Um sistema em crise: caos capitalista – luta de classes se agrava

Publicamos aqui uma proposta de documento sobre Europa e perspectivas mundiais que será discutido durante a reunião do Comitê Executivo Internacional do CIT em janeiro. Ume versão final revisada e emendada será publicada após a reunião.

Um mundo em tumulto

1. Desde o último congresso mundial, há pouco mais de um ano atrás, o mundo tem estado em um tumulto quase contínuo. Testemunhamos as revoluções do Oriente Médio e Norte da África, que ainda perduram, como indicam os sangrentos conflitos no Cairo e outros lugares no final de novembro, que por sua vez foram seguidos pelas eleições no Egito. Nas primeiras etapas das eleições parlamentares egípcias, os partidos islâmicos parecem ter ganhado dois terços dos votos. O Partido da Liberdade e Justiça da Irmandade Muçulmana ganhou 36,6%, segundo os resultados preliminares. Contudo, o partido ultraconservador e fundamentalista Al Nour, com sua doutrina do salafismo, ganhou quase um quarto dos votos em áreas que abarcam nove das 27 províncias do Egito, incluindo os principais centros urbanos do Cairo e Alexandria. De outro lado, os partidos que apoiavam o regime de Mubarak receberam apenas 3% dos votos! No momento do CEI, as eleições estarão finalizadas e teremos um quadro melhor do que isso significa.

2. O CIT previu em esboços gerais, especialmente para o Egito, nos documentos adotados em nosso congresso, os levantes revolucionários que ocorreram na região (comentários mais sobre isso a seguir). Eles devem ser levados em conta junto com as convulsões revolucionárias na Grécia, assim como as greves e protestos de massas na Espanha e Portugal. Novas explosões sociais são iminentes na Itália, Irlanda, Grã-Bretanha e outros lugares. Mesmo os países europeus aparentemente “mais fortes” ou até agora “menos afetados” não estarão imunes do vírus radical, se não revolucionário, da chamada “periferia” da Europa do Sul. Os EUA também têm visto o considerável movimento “Ocupe” que tem afetado e arrastado atrás de si setores dos sindicatos.

3. A continuação da profunda crise do capitalismo europeu e mundial forneceu o impulso para esses eventos. Essa crise foi enormemente fortalecida pela problema da “crise da dívida pública”. Isso por sua vez abre a possibilidade, na Europa, de calotes nacionais e do colapso do euro, com todas as graves consequências que derivam disso para o capitalismo europeu e mundial. Essa crise já levou diretamente à renúncia ou derrubada de vários governos e primeiros-ministros: só no último ano, o execrado Berlusconi na Itália, Papandreou na Grécia, Zapatero na Espanha, Sócrates em Portugal e Cowen na Irlanda do Sul, foram todos varridos do poder.

4. Isso foi precedido pela derrubada de Ben Ali na Tunísia, Mubarak no Egito, Gaddafi na Líbia, e seguido por Saleh no Iêmen. Mas os movimentos de massa e revoluções no Oriente Médio e África do Norte não terminaram sua obra; é provável que outros governos da região sejam derrubados no próximo período. A Europa também pode esperar mais convulsões que levarão à saída precoce de governos atuais e da possível derrota nas eleições de Sarkozy na França, o que pode coincidir com a ruptura da coalizão ConDem [Partido Conservador-Tory e Partido Liberal-Democrata] a Grã-Bretanha e eleições antecipadas, causando sua derrota. Não é apenas a desesperada situação econômica que aflige toda a Europa que pode causar o naufrágio do governo Cameron. A crise da UE poderia acionar referendos em vários países europeus. Embora a Grã-Bretanha não tenha assinado o novo “tratado”, não se pode excluir que o Partido Tory possa se dividir sobre essa questão.

5. A Irlanda também pode enfrentar um referendo muito importante sobre essa questão. Uma pesquisa de opinião em outubro mostrou que 47% do eleitorado irlandês votaria contra a proposta de emenda ao Tratado de Lisboa, com apenas 28% dizendo que votariam por ele. Na Grã-Bretanha, provavelmente ganharia o “Não” no caso de um referendo desse tipo, e isso pode se repetir em outros países dentro da UE, se os diferentes governos realmente permitissem uma votação sobre as emendas propostas ao tratado. Em tal situação, seríamos obrigados a apoiar a campanha do “Não”, como fizemos na Irlanda, especialmente porque o Tratado de Lisboa e a UE em geral são vistos, muito mais do que no passado, como mecanismos de austeridade para atacar selvagemente os padrões de vida da classe trabalhadora. Essa questão já foi colocada no movimento dos trabalhadores britânico. O sindicato dos ferroviários RMT quer que nos envolvamos ativamente em uma campanha de “Não”. A organização da Inglaterra e Gales do CIT considera que será necessário se envolver. Contudo, devemos procurar dar a ela um claro perfil antinacionalista, defendendo medidas socialistas seja dentro ou fora da UE. Provavelmente, produziremos um material especial sobre essa questão.

Os movimentos “Ocupe”

6. Ao mesmo tempo, a base ideológica do capitalismo tem sido severamente minada. Não apenas o capitalismo enfrenta a maior crise econômica “da história” (segundo Mervyn King, presidente do Banco da Inglaterra), em sua esteira ele também enfrenta uma profunda crise de legitimidade. Isso se reflete nas greves de massas da classe trabalhadora, mas também no movimento mundial “Ocupe”, que se espalhou para cerca de mil cidades e todos os continentes.

7. Apesar de sua fraqueza – ele não se baseia de maneira firme, seja ideologicamente seja com profundas raízes e presença nas organizações da classe trabalhadora – não obstante, evocou simpatia pública generalizada, incluindo da classe trabalhadora e do movimento dos trabalhadores. Esse movimento, diferente do movimento antiglobalização da virada do século, ocorre contra o pano de fundo de uma profunda recessão. Contudo, o apoio mais ativo em muitos países vem da juventude cada vez mais alienada, muitos, se não a maioria, vindos das camadas médias da sociedade. Mas, a denúncia da crescente desigualdade contra o pano de fundo do empobrecimento em massa sendo um sinônimo do capitalismo “moderno” evocou um poderoso eco entre amplos setores da população da Europa e EUA. Um fator adicional é que nessa crise não é apenas a classe trabalhadora, mas também grandes setores da classe média foram afetadas – alguns deles muito severamente. Nos EUA, por exemplo, os salários médios dos trabalhadores manuais – ainda citados como “classe média” pela mídia capitalista como um meio de embotar a crescente consciência de classe – estão no nível dos anos 1950 em termos reais; a crença do progresso capitalista duradouro foi despedaçada. A desenfreada acumulação de riqueza pelos “1%” – talvez a maior concentração e centralização do capital na História, prevista por Marx – abasteceu os protestos. Tem havido muitos símbolos disso no período passado, mas talvez o exemplo mais gritante seja o de Bloomberg, o atual prefeito de Nova Iorque, o 30º indivíduo mais rico do mundo – literalmente, um em 230 milhões – que, com sua polícia, procurou reprimir o movimento “Ocupe” em “sua” cidade. As imagens disso foram mostradas em todo o mundo, assim como o uso indiscriminado de spray de pimenta contra as multidões em Seattle, no meio das quais estava um manifestante de 80 anos.

8. Isso vem depois dos ataques anteriores aos estudantes na Grã-Bretanha, seguidos de punições exemplares, incluindo sentenças de prisões draconianas, para os jovens que participaram nos protestos no final de 2010 por causa da destruição de seu futuro, com o enorme aumento das taxas universitárias e a retirada de bolsas para os jovens de 16-18 anos. Contudo, isso não impediu os motins em Londres no final do verão de 2011. Isso confirma completamente nossa afirmação de que, a menos que o movimento dos trabalhadores fornecesse uma resistência organizada aos selvagens cortes públicos do governo Tory-Liberal Democrata à assistência social, uma “pobreza planejada”, então eclodiria um incipiente movimento de desespero vindo de baixo. O governo tentou explicar os motins em termos de “criminalidade” dos envolvidos. Isso foi inteiramente desmentido pelas últimos relatórios, que mostravam que a maioria dos envolvidos eram pobres, econômica e culturalmente carentes etc. De outro lado, outros, como o SWP, procuraram embelezar esse movimento como “positivo”, um levante consciente genuíno dos oprimidos! Isso é igualmente errado e, além disso, potencialmente perigoso para o movimento da classe trabalhadora.

9. Jovens alienados atraídos para o anarquismo – como mostra a Grécia – já atacam de forma indiscriminada e provocadora a polícia, o que por sua vez dá uma desculpa para o Estado usar medidas repressivas contra os trabalhadores envolvidos em greves e protestos. Corretamente, nossos camaradas na Grécia criticaram e se distanciaram de tais ações. Esses métodos, especialmente com base nas derrotas e retrocessos, pode levar um setor de jovens desapontados, nem todos de origem pequeno-burguesa, a recorrer a métodos de terrorismo. Em uma das manifestações na Grécia, foram os próprios trabalhadores – membros do Partido Comunista (KKE) – que foram alvo de ataques físicos. Tais métodos são totalmente alheios ao genuíno marxismo. Mesmo que tais jovens e trabalhadores acreditem realmente que tais métodos podem minar e eventualmente derrubar o capitalismo, é dever do marxismo enfrentar essa abordagem equivocada. A reação pode ganhar apenas se esse método persistir, tanto ao fornecer uma desculpa para o Estado usar a repressão mas também, nessa etapa em particular, ao alienar setores da classe média e mesmo trabalhadores que talvez estejam se unindo à luta pela primeira vez. Portanto, é necessário educar a nova geração ao combater os métodos anárquicos que podem levar o movimento dos trabalhadores a um beco sem saída. Precisamos pontuar em particular que, historicamente, não foram os que começaram com bombas e métodos terroristas os que derrubaram o regime czarista e o latifúndio, mas os bolcheviques, que se baseavam na classe trabalhadora com os métodos de lutas de massa, a greve geral, comitês independentes – sovietes – e o poder dos trabalhadores e camponês.

10. Os burgueses mais sérios e perspicazes mudaram sua posição original, de total hostilidade para com o movimento “Ocupe”, buscando cooptá-lo, “assimilá-lo”. Tentam apoiar-se nos “líderes” ou porta-vozes “apolíticos” desse movimento para lançar a base cobrir as feridas mais gritantes do capitalismo com uma taxa “Tobin” ou “Robin Hood” sobre as transações financeiras. E, dado o alarme na cúpula do capitalismo com a virada dos eventos, não está excluído que algumas medidas de caráter cosmético podem ser feitas contra os bancos, e até contra os “ricos”. O pânico nos círculos burgueses em geral foi resumido pelo fundador direitista do jornal Independent da Grã-Bretanha, Andreas Whittam-Smith, que escreveu recentemente: “As nações ocidentais estão agora maduras para a revolução”. O propósito de Whittam-Smith e da burguesia a quem ele se dirige não é se preparar para cometer suicídio ou sair da cena da história, mas usar esses movimentos como uma alavanca para salvar e, se possível, renovar o sistema capitalista. Além disso, a falta de uma alternativa clara da maioria dos líderes os está ajudando nessa tarefa.

11. O movimento “Ocupe” é o movimento global mais amplo desde o colapso do stalinismo. Ele abarca mais países e é mais profundo que o movimento antiglobalização da virada do século 21. Embora seja em essência “anticapitalista”, o movimento “Ocupe” não desafia seriamente o capitalismo; muitos de seus líderes não propõem “mudar o sistema”, mas buscam “emendar um sistema quebrado”. Incrivelmente, alguns da esquerda, incluindo até trotskistas como o SUQI (na Espanha, por exemplo), procuram reforçar a postura “não-política”, que da parte dos jovens que participam representa a rejeição da “política” pró-capitalista e dos grandes partidos que a representam.

12. Nunca antes na história foi mais necessário enfatizar a necessidade de organização, por um partido dos trabalhadores de massas, como passo vital no desenvolvimento da consciência de classe; o terreno ganho no passado tem que ser reconquistado várias e várias vezes. Em certa medida, por causa das voltas atrás da roda da história, enfrentamos algumas das tarefas de Lênin – esboçadas em seu panfleto “Que Fazer” – sobre a necessidade de um partido para combater falsas ideias, neste caso as dos “economicistas”, da chamada “espontaneidade”, da oposição à “política” etc. É claro, enfrentamos um período inteiramente diferente. Não começamos em uma folha em branco. Há a experiência acumulada da classe trabalhadora e da formação dos grandes partidos. Mas ainda temos que lidar com o profundo ceticismo – produto da traição dos partidos ex-socialdemocratas e do stalinismo – que afeta a nova geração, e a leva para o “apoliticismo”. Isso foi indicado claramente nas recentes eleições da Espanha: “Eles não nos representam”, “São todos os mesmos”; “As eleições estão sob a segura custódia do Banco Central europeu”. Além disso, as abstenções e votos em branco e nulos somaram 11 milhões, mais do que os votos para os vitoriosos de direita, o Partido Popular.

13. Esse movimento, que em uma etapa assumiu proporções de massa em alguns países – Espanha, Grécia e, em certa medida, EUA, representa a etapa necessária de um confuso mas importante despertar político. Isso era inevitável, dados os mais de 30 anos quando as ideias e a influência do capitalismo neoliberal dominavam e eram reforçadas enormemente pela ofensiva ideológica da burguesia no período posterior ao colapso do stalinismo. Esses movimentos oferecem a possibilidade para os que participam e para os que observam, tirarem conclusões revolucionárias. Contudo, a pré-condição para isso é a intervenção do movimento dos trabalhadores e, em particular, do marxismo, que, embora seja simpático e sensível, argumenta contra a posição “apolítica” e antipartido de muitos que foram atraídos para esse movimento.

14. Ao mesmo tempo, nunca tivemos fetiche por uma organização ou partido. É claro, será preciso um partido de massas para a classe trabalhadora conquistar e manter o poder. Contudo, o modo como será construído – que irá variar de acordo com as circunstâncias concretas de cada país – deve ser elaborado ao longo dos eventos e através da experiência da própria classe trabalhadora. Partidos, especialmente de um caráter de massas, nessa era explosiva, não podem ser construídos de maneira linear, passo a passo, como foram construídos no período anterior à I Guerra Mundial. Tal é a gravidade da crise atual – reforçada pela mensagem dos líderes burgueses, de que a classe trabalhadora enfrenta uma “austeridade sem fim” – que se pode imaginar uma situação onde se pode chegar a um levante de massas, o que pode resultar nas massas sendo obrigadas a se mover na direção do poder. Afinal, foi isso o que aconteceu na Espanha após o levante de julho de 1936 e também em Portugal após o fracassado golpe de Spinola em março de 1975, quando os bancos foram expropriados e a maioria da indústria foi posta nas mãos do Estado. Nessas situações, a questão da rápida construção de um partido de massas estaria colocada – e além disso seria possível – se houvesse um fator subjetivo não necessariamente de milhões, mas de milhares ou dezenas de milhares de quadros política e teoricamente armados para intervir na situação. Isso de modo algum é fazer concessões aos sentimentos antipartido e antiorganização existentes. Pelo contrário, coloca de forma aguda a vital necessidade de construir uma organização, um polo revolucionário de atração, capaz de intervir na situação e construir uma poderosa força da classe trabalhadora, especialmente para consolidar o poder quando ela se mover para a revolução em verdadeiras situações pré-revolucionárias. Só colocar essa questão nesta etapa indica a sutileza política que é exigida a nós nesse período.

A Greve Geral

15. A greve geral voltou à agenda do movimento dos trabalhadores, especialmente no sul da Europa. Na Grécia – com sete greves gerais apenas em 2011, incluindo uma greve de 48 horas, e não incluindo greves do setor público! Na Espanha, Itália, Portugal e, nos anos recentes, na França, a marca é de greves gerais de um dia e “greves gerais” parciais. Mas a Europa do norte será contagiada, como mostra a greve geral de um dia do setor público na Grã-Bretanha em novembro. Essa foi uma greve colossal e efetiva, envolvendo pelo menos um milhão e meio de trabalhadores, a maior em números absolutos desde a greve geral de 1926, e foi um marco no movimento dos trabalhadores. Os líderes sindicais belgas tentaram contornar os chamados de uma greve geral organizando a manifestação de 80 mil pessoas em 2 de dezembro em Bruxelas, mas o apoio à greve geral está crescendo, especialmente na Valônia, na luta contra o fechamento parcial da siderúrgica ArcelorMittal em Liège, onde, significativamente, os sindicatos estão pedindo oficialmente a nacionalização da companhia.

16. Greves gerais implicitamente colocam a questão do poder diante da classe trabalhadora e do movimento dos trabalhadores. Contudo, ela não está posta desta maneira, nesta etapa, na perspectiva política da classe trabalhadora. As razões para isso foram delineadas em nosso material anterior; o legado do colapso do stalinismo na forma da ideologia pró-capitalista e uma consequente imaturidade política da classe trabalhadora, assim como o oportunismo dos líderes sindicais, que temem ultrapassar os limites do capitalismo. A fraqueza do polo revolucionário alternativo de atração também é um dos fatores que impedem a classe trabalhadora de tirar todas as conclusões da atual situação. Portanto, as greves gerais, que representam um alto ponto na luta da classe trabalhadora, tomam a forma, nesta etapa, mais de protestos de massas do que uma preparação séria para tomar o poder das mãos do capitalismo, que está arruinando a indústria e a sociedade, no processo arrastando a classe trabalhadora para um abismo econômico e social. Contudo, como a classe trabalhadora está amadurecendo através da luta, com a criação de uma nova geração de lutadores e quadros, isso irá mudar e novas greves gerais, que levantem a alternativa de uma nova sociedade de poder dos trabalhadores e do socialismo, estarão postas nas mentes dos trabalhadores.

17. Além disso, a luta tomará formas diferentes em etapas diferentes. Na Grécia, por exemplo, o número de greves gerais de um dia que ocorreram é incrível; de fato, é sem precedentes. Foram seguidas pela greve geral de 48 horas e nossa organização grega foi a primeira a levantar e popularizar essa palavra de ordem. Neste sentido, os trabalhadores gregos ultrapassaram os argentinos, que tiveram uma luta similar na virada do século. Não apenas a classe trabalhadora, mas camadas mais amplas, incluindo setores da classe media, estão sendo atraídas para as greves, que portanto assumem algumas das características dos “hartals” da Índia e Sri Lanka, com as cidades e o interior, praticamente toda a população, participando de tais ações. Ao mesmo tempo, quando as massas estão no impasse em um plano – neste caso, o plano sindical – elas se voltam para a alternativa, o plano eleitoral. Embora as lutas sindicais e sociais continuem no próximo período, é provável que as massas agora se voltem para essa direção, com as eleições prometidas para o começo de 2012. Isso exigirá que nossos camaradas gregos levantem a alternativa de um governo dos trabalhadores frente às alternativas de direita do Pasok e da Nova Democracia. A expressão precisa disso em termos de partidos a apoiar teve ser elaborada em nossa discussão.

As revoluções no Oriente Médio e Norte da África

18. As revoluções no Oriente Médio e Norte da África são, junto com os eventos na Grécia, os eventos mais importantes para o movimento dos trabalhadores no ano passado. Tunísia e, especialmente, o Egito, o mais antigo Estado-nação do mundo, exerceram um efeito magnético sobre as massas de toda a região. Também ressoaram poderosamente no mundo neocolonial e nos países industriais avançados. Por exemplo, nos EUA ajudaram a inspirar os protestos de Wisconsin e a bandeira egípcia tremulou sobre o movimento “Ocupe” em Oakland. Contudo, como em todas as revoluções, especialmente no período posterior à derrubada de uma ditadura, geram-se ilusões nas massas de que o trabalho principal já foi feito. Na realidade, como a revolução não foi completada, desde o seu início as forças da revolução e da contrarrevolução lutam pela supremacia. A burguesia liberal e os islamistas tentaram conter a revolução, junto com os restos do velho regime. Buscam engendrar um sentimento de conciliação de classe, de “unidade nacional”. Instintivamente, se opõem a todas as tentativas de se organizar ações independentes ou organizações da classe trabalhadora. Além disso, entre as massas, que buscam a linha de menor resistência num primeiro momento, esse sentimento também pode existir. Mesmo onde existir um forte partido revolucionário que procure alertar a classe trabalhadora e combater isso, como com os bolcheviques em 1917, esse sentimento pode existir por um período, permitindo a criação de governos de coalizão e colaboracionismo de classes. Exige-se tempo e experiência, junto com a intervenção das forças revolucionárias, para mudar isso. No caso do Egito, não havia força de massas na clandestinidade que pudesse realizar esse trabalho.

19. No vácuo existente, como em outros casos na história – Polônia sob o stalinismo, o Irã sob o Xá – forças religiosas, com raízes nas massas, podem inicialmente fornecer uma força, um polo de atração em torno do qual a oposição ao regime ditatorial pode se mobilizar. Esse papel no Egito está sendo jogado pela Irmandade Muçulmana e as mesquitas. Elas foram perseguidas, o que realça sua atratividade para os trabalhadores e camponeses explorados, assim como as redes de caridade e empresas que construíram sob Mubarak e, antes dele, Sadat. Consequentemente, estão bem colocadas para explorar as atuais eleições, nas quais receberam 36,6% dos votos contados até agora. Além disso, a expressão mais fundamentalista do islã político de direita, os salafistas em torno do Al Nour, ligada ao ramo wahabista mais fundamentalista do Islã que emana da Arábia Saudita e da doutrina da Al Qaeda, parece ter se saído bem com o quase um quarto dos votos nas cidades que tiveram pleito em 5 de dezembro e provavelmente podem registrar mais do que isso no interior.

20. Se puder formar um governo, então a Irmandade passará por uma prova severa. Ela é, em qualquer sentido, uma força mais conservadora do que no passado. Abandonou a luta para derrubar a ditadura, concentrando-se nas obras de caridade para as massas famintas. Inicialmente, ficou de lado da revolução, o que causou divisões, especialmente entre os jovens dentro de suas fileiras. Diferente da revolução iraniana, quando se desenvolveram forças islâmicas radicais, a Irmandade é politicamente conservadora, aceitando o livre mercado, não favorecendo sindicatos independentes e rejeitando os ramos “extremistas” do Islã a favor do modelo turco de Erdoğan, até adotando o nome do partido no governo na Turquia, “Liberdade e Justiça”. Esse partido foi descrito pelo New York Times como “movimento religioso de centro-direita, mas não um bando fanático”. Esse também é o modelo adotado pelas forças islâmicas “moderadas” em toda a região, incluindo o Ennahda, o partido tunisiano que saiu vitorioso das recentes eleições. Contudo, o conselho militar, o SCAF, não tem intenção de ceder o poder completo às forças “civis”. Outro “modelo” é o Paquistão, onde o exército e os generais são o verdadeiro “poder por trás do trono” – o governo e o parlamento – e têm permanecido assim desde a fundação do Estado paquistanês.

21. Havia grandes ilusões nos militares na época da derrubada de Mubarak – “o exército está conosco”. E na sua base e mesmo entre um setor significativo das camadas médias de oficiais, era o caso. Contudo, os generais da cúpula, alertamos na época, eram e continuam sendo uma parte integral do antigo regime. De fato, comentamos na época que, de fato, os militares realizaram um “golpe suave” ao derrubarem Mubarak em conluio com a CIA e o imperialismo americano. Estavam aterrorizados com a chance de que a revolução – que era e continua sendo uma revolução – se aprofundasse e não se deteria com a saída de Mubarak, mas continuaria até uma revolução social e econômica. A revolução egípcia – o país possui um terço de todos os árabes – foi acima de tudo um evento de massas, onde a classe trabalhadora, em Suez, Porto Said e outros lugares, jogou um papel crucial.

22. Uma vez que as massas arrancaram os grilhões de uma ditadura, inevitavelmente seguem adiante com demandas sociais e econômicas. Tem havido uma onda de ações dos trabalhadores – tentativas de criar sindicatos independentes – que foram efetivamente banidos pelos militares, exigindo que os culpados do assassinato de manifestantes na época da derrubada de Mubarak, assim como os que perpetraram os massacres de novembro, sejam levados a julgamento… Tão grande tem sido a desilusão desde os eventos de fevereiro, que tem surgido o questionamento de se foi uma verdadeira revolução em primeiro lugar. De fato, na Tunísia e no Egito as massas se moveram de forma independente ou semi-independente contra as ditaduras de Ben Ali e Mubarak. Elas fizeram a revolução, mas por causa da consciência insuficiente de seu próprio poder e de um programa para vencer, elas não completaram a revolução num sentido econômico e social.

23. Revoluções, como Karl Marx pontuou, são as locomotivas da História, enquanto as contrarrevoluções – ditaduras – são um enorme freio, fazendo as consciências retrocederem. Mas na Tunísia e no Egito o que vimos foi de fato uma revolução política que mudou os principais atores em cena, mas não tocou as bases sociais do latifúndio e do capitalismo egípcios. Os generais possuem estimados 40% nos aspectos vitais da economia. Além disso, o imperialismo dos EUA doou estimados US$150 milhões para promover a “transição para a democracia”. E o exército ainda recebe US$1,3 bilhões por ano dos EUA. O exército em todos os Estados capitalistas é o maior guardião da propriedade privada. Cada vez mais conscientes da verdadeira situação, alguns participantes do levante de fevereiro agora dizem que tudo que ganharam foi “uma mudança de cortinas”. Isso é verdade sobre o Estado, mas não sobre a consciência das massas, especialmente dos jovens e trabalhadores que participaram da revolução. E as massas começaram a entrar nas cenas sindical, social e política. Agora se fala, corretamente, da necessidade de uma segunda e terceira revoluções. Para isso acontecer, é preciso a construção de poderosas e independentes organizações dos trabalhadores, tanto no plano sindical quanto político.

24. O imperialismo e seus Estados clientes na região foram pegos completamente de surpresa pela eclosão da revolução. Obama e os representantes da maior potência do planeta foram impotentes para intervir, reduzidos a frases arrependidas completamente piedosas sobre o papel do imperialismo americano no apoio a Mubarak. Sarkozy e Cameron foram igualmente impotentes. No Egito e Tunísia, onde as massas urbanas jogaram o principal papel, a intervenção militar estava descartada. Os EUA, que ainda veem a região como de importância estratégica e econômica, estavam de todo modo totalmente atados no Iraque e Afeganistão, e assim não podiam intervir militarmente, ainda mais usando forças terrestres, mesmo se fosse possível. O mesmo se aplica aos aliados da OTAN.

25. Apenas com os eventos da Líbia, e em certa medida no Bahrein, é que o imperialismo recebeu o pretexto para criar um ponto de apoio contra as revoluções. Nossa análise do levante na Líbia, da intervenção da OTAN e do subsequente resultado dos 9 ou 10 meses de luta, passou pelo teste dos eventos. Apoiamos os levantes contra Gaddafi em Benghazi e outras cidades da Líbia. No início, representavam um genuíno movimento das massas em oposição à ditadura. Os comitês criados para administrar Benghazzi depois da expulsão de Gaddafi e seus sequazes, incluindo o agora prisioneiro filho de Gaddafi, Saif, pareciam estar nas mãos de genuínos representantes das massas e ter uma base popular de massas. Nesta etapa, as massas de Benghazzi se opunham à intervenção externa do imperialismo. Contudo, a mobilização das tropas de Gaddafi nos arredores de Benghazzi e o consequente temor de um massacre deu ao imperialismo a desculpa para intervir militarmente através da OTAN. O subsequente curso da guerra – orquestrada e controlada tanto no ar quanto na terra pela OTAN – alterou completamente o caráter da “revolução”. O CIT sempre se opôs ao regime de Gaddafi e apoiavam genuínos movimentos de massa que criassem uma verdadeira sociedade socialista e democrática na Líbia.

26. Contudo, a guerra conduzida contra Gaddafi possuía todas as características de uma intervenção imperialista militar de facto. É impossível aos marxistas dar apoio a tal ação. Mas, para sua eterna vergonha, foi isso que alguns supostos marxistas fizeram! A campanha de propaganda contra Gaddafi incluía histeria fabricada e grosseiros exageros sobre o que aconteceria se suas forças ocupassem as cidades líbias mantidas pelos “rebeldes”. Afirmava-se que massacres ocorreriam imediatamente. Não aconteceram tais coisas quando as forças de Gaddafi lutaram contra os rebeldes por Misrata e outras cidades a caminho de Benghazi. Contudo, isso foi usado para realizar massacres reais por parte dos “rebeldes” quando eles entraram nas cidades que supostamente apoiavam Gaddafi e através da guerra aérea da OTAN. É impossível calcular o número exato de vítimas, mas provavelmente entre 30 mil e 50 mil pessoas foram mortas. Não é possível descrever esse resultado como uma vitória para a “revolução”.

27. O que ocorreu na Líbia no início foi uma genuína revolução de caráter incipiente, desencaminhada por uma contrarrevolução de uma forma “democrática”. Contudo, à medida que a escala do derramamento de sangue e das represálias – algumas vezes contra pessoas completamente inocentes, como líbios de pele escura e trabalhadores estrangeiros, alguns dos quais viviam na Líbia há muitos anos – têm sido reveladas há um profundo questionamento do que domina atualmente, se a “democracia” ou a contrarrevolução. De fato, a Líbia pós-Gaddafi é claramente um novo campo para o imperialismo explorar seus ricos recursos, especialmente as reservas de petróleo. Combinando forças completamente antagônicas, dos islamistas a desertores do regime de Gaddafi, e diversos “democratas” de safra recente, é muito improvável que o Conselho Nacional de Transição se manterá unido. A Líbia ameaça se dividir, como alertamos antes da guerra, e o futuro não semelha uma Arcádia democrática, o que foi prometido, mas o pesadelo de divisões étnicas e tribais nas linhas da Somália. Defendemos um movimento independente da classe trabalhadora de Benghazi e um apelo de classe a todas as massas líbias. Uma abordagem similar é necessária em todos os Estados da região – cujas perspectivas são impossíveis de abarcar nesse documento.

28. O movimento na Síria claramente está numa encruzilhada. O número de vítimas da repressão do regime passa de 4 mil agora. Ocorrem manifestações de massas diárias e sanções foram impostas pela ONU e pela Liga Árabe. Este é um severo golpe para a elite reunida em torno do regime de Assad por causa de sua histórica associação com a luta árabe. Apenas o Irã – onde os xiitas são maioria, ao contrário da Síria – apoia o regime de Assad. Mas o Irã agora também enfrenta sanções por causa de seu programa nuclear. Como apontamos antes, é possível que ocorra uma ação militar, o que poderia causar um conflito regional, incluindo guerras. De fato, com a quase guerra civil na Síria, todos os tipos de possibilidade que envolvam conflitos podem explodir. A Turquia, que já está envolvida em suas fronteiras com a fuga de refugiados para seu território, já alertou o regime sírio que pode ser obrigada a intervir. De outro lado, Israel – que atualmente prefere o regime de Assad, por causa do medo do que poderia acontecer se fosse derrubado – também poderia ser arrastado. Isso pode tomar a forma de ações militares contra o Irã ou a Síria, ou ambos. A região é como um barril de pólvora, onde tudo pode acontecer. E há a questão palestina, que pode explodir a qualquer hora. Além disso, tudo isso está ocorrendo contra o pano de fundo da radicalização – refletida nas greves e ocupações – em Israel. Um novo período de lutas generalizadas, que surge com o aprofundar da crise econômica mundial e de seu severo impacto no Oriente Médio e Norte da África, é possível. Devemos energicamente buscar os melhores setores dos trabalhadores e jovens e convencê-los de nossas ideias e perspectivas.

29. A oposição na Síria parece ter ganhado terreno no período recente. Contudo, não está claro se alcançou a “massa crítica” que poderia levar a uma rápida derrubada do regime de Assad. A Síria está muito dividida em linhas étnicas e religiosas. É por isso que o imperialismo e a vizinha Turquia temem a ruptura do país. O amargo conflito sectário e religioso que resultaria disso teria consequências incalculáveis sobre os Estados vizinhos. A oposição está dividida, com a maioria vindo da população sunita majoritária. Ao mesmo tempo, o exército – sempre crucial para manter a elite alauíta em torno de Assad no poder – ainda não se desintegrou, embora setores tenham desertado para os rebeldes. Portanto, é provável que a luta na Síria seja mais prolongada. O regime ainda não parece estar no ponto de queda, mas nesta situação altamente instável ele pode chegar a essa situação muito rapidamente.

Grave crise econômica para o capitalismo

30. O movimento “Ocupe” é altamente sintomático do sentimento global que se desenvolve sob o chicote dessa crise. Também pressagia movimentos de massas em muitos países que ainda não foram seriamente afetados, e não apenas na Europa, mas em todo o mundo. Essa dedução surge da perspectiva de uma duradoura crise de longo prazo para o capitalismo, que tem formado o fundamento da abordagem do CIT desde seu início em 2007-08. Nossa conclusão é que entramos em um período de revolução e contrarrevolução, por causa da incapacidade da burguesia de resolver essa crise subjacente.

31. Isso tem sido reforçado a cada etapa. Contudo, entre as massas havia ilusões de que o capitalismo fosse capaz de se regenerar através da intervenção estatal, pacotes de estímulos etc. E essas medidas tiveram algum efeito ao impedir uma depressão total, com desemprego em massa nas linhas dos anos 1930; mas elas não resolveram a crise subjacente. Além disso, o giro de políticas semikeynesianas nos EUA, Grã-Bretanha e, em certa medida, outros países, para programas de austeridade reforçaram a recessão, com características depressivas seguindo na sua onda; o capitalismo se encontra agora num beco sem saída.

32. A “crise da dívida pública” europeia ilustra as catastróficas consequências para o capitalismo, não apenas na Europa, mas em todo o mundo, das bolhas do crédito financeiro, que cresceram exponencialmente e envolveram enormes injeções de capital fictício durante o boom dos anos 2000. Esse processo, que remonta aos anos 1970, foi por sua vez consequência da falta de saídas lucrativas na Europa, EUA e Japão. Tem havido certa discussão e controvérsias em círculos econômicos marxistas sobre os fatores imediatos que levaram à crise. Contudo, Marx foi cuidadoso em não pontuar apenas uma causa para a eclosão das crises. Sem dúvida, o limitado poder de compra das massas, que é inerente à exploração da força de trabalho, examinada por Marx, reforçado pela desigualdade colossal, que é uma característica dos últimos 20 a 30 anos, assim como os atuais ataques aos padrões de vida, são grandes fatores na crise presente.

33. De outro lado, a tendência a longo prazo do declínio da taxa de lucros, especialmente quando há uma queda nos lucros brutos – o que mais preocupa os capitalistas – pode ser um grande fator de crise. Como pontuamos, esse certamente não é o caso da atual situação, onde há uma colossal acumulação de reservas em dinheiro (o que os capitalistas chamam de liquidez). Samuel Brittan, um economista britânico e firme partidário de Thatcher no passado, mas agora fervoroso em sua defesa de medidas semikeynesianas, pontua que existem lucros saudáveis nos cofres das grandes empresas, o que poderia fornecer a fonte de novos investimentos e, ele afirma, por sua vez fornecer a faísca para iniciar um processo de crescimento. Contudo, como o capitalismo enfrenta um grande elemento da “armadilha de liquidez” de Keynes – um acúmulo de ativos e dinheiro, baixas taxas de lucro, medo de que a deflação irá persistir etc. – os capitalistas se recusam a investir e estão, de fato, numa “greve de capital”. Os credores se recusam a emprestar e os tomadores de empréstimos – sobrecarregados com enormes dívidas – recusam-se a pegar mais empréstimos. No momento, o sistema está bloqueado e, dado o endividamento governamental e privada, é improvável que mude no futuro previsível. Todas as instituições econômicas do capitalismo mundial apontam, no melhor dos casos, estagnação na atual situação econômica – “uma recuperação em L” – com taxas de crescimento anêmico e, em algumas estimativas, crescimento zero para a zona do euro. Ao mesmo tempo, não se pode descartar que a paralisia da burguesia nas garras dessa crise pode levar a uma depressão total, ou, no melhor, características depressivas – como já ocorre em alguns casos – em países na Europa ou mesmo em continentes inteiros.

China enfrentando uma crise

34. A China não pode fornecer um bote salva-vidas para resgatar o capitalismo mundial. Em 2008, quando a China enfrentou uma séria crise, fábricas foram fechadas e o desemprego subiu exponencialmente. Por isso, a elite chinesa temia uma “perturbação social” em massa, eufemismo para revolução. Então, ela “deu um empurrão” através da injeção massiva de créditos facilitada pelos bancos estatais que dominam a economia. Isso resultou no crescimento de crédito anualizado de 170%, provavelmente o maior “estímulo econômico” da história mundial. A China pôde fazer isso por causa de seu caráter único. Desse modo, a elite chinesa conseguiu elevar a taxa de crescimento aos dois dígitos. Mas o outro lado disso foi que fábricas e shopping centers foram construídos em uma escala massiva que nunca dará lucro, com muitos deles ficando ociosos. Essa supercapacidade é o preço que a China, em especial a elite dirigente, estava pronta a pagar para impedir um levante das massas chinesas. Foi capaz disso por causa do caráter único da China. Ela possui um considerável setor puramente capitalista, especialmente nas províncias costeiras. Mas os restos da agora desintegrada “economia planificada” ainda exercem um importante, em alguns casos, decisivo efeito, sobre a direção da economia. Temos a caracterizado como um regime “capitalista de Estado” de “tipo único”. Sua “singularidade” é indicada pela considerável concentração nas mãos do Estado (alguns acham que é a maioria) de bancos e indústrias, mas com um substancial setor capitalista “puro”. Não há comparação com o tipo de Estado que existe na China no momento presente. Ele permite ao regime fazer algo em meio a uma crise que outros não podem fazer: um enorme pacote de estímulos, o que criou empregos não apenas na China, mas indiretamente também, nos países que comercializam com a China, como na Alemanha.

35. Contudo, o outro lado visível desse processo é a enorme supercapacidade – abastecida pelo crédito bancário – e uma inflação explosiva, que o regime chinês agora parece ter sob controle. Oficialmente, a dívida governamental está abaixo dos 20% do PIB. Contudo, se contarmos os empréstimos de governos locais em infraestrutura e diversos outros encargos, a dívida nacional chinesa está perto dos 70% do PIB. Edward Chancellor, no Financial Times [5 de dezembro] comentou: “Beijing não pode repetir o enorme pacote de estímulos de 2008. Esse foi um truque cuja conta ainda está para ser paga”. Contudo, um segundo pacote de estímulos de tamanho considerável não pode ser descartado. Esse processo se reflete também no crônico problema habitacional. Isso além da corrupção massiva e do crescimento da desigualdade, que despertaram a indignação das massas. Estima-se que a taxa de crescimento pode cair para cerca de 8%, o que irá afetar imediatamente os países cujas indústrias manufatureiras receberam grandes benefícios da economia chinesa, como a Alemanha, e alguns produtores de commodities, como o Brasil, que aumentaram seu comércio com a China, mas agora provavelmente enfrentarão uma contração. Além disso, um efeito importante será o crescimento do descontentamento entre a juventude e a classe trabalhadora contra as inaceitáveis condições sociais existentes na China. Desde 2008, o estoque de crédito privado da China (ou “financiamento social”) cresceu numa medida que excedeu o crescimento do crédito dos EUA no período anterior ao colapso do Lehman Brothers. A desaceleração da economia mundial pode ter um sério impacto na economia da China.

36. A crise capitalista não é só econômica, mas profundamente política, em especial nas cúpulas da sociedade, com os maiores e mais abertos choques dentro das fileiras da burguesia em décadas. Seus líderes políticos são tratados quase com desdém por sua incapacidade de mostrar uma saída. São como uma torcida de futebol insatisfeita com seu técnico que grita: “Você não sabe o que está fazendo!” Sua incapacidade foi mostrada muito claramente na cúpula de Cannes do G20 em novembro. Na preparação para esse encontro, a imprensa estava cheia de otimismo, ecoando o slogan de Obama, com os franceses dizendo: “We Cannes do” (“Sim podemos”). Depois, a conclusão era: “We Cannes not do” (“Não podemos”)!

37. Essa reunião também serviu para ilustrar o declínio do poder econômico do imperialismo dos EUA. No período imediato à 2ª Guerra Mundial, os EUA, com o Plano Marshall, foram capazes de impor sua vontade econômica ao mundo capitalista. Mesmo nas cúpulas dos últimos 10-20 anos, os EUA foram capazes de exercer sua influência na política econômica. Nessa reunião, Obama foi completamente incapaz de impor à “Europa” soluções econômicas benéficas para o continente e, claro, para o mundo como um todo. Sarkozy também foi tratado com desdém – ele foi forçado publicamente ficar na espera – até o presidente chinês, Hu Jintao, eventualmente se dignar a recebê-lo. Essa deveria ser a plataforma para lançar a campanha de Sarkozy para um segundo mandato, com ele se postando perante ao povo francês como o “salvador” do capitalismo europeu e mundial. Sua proposta para a China usar suas colossais reservas para sustentar o euro na forma de empréstimos e garantias ao Banco Central europeu (BCE) foi frustrada poucos dias depois de seu anúncio. Mesmo se quisesse, o regime chinês seria incapaz de convencer sua própria população – com um PIB per capita médio no nível de El Salvador – a transferir enormes fundos para dar suporte às aposentadorias dos “europeus ricos”.

38. O fracasso das cúpulas capitalistas em oferecer uma saída da crise econômica é acompanhado pela clara incapacidade de aprovar ou coordenar qualquer medida séria sobre as questões ambientais, especialmente a mudança climática. De fato, está ocorrendo o processo oposto; mesmo medidas limitadas e ineficientes como o protocolo de Kyoto já são história e vários Estados as estão abandonando. A Conferência Climática de Durban (COP 17) é uma manifestação desse fracasso. Após um declínio menor nas emissões de dióxido de carbono em 2008 e 2009, até o Departamento de Energia dos EUA mostram em seus últimos dados um aumento sem precedentes em 2010. É pior do que todos os cenários do pior tipo apresentado por especialistas do IPCC (o conselho climático mundial da ONU) quatro anos atrás. Com um aumento adicional de 5,9% nas emissões em 2010, a velocidade do aumento alcançou um novo pico. Embora algumas das manifestações ligadas à cúpula do COP 17 fossem menores do que no passado, a incapacidade de achar uma solução teve um grande impacto na consciência dos trabalhadores, especialmente os jovens. Questões ambientais serão novamente um gatilho para novos protestos e rebeliões no futuro.

Europa em ebulição – França

39. O próprio Sarkozy está sob cerco – assim como todos os governos da Europa – por causa dos efeitos da situação econômica em deterioração na França, com o aumento do desemprego. Ele enfrenta uma árdua batalha para assegurar um segundo mandato nas eleições presidenciais de abril e maio. Há dos cortes de empregos a conta gotas; a gigante Peugeot enfureceu os sindicatos com suas propostas de cortar 5 mil vagas de uma força de trabalho mundial total de 200 mil. A ameaça da França ter rebaixado sua nota de crédito está sendo usada por Sarkozy para preparar o terreno para cortes selvagens: “gaste menos e trabalhe mais’. Há uma ruidosa campanha do governo e dos patrões para cortar os “custos de mão de obra”. Alega-se que o custo por hora da mão de obra na França subiu 9 euros entre 2000 e 2010, e no mesmo período, na Alemanha, subiu apenas 4 euros. Esse é apenas um exemplo de como a burguesia em cada país joga suas classes trabalhadoras uma contra a outra – ao mesmo tempo usando o terror do “rebaixamento” de sua dívida nacional – para justificar o avanço das políticas neoliberais.

40. Os patrões também estão exigindo a completa anulação dos restos da semana de 35 horas, que alegam ser “uma desvantagem do custo da mão de obra”. Como a França é a França, a classe trabalhadora, apesar das eleições no horizonte, está destinada a entrar na luta sindical para responder a esses ataques no próximo período. Contudo, ela também olha para o plano eleitoral. Os destacamentos mais avançados dos trabalhadores franceses buscarão uma alternativa combativa clara. Ela não será fornecida pelo principal adversário de Sarkozy, o candidato do Partido Socialista, Hollande, que já está comprometido – como seus primos “socialdemocratas” em toda a Europa – a reduzir a dívida, o que significa mais ataques à classe trabalhadora. Contudo, se ele conseguir derrotar Sarkozy e implementar políticas similares, então encontrará uma resistência feroz. Nas “prévias” para a escolha do candidato do Partido Socialista, houve um grande comparecimento, de cerca de 2 milhões, segundo informes. Isso não justifica o método das “prévias”, emprestado do sistema político falido dos EUA. Ele se destina a dissolver a força organizada e a militância politicamente consciente de um partido na massa, influenciada pela imprensa etc. Mas, foi uma poderosa expressão do despertar de enormes setores da população, em especial de trabalhadores que se sentem desamparados, quando nenhum candidato ou partido expressa realmente suas opiniões. Eles, portanto, compareceram em grande número e, na primeira rodada, 17% votaram no candidato da esquerda, Arnaud Montebourg. O programa dele era apenas vagamente de esquerda, mas tocou nas consciências por causa das críticas implícitas ao capital e à sugestão de uma alternativa radical.

41. Imagine a resposta se o NPA, no último período, tivesse se organizado adequadamente e formulado uma clara perspectiva de luta de classe, intervindo de forma enérgica em todos os conflitos sociais e sindicais dos últimos anos. Nossos camaradas franceses relataram que houve 77 greves na França apenas entre fevereiro e o início de junho. O NPA agora seria um adversário sério para disputar pelo menos um pouco do apoio que atualmente vai para outras forças e candidatos de esquerda. Infelizmente, parece que o NPA não será um adversário sério nessas eleições. Isso por si só é uma crítica à força ainda dirigente dentro do NPA, a antiga LCR, seção francesa do SUQI, que foi incapaz de capitalizar o sucesso das eleições de 2002. Ainda é preciso que nós ajudemos os melhores trabalhadores e jovens que desejam transformar esse partido em um verdadeiro pólo de atração combativo e socialista. Ao mesmo tempo, é preciso urgentemente atrair para nossa própria bandeira os que estão dentro do NPA, assim como o setor considerável que continua fora de suas fileiras. Nos eventos convulsivos que estão se abrindo no país, a França e a classe trabalhadora francesa reivindicarão seu lugar na primeira fileira das forças radicais e revolucionárias da Europa.

Alemanha – a força dominante na Europa

42. A Alemanha há muito tem sido a força econômica dirigente na Europa. Contudo, a crise da zona do euro a forçou a ser uma força mais abertamente política. Os representantes do capitalismo alemão assumiram o manto sobre o resto da Europa, como os EUA fizeram com o mundo no passado. Ela usou a zona do euro – com taxas de juros fixadas pelo BCE, que ela domina e está afinada com seus interesses – para colocar o resto da Europa de “dieta”. Isso foi tolerado – de fato, foi muito benéfica – pela “periferia”, porque lhe permitia pegar empréstimos a taxas de juros baixas, o que permitiu seu “crescimento”, embora ao custo de acumular enormes dívidas. Em contrapartida, esses países e o resto da Europa forneciam os mercados para as exportações alemães, especialmente bens industriais. A China também representa um enorme mercado para os mercadorias alemães, mas com a provável desaceleração da economia chinesa – as últimas estimativas dizem que as taxas de crescimento podem cair abaixo de 8% – as vendas irão cair. O outro lado disso, é claro, é que outros países, especialmente os mais fracos, foram colocados numa camisa de força monetária, o que se provou desastroso – como previmos – quando o boom acabou. Não obstante, o capitalismo alemão fez enormes investimentos financeiros na zona do euro, com seus bancos comprando títulos soberanos e por estão expostos se esses entrarem em colapso.

43. Os ataques aos padrões de vida dos trabalhadores alemães na primeira metade da década passada, com o programa de cortes salariais, empregos parciais e precários etc., até agora deu ao capitalismo alemão uma vantagem competitiva nas exportações. A Europa e a China forneceram a principal vazão para elas, o que não será necessariamente a situação no futuro. Um período de desvalorizações competitivas, que se seguiria à ruptura da zona do euro, poderia ter um efeito devastador sobre a economia alemã, com uma estimativa concluindo que isso poderia resultar na perda de pelo menos um milhão de empregos na Alemanha.

44. Angela Merkel, expressando a confiança da classe dominante alemã, ronda a Europa como uma imitação do “Colosso” de imitação, brandindo o porrete contra os pecados econômicos de toda a Europa, mas ela não desempenha o mesmo papel em casa. O desemprego diminuiu, mas seu governo de coalizão – com os antigos “liberais” do FDP – não é popular e pode colapsar a qualquer momento. Além disso, ela tem que enfrentar grande oposição dentro de seu próprio partido, o Democrata Cristão, a respeito da Europa, com alguns setores do partido, apoiados por elementos do grande negócio, ameaçando romper e formar um novo partido eurocético. A produção industrial oscilou nos últimos meses de 2011, reforçando as preocupações dos representantes mais perspicazes do capitalismo alemão, e da própria Merkel, com as consequências do espiral mortal da econômica da Europa e do mundo, especialmente a ameaça do aprofundamento da deflação. Ela lançou a ideia de um salário mínimo, em parte por causa disso, mas também porque quer lançar a base para expulsar o reduzido FDP do governo. Isso por sua vez pode preparar o caminho para uma grande coalizão com o SPD, mas também é possível que uma divisão da coalizão force eleições antecipadas.

45. Embora o Die Linke tenha sofrido retrocessos eleitorais regionais, e sua preferência nas pesquisas caiu para algo em torno de 8%, ele ainda tem potencial para crescer e agir como um ponto de atração para a oposição de esquerda, especialmente quando o SPD estiver de volta no governo federal. Como alguns outros partidos de esquerda, por exemplo a IU na Espanha, o Die Linke girou à esquerda em resposta à crise. Recentemente, adotou um programa reformista de esquerda que combina abertura para participação em governos de coalizão capitalista, com chamados para a “mudança de sistema” e promessas de que “queremos construir uma sociedade socialista democrática”. A combinação do Die Linke como o único partido no Bundestag que se opõe aos “planos de resgate” dos líderes da UE e do retorno de Lafontaine dá ao partido outra oportunidade de construir um apoio, mas, se ele será capaz de tirar proveito dessa oportunidade, infelizmente é uma questão aberta.

Grã-Bretanha

46. O início da crise afetou profundamente a Grã-Bretanha, especialmente desde a eleição da coalizão ConDem no ano passado. Os erros catastróficos da classe dominante britânica foram expostos. Ela permitiu a atrofia da sua base manufatureira a favor do investimento em serviços financeiros, que por sua vez colapsou. Todas as camadas de gordura acumuladas para proteger o capitalismo britânico das tormentas econômicas foram consumidas. Seu império se foi e as receitas do petróleo do Mar do Norte começaram a secar.

47. Foram implementados cortes sem precedentes nos anos recentes, e mais estão por vir. O governo admite que os padrões de vida em 2015 será mais baixos do que foram em 2002; a sociedade ficará estagnada por 10 anos! Essa passará historicamente como uma década perdida, com uma geração perdida de um milhão de jovens e um milhão de mulheres já desempregados, em um beco sem saída do desemprego.

48. A Grã-Bretanha enfrenta uma situação que não enfrenta há 80 anos. A declaração de guerra do governo ConDem contra todos os direitos e condições da classe trabalhadora britânica – pois é isso o que representa – é o maior desafio desde o período imediatamente anterior à greve geral de 1926. Isso explica a feroz reação da massa da classe trabalhadora, refletida nas enormes manifestações e greves em 2011: 26 de março, a maior manifestação na história só da classe trabalhadora; 30 de junho, uma greve parcial do setor público; e a mastodôntica greve de 30 de novembro.

49. A direção oficial da central sindical (TUC) foi obrigada a ir aonde não queria e ratificou a ação contra os planos do governo. Nisto, nossos camaradas jogaram um grande papel, em especial onde temos considerável influência na esquerda dos sindicatos. Acima de tudo, a batalha que temos nos engajado na Rede Nacional de Delegados Sindicais (NSSN), onde nos mobilizamos a partir de baixo, assim como na cúpula dentro dos sindicatos, valeu a pena ao ajudar a provocar essa situação. Nossos jovens camaradas também conduziram uma heróica e enérgica campanha contra o desemprego na juventude, incluindo a marcha de Jarrow, e também intervindo nos distúrbios de Londres.

50. A situação na Grã-Bretanha ilustra muitas coisas: o beco sem saída do capitalismo e a falta de alternativa de todos os grandes partidos e organizações. Isso inclui a grande maioria dos líderes sindicais, especialmente dos da direita. Ela também ilustra o papel que pode ser jogado por uma pequena organização que possui perspectivas claras. Ela pode ter um efeito muito maior que seu tamanho. É isso que temos conquistado na Grã-Bretanha no presente momento. Contudo, não é suficiente apenas construir influência, mas forças sérias devem ser organizadas no partido.

Trabalhadores americanos começam a contrapor

51. A crise é ilustrada claramente pelo beco sem saída na Europa entre as diferentes potências europeias sobre qual direção tomar na economia. Talvez, a divisão entre os diferentes setores da classe dominante e seus supostos representantes nos EUA é ainda mais pronunciada, como se expressa no impasse entre o Congresso e Obama sobre o tamanho dos cortes, a questão da saúde e da educação. Obama está aterrorizado que o aprofundamento da crise europeia – resultando no colapso ou colapso parcial do setor bancário – tenha repercussões mais amplas nos EUA e no mundo. Isso poderia destruir sua esperança de reeleição para a presidência no próximo ano.

52. Mas a catástrofe econômica dos EUA hoje também está alarmando a burguesia de outros países, por causa da posição ainda central da classe dominante americana para o capitalismo mundial. O “pesadelo americano” foi a manchete de um editorial do Guardian em 28 de novembro, que declarou: “A economia americana agora é quase três vezes maior do que era no começo dos anos 1970 – mas o trabalhador típico não encontra um centavo desse crescimento em seu bolso… Nos anos 1960, se supunha que tal motim prolongado por parte dos ricos causaria uma revolução”. E as bases para uma revolução na perspectiva da classe trabalhadora estão sendo preparadas pela degradação sistemática e aparentemente sem fim das condições de setores significativos das massas. O desemprego está oficialmente em 9%, mas, na verdade, é duas vezes esse nível, e com uma tendência pronunciada de desemprego em massa a longo prazo, nas linhas dos anos 1930.

53. Em certos casos, essa crise já é pior do que nos anos 1930. No global, essa década testemunhou estagnação econômica e “depressão”. Mas dentro dessa estrutura houve um período de crescimento de junho de 1934 a 1937. O ataque de Roosevelt às pensões dos veteranos da 1ª Guerra Mundial em 1937 ameaçou mergulhar a economia dos EUA de volta na crise. Mas os EUA foram salvos de uma crise mais profunda pelo início das preparações da guerra, o que permitiu que o crescimento na indústria de defesa transbordasse para outras indústria. Sem isso, as convulsões sociais dos anos 1930 poderia ter desembocado em um poderoso movimento revolucionário, com a possível criação de um partido dos trabalhadores de massas independente. Mas a História tomou uma rota diferente. Mas agora o nó da História está sendo reatado com o despertar sindical e social da classe trabalhadora na América. Esse processo será abastecido pelos ataques oriundos dessa crise, que irão chover sobre as cabeças dos trabalhadores americanos.

54. Além disso, os EUA atravessa uma profunda crise política. Diariamente, as duas câmaras do congresso demonstram o quanto é deficiente o sistema política e como é ultrapassada a Constituição dos EUA. Essa constituição, escrita no século 18 para uma população de pequenos fazendeiros e para o “bipartidarismo”, não mais “cumpre sua função”. O bipartidarismo está completamente ultrapassado e totalmente incapaz de reconciliar o crescente antagonismo de classe, que está se tornando quase ingovernável. Isso representaria um problema em qualquer Estado, mas pode pôr a nação mais poderosa em perigo mortal.

55. Os infames “interesses especiais” – com pelo menos 13 mil lobistas infestando o Congresso, 25 para cada congressista – dos Grandes Negócios e seus consortes dominam essa “democracia do dólar” como nunca antes na história. Ao mesmo tempo, mais de 50% do povo – e esse número pode crescer na próxima eleição presidencial – está desencantado com essa farsa de democracia, onde uma população cada vez mais empobrecida tem que escolher qual gangue de milionários e bilionários os dominará e explorará nos próximos quatro anos.

56. Nenhum presidente Americano foi eleito para um Segundo mandato com o nível de desemprego existente agora nos EUA. A popularidade de Obama afundou, com uma pesquisa em dezembro dando-lhe uma taxa de aprovação de -24 pontos percentuais! Isso “normalmente” indicaria a derrota nas eleições presidenciais. Contudo, poucos presidentes enfrentaram o incrível fenômeno do Tea Party, com suas ideias e líderes ridículos e malucos. Em muitos poucos países candidatos em potencial sairiam impune com o que Perry, governador do Texas, tentou recentemente. Ao atacar Obama, ele supostamente citou-o como dizendo que a economia “não era importante”. Contudo, Obama nunca disse tal coisa, mas seu adversário nas últimas eleições, John McCain, se expressou desse modo. Mas Perry não fez nenhuma retratação ou se desculpou quando isso foi revelado.

57. O nível político na maioria dos países retrocedeu. E, se depender da mídia, que mente descaradamente até mesmo contra os “liberais”, esse nível não sobe muito. Os EUA começaram de um nível muito baixo e, por causa da ausência de partidos classistas, o nível de compreensão política afundou ainda mais entre grandes setores da população. Não obstante, sob a pressão dos grandes eventos, a compressão política da classe trabalhadora em particular pode se desenvolver aos saltos. Isso seria facilitado enormemente pela construção de um verdadeiro “terceiro partido” como um pólo de atração radical e de massas.

58. Para o Tea Party Obama é sem dúvida um “socialista”! Certamente ele não é, como mostram suas ações quando ele se ajoelha diante dos Grandes Negócios. Ele também recuou das reformas necessárias na saúde. Roosevelt nos anos 1930, à maneira de Jesus Cristo, ameaçou “expulsar os vendilhões do templo”. Obama nem mesmo tentou cortar as unhas dos Grandes Negócios, já que demonstra cada vez mais que está firmemente no campo do capitalismo.

59. De outro lado, a classe trabalhadora americana recebeu uma lição muito forte sobre a realidade do capitalismo no último período. Ela testemunhou expulsões em massa de suas casas – mais de 2 milhões de casas foram “fechadas” – está sendo expulsa dos locais de trabalho e fábricas enquanto os ricos acumulam mais riquezas. Ela viu e derrotou a tentativa de governadores de direita de Estados como Ohio de proibir sindicatos e o direito de organizar o setor público. Essa tentativa foi esmagada por uma vitoriosa campanha sindical num referendo para derrotar essa proposta. Esse é apenas um indicativo da ascendente militância – a crescente polarização de classe – que está tomando conta dos EUA no presente momento. Não é acidente que o movimento “Ocupe” está num nível superior de envolvimento, alcançando os sindicatos em particular, do que na maioria dos países da Europa. Houve um espaço maior para esse movimento por causa da baixa densidade da militância sindical – apenas 12% da força de trabalho americana está organizada em sindicatos – além da casta burocrática conservadora que domina grandes setores do movimento sindical. Portanto, os sindicatos – em especial, a base militante de muitos deles – se jogaram avidamente no movimento “Ocupe”. Deste modo, o movimento “Ocupe” pode alimentar o movimento sindical e provar ser um importante catalizador para a mudança.

Dilema da zona do euro

60. Quanto às perspectivas para a zona do euro, e o destino do euro, a burguesia está sem rumo e completamente incapaz de concordar com soluções. Mervyn King, quando perguntado sobre o que poderia acontecer nos próximos meses, secamente declarou: “Não posso dizer a você o que pode acontecer amanhã, sem falar dos próximos meses”. Igualmente, é muito difícil para nós elaborar de forma precisa a provável marcha dos eventos, em especial na escala de tempo de como a “crise da dívida pública” irá se desenrolar, em especial no curto prazo. Essa questão foi cuidadosamente analisada no artigo que apareceu em nosso website e no jornal teórico da seção da Inglaterra e Gales, Socialism Today. O SI concorda com as análises feitas ali e suas conclusões.

61. O artigo pontuou que Merkel e o Bundesbank impediram o BCE de fazer compras em larga escala de títulos dos governos da zona do euro, a única medida imediata que poderia dar sustento a dívida soberana a curto prazo. Isso apesar dos apelos de governos, como os de Sarkozy, para a intervenção do BCE. Ao mesmo tempo, o Fundo de Estabilidade Financeira europeu (EFSF – do qual resta apenas 250 bilhões de euros) não se transformou num veículo efetivo de intervenção (ele falhou em levantar fundos adicionais nos mercados financeiros). Merkel também rejeitou até agora a introdução de títulos em euro de garantia mútua para assegurar a posição dos países mais fracos da zona do euro.

62. A intervenção do BCE, na visão de Merkel, deixaria os governos “devassos” fora das obrigações das medidas de austeridade. Ela criaria um “prejuízo moral”, permitindo-lhes acumular mais dívidas sem qualquer penalidade. Enquanto isso, o ataque aos títulos da zona do euro pelo mercado financeiro continua, ameaçando até a dívida pública francesa. “Poucos duvidam das boas intenções da sra. Merkel”, comentou Philip Stephens [Financial Times, 22 de novembro], “muitos mais se preocupam, com boa razão, de que sua obsessão com o prejuízo moral ainda possa ser a morte da união monetária”.

63. Mas também há tentativas da Alemanha e França de trazer tais medidas pela porta de trás, aumentando as compras de títulos soberanos pelo BCE ou adiantando a implementação adicional do ESM para 2012. A crise está obrigando as burguesias alemã e francesa a tentar cada vez mais a centralização da Europa e organizar novos resgates para bancos e Estados, o que irá continuar até que não possam mais, financeira ou politicamente. Então, as forças centrifugas virão à tona. Novos giros em U são possíveis e prováveis, tanto no sentido de mais centralização quanto do nacionalismo.

64. Os grandes especuladores forçaram pra cima o custo das dívidas italiana e espanhola, e agora estão se voltando para títulos do governo francês. Os títulos de outros países, como Holanda, Áustria, etc., foram ameaçados. Há até mesmo o início de uma venda de títulos alemães, apesar da força relativa da economia alemã. Isso reflete o crescente temor entre investidores asiáticos sobre um completo colapso da zona do euro.

65. A resposta de Merkel tem sido propor “mais Europa”, inicialmente aumentando a coesão a união monetária da zona do euro. Isso poderia ser, de acordo com seu plano, outro pequeno e incremental passo rumo a união fiscal e política. Ela está propondo um regime mais estreito da zona do euro, com regras estreitas sobre impostos e gastos. Haveria a criação de um novo órgão, um “Fundo Monetário europeu”, que teria poderes para intervir, supervisionar ou mesmo impor políticas econômicas e fiscais dos governos nacionais. Então, sugere-se que poderia ser possível introduzir euro-títulos de garantia mútua, e empregar outras medidas para apoiar os governos da zona. Esse plano, de supervisão de todos os orçamentos da zona, seria realmente um retorno ao pacto de estabilidade, rompido pela França e Alemanha no passado, mas agora “com esteroides’!

66. Merkel, contudo, não acolheu as propostas de Barroso, presidente da Comissão europeia, apresentando planos para os euro-títulos. A versão alemã se basearia em condições mais rígidas do que as propostas pela Comissão. Isso levantou temores entre líderes europeus de que o novo regime da zona do euro significaria, de fato, a hegemonia alemã. Isso especialmente depois dos comentários de Volker Kauder, líder parlamentar de Merkel, na recente conferência da União Democrata-Cristã, de que a Europa “agora está falando alemão”.

67. As propostas apresentadas por Merkel exigiriam uma revisão de tratados. Embora a revisão afetasse apenas os 17 membros da zona do euro, ela exigiria a aprovação de todos os 27 membros da UE. Em vários países isso exigiria referendos. Em seu encontro com Cameron, Merkel parecia estar ansiosa para conseguir a aceitação do governo britânico. Em troca da aceitação de mudanças de tratado pelo governo ConDem (e, segundo alguns relatos, prometendo não convocar um referendo na Grã-Bretanha), Merkel concordaria com mais exceções para a Grã-Bretanha na legislação social e de trabalhista.

68. As medidas propostas por Merkel seriam suficiente para salvar o euro? O primeiro problema é o tempo. Levaria pelo menos vários meses, possivelmente todo o próximo ano, para os líderes da zona do euro serem convencidos a aprovar a nova estrutura da zona. Mas depois haveria o problema ainda maior de ganhar a aceitação nos países da zona. A oposição de massas sem dúvida cresceria com as novas medidas de austeridade, uma queda na economia europeia (e global, provavelmente) e o fato de que Merkel e outros ligam esses passos limitados com a ideia de união política.

69. Merkel está levantando a questão da união política como um objetivo de longo prazo, a ser conquistado passo a passo. Uma união fiscal, com uma infraestrutura política central – um aparato estatal supranacional – é a lógica de uma única moeda. A crise atual mostra a impossibilidade de sustentar uma união monetária pura sem coordenação econômica e fiscal. Os Estados capitalistas mais ricos nunca irão garantir as economias mais fracas sem ter a última palavra em suas políticas econômicas. Para ser vitoriosa a longo prazo, a união monetária exigiria uma política fiscal comum, títulos governamentais comuns e transferências dos países mais ricos para os mais pobres para evitar o crescimento de disparidades econômicas e tensões políticas.

70. Isso implica um Estado federal europeu, similar à estrutura federal dos Estados Unidos. Mas, os EUA foram formados durante um crescimento de longo prazo no século 19. Seu capitalismo foi consolidado como resultado da guerra civil contra os escravagistas sulistas, que se baseavam numa economia de plantation. O capitalismo dos EUA foi capaz de desenvolver uma língua e cultura comuns (ou, pelo menos, dominantes). Ao contrário, a Europa (seja os 17 ou os 27) consiste de uma coleção de estados nacionais com suas próprias línguas, histórias e consciência nacional.

Trabalhadores gregos continuam a lutar

71. Por essas razões – como há muito temos dito – o euro e a zona do euro, ao invés de levarem a uma Europa mais unificada, resultarão no oposto: a divisões, nacionalismo e a todos os “males” que diziam que o projeto do euro iria banir para sempre. O próprio euro pode colapsar com a saída voluntária ou forçada de vários países, começando com a Grécia. O preço de permanecer dentro do euro é um permanente pacote selvagem de austeridade, e, no fim disso, a dívida nacional ainda será 120% do PIB! Mas esse já é o “inaceitável” nível da dívida nacional italiana, o que forçou grandes cortes e causou a queda de Berlusconi, substituído pela imposição de um governo “tecnocrata” não-eleito.

72. Isso significa o empobrecimento em massa do povo grego por todo um período histórico. Trabalhadores de outros países compartilharão do mesmo destino, como indica o programa do governo britânico de anos de austeridade. O povo grego atualmente teme que a saída da zona do euro faça o relógio voltar para o atraso econômico e isolamento do período pré-euro. Portanto, em pesquisas de opinião 80% se expressaram contra deixar o euro na época do planejado referendo de Papandreou, depois rejeitado. Mas, isso pode mudar rapidamente, e num referendo de “sim ou não” – que pode surgir muito rapidamente, não apenas na Grécia, mas em outros países europeus – sair da UE pode parecer uma opção mais atraente do que continuar na camisa de força de austeridade. Contudo, enfatizamos que “dentro ou fora”, os mesmos problemas serão colocados e os mesmos ataques aos padrões de vida serão desencadeados contra o povo grego. A reintrodução da dracma pode levar ao colapso total dos bancos e com isso a destruição das poupanças – à la Argentina – assim como à desvalorização da nova moeda, o que seria acompanhado por um grande aumento na inflação.

73. Temos que ser extremamente flexíveis no modo como abordamos a UE e a possibilidade – talvez probabilidade – de um referendo a favor ou contra o euro e a zona do euro, que pode ser colocada tanto nos 17 países dentro da zona do euro quanto nos outros 10 países “fora”. Como a continuidade na UE pode se identificar nas mentes das massas com mais cortes implacáveis nos padrões de vida, em algumas situações a classe trabalhadora e nossas seções vão defender o votando para deixá-la. Nessa situação, é vital que apresentemos uma posição classista e internacionalista, com oposição clara ao nacionalismo burguês, o qual nos opomos em todas as ocasiões. Contudo, em vista dos ditames centralistas burocráticos da UE, pode se desenvolver um legítimo sentimento de indignação nacional, como foi obviamente o caso da Grécia, e pode se desenvolver em outros países. Trotsky pontuou que a classe trabalhadora e suas organizações é que são os verdadeiros defensores da “nação”, cuja maioria é a classe trabalhadora e seus aliados.

74. A ideia de que a UE foi “progressista” e estava levando inelutavelmente para uma “Europa unificada” foi destruída com o início da crise econômica. Essa ideia, nutrida não apenas por liberais burgueses e líderes sindicais pró-capitalistas, mas até por certos marxistas e até trotskistas, foi severamente destruída à medida que se tornou claro o caráter neoliberal da UE – com a imposição de medidas anti-trabalhadores como a diretiva sobre “trabalhadores destacados”, a abertura para a aceitação de salários e condições do mundo neocolonial. Essa opinião foi reforçada por aquilo que foi percebido, em especial nos países que estavam no fim da fila, como um virtual poder colonial infligindo miséria e ditames a seus “súditos”. Esse é o caso da Grécia, com funcionários da UE instalados – ou pelo menos tentando agir – nos escritórios dos diferentes ministérios, assegurando assim a implementação dos programas de austeridade. O mesmo se aplica ao virtual “golpe” do suposto governo “apolítico” de Monti na Itália, que substituiu Berlusconi no poder. O mesmo processo foi testemunhado na Grécia, com a substituição do governo de Papandreou por um governo “nacional” liderado pelo antigo vice-presidente do BCE Papademos como “árbitro” entre a Nova Democracia e o Pasok.

75. Isso representa uma nova fase na Europa, refletindo a profundidade e seriedade da crise econômica, a severidade dos ataques à classe trabalhadora, sua resistência a eles e, como consequência, a intensificação da luta de classes. Mesmo em períodos “normais” de “paz social”, ocorre uma guerra civil velada entre as classes antagonistas. Contudo, ela tomou uma forma mais direta e aberta à medida que a burguesia, em alguns casos, recorreu a medidas brutais contra os direitos e condições da classe trabalhadora, como claramente é o caso da Grécia. Os trabalhadores gregos ainda estão resistindo ferozmente, como visto na recusa dos eletricitários de implementar as medidas impostas pelo governo, que iriam cortar o fornecimento de energia dos domicílios se eles não pagassem o novo imposto sobre moradia. Isso é acompanhado por uma campanha pelo não pagamento, na qual nossos camaradas estão participando. Mas mesmo em outros países onde a luta de classes ainda não alcançou seu pico – na Irlanda, Grã-Bretanha e outros países – um tipo de “guerra civil unilateral” foi desencadeada, e ainda não recebeu uma resistência suficientemente resoluta dos líderes sindicais. De fato, os capitalistas, em vários países, ganharam a primeira rodada; em alguns casos – como a Grécia – a segunda e terceira rodadas também. Na Grã-Bretanha, 300 mil empregos no setor público foram perdidos desde que o governo ConDem chegou ao poder e outros 400 mil podem desaparecer. A promessa de Osborne e Cameron de que empregos no setor privado iriam substitui-los, como a fênix das cinzas, foi comprovada como totalmente ilusória; há bastante “cinzas” nas fábricas vazias e um aumento enorme no desemprego, mas nenhum sinal da Fênix, que se mudou para a China e outras “áreas em crescimento”, para nunca mais retornar!

Espanha e Portugal à beira do abismo

76. Com o advento de governos de direita em Portugal e Espanha, a classe trabalhadora pode esperar uma grande piora de sua posição e o aprofundamento das medidas de austeridade prometidas pelo novo governo direitista de Rajoy na Espanha e pelo governo de coalizão de centro-direita português, eleito em junho. A economia portuguesa contraiu-se de julho a setembro de 2011 pelo quarto trimestre consecutivo, a pior performance de todas as 27 nações da UE. O Produto Interno Bruto caiu 0,4% no terceiro trimestre comparado com os três anteriores, e caiu 1,7% comparado ao mesmo período do ano passado. E um aumento de impostos visa reduzir a renda real dos trabalhadores do setor público e aposentadorias em mais de 20% comparado a 2010. Significativamente, soldados e policiais, usando roupas civis, uniram-se às enormes manifestações e à greve geral em novembro, que paralisaram totalmente o país.

77. Até o octogenário Mario Soares, antigo líder do Partido Socialista Português (PSP) e ex-presidente de Portugal, foi obrigado a se opor ao programa do governo e apoiar a greve geral! Que virada para Soares, que jogou um decisivo papel para desencaminhar a Revolução Portuguesa nos anos 1970! Ele agiu como um porta-voz para a socialdemocracia portuguesa – que por sua vez estava ligada à CIA americana – ao facilitar a contrarrevolução em uma forma “democrática” em Portugal. Isso salvou o capitalismo português, que o jornal The Times, num obituário prematuro, declarou “morto” após os eventos de março de 1975. Infelizmente, Soares e seu partido, junto com outros fatores – e especialmente com a ausência de um partido revolucionário de massas – conseguiram trazê-lo dos mortos, mais tarde liderando o retrocesso dos ganhos da revolução e por sua vez lançando as bases para o pesadelo que o povo português enfrenta hoje.

78. Uma coisa é certa: as tradições da Revolução Portuguesa, iniciada em 1974, serão redescobertas pela nova geração que entra em luta. A mesma necessidade de uma organização dirigente das massas portuguesas continua tão urgente hoje quanto era no período posterior à derrubada de Caetano. O Partido Comunista Português, embora ainda tenha uma importante presença na classe trabalhadora, ainda não conseguiu se livrar de suas tradições e métodos stalinistas do passado, e não conseguiu alcançar a nova geração com uma genuína política revolucionária democrática marxista. De outro lado, o Bloco de Esquerda, que tinha a promessa, quando foi fundado, de se tornar a base de um novo polo revolucionário alternativo, estagnou por causa de seu caráter de classe heterogêneo, não está firmemente enraizado nem apela à classe trabalhadora, especialmente a classe trabalhadora industrial. Também foi oportunista em sua abordagem nas recentes eleições, quando apoiou o candidato do PSP à presidência! As pequenas forças do marxismo em Portugal devem lutar por um genuíno programa marxista, orientado para a nova geração de trabalhadores, e ao mesmo tempo combinar isso com a luta dentro das duas maiores forças de esquerda, o PC e o Bloco de Esquerda.

79. A crise econômica também pode trazer de volta à agenda a questão nacional na Europa: por exemplo, na Espanha e Grã-Bretanha – Escócia e Gales. Mesmo em países onde a questão nacional aparentemente foi “resolvida” ou deixada para escanteio, ela pode reaparecer: na Bélgica, na Itália (por exemplo, no norte e em Alto Edige), na Irlanda, Chipre etc. Isso pode complicar as lutas da classe trabalhadora, a menos que uma política e abordagem claras sejam adotadas. Isso envolve apoiar a legítima aspiração nacional e se opor ao nacionalismo burguês e lutar pela estreita unidade da classe trabalhadora em ação através da organização unificada nos sindicatos e partidos.

80. Na Espanha, o governo direitista, sob feroz pressão da UE por mais cortes, agirá rapidamente para introduzir “reformas”, na verdade enormes contrarreformas. Um programa de cortes, estimado em 16 bilhões de euros, deve ser imposto ao povo espanhol para acalmar os “mercados”, na verdade um punhado de vigilantes de títulos. Mas os capitalistas têm pouca fé no governo direitista. A vitória eleitoral do PP levou a uma queda abrupta das ações no dia seguinte de sua eleição! Esse é um reconhecimento tácito de que os trabalhadores espanhóis e suas organizações – apesar da existência do desemprego em massa – continuam a ser uma força formidável a se levar em conta. O governo de Zapatero agiu para impedir, em certa medida, um confronto total com a classe trabalhadora, por causa de seu suposto pedigree “socialista”, embora na realidade – como mostra o movimento dos indignados – ele se moveu tanto à direita que é visto como apenas outro partido capitalista.

81. As massas espanholas estarão muito mais preparadas para enfrentar um governo de direita descarado do PP, talvez depois de uma pausa inicial, à medida que reúnem forças para resistir ao novo governo. Um prolongado período de lutas se abre na Espanha nas arenas social, sindical e política. O movimento dos “indignados” que começou na Espanha –inspirado pela Praça Tahrir no Egito – inicialmente adotou talvez o caráter “apolítico” mais evidente de todos. Isso foi precisamente por causa do completo desapontamento, especialmente dos jovens, com a decadência política de todos os principais partidos. Isso inclui os sindicatos e a Esquerda Unida (IU). É verdade que a IU aumentou sua representação nas Cortes, triplicando seus parlamentares. Mas, dada a desilusão com os partidos capitalistas, em especial o partido “socialista”, e contra o pano de fundo da devastadora crise econômica, poderia ter sido imensamente maior. Na Valência – a terceira maior cidade da Espanha – por exemplo, um quarto da força de trabalho está desempregada. O PSOE elegeu o menor número de deputados – 110 – desde o fim do regime de Franco em 1977.

82. Contudo, a abstenção política dos jovens não pode se manter em vista da seriedade da crise que devasta a Espanha e da urgência de buscar uma solução viável. O movimento “Ocupe” irá se desintegrar a menos que tome uma clara direção política. O CIT na Espanha deve lutar, como temos feito até agora com sucesso, dentro das organizações de esquerda, em especial a IU, por uma clara política marxista de luta, que possa engajar os jovens atraídos pelo movimento “Ocupe” e politizá-los numa linha de classe. Isso deve se combinar levantando uma bandeira marxista independente. Rajoy expressa a complete bancarrota do capitalismo espanhol, falando para o sistema como um todo, para a Europa e o mundo, quando declarou: “Não haverá milagres… Não prometemos nada”.

Berlusconi se foi, mas continuam os ataques na Itália

83. Uma abordagem similar é adotada pelos líderes em outros países, incluindo os da “esquerda”, como Bersani da Esquerda Democrática (PD) na Itália. O PD – o que restou do outrora poderoso Partido Comunista da Itália – cedeu à campanha dos capitalistas que levou Monti à chefia de um governo “tecnocrata” completamente antidemocrático que substituiu o desacreditado Berlusconi. De fato, ocorreu um “golpe brando” da direita, sem um som de protesto dos líderes políticos de “esquerda”. Eles agora mostram o mesmo medo de tomar o poder, que Trotsky observou em relação ao plano de Man da socialdemocracia belga nos anos 1930. A crise devastadora – parcialmente escondida pelo longo período de Berlusconi no poder – agora é claramente visível. A Itália experimentou uma “década perdida” de estagnação econômica, que deixou a Itália no fundo da lista de crescimento. Segundo o FMI, “apenas Zimbábue, Haiti e Eritreia foram piores”. Como em outros países no sul da Europa, é a juventude que paga o pato, com pelo menos 30% dela desempregados; muitos, por causa da crise habitacional, são forçados a viver com seus país até os quarenta. Sob o “guarda chuva nacional”, o governo Monti – incitado pela UE – tentará atacar todos os ganhos passados da classe trabalhadora italiana, as aposentadorias em especial, buscando reduzi-las e aumentar a idade de aposentadoria para os 67. Mas não foi por nada que o líder da Liga do Norte, Bossi, alertou Berlusconi antes que este saísse de cena que, se ele tocasse nas aposentadorias, “o povo iria nos matar”! O mesmo se aplica para o governo Monti ou qualquer outro governo que o substitua.

84. Existem famílias inteiras na Itália – como em outros países – cuja única fonte de renda é a aposentadoria de algum parente. Um ataque às aposentadorias – o que o governo Monti seguramente fará – é portanto um ataque muito mais direto a famílias inteiras do que em outros países. É certo que provocará resistência massiva, assim como o aumento da idade de aposentadoria: “Como você pode se aposentar aos 67 em uma linha de produção? Não é fisicamente possível. Estamos produzindo um carro em menos de um minuto”, comentou um metalúrgico ao Financial Times.

85. Portanto, a expectativa de que esse governo irá durar até as eleições programadas para 2013 é uma quimera. Se o governo Monti acenar para a “esquerda” – introduzindo um imposto para os ricos por exemplo, altamente improvável mas não descartado – ele pode ser derrubado pelos partidos de direita que ainda têm uma maioria formal. Mas não será no parlamento que as questões sociais cruciais serão decididas. Serão as fábricas e locais de trabalho e as “ruas” que serão agora decisivas. As manifestações de massas, os cantos de Aleluia em Roma quando Berlusconi se foi – mais uma “libertação” do que a troca normal de governos – a reação feroz dos estudantes de toda a Itália, dará o tom para o próximo período.

86. A greve geral chamada por todos os grandes sindicatos para 12 de dezembro, alguns dias após o anúncio de um novo pacote de austeridade, é um indicativo da raiva que explodiu em baixo. Ela pressagia um novo período de luta de classes na qual o que restou da Rifondazione Comunista, que está dando seu apoio ao PD, se provará incapaz de fornecer uma direção combativa. A iniciativa do famoso líder dos metalúrgicos, Giorgio Cremaschi, que reuniu centenas de esquerdistas sob a bandeira “Cancelar a Dívida”, também será testada nas grandes batalhas entre as classes.

87. A Itália verá o redespertar de suas melhores tradições revolucionárias no próximo período. A ideia de uma “frente dos trabalhadores” dos melhores militantes e lutadores da classe trabalhadora e juventude, que pode lançar a base para a reconstrução de um genuíno partido dos trabalhadores, se adéque às atuais necessidades do marxismo na Itália. A instalação de regimes antidemocráticos na Itália e Grécia levanta a questão do caráter e dos limites da democracia burguesa no presente período.


Elementos de bonapartismo

88. Uma função da democracia burguesa é conter as tensões sociais que surgem em especial numa crise que transborda as margens da luta parlamentar “normal”, “pacífica” e cotidiana. Mas o aumento das tensões de classe – pode alcançar tal pico que o “fusível” derrete. A ideia de uma solução interclassista para a crise foi resumida pelo Chancellor of the Exchequer (ministro das finanças) George Osborne na frase: “Estamos todos juntos nessa”. A ideia de que a luta de classes foi superada convence poucos neste período de grandes tensões de classe. Warren Buffet, supostamente o homem mais rico do mundo, declarou secamente: “Há uma guerra de classe, tudo bem, mas é a minha classe, a classe rica, que está fazendo a guerra, e estamos ganhando”.

89. Face a um desafio ainda mais ameaçador, que assume cada vez mais um caráter aberto – como na Grécia – os capitalistas podem recorrer a medidas extraparlamentares. Há um elemento de bonapartismo mesmo nos países mais “democráticos” ou “republicanos”, nos poderes, “latentes” e mantidos “na reserva”, aos quais os governos podem recorrer em “emergências”. Parte desse processo tem sido a crescente tendência a usar a repressão estatal. A manifestação mais extrema de medidas extraparlamentares de contrarrevolução, claro, é o fascismo. A burguesia não pode recorrer ao fascismo clássico de Hitler e Mussolini na era moderna. O equilíbrio de força entre as classes – em especial com o esmagador peso social da classe trabalhadora, incluindo suas camadas novas, assim como a radicalização da pequena burguesia e de setores dela – exclui isso.

90. Mas isso não significa que a burguesia não buscará medidas mais “autoritárias”, que têm como seu objetivo escapar do controle democrático através de órgãos eleitos. No futuro, especialmente se a classe trabalhadora e suas organizações perderem as chances de pôr sua marca na situação, causando uma desilusão em massa, não se pode excluir que um novo “homem forte” possa surgir do caos, com todo o seu barbarismo associado – como na América Latina nos anos 1970. Antes que o pesadelo assuma uma forma real, entretanto, a classe trabalhadora terá mais de uma oportunidade de efetuar a mudança socialista, especialmente se o marxismo puder ganhar a grande maioria. Está claro que, na Grécia, apenas nos últimos dois ou três anos, a classe trabalhadora poderia ter tomado o poder e efetuado a mudança socialista se tivesse à sua frente um partido revolucionário de massas – nossa atual organização organizada em uma base de massas.

91. Mas mesmo na crise presente, formas de bonapartismo – bonapartismo parlamentar em especial – podem ser usadas pelos capitalistas quando houver um beco sem saída político, como em certa medida na Grécia e Itália. Além disso, tais medidas podem ser usadas em escala europeia assim como nos Estados nacionais; veja o vazamento no Bundestag do próximo orçamento da Irlanda antes que o Dáil e o povo irlandês fossem informados de seu conteúdo! A comissão da UE não eleita – com a conivência de Merkel e Sarkozy – recorreu a ditames bonapartistas contra os países ‘delinquentes’ que são relutantes em engolir o remédio de austeridade. Está propondo uma verão mais rígida do “pacto de estabilidade”, que não funcionou direito num período de boom, e é menos provável que seja efetivo em um período de séria crise econômica. Ela ameaça “multar” países que pecam contra os limites da dívida.

92. Contudo, nessa etapa essa é uma forma muito fraca de bonapartismo parlamentar. Além disso, ela pode ser varrida quando a situação que lhe deu origem mudar, especialmente com um aumento da luta de classes, o que é provável em vários países. Também na Grécia, com a nova amargura reinante, a resistência da classe trabalhadora será retomada quando todo o impacto das medidas de austeridade, por cima das agonias que o povo grego sofreu no período passado, for sentido.

A extrema direita

93. Os partidos e organizações de extrema direita na Europa continuam a ocupar uma parte importante do vácuo político que existe no momento. De fato, em alguns países eles fortaleceram sua posição no campo eleitoral. A Frente Nacional liderada por Marine Le Pen pode ter um impacto nas eleições presidenciais francesas no ano que vem, e não está excluído que possa passar Sarkozy no primeiro turno. Na Holanda, o partido de Geert Wilders, o PVV, está sustentando o governo. Wilders é visto nas pesquisas como o segundo politico mais popular do páis. Na Áustria, o Partido da Liberdade está um pouco atrás nas pesquisas do governante Partido Socialdemocrata, com outro partido de extrema direita, o BZÖ, com 5%. Nas eleições russas, o nacionalista de direita Partido Liberal Democrático da Rússia liderado por Zhirinovsky recebeu 11,4% dos votos. E, infelizmente, nas pesquisas de opinião da Grécia, o partido nacionalista de direita LAOS está com 8% no momento, e na Hungria o partido violentamente antissemita Jobbik possui uma substancial base eleitoral, com quase 17% dos votos na eleição de 2010, ganhando 47 vagas no parlamento. Seus votos subiram mais de sete vezes desde a eleição anterior, de 2006. Há importantes e violentas organizações de extrema direita, com alas paramilitares, embora com números menores, na Escandinávia, Alemanha e Itália, Grã-Bretanha e outros países. O perigo e caos que podem infringir a pessoas completamente inocentes foram revelados nos massacres noruegueses neste verão pelo louco racista de extrema-direita Anders Breivik, seguidos pela descoberta, na Alemanha, de uma célula de neonazistas que realizaram uma série de assassinatos nos últimos sete anos e que nunca tinha sido detectada pela polícia!

94. Esses partidos e organizações precisam ser combatidos antes que levantem suas cabeças, mas ainda não representam uma base firme para a reação de direita. Na busca de popularidade eleitoral e aceitação, muitos buscam abafar seu racismo, antissemitismo, anti-islamismo etc. Mas se a classe trabalhadora não apresentar uma alternativa clara, um novo partido seu, esses partidos podem crescer. Eles podem ser fortalecidos pelo agravamento da crise e o consequente aumento do desamparo e desespero. É urgente que nós, do CIT, e as seções nacionais da Internacional continuem a dar atenção especial à extrema direita e proponham medidas efetivas para conter e minar sua influência.

Rússia e Leste europeu foram afetados gravemente

95. O Leste europeu e Rússia também foram severamente afetados pela crise na zona do euro. A República Tcheca, Hungria e Polônia viram o valor de suas moedas afundar. A coroa tcheca – considerado ainda recentemente um “porto seguro” para a região – se desvalorizou frente ao euro. Além disso, a República Tcheca é talvez a mais vulnerável, com 49% do seu PIB consistindo de exportações para a zona do euro, enquanto a Hungria tem 44% de seu PIB, a Bulgária e a Polônia, 20%! A Rússia, de outro lado, envia para a zona do euro menos de 10% de seu PIB, enquanto a Turquia envia pouco mais de 5%. A brilhante promessa de uma escalada duradoura para a prosperidade ligada ao retorno ao capitalismo e a perspectiva destes países de entrar na Europa, foram severamente minadas. Não obstante a confusão na UE, a classe ou casta dominante que dirige países como a Polônia estão esperançosas e ainda batem na porta exigindo sua entrada. Contudo, quando a poeira assentar, se de fato assentar, ao fim da atual crise europeia, então haverá pouco para eles quando entrarem! Países como a Polônia podem se ver, como consequência, jogados de volta ao tipo de catástrofe econômica que frustrou países como Letônia, Lituânia e Estônia no período passado.

96. Ao mesmo tempo, o brilho começou a se apagar para o regime de Putin, apoiado nas rendas do petróleo. O preço dessa commodity foi afetado pela estagnação e até declínio da economia mundial. Ao mesmo tempo, há o crescente descontentamento em parte refletido no resultado da eleição parlamentar fraudada. O partido de Putin, Rússia Unida, perdeu sua maioria de dois terços e ganhou apenas metade dos votos, comparado com os 64% da eleição anterior. Os votos no Partido Comunista subiram de 11% para quase 20%, e parece que ganhou votos de uma camada da juventude. Com a proibição e intimidação da oposição, que o regime Putin aperfeiçoou ao ponto de uma arte, o verdadeiro descontentamento das massas só pode ser expressada indiretamente. Contudo, ela foi espetacularmente mostrada quando Putin compareceu a um torneio de artes marciais – no qual, segundo sua própria confissão, ele é um “especialista” – e foi ruidosamente vaiado pela multidão. Isso chocou Putin visivelmente, o que fez seus partidários tentarem desculpar as vaias; elas não indicavam oposição a Putin, mas queriam simplesmente ir ao banheiro! Portanto, supostamente, estavam convidando Putin a “piss off” (“cair fora”, literalmente “ir mijar” em inglês)!

97. Na verdade, incidentes como esse mostram o ódio acumulado a Putin – citado por seu círculo mais próximo como o “czar” – e seu regime, que está saqueando os recursos da Rússia às custas do povo, de setores cada vez maiores das massas: “O putinismo, a autocracia seletiva que ele criou, é uma gigante feira do rolo.” [David Hearst, Guardian 30 de novembro de 2011] Ao chegar ao poder, ele jurou eliminar o poder dos “oligarcas” – sete deles controlam metade da riqueza da Rússia – mas, na verdade, criou uma nova gangue, seus próprios oligarcas, em lugar de outros como Khodorkovsky, que foi preso. O recente caso judicial em Londres, entre Berezovsky e Abramovich revelou, em todos os seus detalhes grotescos, o escandaloso e vergonhoso saque econômico da Rússia, o roubo dos recursos construídos pelo povo russo, através das privatizações em massas e do “capitalismo selvagem”. Provavelmente, foi o maior roubo perpetrado na história humana. Esses dois oligarcas, com seus atos e desmandos, fizeram os gangsters de Chicago como Al Capone e Bugsy Siegel parecerem ladrõezinhos de rua.

98. E há a crescente consciência disso entre o povo, mesmo entre aquele setor da juventude que nos anos 1990 tinha grandes ilusões no retorno da Rússia e da antiga União Soviética ao capitalismo. Mas os únicos governos que experimentaram são regimes gangsters do podre e prematuramente envelhecido capitalismo russo. Mas como indica o artigo do Guardian: “Os russos ainda estão esperando viver a vida normal que legitimamente anseiam. Muitos desistiram de esperar. Uma pesquisa particular de 5 mil estudantes na Universidade Estatal de Moscou descobriu que 80% pretendiam deixar o país. Algo entre 30% e 40% da população total também gostaria de emigrar!

99. Hearst também mostrou que há um fluxo de capital deixando a Rússia. Os “podre de ricos” mostraram seu “patriotismo” dobrando a evasão de capitais do país esse ano, de US$34 para 70 bilhões! Além disso, se o preço do petróleo cru atingisse US$125 o barril, isso não beneficiaria o povo russo, já que sai quatro vezes mais dinheiro da Rússia do que entra. Em outras palavras, tanto o setor mais dinâmico da população, a juventude, quanto os capitalistas e seus apoiadores internacionais não têm fé em Putin ou no regime no qual ele se apoia. Portanto, as condições para uma revolução, uma explosão, estão sendo preparadas na Rússia: “Está claro que as autoridades temem muitíssimo uma situação do tipo Cairo”, disse Nikolai Petrov, analista de Moscou. [Financial Times 5 de dezembro.]

100. Como em vários lugares, o poder independente da classe trabalhadora não se expressou em poderosos sindicatos independentes ou na criação de um partido de massas da classe trabalhadora. A principal oposição a Putin nesta etapa está em torno dos “liberais” que lutam contra o “capitalismo de compadrio” de Putin buscando estabelecer um capitalismo mais “normal”, apoiado firmemente no “domínio da lei [capitalista]”.

101. Por causa da história do movimento dos trabalhadores na Rússia, quando os trabalhadores entrarem em ação redescobrirão as ricas tradições revolucionárias do passado. É a nova geração – estudantes que se voltam seriamente para a classe trabalhadora – assim como os jovens trabalhadores, que fornecerão o fermento necessário para a ascensão do movimento dos trabalhadores na Rússia.

Conclusões

102. Claramente, chegamos a um ponto de inflexão na história mundial. A total bancarrota do capitalismo está clara aos olhos do mundo. A burguesia – pelo menos seus representantes – confessa abertamente sua incapacidade de resolver os problemas da humanidade. Soluções incompletas, que é o que está sendo oferecido, não são suficientes. Isso se revela na economia, no campo social, com o crescente empobrecimento de vastos setores das massas trabalhadoras, e também no meio ambiente. Qualquer pretensão de uma “agenda verde” está sendo jogada fora à medida que o capitalismo –busca um bote salva-vidas para seu sistema. O “crescimento” a qualquer custo – que em todo caso continua uma ilusão – é proclamado pelo governo ConDem na Grã-Bretanha, mesmo se resultar no aumento de emissões nocivas. Ao mesmo tempo, a conferência climática em Durban está num impasse e pode terminar sem nem mesmo um acordo mínimo. Isso reforça nossa certeza de que o capitalismo será incapaz de salvar o mundo de uma catástrofe e do derretimento potencialmente irreversível das calotas polares e do meio ambiente como um todo.

103. A divisão de classe se ampliou enormemente durante a crise e está destinada a se ampliar ainda mais. Mas o maior fosso é entre a situação objetiva de falência e desintegração do capitalismo e a consciência das massas. Isso surge de várias fontes e difere de continente para continente, e dentro de países do mesmo continente. Setores da classe trabalhadora – com a memória da recente prosperidade – ainda está em estado de choque com o tamanho da crise. Ela precisará de mais tempo para ver que o capitalismo só achará uma saída minando os direitos e condições deles e de suas famílias. Muitos tem a esperança de que os “bons tempos” vão voltar. A maioria será gravemente desapontada quando isso não se materializar. Mas, estaremos cometendo um erro se concluirmos que essa é a perspectiva de todos os setores, ou da maioria, da classe trabalhadora. Os eventos desde 2007-08 deixaram sua marca na consciência de camadas inteiras da classe trabalhadora, em especial dos jovens. Mas, como repetimos muitas vezes, a maioria destes trabalhadores sabe o que não quer, mas ainda não conhece uma alternativa. Os grandes eventos mudarão isso e prepararão o terreno para mais explosões revolucionárias e semi-revolucionárias, levando a uma mudança molecular na consciência da classe trabalhadora. Novas formações políticas, incluindo partidos de massa, surgirão neste período e nos darão oportunidades. A mudança da consciência nos permitirá ganhar os melhores para a bandeira do marxismo, para o CIT.