Pan-demônio ou demônio do Pan?
Faltam poucos dias para a largada dos jogos pan-americanos no Rio de Janeiro, e o clima de euforia, que a mídia tenta transmitir, choca-se com a vida dos trabalhadores cariocas que só sofrem com o evento. Eufóricos estão, apenas, os empresários, com os bolsos cheios e em busca de mais verbas públicas.
O Pan claramente não beneficia a população e sim apenas empresários da área de especulação imobiliária e do comércio. Já foram gastos quase 7 vezes mais do que o planejado no projeto original. Em números absolutos, o gasto público chega a 3,2 bilhões de reais. Boa parte desses gastos, por serem considerados urgentes, dispensaram licitações. Em resumo, de um lado, o Pan é a festa das empreiteiras.
Sem participar efetivamente da elaboração do evento, além de não serem beneficiadas, muitas pessoas estão sendo seriamente prejudicadas, como aquelas que foram e estão sob ameaça de remoção de suas residências de forma ilegal pela prefeitura.
O caso mais escandaloso é o da Vila Pan-Americana. Construída com verba do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), a Vila é um grande negócio imobiliário. Em oito horas foram vendidos 1300 apartamentos, dos 1480 da Vila Pan-Americana. Hoje, já se compra apartamentos de 1 quarto, vendidos pelo governo por 100 mil, por 160.000 mil reais. Ou seja, usou-se a verba destinada a ações para a melhoria da vida dos trabalhadores em prol da especulação imobiliária.
Outro efeito da elitista Vila Pan-Americana é o processo de despejo iniciado no Canal do Anil, vizinho à Vila. Já foram demarcadas casas de 550 famílias. Entrevistada pela Rede Nacional de Jornalistas Populares, uma moradora da comunidade disse: “Picharam a minha casa com um número sem a mínima explicação. Depois fiquei sabendo que seria removida. Toda a minha vida está ali, hoje durmo e não sei se acordarei com minha casa”.
Reestruturação da cidade
As remoções não são realidades apenas dos vizinhos à Vila. Na verdade, a prefeitura vem utilizando o Pan como argumento para mais rápido e facilmente remover favelas.
Trata-se de um projeto de reestruturação urbana que pretende remover 28 comunidades de baixa renda, sem o mínimo de diálogo e participação. Segundo o representante da FAFERJ (Federação das Associações de Favelas) José de Oliveira – durante o Seminário “Favela é Cidade” –, 14 favelas foram intimadas a ser removidas, em outubro de 2005, sendo que muitos moradores possuíam título de propriedade, todas as casas eram de alvenaria existentes mais de 5 anos no local, e ainda alguma comunidades já havia realizado o Favela-Bairro. Nesse mesmo evento tais representantes denunciaram a retirada de duas favelas; favela da Harmonia e Arroio da Pavuna localizada próximo à Barra da Tijuca, área nobre, que aconteceram na calada da noite, de forma ilegal, pela prefeitura.
Uns dos possíveis instrumentos utilizados pelo Estado favorecendo tal incremento é a modificação do artigo 429 da lei orgânica da cidade, garantida pelo estatuto da Cidade. O artigo dá o direito, no caso de remoção, do morador permanecer num raio de até 500 metros do local de origem. Com a modificação, em tramitação no Congresso, o indivíduo seria deslocado para lugares muito longe, negando a sua história construída ao longo do tempo em que viveu ali. Graças à pressão popular, o projeto de lei está paralisado.
Evidentemente, os alvos são aquelas comunidades que estão mais próximas das áreas nobres do Rio de Janeiro, onde os empreiteiros esperam a valorização desses espaços. Como aquelas localizadas em Vargem Grande e Recreio, onde a valorização dos terrenos acelera.
Para conseguir remover as favelas, as armas usadas são os argumentos que põem as favelas como inimigas do meio ambiente pelo crescimento desordenado. Por outro lado, não se faz críticas do crescimento vertical e acelerado dos condomínios de luxo, pois esses essencialmente são os que causam impacto ao meio ambiente.
Nesse caso, o vínculo de cumplicidade entre especuladores imobiliários e prefeitura tem no Pan a bala da arma, porque é daí que surgi o fortalecimento entre os dois e essa bala atinge os pobres.
Estado de exceção
Durante o Pan, um verdadeiro estado de exceção nos aguarda. Qualquer aglomeração pública de 50 pessoas poderá ser dispersada pela Força Nacional de Segurança – braço do exército. Para poder se manifestar, deve-se ter a autorização da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e a Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp). Segundo o Jornal do Brasil (03/06/07) esses órgãos avaliaram consultando a ficha corrida dos manifestantes e outros procedimentos não revelados! Não há dúvida que isso será usado para diminuir a resistência popular aos planos elitistas da prefeitura e dos governos estadual e nacional.
Resistências
As ações do Pan, no entanto, não estão sendo feitas sem resistência. No 1º de Maio, uma manifestação na Vila do Pan reuniu centenas de moradores, a Central de Movimentos Populares e partidos como PSOL, PCB e PSTU.
Com a mesma coragem, os operários que trabalham na construção do Estádio João Havelange, mais conhecido com Engenhão, fizeram uma greve relâmpago vitoriosa por melhores condições de trabalho. Os Operários reclamavam da qualidade da alimentação, da falta de água potável que muitas vezes estavam em temperatura maior que a ambiente e na entrega demorada dos seus almoços.
Inspirados por essas experiências é que devemos nos preparam para impedir que o Pan seja usado ainda mais contra os trabalhadores cariocas. Denunciar e mobilizar contra as ilegalidades e injustiças que estão sendo cometidas para a diversão e lucro de poucos!