Parque Linear do Tietê de Serra: revitalização da várzea ou mais discriminação e expulsão do povo da periferia?
O Governo de São Paulo quer construir um parque nas várzeas do Rio Tietê, “o maior parque linear do mundo”, e para isso pretende despejar mais de 5 mil famílias. Até agora não existe nenhum projeto de habitação para essa população, apesar das obras do parque já ter um cronograma de começo e fim.
A atitude padrão do governo nesses casos é derrubar as casas e deixar essas pessoas sem nenhum direito, já que essas comunidades são consideradas apenas como “ocupações irregulares”, e são ignoradas pelo poder púbico como um grave problema social.
O povo do Pantanal da Zona Leste já sabe disso e está se organizando para garantir sua moradia e resistir a mais esse projeto desumano, que tem como principal objetivo fazer o marketing eleitoral de José Serra. A Terra Livre também está nessa luta, mostrando que só o povo organizado e em luta pode ter força para enfrentar o governo.
As metrópoles, com a Grande São Paulo, continuam crescendo baseadas na exclusão social e discriminação do povo pobre. É o povo que mais trabalha na base da produção social desse grande monstro. É o que pega o trem ou ônibus lotado na madrugada e é super-explorado com o trabalho desregulamentado, como o terceirizado. Essa população está engrossando as favelas, ocupações, áreas de risco e irregulares, já que não tem condições de pagar os caros aluguéis das capitais. Não existem planos públicos de habitação para essa massa, que é obrigada a juntar tapumes de madeira e ocupar terrenos vazios para conseguir ter um teto. Do Estado só vêm projetos de habitação para a classe média que a obriga a se endividar mais e enriquecer bancos e construtoras, como é o caso do “Minha Casa, Minha Vida”, ou “Minha Dívida”. Para o povo só vem do Estado a violência policial que invade as favelas, bate e mata esses trabalhadores que são considerados como de uma raça inferior.
Agora, o Governo Serra resolveu atacar mais uma vez o povo pobre. Quer construir um parque na várzea do Rio Tietê e para isso irá despejar mais de 5 mil famílias que vive na região. Por trás de um argumento ambiental, a da recuperação do ecossistema que beira o rio, o governo esconde a verdade: foi o Estado que destruiu toda a várzea e agora culpa o povo fragilizado que vive às margens do rio pela degradação ambiental. Foi o governo que instalou as marginais que cobriu de concreto a várzea e retificou todo o rio, causando enchentes e patrocinando a desastrosa política de transporte centrada nos carros particulares. Além disso, sempre aprovou a instalação de empresas e continuou a construir prédios públicos como a Estação da Sapesp em São Miguel Paulista e o campus da USP-Leste. É curioso também que foram os próprios caminhões a serviço da prefeitura e suas máfias que aterraram áreas de várzea no Pantanal, no distrito de São Miguel Paulista, que foram ocupadas em seguida pela população carente, muitas vezes até pagando pelos lotes.
Agora o governo e a prefeitura tratam de incriminar toda a comunidade pela ocupação irregular e degradação ambiental do rio. Durante todo esse ano lançaram forte campanha publicitária na região, inclusive nas escolas, dizendo em um escandoloso jornalzinho que os moradores são criminosos e os ameaçando de prisão.
Mais carros e asfalto: compensação ambiental e o incalculável impacto social
Como um alto funcionário da Dersa (Desenvolvimento Rodoviário S.A., empresa estatal) afirmou em audiência pública na Assembléia Legislativa, o parque faz parte da compensação ambiental pelas obras de ampliação das vias da Marginal Tietê. Ou seja, para por mais concreto na várzea do rio, o governo precisa plantar 180 mil árvores, para compensar o grande palco para novas enchentes, querem deixar uma grande área de escoamento da água na parte alta do rio, e quem paga o pato novamente é o setor mais pobre da classe trabalhadora. Querem ampliar o espaço para os carros, patrocinando ainda mais o uso de transporte particular nas marginais – sendo essa obra muito pouco relevante para o atual trânsito de São Paulo – e fomentam mais o caos nas ruas da cidade. Muito mais propaganda vista a toda hora na televisão, focando em 2010, ano de eleição presidencial.
O parque, de acordo com o projeto, será baseado em áreas de recreação, com a construção de uma ciclovia, quadras e uma estrada-parque para se andar de carro. Nos mapas oficiais do projeto, assinados pelo Departamento de Águas e Energia Elétrica da Secretaria de Saneamento e Energia do governo estadual, percebe-se que a preocupação não é resgatar a várzea do rio, pois muitas construções à beira do rio serão mantidas, como as empresas Nitroquímica, de Antonio Ermírio de Morais, um centro de armazenamento da Bauducco, recém-construído, e a Sabesp, além de instalações públicas, como escolas e o campus da USP em Ermelino Matarazzo.
Sob esses fatos, e conhecendo o tratamento que esses governos dão ao povo pobre, vemos que o objetivo é limpar a área, como a “higienização” que já fizeram no centro. Todas essas áreas estão sendo removidas violentamente pelo governo como o Real Parque no Morumbi e por onde passará o Rodoanel, como em São Matheus, só para dar alguns exemplos recentes. Muitas vezes usam um método nazista de abordagem: oferecem o dinheiro da passagem para essas pessoas voltarem para “suas terras”, ignorando o fato dessa massa construir, com salários muito baixos, a “terra dos paulistas”. Apesar de dependerem dessa massa, não a querem sob os olhos, a querem escondida em guetos, de um jeito que os turistas da Copa do Mundo de 2014 não possam ver a realidade. O governo e os “investidores” querem essas áreas “recuperadas”, ou seja, com valorização dos terrenos para a classe média alta, especulação imobiliária e um belo parque para passear de carro com seus filhos. Enquanto isso, a massa pobre, com seus filhos, é empurrada para mais longe, onde se verão obrigados a ocuparem outras áreas e recomeçar suas vidas. Mais impacto social para a melhora da vida da parte alta da pirâmide social, seja para os que vão lucrar com a revitalização, ou para os novos e bem sucedidos moradores que viverão na beira de um belo parque.
A política habitacional dos governos como o de São Paulo é essa: despejos de favelas e áreas irregulares e especulação imobiliária. Atualmente são mais de 740 mil pessoas que não tem onde morar na Grande São Paulo (Déficit Habitacional, Ministério das Cidades, 2005). Enquanto isso, são mais de 400 mil imóveis vazios só no centro de São Paulo, servindo para a especulação imobiliária.
O Jardim Pantanal, em São Miguel Paulista, tem uma história importante de luta da sua comunidade. Precisaram lutar muito para garantir a sua moradia e a urbanização da área, no fim dos anos 80. Em 1997, se mobilizaram para acabar com a maior enchente que já houve na região, quando ficaram mais de duas semanas debaixo d’água. Descobriram que tinha sido o Governo do Estado o culpado, pois haviam fechado a barragem da Penha para não encher de água a Marginal, ao custo de deixar mais uma vez o povo pobre sem moradia.
O MULP (Movimento de Urbanização e Legalização do Pantanal) representa muito dessa luta e sempre buscou a conscientização e formação política contínua da comunidade, além de fomentar e aglutinar experiências de educação e cultura desse povo. Sempre estimulou a participação e a democracia direta como forma de política para enfrentar os governos e a exploração capitalista, seja na questão da moradia ou outros problemas da comunidade.
A Terra Livre também está participando ativamente dessa luta, trazendo sua experiência de lutas, ajudando a politizar o debate da moradia e sobre os despejos e chamando a população a se levantar e criar a organização necessária para essa batalha. Mostramos a história da luta da classe trabalhadora contra a exploração capitalista e comparamos com suas vidas concretas: os governos têm compromisso com os ricos e sua classe e, se quisermos garantir as moradias, teremos que enfrentar com uma política independente e baseada na auto-organização do povo pobre.
No Pantanal, assim como em diversos bairros e vilas que serão afetadas, como a Vila Itaim e o Jardim Aymoré, as assembléias que discutem e esclarecem o problema são freqüentes. O Pantanal tem representantes votados em assembléia que já vinham se reunindo com o poder público, através da subprefeitura de São Miguel Paulista. Nessas negociações colocamos propostas que recuperariam a várzea e incluiriam a comunidade. Do lado deles, só ouvimos demagogia e enrolação. Mas o movimento está crescente, com novas lideranças surgindo das mobilizações e das reuniões. O Governo do estado virá com a Justiça e a Polícia dos ricos. Do nosso lado teremos resistência e o povo organizado e formado para resisitirem a mais esse ataque dos capitalistas e seus governos.