Balanço da greve de educação no RJ: Radicalizar a democracia e reafirmar o SEPE na luta!

Estamos saindo de duas greves que, sem dúvida nenhuma, marcarão a história deste sindicato, não só pela capacidade de garantir o avanço da consciência crítica da base da categoria mobilizada, como também, e principalmente, pela forma como fomos capazes de colocar em questão o projeto do Capital para a educação pública em nosso estado e município.

Sem dúvida nosso movimento poderia ter possibilitado outros avanços, fundamentais para preservar nossa carreira e para garantir uma educação de qualidade, que é direito de nossos alunos. Infelizmente erros de avaliações e conduções da nossa greve enfraqueceram um canal importante nessa disputa, os espaços de negociação e/ou confrontação com os governos e instituições.

Para nós do Campo Luta Educadora, que também somos parte da direção – embora de forma minoritária – e que não nos alinhamos às posições do bloco majoritário constituído a partir das greves (conformado principalmente por grupos que compõem a coordenação geral central), nenhum espaço de luta pode prescindir da participação da base da categoria. Muitos de nós, que conhecem o SEPE há mais tempo, vivenciaram inúmeras experiências de greves onde a base esteve presente junto à direção, nas mesas de negociação.

Retomar essa prática significa restabelecer a confiança mútua entre base e direção, elemento fundamental para garantir a estabilidade de qualquer movimento grevista.

Voltando às escolas o grande desafio será manter a mobilização e organização para próximos embates que poderão surgir no próprio local de trabalho. O papel do sindicato nesse momento é fundamental, ele é o nosso instrumento de classe e devemos defendê-lo de todo e qualquer ataque oportunista.

Para fortalecer essa ferramenta de luta devemos radicalizar a democracia ocupando os espaços que demandam a participação da base. Precisamos eleger representantes em todas as escolas e creches, garantir as instâncias decisórias em nossos núcleos, regionais e nos grandes fóruns centrais, constituir espaços de formação política e sindical, trabalhar para que o SEPE realize o mais rápido possível o seu XIV Congresso. Dessa forma manteremos aceso o debate acerca das nossas questões mais imediatas, ao mesmo tempo em que nos preparamos para os grandes embates futuros.

A greve acabou, mas a luta continua

Com certeza essa afirmação é verdadeira. Sabemos que o nosso enfrentamento com os governos que hoje implementam um modelo de educação subserviente aos interesses do mercado, em detrimento às necessidades de formação humana de nossos alunos, não se esgota em uma greve. Entretanto tal afirmação não pode funcionar como cortina de fumaça, negando um honesto e necessário balanço dos processos que acarretaram avanços e retrocessos em nossas greves, pondo em risco nossas lutas futuras. 

Nós da LE consideramos um grande avanço a participação da base na condução das duas greves. A greve da rede estadual, por exemplo, eclodiu por subversão de uma base mais radicalizada, apesar das inúmeras tentativas que partiram de setores majoritários da direção do sindicato, de frear o movimento.

O mesmo método, infelizmente, também se verificou no movimento da rede municipal, inicialmente na Assembleia extraordinária realizada no Terreirão do Samba, em 26 de agosto e, posteriormente, na assembleia que deliberou a primeira suspensão da greve (10/09), antes mesmo da categoria ter tido acesso a minuta de plano de carreira que foi enviada à Câmara de vereadores.

O desfecho de todos esses erros e atropelos foi uma greve da rede estadual conduzida pela base, com ações mais radicalizadas como a ocupação da SEEDUC e o acampamento na ALERJ, que conseguiram dar visibilidade ao movimento, mas que por não ter o apoio efetivo da direção majoritária do sindicato não avançaram para o interior do estado e outras regiões fundamentais, como a Baixada Fluminense por exemplo. Isso resultou em baixos índices de adesão, considerando a totalidade da rede, e serviu de argumento para as inúmeras tentativas, da maioria da direção, de suspender o movimento.

A rede municipal por sua vez, demonstrou coragem e atropelou a direção majoritária do sindicato no Terreirão do Samba mantendo a greve, mas os constantes equívocos e erros na condução de assembleias e processos de negociações, como os ocorridos na Fundição Progresso e nas diversas atas acordadas em reuniões com a prefeitura, geraram insegurança e levaram a categoria a sair da greve de forma prematura, na assembleia do dia 10 de setembro, dando um voto “de confiança” aos setores da direção que afirmavam que as negociações já haviam garantido os avanços possíveis.

O resultado desses equívocos foi a proposta nefasta de plano de carreira que chegou a Câmara e que foi votada de forma autoritária, com a cidade sitiada e os profissionais da educação sendo covardemente agredidos na Cinelândia.

Foi a determinação da base da categoria que garantiu, apesar de tudo, um desfecho positivo para o nosso movimento, dimensionando a nossa luta e construindo laços de solidariedade com trabalhadores em todo o país.

A ocupação da Câmara Municipal e os atos de rua que unificaram os trabalhadores da educação pública do ensino básico em greve com outras categorias e população em geral, colocando 100 mil pessoas nas ruas do dia 15 de outubro dia do professor, rememoraram as passeatas de junho e deram repercussão nacional e internacional a nossa luta.

O saldo positivo de ações vitoriosas organizadas pela base da categoria, contrastado aos erros e atropelos de uma direção que demonstrou total falta de habilidade para lidar com culturas e práticas militantes renovadas, sinaliza a urgência de repensarmos uma melhor forma para organizar as nossas próximas greves. A tolerância, humildade e capacidade de fazer uma boa auto crítica nos parece fundamental para diminuir desconfianças e estabelecer canais de diálogo e cooperação entre aqueles que constroem e dirigem as lutas.

Comunistas, anarquistas e black blocs. Quem tem medo da base?

O SEPE é um sindicato que se orgulha da sua composição plural. A proporcionalidade nas eleições garante a democracia de ideias, permitindo o convívio no interior da direção de diferentes organizações com distintas concepções e nuances teóricas. Também impede a cristalização de um pensamento único e autoritário.

Sem dúvida não é um exercício fácil conviver entre tantas diferenças, mas para nós, essa pluralidade de certa forma também reflete a diversidade de concepções presentes na base de nossa categoria, e é o que reivindicamos como a melhor maneira de expressar os interesses de nossa classe.

Diante de uma conjuntura tão rica, com a retomada das grandes mobilizações, a massa ocupando as ruas para reivindicar direitos e confrontar a violência do Estado burguês, organizações de esquerda tradicionais, como partidos e sindicatos, sendo questionados por causa de experiências negativas recentes como a traição de classe feita pela CUT e pelo PT, é natural que surjam também no SEPE movimentos de oposição pela base.

Esse processo precisa ser entendido como saudável e legítimo para oxigenar o nosso sindicato e potencializar as nossas lutas. A participação dessa nova camada de ativistas no SEPE, organizada ou não, formada também por grupos com culturas militantes distintas (horizontal, descentralizada) e que destoam do modelo mais tradicional da maioria das organizações da esquerda (centralizado, hierárquico e estável) foi fundamental nas duas últimas greves, principalmente para garantir ações que exigiram uma maior radicalização da nossa base.

Infelizmente todo esse  vigor e radicalidade de uma nova camada de ativistas do SEPE não se expressou nas atitudes e negociações conduzidas pela atual direção. A gota d’água foi o acordo firmado no STF que pôs fim as greves. Por conta disso acirraram-se as disputas entre setores descontentes da base e a maioria da atual direção.

Em nossa opinião alguns setores da direção erram mais uma vez ao tentar rechaçar e criminalizar esses novos grupos. Nós do campo Luta educadora não somos anarquistas, mas somos a favor da democracia direta através das decisões em assembléias e somos a favor de ações mais radicalizadas como acampamentos e ocupações em órgãos públicos como fizemos ativamente nesta greve. Para nós os anarquistas e os simpatizantes das táticas black blocs são parte da nossa categoria, lutam cotidianamente em defesa da escola pública, constroem nossas greves e atos, e tem todo o direito de disputar os espaços do nosso sindicato.

Nunca existiu patrulhamento ideológico no SEPE e não será essa direção que irá inaugurá-lo. A nossa tarefa, ao contrário, é tentar aproximar essa nova camada de ativistas, construir espaços amplos de formação política, garantindo o diálogo fraterno entre as diferentes culturas e concepções, buscando fortalecer pontos que nos unifiquem, tendo como objetivo acumular toda essa energia que está surgindo no interior da nossa categoria, e que sem dúvida será determinante para derrotarmos os atuais e futuros ataques à educação pública.

O SEPE somos nós! Nossa força e nossa voz!

Você pode gostar...