Porto de Mariel: Diplomacia solidária?
Por ocasião da viagem da presidente Dilma a Cuba, para a inauguração do Porto de Mariel, os setores conservadores da mídia nos brindaram com um festival de besteiras e desinformação. Com o objetivo explícito de atacar o PT pensando nas próximas eleições, ressuscitaram a velha lenga-lenga anticomunista de que o Brasil está ajudando uma ditadura de esquerda, ou que, enquanto o Brasil sofre de falta de verbas para áreas essenciais (Ah, é mesmo? Só agora descobriram isso?) o governo despeja milhões em obras caras no exterior.
Outro setor, a esquerda governista, apresenta tal fato como uma prova da política externa “soberana” e “solidária” do governo petista. Com isso, estaríamos “ajudando” a Revolução Cubana a contornar o bloqueio econômico do imperialismo e a enfraquecer a direita, etc…
Calma lá! Antes de tudo, a coragem de embate contra o imperialismo e a direita nunca foi uma marca do atual governo. Basta ver a postura frente ao escândalo de espionagem nos EUA, ou o leilão do Campo de Libra, ou mesmo a omissão eleitoreira nas questões de gênero e combate à homofobia, tudo para não provocar a direita evangélica cujos votos a Dilma buscou na última eleição.
Então, quais são os interesses que o governo atende ajudando a construir o porto de Mariel? Mais uma vez, o interesse da burguesia nacional e do grande empresariado. As ações da diplomacia brasileira em Cuba, como no resto da América Latina, tem muito pouco a ver com ideologia e muito a ver com interesses econômicos e geopolíticos bem concretos, e também não têm nada de novo. Desde o governo FHC, o Brasil, por meio do BNDES, apóia e estimula a internacionalização de empresas de capital nacional. Companhias como Odebrecht, Friboi, Petrobrás e Votorantim, através de empréstimos generosos, têm ampliado o alcance de suas operações para os países vizinhos e, para isso, contam também com a ajuda do governo brasileiro, que age muitas vezes como agente dessas empresas. Para só ficar em um exemplo, no Equador, Lula interferiu várias vezes junto ao governo Correa para que não expulsasse do país a Odebrecht (a mesma que está construindo Mariel), quando a imprensa daquele país denunciou diversas irregularidades na construção de represas. Fato comum, pois em todos os países onde atuam, as empresas brasileiras não são muito conhecidas por seu respeito ou cumprimento às normas ambientais e trabalhistas locais.
No caso de Cuba, há uma situação muito especial: desde a ascensão de Raul Castro, a ilha tem visto uma série de transformações com o claro objetivo de reintroduzir relações sociais capitalistas. Medidas como a demissão em massa de funcionários públicos, aumento da idade de aposentadoria e um novo código de trabalho que flexibiliza os direitos trabalhistas, tudo isso tem por objetivo, em última instância, atrair investidores internacionais, interessados em mão de obra barata e qualificada. Na falta de investimentos dos EUA, que se apegam a uma postura intransigente de não negociar até que o regime caia, Cuba se volta para outros países, como China, Espanha, Brasil e Canadá, mais interessados em fazer negócios do que em preconceitos ideológicos da época da Guerra Fria.
Nesse contexto, o Brasil está em uma posição relativamente privilegiada. Graças à falta de concorrência e aos financiamentos generosos do BNDES, o Brasil espera ter uma fatia grande do mercado cubano, que só aumentará em um futuro de maior abertura econômica. De acordo com dados do governo, o Brasil já é o segundo maior exportador para Cuba, atrás apenas da China. O porto de Mariel foi construído graças a empréstimos do BNDES que já somam US$ 682 milhões. Aliás, o porto de Mariel é um exemplo ilustrativo de que, em se tratando de negócios, o Brasil não faz caridade. Segundo as cláusulas dos empréstimos, as obras são executadas por uma empresa brasileira (a Odebrecht), todo o material e equipamento utilizados lá devem ser fabricados no Brasil. O mesmo que é feito em todas as obras realizadas por empresas brasileiras em todos os países da América Latina. Por um lado, isso tem o objetivo de gerar empregos aqui no Brasil. Por outro, fortalece a presença de empresas brasileiras no cenário internacional, já que tais cláusulas de empréstimos são praticamente uma reserva de mercado: o país que pega empréstimos do Brasil não pode utilizar o dinheiro com outros produtos que não sejam brasileiros. Já que, comparados com produtos feitos por empresas de outros países, em especial dos EUA e Europa, os brasileiros são relativamente mais caros e menos avançados. Isso protege as empresas brasileiras da concorrência. Segundo a Folha de São Paulo (27/01/2013), já são 300 as empresas brasileiras com presença em Cuba, que são atraídas pelos planos do governo brasileiro de oferecer uma linha de crédito de até R$ 1,2 bilhão de reais por ano para que Cuba compre produtos do Brasil.
Com a construção de Mariel, estrategistas empresariais brasileiros também esperam conseguir uma plataforma para ampliar suas operações e chegar ao mercado de outros países do Atlântico e atingir novos mercados, sempre com o governo brasileiro e o BNDES como fiadores. Mais uma vez, o governo do PT atua com competência quando se trata de garantir os interesses do grande empresariado brasileiro. Quanto aos trabalhadores e pobres do Brasil e de Cuba, eles pouco vão ganhar com isso.
A verdadeira solidariedade que Cuba precisa é em apoio da defesa das conquistas da revolução que ainda estão presentes, contra a ala da burocracia que busca seguir o caminho chinês para reintroduzir o capitalismo e os abutres capitalistas que buscam qualquer abertura para começar a explorar um novo mercado e apagar o símbolo d a luta pelo socialismo e contra o imperialismo que Cuba ainda representa nas mentes de milhões na América Latina.