Europa “ingovernável” entra em depressão econômica
Espanha e Grécia na vanguarda da profunda crise econômica, política e social na Europa
A Europa foi o centro da discussão da Escola de Verão do CIT de 2012, que ocorreu na Bélgica semana passada com 400 participantes. Essa discussão foi introduzida por Peter Taaffe e houve um grande número de excelentes contribuições de camaradas socialistas que estão enfrentando situações reais e imediatas, internacionalmente.
A crise mundial inventou uma série de novas palavras: “Grexit”, “spanic”, “brixit”, dentre outras, para representar as diferentes possibilidades na crise. Mas o que ninguém poderá fazer é resolver essa crise econômica se baseando no capitalismo. Nem mesmo o capitalismo alemão, como a Chanceler Angela Merkel confessou, tem fontes ilimitadas. Na década de 1920, o Plano Dawes, sustentado pelo capitalismo americano, salvou a Alemanha e toda a Europa por seis anos até o Wall Street quebrar e iniciar a Grande Depressão; isso foi o preço econômico pago para impedir a revolução. Agora, nenhum poder no mundo pode agir de forma similar para resolver a crise na Europa.
Os capitalistas europeus criaram um Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) para socorrer as economias em dificuldades. Mas o montante das dívidas da Espanha e Itália, os próximos países na linha de fogo, chega a 2,8 trilhões de euros, seis vezes mais que a reserva do MEE! Economistas e políticos dizem que um colapso do euro é inconcebível, disseram o mesmo da União Soviética. Em ambos os casos, os capitalistas não conseguiam ver como a situação poderia se sustentar, todavia não puderam prever seu colapso! No caso do euro, os eventos trazidos pela crise econômica mundial irá conduzir o seu desaparecimento. Peter ressaltou que houve 70 colapsos de moedas desde 45.
O CIT previu antes da criação do euro que ele carregava dentro de si todas as sementes para sua própria destruição. O prolongado período de crescimento econômico até 2007 impulsionou seu lançamento e fez que ele durasse tanto tempo. Mas a profunda crise econômica e política, que esta abalando todas as instituições, faz com que a zona do euro cambaleie de uma crise para outra.
O Norte da Europa não está imune
O Norte da Europa tem sido afetado pela crise, na Suécia o desemprego na juventude atingiu 28%. A Escandinávia, particularmente a Suécia, como Arne Johansson do Rättvisepartiet Socialisterna (seção sueca do CIT) apontou, já foi modelo de um projeto de estado de bem estar social e da social democracia, hoje é um modelo de privatização neoliberal dos serviços públicos sob o governo de direita. Livros estão sendo escritos sobre o desaparecimento do “modelo sueco”. Os petroleiros têm feito greves na Noruega e a crise é tão aguda na Holanda que o partido de esquerda, Socialist Party, vem tomando a frente nas pesquisas de opinião. Até mesmo a Alemanha não esta imune; apesar do seu crescimento, em parte devido a desvalorização, a longo prazo, do euro comparado com o “deutschemark”, os partidos governistas tem sido atingidos por maus resultados nas eleições regionais.
O Leste Europeu e os países da anterior União Soviética também têm sido devastados pela crise, o que tem causado levantes políticos e econômicos na Hungria, Romênia e outros lugares. A intervenção do CIT no Cazaquistão tem mostrado possibilidades de ganhar base para genuínas ideias socialistas em países ex-stalinistas. Mas é principalmente do sul da Europa onde a situação social, econômica e política é mais aguda, com Grécia na vanguarda e Espanha, Portugal, Itália, Irlanda e outros não muito atrás.
Grécia
A Grécia, a pesar de sua economia equivale a menos de 2% do PIB da zona do euro, é importante para os capitalistas da Europa, a classe trabalhadora e o CIT. Nós estamos assistindo avidamente como a nossa seção grega tem enfrentado com garra a tarefa de tirar uma linha política frente a cinco anos de depressão, condições sociais terríveis, que piora a cada dia, numa sociedade forçada para trás pelos bárbaros europeus capitalistas, representados pela “troika” da União Europeia, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Central Europeu. Nas recentes eleições gerais, a maioria dos eleitores gregos, apesar da redução de comparecimentos, votaram em partidos contrários aos pacotes de austeridade impostos. No entanto, o sistema eleitoral, que dá ao vencedor das eleições legislativas 50 mandatos extras, permitiu ao partido de direita Nova Democracia a formar um governo pro-austeridade com o ex-socialista PASOK e seu racha, Esquerda Democrática. Este governo já desistiu (se eles em algum momento foram sinceros com suas promessas eleitorais) de renegociar o pacote de austeridade aceito pelos governos anteriores e avançará com novos cortes.
Nossa seção grega enfrenta grandes desafios, defendendo a classe trabalhadora de ataques, colocando as demandas corretas que possibilitam avanços na consciência e buscando a melhor tática, para ganhar os mais combativos dos trabalhadores e da juventude para as ideias marxistas genuínas. A situação foi explicada graficamente por Nikos Kanellis e Nikos Anastasiadis da seção grega: as manifestações recorrentes no centro de Atenas, as greves gerais que não conseguiram derrotar as medidas de austeridade, e o efeito das eleições como um “terremoto político”, que superou o desânimo depois do fracasso das greves gerais. Syriza foi de 4% de votos em 2009 para 26% em junho de 2012 e isso atraiu para suas fileiras ex-apoiadores do PASOK, que pode ser perigoso se puxar Syriza a direita. De fato, uma falta de linha mais firme e clara, particularmente sobre o euro, nos últimos dias da eleição pode ter custado a vitória do Syriza.
Grécia, num certo momento, não irá honrar suas dividias e será expulsa do euro. A questão de uma nova moeda estará colocada. O euro tem sido bem associado com a idéia de modernidade comparado com o velho dracma, mas como os trabalhadores irão se defender se a Grécia (ou qualquer outro país) for forçado a sair? Portanto, nós não colocamos “Saia do euro”!, mas os trabalhadores, apesar de sentirem que o euro foi um passo a frente, não tolerarão anos de dívidas impostas pela Zona do Euro e pressionarão para sair no futuro.
Alguns economistas capitalistas – como os da “Deutsche Bank” (banco central alemão) – tem levantado a ideia de uma moeda paralela para funcionar ao lado do euro por um período. Isso teria como efeito a redução dos padrões de vida através da desvalorização interna. A ruptura da Argentina do vínculo dólar-peso na virada do século XXI foi acompanhada por moedas paralelas, mas isso excluiu grupos da sociedade do sistema monetário e reintroduziu o escambo. Houve uma discussão sobre essa questão na escola e nós continuaremos a debater o tema.
Esses pontos levantaram a discussão sob quais seriam as melhores reivindicações para apresentar para os trabalhadores. No entanto, como Lynn Walsh da Secretaria Internacional apontou, independente do destino do euro, socialistas na Grécia devem reivindicar o cancelamento das dívidas, a nacionalização dos bancos e da indústria, a rejeição da austeridade, o controle do cambio externo e do comércio como parte de um plano socialista que é a única forma de defender os padrões de vida dos trabalhadores.
Ameaça do Aurora Dourada
A extrema direita na Grécia, na forma do Aurora Dourada, ganhou cerca de 7% nas duas eleições gerais esse ano. O crescimento da extrema direita por toda a Europa é o outro lado da moeda desse período de aumento das ideias socialistas. Enquanto a crise forçará trabalhadores para a esquerda, a extrema direita irá também ganhar quando as organizações da classe trabalhadora não derem respostas fortes o suficiente, como já tem sido visto na Grécia, na Hungria com Jobbik, com os votos da Frente Nacional na França e outros partidos de extrema direita na Europa. Ter as ideias corretas para enfrentar a extrema direita, o que significa assumir os problemas sociais que eles exploram, é vital para as seções do CIT.
Formações alternativas também surgiram onde os partidos tradicionais, ambos direita e esquerda, tem sido desacreditados pelas políticas de austeridade pró-capitalistas. O sucesso do partido “Pirata” na Alemanha e o movimento do comediante Bepe Grillo na Itália mostram o descontentamento com as “velhas” políticas por toda a Europa.
A situação na Grécia tem elementos de uma guerra civil. Não é por coincidência as comparações que ocorreram com a República de Weimar na Alemanha entre 1919 e 1933, e particularmente o regime de austeridade do Chanceler Bruning, que levou à ascensão nazista. Entretanto, nós temos que advertir que a ideia de que os capitalistas podem ir diretamente para um regime militar ou fascismo é errada. A classe trabalhadora terá um número de oportunidades antes de isto estar colocado, mas socialistas precisam avisar os perigos se a classe trabalhadora falhar em assumir o poder.
Espanha
Recentemente grande parte do foco da atenção tem passado para a Espanha, onde a situação lembra àquela que antecedeu a guerra civil. Medidas de austeridade provocou reações massivas, caracterizado pela marcha dos mineiros da Astúrias a Madrid para protestar o corte de subsídios no carvão. O Primeiro Ministro Rajoy enviou um texto durante as negociações da cúpula europeia, protestando contra propostas de medidas duras, em que disse: “Espanha não é Uganda”. Infelizmente para ele, foi apontado que a economia da Uganda estava crescendo enquanto a da Espanha estava encolhendo. A crise bancária deixou garantias de 100 bilhões de euro diretamente para os bancos da Espanha, porém isso não vai resolver os problemas subjacentes da economia e o governo espanhol necessitaria provavelmente de um resgate separado.
A crise na Espanha também levantou o debate da questão nacional. As regiões autônomas controlam quase 40% dos gastos públicos. Políticas de austeridade enfrentarão a raiva das nacionalidades e regiões, especialmente na Catalunha, o país Basco e mesmo em Andaluzia. Um nacionalismo de esquerda pode se desenvolver, com lutas contra a austeridade combinadas com sentimentos nacionalistas. Isso também pode ser o caso na Escócia, País de Gales, assim como a de outros países europeus. O papel dos marxistas é apresentar um programa sobre a questão nacional que esteja ligada com a luta contra capitalismo e pelo socialismo.
François Hollande ganhou as eleições presidenciais na França, e o Partido Socialista as eleições para a assembleia, prometendo algumas concessões, mas nada na escala de François Mitterrand, presidente que nacionalizou 38 bancos antes forçados a rever sua política no início dos anos 80. O ceticismo em relação a todos os partidos foi mostrado pela abstenção nas eleições. Os votos eram mais contra Sarkozy e o UMP que pró-socialistas. O fator significativo foi o aumento da Front de Gauche (Frente de Esquerda) liderada por Mélenchon.
Partidos de Esquerda
Como o CIT explicou a partir dos meados da década de 90, a mudança da antiga socialdemocracia e Partidos Trabalhistas europeus para abertamente adotar o capitalismo deixou um espaço para as novas formações apresentarem as ideias socialistas. Partidos como a Rifondazione Comunista (Refundação Comunista) na Itália cresceu nos anos 90, mas retrocedeu quando falhou em desenvolver políticas socialistas claras.
A crise tem estimulado a construção e crescimento das novas formações, incluindo a Front de Gauche, o Partido Socialista na Holanda, Die Linke (A Esquerda) na Alemanha e outros. O Syriza tem sido empurrado para uma posição de disputa de governo e pode compor o próximo governo da Grécia quando o atual cair, o que muito provavelmente ocorrerá e em não muito tempo. O CIT tem se orientado para essas novas formações que, mesmo ainda não tendo necessariamente uma grande base de militantes, eleitoralmente representam uma força onde os trabalhadores e juventude entrarão, nesta ou em organizações similares, no futuro. O CIT estará presente nessas organizações para dar uma direção socialista clara para eles.
Peter também fez referência a situação na Irlanda, onde a United Left Alliance (Aliança da Esquerda Unida), incluindo a seção do CIT, o Socialist Party, agora tem 5 TD (membros no parlamento) e está comandando uma campanha massiva contra um novo imposto por domicílio. Sinn Fein, o partido do republicanismo na Irlanda, pode se tornar o maior partido no sul na próxima eleição, e uma bancada forte de socialistas podem também ser eleitos. Como Joe Higgins, um dos TD do Socialist Party, apontou que o partido vem sofrendo ataques de alguns setores da direita da imprensa, que vem usando um falso pretexto de uso de “despesas” dos TD para apoiar a campanha contra o injusto novo imposto domiciliar. O governo está intimidando os não pagadores do imposto, mas essa campanha pode ser tão grande quanto a “poll tax” na Grã-Bretanha, que levou à queda da Thatcher.
O governo de coligação da Grã-Bretanha é dilacerado com as divisões internas, o que tem acarretado um ressurgimento de greves nos setores público e privado. A “rede nacional de delegados sindicais” (National Shop Stewards Network) está jogando um papel importante em dinamizar o movimento sindical. A Coalizão Sindical e Socialista (Trade Unionist and Socialist Coalition) está começando a fazer um pequeno, mas importante avanço no plano eleitoral.
A Europa tem se tornado “ingovernável”, já que entra na fase de “japonesificação”, um longo período de depressão. “Quanta dor os países sob estresse podem suportar? Ninguém sabe. O que acontecerá se um país sair da zona do euro? Ninguém sabe. Alemanha talvez considerará sair? Ninguém sabe. Qual a estratégia a longo prazo para sair da crise? Ninguém sabe. Dada tamanha incerteza, pânico é, infelizmente, racional. Uma moeda imposta apoiada por países heterogêneos é irremediavelmente frágil. Até agora, eu não tinha realmente entendido como os anos 1930 pode acontecer. Agora eu consigo”. Esse foi o prognóstico sombrio para o capitalismo de Martin Wolf no Financial Times. Mostra o extremo pessimismo dos capitalistas europeus.
Militância sindicalista
Peter concluiu que marxistas precisam se enraizar na situação. A geração jovem vigente será “a geração sortuda”. Por 50 anos, os pioneiros do marxismo na Europa tiveram desenvolvimentos maravilhosos, mas dariam tudo para poder participar desses eventos atuais. Nós podemos agora olhar adiante para a revolução socialista que se desenvolve na Europa e mundialmente.
Em resposta a excelente discussão, Tony Saunois da Secretaria Internacional ressaltou o crescimento na militância sindical. As greves gerais que tem ocorrido tem sido manifestações, que alguns dirigentes sindicais andam muito ansiosos para sufocar. Nessas greves ainda não se levantou a questão do poder para a classe trabalhadora. Isso virá no futuro, como virá a necessidade dos trabalhadores se organizarem politicamente, em formações amplas ou em partidos revolucionários diretamente. No momento atual, ainda teremos um clima anti-partidário nos maiores países da Europa.
As tarefas do CIT incluem construir nossas próprias seções mas também lutar por novos partidos de massas com a demanda de transformar essas novas organizações em parte da luta para transformar a sociedade. Nesse sentido, nossas seções precisam crescer dentro de partidos maiores e grandes acontecimentos. Tony disse que nós estamos em uma crise prolongada e em uma corrida contra o tempo. A questão chave para o CIT é encarar os desafios e construir nossas forças para transformar a sociedade.