Descriminalização do aborto em caso de anencefalia – a luta pela legalização integral do aborto continua!

Esse ano a luta das mulheres teve uma vitória no dia 12 de abril! Mas essa é apenas uma vitória parcial. Depois de dois dias de discussão o Supremo Tribunal Federal (STF) aprovou por 8 votos a 2 a descriminalização do aborto em caso de anencefalia.

No Brasil, a descriminalização do aborto em dois casos específicos esta prevista na Constituição Federal: estupro ou risco de morte da mãe. No entanto, mesmo nestes casos, não há garantia de acesso a uma interrupção, mesmo a mulher comprovando o seu estado de desgraça ou morte eminente. Nos casos de anencefalia, muitos profissionais se recusavam a realizar o procedimento, mesmo com a autorização judicial, a anencefalia era analisada caso a caso com ações demoradas na justiça, resultando várias vezes numa gestação completa onde a decisão favorável para a interrupção terapêutica era julgada após o nascimento do feto, onde ai literalmente falando, “Inês já é morta”.

Processo durou 8 anos

Vale lembrar que a Confederação Nacional de Trabalhadores da Saúde ingressou com uma ADPF 54 – Ação de Descumprimento de Direito Fundamental – em 2004 e só agora, passados 8 anos que o Supremo debruçou-se sobre o tema, depois de dois dias de intensos debates. É interessante observar que os votos contrários afrontam diretamente os preceitos fundamentais da Constituição Federal que garantem a não interferência da religião no Estado, que garantem o direito a vida e a dignidade da pessoa humana, da saúde, da privacidade da mulher. Esta afronta reflete uma posição conservadora que se iniciou na campanha de Dilma, onde a bandeira pela legalização e descriminalização do aborto foi usada como moeda de troca para garantir sua eleição e uma falsa governabilidade.

Tais fatos nos colocam de volta ao tema da discussão onde fazemos várias perguntas, afinal, acreditamos que a mulher que queira ter filhos tem TODO esse direito e o Estado deve garantir-lhe condições para tê-lo, com um acompanhamento no serviço público de saúde e na assistência social! Mas fica a pergunta: e a que não quer!? E a vida dessa mulher? Ela não pode ter nenhuma relação sexual? E se tem, não pode decidir pelo seu corpo? E a que engravida e descobre que terá um filho anencéfalo? Tudo bem ela ter uma gravidez de risco e poder morrer junto com seu filho? Tudo bem ela gestar 9 meses um filho que não vai viver mais de uma hora por malformação, tendo praticamente uma “gravidez funeral”? E a vida dessa mulher!? E a saúde dessa mulher!? Saúde física e mental… na verdade DESSAS mulheres, pois milhares de mulheres morrem em consequência de abortos clandestinos e complicações do parto todos os anos, para além dos casos de anencefalia! Por isso somos a favor da legalização do aborto!

Por quem lutamos

Lutamos hoje pelo direito das mulheres, que estão inseridas numa cultura que valoriza amplamente o processo de gestação em suas vidas, como se elas nascessem apenas pra isso, como se a gravidez fosse uma missão, um dever.

Lutamos pelas mulheres que não querem ter mais filhos, devendo se submeter a uma moral que não permite que elas digam não a seus parceiros na hora do sexo, e ao mesmo tempo lhes proíbem o uso do mais básico dos contraceptivos que é a camisinha. Lutamos pelas mulheres que enfrentam um Estado muitas vezes omisso e até mesmo opressor, que vira as costas para seus direitos de uma saúde plena para submeter-se à valores religiosos. Lutamos pelo direito das mulheres pelos seus corpos e pelo direito à decisão sobre se querem ou não continuar com uma gestação, sendo ela de risco ou não.

Lutamos também, pela saúde das mulheres que querem ter seus filhos, mas, infelizmente, o feto é anencéfalo. Lutamos pela preservação da saúde mental e física dessas mulheres. Quando dizemos saúde física, nos referimos ao fato dessa gravidez trazer sérios malefícios à mulher, como por exemplo, hipertensão arterial, excesso de líquido amniótico com consequente hiperdistenção do útero, o que pode levar a grandes hemorragias. Quanto à saúde mental, nos referimos à tortura que é pra uma mulher não poder cuidar do seu filho quando ele nascer, não poder acariciá-lo, dar banho, amamentar, vê-lo correr, brincar e amá-lo como deseja. Pois, nada deve ser tão deprimente e mortífero pra uma mulher que quer ser mãe, sentir seu filho crescendo dentro dela e não poder segurá-lo no colo, vê-lo viver, por conta desta malformação.

Vale salientar que a decisão do STF não obriga nenhuma mulher a interrupção terapêutica, sendo esta uma gravidez anencefálica. Ela apenas assegura que, pelo menos, nos casos permitidos por lei, de estupro, risco de morte pra mãe e agora anencefalia, haja o DIREITO DE ESCOLHA!

A vitória é ainda parcial

Apoiamos a decisão majoritária do STF neste caso, mas não podemos deixar de analisar que é uma vitoria parcial, pois a mesma justiça burguesa que votou favorável a anencefalia, também absolveu recentemente um pedófilo com o argumento de que as três meninas de 12 anos já eram prostitutas na ocasião dos fatos. Como se com prostitutas pode-se fazer o que quiser independente da idade. Caso estas meninas engravidassem, lhes seria negado o direito ao aborto, já que não se caracterizou um estupro.

Ainda há muito que lutar e conquistar para que tenhamos uma sociedade igualitária e as mulheres realmente consigam ter mais direitos que um feto. Mas o fundamental para todas estas lutas é lhe garantir o direito a vida com dignidade, como afirma o lema da campanha nacional das mulheres do PSOL: não há vida digna para as mulheres com violência e sem direitos.

A anencefalia é uma malformação fetal grave que resulta na ausência total do cérebro, calota craniana e couro cabeludo impossibilitando que o feto sobreviva depois de nascer. A anencefalia, ou a tal malformação, pode ser descoberta já nos primeiros três meses de gestação, sendo esse um diagnóstico extremamente preciso através de exames simples como o ultrassom. A maioria desses fetos acaba morrendo dentro do útero em poucos meses de gestação. 

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