e dotes de noivas – são carregadas como bandeiras de diferentes religiões. Há muitos fatores, incluindo o grau de influência religiosa na sociedade ou no governo, e o nível da luta de classes, a qual afeta a opressão das mulheres em determinados países, mas em geral é a predominância das relações econômicas semifeudal, que determina o nível de opressão, ao invés de qualquer religião.
11. Em todos os países as mulheres continuam carregando o fardo das responsabilidades domésticas a pesar de estarem indo cada vez mais trabalhar fora. Em muitos casos as mulheres são, ainda, como colocou Trotsky, “escravas dos escravos”. Em alguns países onde a classe trabalhadora não pode usufruir os eletrodomésticos do capitalismo moderno – máquina de lavar, refrigerador, aspirador de pó, dentre outros – e frequentemente não tem eletricidade para utilizá-los, o fardo do trabalho doméstico recai sobre suas costas. Em países de economia desenvolvida a combinação dos eletrodomésticos e melhorias no comportamento tem significado uma diminuição do fardo do trabalho doméstico sob as mulheres. Na Inglaterra, por exemplo, a maioria dos estudantes homens aceitam que poderiam fazer uma quantidade igual de tarefas domesticas que as mulheres, mas há ainda uma considerável distância entre intenção e realidade. Uma pesquisa sobre a Inglaterra mostra que em média as mulheres trabalham 17 horas por semana em tarefas domésticas (excluindo o cuidado das crianças) enquanto que os homens trabalham menos de 6 horas.
12. A distribuição desigual do trabalho doméstico contribui para que as mulheres em geral tenham salários mais baixos, menos tempo de lazer e saúde sendo mais prejudicada que os homens, mas o maior ganho é dos capitalistas. Colocando o principal fardo do trabalho na vida doméstica, passando para as próximas gerações, e delegando os cuidados dos doentes e idosos às mulheres, removendo a responsabilidade da sociedade como um todo.
13. Enquanto historicamente o desenvolvimento capitalista geralmente tem levado a avanços para as mulheres em relação as sociedade anteriores, esse processo em grande parte têm se esgotado. O capitalismo do século XXI, longe de dar passos na diminuição do fardo do trabalho doméstico sobre as mulheres, leva a direção oposta. Os cortes implacáveis nos serviços públicos realizados nos países economicamente desenvolvidos estão destruindo as creches, os locais de cuidados com os idosos e outros serviços sociais que anteriormente aliviavam parcialmente o fardo sobre a classe trabalhadora, particularmente as mulheres. Mulheres são mais propensas a trabalharem no setor público e estão, portanto perdendo seus trabalhos por conta dos cortes. O aumento do custo com moradia e o fechamento de abrigos para mulheres em muitos países, faz com que seja mais difícil para elas deixarem seus parceiros agressores. Ao mesmo tempo em que a queda real dos salários e corte dos benefícios sociais significam que não há perspectiva para a maioria das mulheres da classe trabalhadora ou da classe média de escolher deixar o trabalho para se concentrar nas tarefas domésticas. Sustentar uma família com só um salário está ficando cada vez mais impossível. Ao contrário, ambos os pais muitas vezes têm que trabalhar em mais de um trabalho cada. Isso está criando as bases para uma grande explosão social por conta dos cortes dos serviços públicos, custo de moradia e salários. Mulheres serão a linha de frentes destas lutas, assim como tem sido com o movimento pelos 15 dólares por hora nos EUA.
14. Nós também temos que nos preparar para mais movimentos massivos relacionados as opressões específicas de gênero. Em geral a classe dominante está dividida em como lidar com esta questão. Um setor apoia uma maior ofensiva contra os direitos das mulheres, relacionado a propaganda sobre a importância da família, o papel da mulher na casa, dentre outros. Entretanto, há outro setor que avalia que isso se chocaria demais com as atitudes sociais e poderiam provocar movimentos de massa. Isso foi o caso das grandes manifestações na Espanha contra as tentativas de cercear severamente os direitos ao aborto; em que o movimento derrotou a proposta de lei. De fato o crescimento da confiança da mulher globalmente, significa que podemos ter como resultado movimentos ofensivos, como na Irlanda, capaz de melhorar os direitos das mulheres. As manifestações contra o estupro na Índia são também uma indicação do tipo de lutas que podemos desenvolver no mundo neocolonial.
15. A luta pela emancipação das mulheres é, na sua raiz, parte da luta de classe, na qual as lutas das mulheres contra sua opressão especifica anda junto com a luta da classe trabalhadora em geral por uma reestruturação fundamental da sociedade e pelo fim das desigualdades e opressão. Nós discordamos do feminismo burguês e pequeno burguês porque eles não trabalham com a perspectiva de classe para lutar pela emancipação das mulheres. Isso não significa, obviamente, que apenas a mulher da classe trabalhadora é oprimida. As mulheres da classe trabalhadora são duplamente oprimidas, pela classe e pelo gênero. Mas as mulheres de todas as classes sofrem opressão como resultado do seu sexo, incluindo violência doméstica e assédio sexual. Entretanto, na raiz, para ter uma real igualdade sexual para as mulheres, incluindo mulheres da elite da sociedade, é necessária uma reviravolta completa na ordem existente, em todas as esferas: econômica, social, familiar e doméstica. O ponto de partida necessário para iniciar essa reviravolta é acabar com o capitalismo. A classe trabalhadora e a única força capaz de liderar com sucesso a derrubada do capitalismo e por isso a luta pelo fim da opressão contra a mulher e a luta de classes estão intrinsecamente ligadas.
16. Dizer isso não significa que temos uma atitude negativa diante da nova geração de mulheres que entram na luta inicialmente em torno dos direitos da mulher e que não possuem ainda uma perspectiva de classe. Reconhecer que é oprimida, e saber que você pode lutar contra isso através da luta comum com outras que compartilham a mesma opressão, é um importante passo à frente. Neste sentido, o que podemos amplamente descrever como a política de identidades é parte inevitável de um despertar político de muitos membros de grupos oprimidos na sociedade. Entretanto, a história da luta contra as opressões mostra que, com base nestas experiências, estes participantes tendem a ir além da política de identidades quando reconhecem que a causa das opressões está ligada a estrutura da sociedade. Nosso papel tem sido de intervir habilmente, com um método transicional, ligando a luta contra a opressão às mulheres a luta pelo socialismo. Isso inclui estar preparado, quando necessário, para se opor as ideias do feminismo burguês e pequeno burguês, especialmente a ideia mantida por muitas feministas de que a culpa pela opressão das mulheres reside nas características inatas aos homens ao invés de localizar a razão na estrutura social.
17. Naturalmente, isso não significa que não combateremos os comportamentos machistas na sociedade, especialmente no interior do movimento operário. Ao argumentar que a classe trabalhadora é a única força capaz de provocar mudanças fundamentais na sociedade, nós não deixamos de enxergar nenhum preconceito, incluindo racismo, machismo e homofobia, os quais existem dentre todas as classes incluindo a classe trabalhadora, na qual temos o orgulho de ter um histórico de combate.
18. As organizações de trabalhadores em geral e os partidos revolucionários para serem bem sucedidos na unificação da luta da casse trabalhadora para transformar a sociedade, devem ser os campeões da luta pelo direitos das mulheres e dos grupos oprimidos. Nós não assumimos uma posição bruta como algumas organizações revolucionárias; como o exemplo da TSI (Tendência Socialista Internacional). Quando o CIT da Inglaterra e Gales iniciou a Campanha Contra a Violência Doméstica (CADV) o TSI (organização internacional do SWP – Partido Socialista dos Trabalhadores) inicialmente reagiu argumentando que pautar a violência dos homens contra a mulher nos sindicados era divisionismo. Isso parte de uma equivocada posição teórica sobre como o movimento operário deveria lidar com a opressão de gênero. No seu livro “Luta de classes e libertação das mulheres” Tony Cliff, fundador do SWP, argumenta que o movimento pela libertação das mulheres errou em focar “consistentemente nas áreas onde homens e mulheres estão em conflito – estupro, agressão as mulheres, trabalho doméstico remunerado – enquanto ignoravam ou subestimavam a importância das lutas em que as mulheres tem mais probabilidade de ganhar o apoio dos homens: greves, oposição a cortes de gastos, salário igual, sindicalização, aborto”.
19. Nós nos contrapomos a esta abordagem limitada. Naturalmente é vital para o movimento operário pautar as questões econômicas tais como oposição aos cortes nos serviços e igualdade salarial. De fato essas questões são centrais também para uma campanha contra a violência doméstica. CADV lutou, como o Partido Socialista e outras seções do CIT hoje, contra todos os cortes nos serviços que auxiliam em casos de violência doméstica e sexual, pela expansão do número de abrigo para mulheres, e por um programa de construção de moradias públicas para garantir à mulher sua independência. Mas nós lutamos pelo máximo de unidade da classe trabalhadora, não tentando varrer questões relativas as opressões especificas das mulheres para debaixo do tapete, mas trabalhando para convencer o movimento operário como um todo que é necessário levar a sério estas questões. CADV jogou um importante papel no convencimento de cada grande sindicato na Grã Bretanha a adotar nacionalmente a política de combate a violência doméstica. Essa é uma demonstração que, ao contrário da visão de Cliff, a grande maioria dos homens da classe trabalhadora podem ser ganhos para a luta contra a violência doméstica.
20. Naturalmente, a política correta e campanhas efetivas, não eliminam a violência, o assédio e preconceitos contra as mulheres no movimento operário. Enquanto o capitalismo prevalecer, todas as organizações, incluindo o CIT, não escapará de ser afetada pelo machismo na sociedade. Nós temos, portanto o dever de lutar para construir uma organização da classe trabalhadora que enfrente a violência sexual e assédio sempre que eles ocorrem dentro do movimento. Toda acusação de agressão ou assédio sofrido pela mulher deve ser tomada muito a sério, e investigado de forma confortável à mulher que fez a acusação. Isso é vital dado a experiência das mulheres nas mãos das instituições capitalistas, que frequentemente tem suas acusações menosprezadas e desacreditadas. Um resultado é que as mulheres muitas vezes não se sentem capazes a denunciar casos de violência contra elas. É muito mais comum mulheres deixarem de denunciar ataques sobre elas do que fazer acusações falsas. Não obstante, não podemos adotar a abordagem de que o homem acusado de agressão ou assédio é sempre culpado, independente de evidências para tal afirmação, ou ausência delas. Apoiamos o direito das vítimas de levar seus casos à polícia se quiserem.
21. As organizações operárias existem dentro do capitalismo. Elas não são modelo de uma nova sociedade, mas ferramentas para lutar para a construção de uma. Isso não é uma desculpa para não lidar firmemente contra todos os casos de assédio e abuso sexual, mas ao invés disso reconhecer que tais casos poderão ocorrer. É uma utopia imaginar que é possível criar um modelo socialista de sociedade dentro do capitalismo. Mesmo os setores com maior consciência de classe são produtos do capitalismo, entretanto, com todas as distorções na personalidade humana criadas por ele. Nós não podemos esperar que nossos membros – especialmente os novos membros – estejam totalmente formados com uma compreensão completa de todas as questões, incluindo o machismo. O objetivo dos socialistas e do movimento operário deve ser a de aumentar a compreensão de todas as questões ao longo do tempo, incluindo a opressão machista e tendo uma posição de enfrentamento a qualquer nível de assédio e abuso sexual.
22. Nós também devemos lutar por uma maior participação das mulheres nos espaços no CIT e no movimento operário como um todo. Primeira e principalmente esta é uma questão política. Ao adotar e lutar por um programa que é de interesse da mulher da classe trabalhadora, o movimento operário será mais atrativo para as mulheres entrarem nas nossas fileiras. Precisamos garantir que as discussões sobre perspectivas e programa incluam uma perspectiva socialista de gênero. Isso não significa que um programa correto irá – por si mesmo – superar o problema. Em todos os países a dupla opressão que sofre as mulheres significa que elas possuem um obstáculo extra a ser superado para militar, especialmente em períodos em que não há uma intensificação das lutas. Se isso é verdade para o movimento operário como um todo é ainda mais nos casos em que as mulheres aderem ao CIT, a qual é ainda relativamente pequena minoria revolucionária na sociedade. Particularmente nas sociedades em que a opressão das mulheres é mais brutal, é uma grande conquista construir um quadro feminino na organização, mesmo que sejam – até este momento – uma pequena minoria do partido.
23. Pode ser necessário em alguns momentos manter espaços separados de reunião de células/núcleos do partido para mulheres, particularmente novos membros, mas naturalmente isso deve ser sempre uma medida transicional com o objetivo de construir células/núcleos que envolve ambos homens e mulheres. Nós deveríamos nos esforçar para conseguir a metade de mulheres – ou mesmo a maioria como no atual Comitê Executivo da Inglaterra e Gales – nas direções dos organismos e células, nacional e internacional, em todos os níveis. Nós devemos lutar também para que camaradas mulheres joguem um papel de figura pública pelo CIT onde elas podem ser extremamente eficazes como o exemplo dos EUA e Irlanda. Entretanto estes objetivos não podem ser alcançados artificialmente, mas devem ter bases para o desenvolvimento do quadro feminino ao logo do tempo. Isso é crucial para que coloquemos esforços na formação política e na confiança das camaradas mulheres. As seções do CIT devem regularmente fazer um balanço e discutir que medidas podem ser tomadas para envolver mais mulheres na seção e sua direção.
24. A auto-organização da mulheres nos partidos de esquerda e movimento operário é muito importante para combater a ideia de que a opressão das mulheres é natural e para fortalecer a contribuição das mulheres para a luta de classes e ajudá-las a atingir seu pleno potencial. Isso pode ser feito através da organização de comissões ou setoriais de mulheres onde elas podem se reunir para discutir e formular políticas – específicas, bem como temas gerais do ponto de vista das mulheres. Isso cria um ambiente para que as mulheres se sintem mais confortáveis e fortalecer sua capacidade de intervir em outros lugares. Essas comissões não são órgãos de decisão. (São as células/núcleos, plenárias, direções eleitas e congressos que tomam as decisões.) As mulheres são a metade da classe trabalhadora, mas estão sub-representadas, especialmente nos órgãos dirigentes de partidos e sindicatos. Nós não acreditamos que vamos resolver este problema ou superar a discriminação contra as mulheres somente por essas medidas, mas eles podem ser de grande ajuda para envolver plenamente as mulheres na luta.
25. Diante dos nossos escassos recursos não será sempre possível fazer tudo que necessitamos; nós temos que nos esforçar para colocar em prática medidas para possibilitar que as mulheres possam ser mais ativas, tais como a garantia de creches, lugares seguros para as reuniões, dentre outros. Ao mesmo tempo nós temos que lutar para fazer o mesmo no movimento.
26. Em alguns países o movimento operário adotam cotas ou reservas de vagas como meio de inserir mulheres como representantes dentro da direção. Tais medidas não podem por si próprio superar os obstáculos que as massas de mulheres enfrentam para se tornar ativas no movimento operário, e podem até se tornar obstáculos concretos. Em alguns sindicatos na Grã Bretanha, por exemplo, medidas simbólicas tem sido tomadas para aumentar o número das mulheres na direção, mas é também usado pela ala direita do sindicato para fortalecer a sua posição na direção. Como resultado da deplorável falta de luta dos sindicatos, as massas das mulheres estão sem dúvida menos envolvidas ativamente no sindicato, apesar de ter mulheres na direção. Todavia, por causa da visão de que elas podem atuar como uma ferramenta para o aumento da participação das mulheres no movimento; nós geralmente não nos opomos as cotas, especialmente onde elas já forma introduzidas. Em alguns casos seções do CIT têm apoiado a introdução de cotas em organizações de trabalhadores e de esquerda, por exemplo no PSOL no Brasil, onde hoje a direção é composta por 50% de mulheres, o que tem jogado um papel de aumentar a participação de mulheres. Entretanto, podem haver ocasiões onde nós nos oporemos medidas particularmente simbólicas, e em todo caso, nós temos que clarificar que as cotas não irão solucionar o problema e que a construção de um programa de luta a partir das demandas das mulheres trabalhadoras e medidas práticas – tais como as creches – para ajudar as mulheres a se envolverem, são centrais.
25. O CIT tem orgulho de organizar campanhas com questões relativas as opressões específicas das mulheres e também de desenvolver quadros femininos no interior da direção do CIT. Entretanto, o que nós temos alcançado, de longe, é só o começo. Intervir energeticamente, e com clareza programática, no interior das lutas que irão eclodir, incluindo aquelas relativas as opressões especificas as mulheres, nos tornará hábeis a ganhar milhares de mulheres trabalhadoras para as nossas fileiras.