Mês do Orgulho: É preciso resistir aos ataques aos direitos LGBTQIA+ em escala mundial

Neste mês do orgulho, precisamos de uma resposta militante e internacional à enxurrada de ataques aos direitos LGBTQIA+

À medida que o governo Trump lança um ataque após outro contra as pessoas trans e a comunidade LGBTQIA+ em geral, ele está encorajando a direita em todo o mundo a fazer o mesmo. Para as pessoas LGBTQIA+ nos EUA, isso aumenta a urgência de sua situação, com muitas se perguntando se realmente querem permanecer no país. Infelizmente, existem poucos lugares no mundo que não foram afetados por essa ofensiva transfóbica e homofóbica da extrema direita.

O Reino Unido era visto por muitos como um farol de esperança no momento em que o Partido Conservador (Tories), no poder desde 2010, foi rejeitado de forma esmagadora nas eleições gerais do ano passado. Mas, em 16 de abril, a Suprema Corte do Reino Unido decidiu que a definição legal de mulher se baseia no “sexo biológico” atribuído no nascimento e não na identidade de gênero. Keir Starmer, o primeiro-ministro do Partido Trabalhista (Labour) do Reino Unido, apoiou vergonhosamente esse ataque.

Isso aconteceu dois dias depois de uma medida mais severa na Hungria, quando o parlamento do país aprovou uma emenda constitucional que permite ao governo proibir eventos LGBTQIA+ públicos. Isso foi justificado com o argumento absurdo de que as pessoas LGBTQIA+ ameaçam “os direitos das crianças ao desenvolvimento moral, físico e espiritual”. O primeiro-ministro Viktor Orbán, um autoproclamado defensor da “democracia cristã iliberal” à la Trump, insiste que esse direito se sobrepõe a outros direitos, como a liberdade de reunião.

No mundo neocolonial, a Lei Anti-Homossexualidade de 2023 em Uganda, que torna a “homossexualidade agravada” um crime punível com a morte, inspirou leis semelhantes de Gana ao Quênia.

Os ataques aos direitos LGBTQIA+ são um fenômeno global: desde autoritários de direita na Rússia, Turquia e Argentina até supostos bastiões dos “valores liberais” como Canadá, França e Nova Zelândia. Mas a resistência também é um fenômeno global. Ao entendermos as forças que impulsionam esses ataques, podemos derrotá-las e conquistar a verdadeira libertação LGBTQIA+.

Por que esses ataques estão acontecendo?

O aumento desses ataques está enraizado na era atual do capitalismo. A crise do neoliberalismo após a crise financeira de 2008 desacreditou as instituições governantes do capitalismo. Com as crescentes tensões imperialistas, a classe dominante global está se preparando para um conflito mais intenso, intensificando o nacionalismo e reorganizando a sociedade para a guerra. O período anterior foi marcado pelo crescimento da luta anticapitalista, incluindo a luta LGBTQIA+. A classe dominante está contando com uma reação anti-“woke” para reafirmar seu controle.

Isso também levou a uma mudança significativa em direção ao autoritarismo e ao crescimento da extrema direita. A emenda constitucional de Orbán está usando a homofobia para reprimir os direitos democráticos em geral, ao mesmo tempo em que intensifica a unidade nacional em torno dele e de seus comparsas capitalistas. Apesar de sua postura anti-imperialista, os ataques do governo de Uganda e seus imitadores estão agindo pela mesma razão.

A compreensão disso ajuda a esclarecer as razões contraditórias apresentadas pelas forças anti-LGBTQIA+ para suas ações. Para o Institute of Economic Affairs, um think tank transfóbico com sede no Reino Unido, “a ideologia transgênero é um ataque ideológico contra as tradições filosóficas e políticas pluralistas do mundo ocidental”. Para Orbán, as “tradições políticas pluralistas do mundo ocidental” são o problema. Ele declarou a famosa frase: “Os ‘valores ocidentais’ significam três coisas: imigração, LGBTQIA+ e guerra”. Os políticos que promovem leis anti-LGBTQIA+ em toda a África retratam a homossexualidade como uma invenção ocidental imposta ao continente pelo colonialismo, mesmo que seus esforços reacionários sejam financiados por evangélicos estadunidenses.

Ocidental ou não, a classe dominante está usando ataques às pessoas LGBTQIA+ para reduzir os recursos e a força da classe trabalhadora em geral. O capitalismo depende da família nuclear, com suas rígidas normas de gênero, para arcar com o fardo de trazer cada nova geração de trabalhadores ao mundo. Transformar aqueles que estão fora dessas normas em bodes expiatórios é uma maneira conveniente de manter a classe trabalhadora na linha.

Uma das primeiras medidas de Javier Milei como presidente da Argentina foi fechar o Ministério da Mulher, Gênero e Diversidade, bem como o Instituto Nacional contra a Discriminação, a Xenofobia e o Racismo. Com isso, tenta usar a ideia de uma guerra contra o “woke” como uma cunha para empurrar sua agenda mais ampla de usar uma “motosserra” contra os serviços sociais.

Tudo isso mostra que a luta pelos direitos LGBTQIA+ deve ser vista como parte de uma luta comum contra a austeridade, a guerra, o imperialismo e o capitalismo.

Capitalistas “menos piores” não vão nos salvar

Com tão pouca representação política independente da classe trabalhadora internacionalmente, a maioria das eleições é dominada por partidos capitalistas. Mas os partidos capitalistas “menos piores” não são aliados genuínos. O papel desempenhado por esses políticos mostra porque a luta LGBTQIA+ precisa de uma política independente da classe trabalhadora.

Na Hungria, muitos estão olhando para o oposicionista Péter Magyar como forma de derrotar Orbán nas eleições do próximo ano. Mas, diante do ataque de Orbán, Magyar evitou mencionar os direitos LGBTQIA+ e se concentrou exclusivamente na liberdade de reunião, retratando a emenda como uma “armadilha” de Orbán para levá-lo a abordar questões sociais em detrimento da crise do custo de vida.

Já vimos isso antes com os democratas dos EUA e a luta contra Trump. Os democratas não se importaram em pressionar a comunidade trans a votar neles para derrotar Trump. Mas, assim que Trump voltou ao poder, eles descartaram as pessoas trans, culpando a suposta impopularidade dos direitos trans por sua própria derrota constrangedora.

A mesma coisa aconteceu no Reino Unido, onde muitos esperavam que o Partido Trabalhista (Labour) os libertasse da reação conservadora. Mas o apoio de Starmer à decisão anti-trans da Suprema Corte trouxe uma decepção inevitável. Assim como não podemos confiar nos democratas para lutar pelas pessoas LGBTQIA+, não podemos confiar em Péter Magyar ou Keir Starmer. O apoio do independente de esquerda Jeremy Corbyn a iniciativas que clamam por um novo partido de esquerda é um primeiro passo adiante. Os camaradas do Socialist Alternative na Inglaterra, País de Gales e Escócia têm se envolvido ativamente nesses processos por meio da campanha PACE.

A impossibilidade de confiarmos nas instituições capitalistas para a defesa dos direitos LGBTQIA+ é mais acentuada no mundo neocolonial. As leis anti-LGBTQIA+ em toda a África provocaram represálias do FMI e do Banco Mundial. A instituição de caridade pró-capitalista LGBTQIA+ Open for Business apoiou essas represálias como “o argumento econômico” para se opor à recente legislação no Quênia. Mas, independentemente dessa postura pró-LGBTQIA+, o FMI e o Banco Mundial são justificadamente odiados na África como os piores executores da austeridade neocolonial. Foram justamente essas políticas no Quênia que provocaram os protestos de massas no país no ano passado. Esse tipo de protesto, quando ligado à luta pela libertação LGBTQIA+, mostra o que é realmente necessário para que se possa vencer. Para ter sucesso, precisamos construir uma alternativa da classe trabalhadora aos partidos capitalistas que dominam a política global, uma alternativa que lute por todos os oprimidos como parte de uma luta internacional da classe trabalhadora.

Unir as lutas

Os trabalhadores não podem aceitar esses ataques passivamente. A aprovação da emenda na Hungria que proíbe eventos públicos LGBTQIA+ foi recebida com uma onda de protestos, bloqueios de rodovias e pontes. O cenário está pronto para eventos do mês do Orgulho LGBTQIA+ altamente combativos, em desafio à emenda constitucional.

Políticos de direita em todo o mundo estão enfrentando protestos semelhantes por uma ampla gama de questões. A vizinha Sérvia está passando pelos maiores protestos da história do país contra a presidência corrupta de Aleksandar Vučić, aliado de Trump. Isso foi estimulado pela queda de uma marquise em uma estação ferroviária. Enquanto isso, a Alemanha tem visto protestos contra as políticas anti-imigrantes da AfD de extrema direita e dos partidos do establishment que os imitam. E a Turquia viu milhões tomarem as ruas contra a repressão do presidente Recep Tayyip Erdoğan aos direitos democráticos.

É a classe trabalhadora entrando em ação, e não a boa vontade dos políticos capitalistas, que pode trazer vitórias para as pessoas LGBTQIA+. No Sudão, a legislação anterior que instituía a flagelação e a pena de morte como punições para o sexo gay foi revogada em 2020. Essa vitória foi resultado da insurreição revolucionária que começou no ano anterior e derrubou o ditador Omar Al-Bashir. O Sudão enfrentou sérios reveses nos anos seguintes, mas o legado da revolução de 2019 mostra o que pode ser feito.

Os direitos LGBTQIA+ não são uma distração das “questões reais” — um ataque a um é um ataque a todos. A legislação anti-LGBTQIA+ em todo o mundo está sendo usada para atacar a classe trabalhadora de forma mais geral. Impedir essa legislação é do interesse de toda a classe trabalhadora.

Isso torna vital que o movimento dos trabalhadores assuma a luta pela libertação LGBTQIA+. O poder dos trabalhadores foi visto nas múltiplas greves gerais organizadas contra o “massacre da motosserra” de Milei na Argentina. O país também viu manifestações de centenas de milhares de pessoas especificamente contra os ataques de Milei às pessoas LGBTQIA+. Todos os políticos que querem lançar ataques semelhantes precisam ser confrontados com essa intensidade de luta.

Uma ampla luta pela libertação LGBTQIA+, quando ligada às demandas de longo alcance dos trabalhadores que estão entrando em luta em todo o mundo, poderia abalar os alicerces do sistema capitalista. Poderia acabar com a corrida imperialista em direção à guerra, a corrupção endêmica do capitalismo e as opressivas normas de gênero. A opressão está enraizada no capitalismo, por isso precisamos acabar com ele. Precisamos do socialismo e de um mundo livre de capitalistas que culpam os oprimidos pelas crises que eles mesmos criaram.

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