Escola de verão do CIT: Crise capitalista mundial
Niall Mulholland, do Secretariado Internacional do CIT, introduziu a discussão plenária sobre economia mundial e relações inter-imperialistas na Escola de verão explicando como cada parte do globo é afetado pelo aprofundar da crise econômica. Com a globalização, nenhum continente é capaz de escapar, e nenhum dos problemas fundamentais foi resolvido.
A classe dominante mundial está tentando manter seus privilégios às custas da classe trabalhadora e de seus rivais de outros Estados-nações. Isso significa o desenrolar de novos movimentos revolucionários e o desdobramento da possibilidade de tensões e conflitos globais.
O capitalismo é um sistema de extrema desigualdade. Nos EUA os altos executivos tiveram um aumento de 38% em seus bônus em 2010, enquanto doze milhões de pessoas atualmente estão à beira da fome no leste da África. A especulação do preço dos alimentos lançou 44 milhões de pessoas a mais para a pobreza somente esse ano.
Mas a fome no leste da África não é um “ato de Deus”. Cientistas acreditam que as sucessivas secas da região podem estar ligadas à mudança climática. Conflitos locais e a interferência imperialista na Somália também contribuíram para a tragédia da fome, assim como a destruição dos pastos tradicionais e dos meios de vida sustentáveis pelo agronegócio.
O meio ambiente é parte vital das perspectivas hoje e forma uma parte crucial do programa do CIT, especialmente agora que a Grã Bretanha, China, Rússia e Índia têm planos de construir mais usinas nucleares. Questões ambientais podem abalar governos e até mesmo derrubá-los.
Na Austrália, o governo do Partido Trabalhista/Verdes introduziu um imposto de carbono muito impopular. Impopular porque os custos da taxa serão simplesmente passados para a classe trabalhadora pelos grandes negócios, enquanto as emissões de carbono irão aumentar.
Acabar com a fome, o desastre ambiental e a pobreza exige a reorganização da economia mundial com base nas necessidades sociais, o que está se tornando mais urgente à medida que a crise capitalista se prolonga.
Até recentemente muitos economistas falavam de uma recuperação econômica – ao olhar para os mercados financeiros e o crescimento das economias do Brasil, Índia e China. Agora, eles descobriram que a economia mundial está atolada na crise. A economia global está num período de estagnação, mas a menos que haja uma mudança fundamental, os ciclos de “boom” e “recessão” irão continuar. Mas a tendência geral agora é por fases de crescimento mais fracas e curtas, num período depressivo geral do capitalismo mundial. O desperdício do capitalismo pode ser mostrado apenas por um único fato – o desemprego global aumentou em 27 milhões desde 2007, para 205 milhões em todo o mundo.
O barbarismo do capitalismo pode ser visto nos milhares que morreram na violência relacionada às drogas no México. Milhares de soldados estão engajados em cidades ocupadas, realizando torturas e assassinatos em nome da “guerra às drogas”.
A resposta das classes dominantes à crise financeira e econômica de 2007/2008 foi resgatar os bancos e lançar um pacote de estímulos, mas isso trouxe novos problemas. Os déficits governamentais forçaram uma redução dos gastos sociais, enquanto as grandes corporações, os bancos e domicílios estão afundados em dívidas.
Nos EUA, o pacote de estímulo de Obama se esgotou. O efeito dos cortes de impostos em 2010 foram anulados pelo aumento no custo do petróleo e dos alugueis. O estouro da bolha imobiliária resultou em uma queda na riqueza das famílias. Há uma depressão na indústria de construção e nos gastos em habitação. As companhias americanas estão cortando a produção e demitindo trabalhadores. Mais de 24 milhões de pessoas estão desempregadas ou subempregadas. O número de pessoas precisando de bolsa alimentação aumentou em 50% de 2008 a 2011, assim, 45 milhões de pessoas – quase uma em cada sete pessoas nos EUA – precisam de ajudar para ter o suficiente para comer.
A classe dominante em todo lugar está tentando destruir os ganhos sociais conquistados pela classe trabalhadora no período do pós-segunda guerra mundial, e há mais cortes planejados.
A ruptura das negociações entre os Republicanos e os Democratas nos EUA sobre o programa econômico alarmou os mercados e o FMI alertou que mesmo apenas uma crise de confiança na solvência dos EUA pode acionar uma nova recessão global.
Os Democratas defendem cortes e um pequeno aumento na taxação dos ricos, enquanto os Republicanos, sob pressão do Tea Party à direita, apenas querem enormes cortes. Um terço dos Republicanos no Congresso foram eleitos apenas em 2010 e são vulneráveis à pressão do Tea Party, assim temem perder seus cargos se foram se aliar aos Democratas.
Com as duras consequências de um calote, mesmo que temporário, é provável um acordo, mas ele não trará uma resolução a longo prazo da crise econômica dos EUA. A sua classe dominante não possui estratégia a longo prazo, sem falar numa solução a longo prazo, em face da crise sistêmica e prolongada do capitalismo.
Os trabalhadores americanos não têm escolha a não ser lutar e eles já mostraram isso em Wisconsin, na luta de massas contra o governador direitista e seus ataques anti-sindicais e sociais. Mas o fracasso de impedir esses ataques, em grande parte porque as cúpulas sindicais não desenvolveram a luta de massas, também ilustra a necessidade de construir um partido independente e lutar por uma mudança nos sindicatos.
A China também está propensa às contradições globais do capitalismo. A crise de 2008 resultou numa queda em suas exportações, ao custo de 23 milhões de empregos. Temendo a inquietação social, foi introduzido um programa de estímulos pelo bancos estatais, resultando no crescimento rápido que encorajou os mercados e que também resultou em aumentos de preços.
Por três anos, a China pareceu evitar a crise econômica mundial, mas sua economia superaquecida criou novos problemas e contradições, não menos suas enormes “dívidas podres”. O desenvolvimento da produção industrial dependia de empréstimos dos bancos estatais, enquanto as autoridades locais se endividavam pesadamente para investir na infraestrutura. Até o fim de 2010, a dívida dos governos locais era equivalente a 40% do PIB.
A especulação imobiliária causou um aumento dos preços e do mercado habitacional. Mas milhões de pessoas não podem comprar ou alugar nada.
Brasil, Austrália e Canadá fornecem muitas matérias primas para esse crescimento da China. Mas isso significa que esses países são vulneráveis a uma recessão da economia chinesa. Igualmente, qualquer recessão significaria um ataque aos salários e condições da classe trabalhadora chinesa.
A crise econômica e a relativa força crescente da China veem um aumento de rivalidades e tensões entre as grandes potências.
A classe dominante do Paquistão está desenvolvendo crescentes laços com a China, enquanto seus rivais na Índia estão se ligando mais com os EUA – piorando as tensões entre esses países.
A classe dominante dos EUA tenta impor regimes cúmplices em regiões geoestratégicas vitais do mundo, e controlar as reservas de petróleo e outros recursos vitais. No Afeganistão ela se tornou dependente de senhores de guerra, já que a ocupação e o regime títere de Karzai carece de qualquer apoio popular real. Os planos de Obama de retirar 33 mil soldados do Afeganistão até o fim de 2012, mas cerca de 70 mil vão ficar. Também há 50 mil americanos no Iraque, em 53 bases militares.
Há crescentes tensões dentro da elite russa com a corrida para as eleições presidenciais, sobre a política econômica e a abordagem com o Ocidente. O Presidente Medvedev é mais pró-ocidental e “livre mercado”. O Primeiro Ministro Putin e Medvedev querem concorrer às eleições, mas ambos enfrentam queda nas pesquisas. No contexto de crescente descontentamento entre as massas russas, a luta entre Putin e Medvedev pode se tornar explosiva.
Na Venezuela, a doença do presidente Hugo Chávez trouxe à superfície as facções rivais do regime. Chávez ainda é popular por causa de seus programas de reforma social, incluindo na saúde e educação. Mas o apoio ao regime “bolivariano” está declinando contra o pano de fundo de crise energética, corrupção, crise habitacional e um dos mais altos índices de assassinato no mundo. Uma nova camada da burocracia dirigente está se enriquecendo.
Chávez anunciou que irá concorrer a outro mandato de seis anos, mas se sua saúde piorar e ele ficar fora do país por períodos prolongados, isso pode abrir uma luta pelo poder. Isso incentivará a oposição reacionária. E se a revolução bolivariana se desencaminhar, isso terá um grande efeito sobre Cuba, que se apoia no petróleo venezuelano.
O único meio de defender os ganhos sociais conquistados na Venezuela e Cuba é a classe trabalhadora se organizar em defesa da revolução: pôr a economia sob controle é gestão democráticos da classe trabalhadora e difundir a revolução pelas Américas.
A polarização entre ricos e pobres na América Latina abasteceu a luta de classe. No Brasil, houve lutas contra a corrupção e dezenas de milhares de professores e estudantes marcharam no Chile em 30 de junho em defesa da educação pública.
Na África, as lutas da classe trabalhadora foram estimuladas pelos movimentos revolucionários do norte da África e Oriente Médio. Na África do Sul, uma recente greve de três semanas de engenheiros resultou em certos ganhos. Os petroleiros sul-africanos agora estão em luta. Esses movimentos abalaram o governo pró-mercado do CAN, mas a federação sindical COSATU falhou em coordenar efetivamente as greves e difundir a ação para satisfazer a necessidade de milhões de trabalhadores e pobres.
Na Nigéria, uma greve geral de três dias por salários foi cancelada, mas essa questão tem o potencial de explodir novamente, dada as terríveis condições de pobreza de milhões. Também houve protestos “sem precedentes” no Malaui, onde 75% da população vive com menos de um dólar por dia.
Esses exemplos mostram o potencial de resistência da classe trabalhadora. Mas há um grande fosso entre as necessidades dos trabalhadores e o nível de consciência a nível mundial. O CIT deseja ligar as lutas dos trabalhadores mundialmente, propor e onde possível ajudar a construir novos partidos combativos de massa da classe trabalhadora e também construir as forças do marxismo.
Na discussão plenária, participantes de todo o mundo deram relatos inspiradores das lutas sociais e operárias e também sobre o desenvolvimento do CIT.
Na Austrália, a exportação de matérias primas para a China e Japão resultou em um boom da indústria mineira, mas também um aspecto desequilibrado para a economia. A consciência das massas pode estar atrás da Europa, mas esse período de relativa quietude não se manterá com a crise que também atingirá a Austrália. O governo de minoria do Partido Trabalhista está numa impopularidade histórica nas pesquisas, após a imposição do imposto de carbono. Se houvesse uma eleição amanhã a oposição de direita ganharia, mas apenas para lançar um ataque ainda mais severo sobre a classe trabalhadora. Uma revolta ao estilo europeu pode se desenvolver na Austrália. Ela sofre dos mesmos problemas subjacentes da dívida e um terço de todos os empregos é identificado como “instáveis”.
A Malásia tem tido uma economia em rápido crescimento nos anos recentes, mas não está imune à crise. As exportações de matérias primas, como borracha para a China, resultaram num crescimento de 7% em 2010. Mas a Malásia é altamente dependente das economias mais poderosas. Quando o país for inundado com bens chineses baratos, o mercado local não será capaz de competir. Enquanto isso, o governo está buscando mais “liberalização” – desmantelando o controle de preços e cortando gastos.
Paul Murphy, MEP (membro do Parlamento Europeu) do Partido Socialista da Irlanda, deu um relato inspirador de sua recente visita aos trabalhadores do Cazaquistão. Usando sua posição como MEP, Paul foi capaz de dar um apoio concreto aos petroleiros, que estão travando uma das maiores batalhas sindicais de qualquer ex-país soviético desde o colapso do stalinismo.
O Cazaquistão é o país mais rico do mundo em termos de recursos naturais per capita, mas quase todo o dinheiro vai para a elite dirigente. Os petroleiros trabalham em condições de deserto, com verões muito quentes e invernos muito frios.
Os trabalhadores estão lutando por salários, pelo direito de formar sindicatos independentes e pela libertação de seu advogado sindical, que foi preso quando a disputa começou.
Milhares de trabalhadores estiveram em greve por dois meses sem pagamento e muitos têm que sustentar uma família de oito ou nove pessoas. Alguns fizeram uma greve de fome de 40 dias em protesto contra os patrões.
Toda a força do Estado foi usada contra os trabalhadores. Centenas foram literalmente trancados e alguns receberam ameaças de morte.
Paul Murphy foi saudado calorosamente em comícios de massa dos grevistas e foi capaz de ajudar nas negociações com a diretoria. Esperando uma visita simbólica de um MEP dócil, a alta diretoria ficou chocada quando Paul argumentou veementemente em nome dos trabalhadores.
Tudo isso foi noticiado com estardalhaço na imprensa não-governamental cazaque, o que ajudou a aumentar a confiança dos trabalhadores. A tarefa agora é construir apoio internacional. Paul prometeu à companhia que se não começasse negociações significativas haveria uma enorme campanha internacional contra ela.
E agora o governo cazaque sabe que essa não é apenas uma greve econômica – está inspirando trabalhadores de todo o país.
Uma das grandes questões para a classe trabalhadora mundialmente é o meio ambiente. Pete do Partido Socialista (Inglaterra e Gales) explicou que a Academia Nacional de Ciências dos EUA concluiu que as emissões de gases estufa “estabilizaram” desde 1990. Mas é preciso um corte de 40% nos próximos dez anos para conter o aquecimento global.
Tem havido uma enorme exportação de poluição para a China. Entre 2002 e 2008, a produção de gases estufa na China subiu de quatro para sete gigatoneladas.
A China consome metade do cimento, carvão, aço e minério de ferro do mundo, e é o maior emissor mundial de gases estufa.
A maioria dos Verdes defende um grande corte no consumo, condenando os trabalhadores da China e outros países como Índia à eterna pobreza. Pelo menos os ativistas da Esquerda Verde culpam as potências imperialistas mundiais por essa situação.
O governo chinês de maneira oportunista ecoa esse argumento. Ele desenvolve fontes de energia renovável, mas como parte de uma tentativa mercadológica de se tornar o líder mundial de energia renovável.
O CIT defende que não há solução a longo prazo para a crise ambiental na base da busca por lucros. Mercados competitivos degradam o meio ambiente. Precisamos de um plano democrático de produção, em harmonia com o meio ambiente, em todo o mundo.
Houve muitas outras contribuições interessantes na discussão, vindas de Hong Kong, França, Bolívia, Venezuela, Brasil, Israel, Rússia, Nigéria e Índia.
Tom dos EUA explicou como os protestos em Wisconsin foram um pequeno sinal do espírito combativo dos trabalhadores; um levante de baixo contra os ataques aos sindicatos, aposentadorias e outros benefícios sociais. Os protestos incluíram milhares de trabalhadores e jovens desorganizados.
A eleição de governadores de direita, em novembro, intensificou os ataques aos trabalhadores. Os Democratas em muitos casos estão usando o Tea Party como uma cobertura para seus ataques aos trabalhadores.
No Wisconsin, os apoiadores da Alternativa Socialista (CIT nos EUA) chamaram um dia de greve geral, enquanto os líderes sindicais argumentavam que mais ações “arriscariam a perder o apoio popular” e se recusaram a construir a ação.
Mas Wisconsin foi uma batalha numa guerra – as próximas batalhas serão travadas a nível nacional. A classe trabalhadora está sendo solicitada a pagar pela crise de Wall Street. O CIT defende nos sindicatos a necessidade de candidatos independentes contra os cortes.
Na Irlanda do Sul, Joe Higgins, um TD (membro do Parlamento Irlandês) do Partido Socialista conquistou as manchetes essa semana ao responder ao anúncio do governo do Fine Gael/Trabalhismo de um novo “imposto domiciliar” de 100 euros ao ano. Joe Higgins e o Partido Socialista chamam uma campanha de não-pagamento em massa e um fórum nacional em 10 de setembro para organizar essa luta. Isso teve ampla cobertura na mídia. Em contraste, um TD do Sinn Fein, citado na imprensa, alertou que “um boicote é muito perigoso”.
Resumindo a discussão, Clare Doyle do Secretariado Internacional, observou que o CIT tem membros em mais países do que nunca antes e que havia mais representação na Escola do CIT.
Ficou claro na discussão que as ideias de luta e revolução estão se espalhando. O capitalismo está numa crise tão profunda e prolongada que a elite dirigente em cada país está preocupada com o futuro. Uma indicação brilhante da profundidade da crise é o preço recorde do ouro.
Ditaduras em todo o mundo foram abaladas pela queda de Mubarak no Egito e Ben Ali na Tunísia. Mais greves e protestos irão eclodir, muitas apesar dos líderes sindicais. Nossa tarefa no CIT é construir nossas forças e uma liderança digna do sacrifício e espírito combativo desses trabalhadores.