Retomar a ofensiva nas ruas para derrubar Bolsonaro!

Barrar o golpismo e os ataques aos direitos e construir uma saída da classe trabalhadora para a crise!

Enquanto Bolsonaro eleva o tom de sua retórica golpista, a base bolsonarista se prepara para ir às ruas no dia 7 de setembro. Corretamente, a maior parte da esquerda e dos movimentos sociais não recuou e se mobiliza para a mesma data, apesar da vacilação de alguns.

Mesmo que o 7 de setembro em si não faça jus a certas expectativas, a apreensão e ansiedade em torno do que pode acontecer a partir daí tem provocado uma legítima busca de respostas por parte dos trabalhadores mais conscientes e ativos.

Existe razão para preocupação? Bolsonaro poderá sair fortalecido do dia 7? Estamos realmente na antessala de um golpe de Estado? Policiais militares, setores das Forças Armadas e milicianos estão se mobilizando para uma ruptura institucional?

A resposta dos movimentos sociais e da esquerda deve se dar no mesmo calibre e nas ruas? Ou deveríamos evitar cair em supostas provocações e armadilhas e confiar nas instituições do sistema político como anteparos efetivos à escalada autoritária? Quem são nossos aliados e como poderemos barrar a extrema-direita?

Todas essas são questões legítimas e refletem o grave momento que atravessamos. Elas adquirem uma importância ainda maior quando colocadas no contexto das hesitações e indefinições por parte de setores dirigentes da esquerda, do movimento sindical e movimentos sociais.

O tom e o conteúdo de nossas respostas devem evitar o impressionismo alarmista que toma como literal os arroubos bolsonaristas. Mas, também não podem subestimar a gravidade do momento que atravessamos e os riscos existentes.

Uma coisa é certa: Bolsonaro está acuado e em crise, mas a falta de uma estratégia efetiva para combater e derrubar esse governo por parte das organizações de massas da classe trabalhadora pode sim abrir espaços para que a canalha bolsonarista recupere algum terreno perdido e dê passos adiante em seu projeto golpista e reacionário.

Encontrar os meios que possam levar à derrubada desse governo é questão de vida ou morte para a maioria do povo brasileiro que sofre com a pandemia, o desemprego, a fome, a violência do Estado, a retirada de direitos e a falta de qualquer horizonte de melhora da situação.

Uma crise histórica

O Brasil vive hoje um dos piores momentos de sua história. A conjunção da gravíssima crise econômica, social, ambiental e sanitária com uma profunda crise do regime político, no contexto de um governo de extrema-direita, está deixando marcas profundas no país e na vida do povo.

A pandemia já ceifou mais de 580 mil vidas no Brasil e ainda segue seu curso ameaçador. Enganam-se aqueles que pensam que o problema foi superado. O índice de vacinação plena (duas doses, quando requeridas) no Brasil ainda está na faixa dos 30% e distribuídos de forma social e regionalmente desigual.

Nesse contexto, o impacto da variante Delta, que avança no Brasil, pode agravar muito a situação. Estamos na iminência de voltar a ver o sistema de saúde fortemente afetado, milhares de vidas perdidas, além de um enorme impacto econômico e social. A negligência do governo federal, mas também dos governos estaduais, diante dessa ameaça é, mais uma vez, criminosa.

Fome e desigualdade

Junto com a devastação causada pela pandemia e as políticas criminosas de Bolsonaro, alastra-se também de forma avassaladora as pragas da fome, pobreza e desigualdade.

Já são 52% os domicílios brasileiros onde há insegurança alimentar, sendo que em 9% deles (19,1 milhão de pessoas) a fome é uma realidade cotidiana.

O retrato do Brasil de hoje vem da periferia de Cuiabá, com suas filas de desempregados, em geral mulheres, esperando para receber pedaços de ossos de onde tentarão raspar resquícios de carne para se alimentar.

A capital do Mato Grosso, terra do agronegócio que movimenta bilhões de dólares, ganhou destaque, mas cenas semelhantes acontecem em várias partes desse país que está entre os mais desiguais do mundo.

Ao mesmo tempo em que cresce o número daqueles a quem só resta buscar fiapos de carne em pedaços de ossos, o volume de exportação da carne Angus, considerada nobre, avançou 21,5% no primeiro semestre.

Nesse período, o Brasil também teve um pico na exportação de gêneros alimentícios coincidindo com o crescimento da fome no seu próprio território.

O Brasil que volta ao mapa da fome também é o país em que 1.692 carros de luxo (a partir de 508 mil reais cada) foram vendidos para um seleto grupo de ricaços no primeiro semestre. A revendedora da Porsche no Brasil zerou seus estoques e ainda tem uma lista de espera com 1,5 mil compradores.

Apesar da pandemia e da crise econômica e social, o Brasil passou a ter mais 40 novos representantes na lista de bilionários da revista Forbes em 2021. Cedo ou tarde, essa desigualdade abjeta e nojenta acabará provocando a implacável e justa fúria dos de baixo.

Desemprego e arrocho salarial

O desemprego atinge hoje 14,4 milhões de pessoas no Brasil. De forma mais ampla, os índices de subutilização da força de trabalho em geral no Brasil permanecem em um patamar altíssimo.

São mais de 32 milhões de brasileiros que estão sem ocupação, ou trabalhando menos do que desejariam ou “desalentados” (desistiram de buscar emprego). Isso significa que menos da metade da população em idade para trabalhar (49,6%) está ocupada no país.

O rosto do desemprego no Brasil é um rosto de mulher, mãe, negra e nordestina. De forma geral, entre as mulheres pretas ou pardas com crianças, o índice de desocupação ultrapassa os 50%. Os dados são mais dramáticos no Norte e Nordeste do país.

Entre os homens e mulheres que tem trabalho, a parcela daqueles submetidos a uma situação de precarização só cresce. Em um ano, o número de trabalhadores informais cresceu quase 5 milhões. São hoje 35,6 milhões representando 40,6% da força de trabalho do país.

Para o conjunto dos trabalhadores, formais ou informais, salários e condições de trabalho só se deterioram. Segundo o DIEESE, houve reajuste abaixo da inflação em 59% das negociações salariais das categorias com data-base em junho desse ano. Em 16% delas o reajuste foi apenas igual à inflação. Somente 25% das categorias obtiveram reajuste acima dos índices oficiais de inflação.

Paradoxalmente, em plena pandemia, os trabalhadores da saúde privada, por exemplo, foram os que tiveram o pior resultado nas negociações salariais. Dos 271 acordos fechados para julho, 78% ficaram abaixo da inflação.

O reajuste do salário-mínimo previsto para 2022 ficará abaixo da inflação. Os aumentos nos preços dos combustíveis, da energia elétrica, do gás de cozinha, dos alimentos e demais produtos da cesta básica representam um inferno cotidiano para a vida dos trabalhadores.

Crise energética e baixo crescimento

A iminência de uma crise energética e hídrica no país pode agravar qualitativamente o cenário econômico e social. A falta de chuvas representa uma ameaça direta aos reservatórios das usinas hidrelétricas, além de afetar o abastecimento de água em várias partes do país

Estamos em meio à pior crise hídrica no Brasil dos últimos 91 anos. Os reservatórios do Sudeste e Centro-Oeste estão com apenas 22,7% de sua capacidade. No mesmo período, no ano passado, estavam acima de 42%. Esses reservatórios representam quase 70% da geração de energia do país.

A estiagem tem relação direta com a crise ambiental global, a devastação da Amazônia e o modelo agroextrativista exportador vigente no país.

Trata-se de um modelo econômico que destrói o meio ambiente e se sustenta sobre a base da violência contra camponeses, povos indígenas, quilombolas e povos das florestas. Se a lógica desse modelo permaneceu durante os governos do PT, com Bolsonaro ela se aprofundou no que tem de mais nefasta e destrutiva. 

Todo esse cenário está afetando fortemente as perspectivas de crescimento econômico. Apesar do governo tentar evitar ao máximo usar a palavra proibida – “racionamento” – é muito provável que ela tome conta das manchetes no próximo período. O risco de termos “apagões” é real. O governo acabará tendo que arcar com todas as pesadas consequências políticas e econômicas disso.

As ilusões em uma retomada vigorosa da economia esse ano baseada na diminuição relativa dos casos de Covid-19 e no crescimento acima do esperado no primeiro trimestre (1,2%), já não se sustentam mais.

O fôlego curto ficou demonstrado pelo recuo de 0,1% no segundo trimestre em relação ao trimestre anterior. Esse foi um dos piores desempenhos do mundo para o segundo trimestre (38ª posição entre 48 países).

Com a pandemia ainda presente, com a inflação nas alturas e o Banco Central elevando as taxas de juros, com a crise energética a caminho e, finalmente, com a permanente instabilidade e crise política no país, as perspectivas de um crescimento significativo não se colocam como prováveis nesse e no próximo ano.

Mesmo a aposta em um cenário externo favorável ao Brasil já não se coloca mais como antes. EUA e China, além de outros países, também tiveram desempenhos econômicos decepcionantes. A variante Delta é hoje um fator concreto nessa desaceleração, junto com a alta da inflação, problemas nas cadeias globais de suprimentos etc.

A esperança em um novo boom de commodities que ajudasse a economia brasileira também não se mostra real. Já se percebe hoje uma queda nos preços de commodities importantes para o Brasil, como minério de ferro.

Além disso, existe a possibilidade de que o FED (Banco Central dos EUA) passe a promover em 2022 o fim das políticas de afrouxamento monetário que vem adotando. O impacto de um alta dos juros nos EUA acontecendo em um contexto de profunda instabilidade política no Brasil em ano eleitoral pode provocar todo tipo de instabilidade financeira e crise.

As contradições estruturais da economia capitalista que se manifestaram no mundo e no Brasil durante a pandemia não foram superadas e seguem sendo um fator de profunda instabilidade e crise.

A classe dominante diante de Bolsonaro

O presidente da república no Brasil é um fator agravante desse cenário de crise e desempenho econômico débil. Essa constatação vem sendo feita cada vez mais pela classe capitalista no Brasil e isso pode ter repercussões políticas importantes.

Jair Bolsonaro foi muito útil para os grandes capitalistas. Mesmo preferindo uma alternativa mais orgânica e sob seu controle, a classe dominante brasileira nunca teve pruridos em aceitar o candidato da extrema-direita e seu viés protofascista. Usou e abusou do bolsonarismo para defender seus lucros e privilégios.

Foi assim também com os políticos da direita tradicional. Já na campanha de 2018, tucanos como Doria (SP) e Eduardo Leite (RS), não vacilaram em apoiar Bolsonaro, mesmo contra o candidato de seu próprio partido, Geraldo Alckmin.

Isso também vale para figuras como Rodrigo Maia (DEM-RJ) que, na condição de presidente da Câmara de Deputados, impediu o avanço do impeachment do presidente da República e é conivente com todo o descalabro nacional, mesmo que tenha sido depois engolido pelo monstro que ajudou a alimentar.

Evidentemente, essa também é a situação de toda uma plêiade de cúmplices do bolsonarismo que hoje se colocam como dissidentes e que caíram em desgraça, como o ex-governador Wilson Witzel (RJ) e o ex-juiz da Lava Jato e ministro Sérgio Moro.

Também foram cúmplices, coniventes ou mesmo protagonistas do acenso do bolsonarismo os grandes monopólios da mídia tradicional, como a Rede Globo, Folha, Estadão etc., que apoiaram o golpe institucional de 2016 e prepararam o terreno para a extrema-direita.

Apesar da pusilanimidade desses atores políticos, a gravidade da crise e dos desmandos do governo, em particular a partir da pandemia em 2020, acabaram por provocar divisões na classe dominante e deram origem a uma oposição de direita, burguesa e neoliberal, a Bolsonaro.

Além do temor diante das consequências de uma escalada autoritária promovida pelo presidente, essa oposição reclama que Bolsonaro tem se afastado do projeto neoliberal radical com que se comprometeu nas eleições ao nomear Paulo Guedes como ministro da economia.

Reclamam que as contrarreformas neoliberais não têm avançado como poderiam no Congresso. A contrarreforma da previdência social, por exemplo, só teria sido aprovada pelo papel jogado por Rodrigo Maia e outros setores da direita neoliberal tradicional.

Diante da excepcionalidade dos gastos públicos como resposta à gravidade da pandemia, temem que Bolsonaro caia no que chamam de “populismo” fiscal e que perca qualquer compromisso com um duro ajuste das contas públicas. A proposta de emenda constitucional do governo parcelando o pagamento dos precatórios fortalece essa percepção.

A pandemia foi o ponto de inflexão na relação desses setores com Bolsonaro. Os capitalistas foram perdendo aos poucos as esperanças de que Bolsonaro seria capaz de reorganizar o país para um novo período de contrarreformas, retomada econômica e de lucros garantidos.

Depois de muitos meses e centenas de milhares de cadáveres, a negligência do governo no que se refere à aquisição de vacinas, provocou uma primeira reação de representantes do grande capital através de uma Carta aberta assinada por banqueiros, empresários e economistas neoliberais.

Uma segunda Carta, envolvendo mais ou menos os mesmos autores da anterior, clamou pelo respeito ao resultado das eleições de 2022. O texto respondia à ofensiva golpista de Bolsonaro em defesa do voto impresso como condição para que o resultado eleitoral fosse respeitado.

Uma terceira iniciativa foi tomada através de um manifesto costurado nos últimos dias, envolvendo dessa vez a FIESP, Febraban e outras entidades representativas dos capitalistas. Seu teor clamava (de forma um tanto patética) por harmonia entre os três poderes.

Mesmo esse tom moderado foi entendido como uma crítica velada ao poder executivo. A pressão do governo, através do Banco do Brasil e Caixa, sobre as entidades signatárias fez com que o Manifesto acabasse não sendo lançado oficialmente, pelo menos por enquanto.

Mesmo assim, ele reflete a insatisfação existente do grande capital em relação a Bolsonaro. É bom lembrar que o ex-presidente da Fiesp, Paulo Skaf, articulador do Manifesto, sempre se notabilizou por sua posição governista.

Dessa vez até mesmo um setor do agronegócio acabou tornando público seu próprio Manifesto em que reivindicam “liberdade para empreender, gerar, compartilhar riqueza, contratar e comercializar, no Brasil e no exterior”. Defendem também o Estado Democrático de Direito “que nos assegura essa liberdade empreendedora essencial numa economia capitalista”. Ainda segundo eles, a liberdade empreendedora de que precisam é o inverso de “aventuras radicais, greves e paralisações ilegais”.

Confiar nos capitalistas como aliados contra Bolsonaro?

No fundo, esses setores do grande capital se chocam com Bolsonaro não porque se preocupam com vidas ou com a democracia. O que não querem é que a atual crise política afete seus negócios e lucros. Esse é seu único critério.

O pior erro da esquerda e do movimento dos trabalhadores é ter qualquer ilusão nesses setores em sua luta contra Bolsonaro. Eles não pretendem ir até o fim a não ser que sejam obrigados a isso.

Devemos sim aproveitar e buscar aprofundar as divisões interburguesas. Devemos aproveitar a crise institucional no país para evitar o avanço dos ataques contra nossos direitos. Um exemplo disso foi a recente rejeição por parte do Senado da mini contrarreforma trabalhista impulsionada pelo executivo e aprovada na Câmara de Deputados.

Da mesma forma, a CPI da Covid-19 no Senado abre inúmeros canais para a denúncia dos crimes e aberrações cometidas pelo governo durante a pandemia. Mas, isso não significa que temos qualquer ilusão de que o Senado ou outra instituição do regime possa garantir nossos direitos sociais e democráticos.

Queremos aprofundar as divisões no andar de cima, mas confiando única e exclusivamente na força independente dos trabalhadores e do povo oprimido. Essa deve ser a prioridade.

A luta organizada da classe trabalhadora, incluindo a preparação de uma greve geral em defesa dos direitos e pelo Fora Bolsonaro, atingiria o ponto fraco dos grandes capitalistas, obrigando empresários e banqueiros a buscar uma saída sem Bolsonaro. Nenhuma negociação ou acordo de cúpula pode substituir isso.

Achar que Itaú, Bradesco e as grandes empresas são nossos aliados contra Bolsonaro e por isso não podemos levantar as demandas de nossa classe ou fazer greve contra eles é o cúmulo do peleguismo e só pode conduzir a mais derrotas para a classe trabalhadora. 

Isso vale também em relação às instituições da democracia burguesa no país, em particular quanto ao papel do poder judiciário.

STF e a crise institucional

Escolhido como bode expiatório e alvo prioritário de Bolsonaro e sua retórica autoritária, o Supremo Tribunal Federal vinha respondendo com relativa moderação, embora atuando para conter os excessos bolsonaristas.

O ponto de inflexão nos conflitos entre os poderes executivo e judiciário se deu diante da manobra golpista de Bolsonaro em torno da questão do voto impresso em 2022. Nesse ponto o ataque de Bolsonaro é direto contra o Supremo e o Tribunal Superior Eleitoral e coloca sérias ameaças sobre o processo eleitoral de 2022.

Sob ataque direto, ao STF não caberia outra postura que não reagir, mesmo que isso tenha demorado e que ainda pairem muitas incertezas sobre sua disposição de ir até as últimas consequências.

De qualquer forma, em fevereiro, o ministro Alexandre Moraes determinou a prisão do deputado Daniel Silveira. Em agosto foi a vez do presidente do PTB, ex-deputado Roberto Jeferson. Os dois canalhas “fascistóides” defenderam uma intervenção militar e o fechamento do STF.

A partir daí, o STF passou a tomar iniciativas mais duras. O Supremo acatou a denúncia do TSE de abuso do poder econômico e uso indevido das mídias por parte da chapa Bolsonaro/Mourão nas eleições de 2018.

Além disso, Bolsonaro foi incluído entre os investigados no inquérito das fake news no STF. Nesse caso a abertura do processo contra o presidente dependeria da anuência de Augusto Aras, procurador geral da república, além do voto favorável de 2/3 da Câmara de Deputados.

Conseguir isso é tão difícil quanto a tramitação de alguns dos mais de cem pedidos de impeachment protocolados na Câmara.

Mas, esse não é o caso da denúncia contra a chapa Bolsonaro/Mourão em relação às irregularidades na campanha de 2018. O julgamento dependeria apenas do STF. Se julgados culpados, presidente e vice estariam inelegíveis em 2022.

Na lógica da oposição de direita a Bolsonaro e setores do grande capital isso poderia abrir espaço para uma alternativa política da direita tradicional mais afinada com os seus interesses.

Evidentemente uma decisão como essa do STF provocaria enormes conflitos políticos. Assim como no caso dos demais mecanismos legais para a destituição de Bolsonaro, tudo vai depender da força das ruas, da pressão popular.

Só uma luta de massas poderia levar à queda de Bolsonaro, seja pelo mecanismo que for. Qualquer ilusão de que as instituições por si mesmas fariam isso não se sustenta. Mesmo se o fizessem, sem povo na rua, teriam muito mais chances de impor uma saída que mais uma vez atendesse às elites e não ao povo.

Um rato acuado contra a parede

A retórica e postura agressiva de Bolsonaro não esconde – pelo contrário, desnuda – sua fragilidade e isolamento. É um rato acuado contra a parede que guincha e ameaça porque não tem outra coisa a fazer. Ainda assim, oferece perigo.

Hoje cerca de dois terços dos brasileiros avaliam negativamente o governo. Não se confirmou a expectativa de que, na medida em que pandemia fosse saindo do foco absoluto das atenções, o governo poderia reconquistar apoio popular.

Pesquisa recente (Quaest) aponta que, conforme as pessoas passam a dar maior atenção à economia e não tanto à pandemia, Bolsonaro continua perdendo apoio. Inflação e desemprego, por exemplo, são hoje preocupações tão grandes quanto a pandemia, ao contrário do que acontecia até julho.

E o governo só perde com isso. Bolsonaro não conseguiu livrar-se da culpa pelas mazelas sociais e econômicas tentando jogá-la nas costas dos governadores.

Sua intenção de fazer mudanças no ‘Bolsa Família’, transformando-o em ‘Auxílio Brasil’ e concedendo algum incremento nos valores repassados, até pode ajudar na diminuição de sua rejeição entre alguns setores. Mas, não terá o mesmo efeito que o auxílio emergencial teve em 2020 e não será capaz de reverter o quadro de impopularidade.

Apesar da alta rejeição, Bolsonaro ainda tem uma base fiel significativa e suficiente para que tenha poder de barganha e possa causar muita instabilidade.

É sempre importante reafirmar que Bolsonaro não é um presidente como Michel Temer, FHC ou mesmo Collor de Mello. Com ele não se trata apenas de uma disputa dentro dos marcos da institucionalidade burguesa.

O atual presidente não pode simplesmente aceitar uma derrota eleitoral e ir para casa em seguida. Na iminência de um fiasco eleitoral ele irá agir preventivamente para que tenha condições de virar a mesa na hora certa.

Bolsonaro tem uma base social capaz de mobilizar-se, principalmente entre a pequena burguesia ultraconservadora e racista e bases populares evangélicas mobilizadas por pastores reacionários.

Além disso, seu peso no interior das polícias militares, outras corporações policiais, grupos criminosos paramilitares como as milícias e mesmo dentro das forças armadas, lhe conferem um caráter especial.

Não há nenhuma dúvida de que o projeto de Bolsonaro é de caráter golpista e autoritário. Se tiver chance, ele vai conduzir o país a um regime de tipo ditatorial. Isso poderia se dar de forma aberta e direta ou de forma furtiva e gradativa dependendo da situação.

A questão é que as condições para isso não estão colocadas, pelo menos agora. O melhor caminho para Bolsonaro seria vencer as eleições de 2022. Uma vez reeleito poderia avançar rapidamente numa direção autoritária.

Por isso, sua primeira preocupação hoje é conseguir ser candidato em 2022, ou seja, ter alguma garantia contra um processo de impeachment ou autorização da Câmara para um julgamento por crime comum.

Daí sua prioridade na relação com Arthur Lira, presidente da Câmara, e o “Centrão”. A indicação de Ciro Nogueira (PP-PI) como novo superministro da Casa Civil significa liberdade para as concessões, subornos e ‘mamatas’ para os deputados do “Centrão”.

Se chegar até outubro de 2022 como candidato, as pesquisas demonstram que Bolsonaro, com seus cerca de 25% de intenção de voto, ainda tem grandes chances de ir ao segundo turno contra Lula (que tem cerca de 45% dependendo do cenário). Mas, no segundo turno tenderia a perder para qualquer outro candidato devido ao seu altíssimo índice de rejeição.

É essa situação que Bolsonaro quer modificar utilizando-se de qualquer meio que seja necessário. O risco de que tenha algum êxito ainda existe apesar de não ser o mais provável.

Ao questionar a urna eletrônica e apontar a inevitabilidade de fraudes contra ele, Bolsonaro constrói a narrativa necessária para aglutinar sua base social contra um inimigo que já não conta (justificadamente, diga-se) com a simpatia popular, o poder judiciário.

Bolsonaro assume a bandeira da democracia e da liberdade contra um golpe que estaria sendo articulado pelos pomposos e endinheirados “marajás” ministros do Supremo.

Mesmo com a derrota da proposta de voto impresso no Congresso, o argumento continua servindo como explicação para uma provável derrota eleitoral e base para futuras aventuras golpistas se as condições permitirem.

Com isso, Bolsonaro começou a agitar a bandeira da “liberdade de expressão” e suas bases redobraram as denúncias contra um golpe do STF que estaria em curso. Esse é o mote que está servindo para mobilizar as hostes bolsonaristas para o dia 7 de setembro.

O papel das Forças Armadas

Nessa estratégia golpista, o papel das Forças Armadas é decisivo. Apesar de toda a canalhice dos generais de pijama (ou não) que compõe o governo, Bolsonaro ainda não tem o conjunto do comando das Forças Armadas inseridos plenamente em sua estratégia. Bolsonaro precisa criar uma situação que leve os militares a agir como ele deseja.

Os militares têm seu próprio projeto de poder (autoritário, reacionário, entreguista e corrupto, diga-se) e Bolsonaro é hoje um componente importante desse projeto, mas não é indispensável e insubstituível. Na medida em que Bolsonaro se torne mais e mais inconveniente, eles podem apostar em um caminho sem ele. Não faltariam interlocutores dispostos a colaborar entre os políticos da direta tradicional.

Os militares conscientemente mantêm vivos possíveis planos B ou C no caso da relação com Bolsonaro degringolar de vez. A postura aparentemente ponderada, relativamente distante das loucuras de Bolsonaro, por parte do vice Mourão, faz parte dessa política.

Setores da burguesia podem apostar numa queda de Bolsonaro e uma recomposição política do país em torno de Mourão como agente de transição até que consigam construir uma terceira via.

Para isso contariam com a conivência de setores da própria esquerda. Essa saída chegou a ser defendida por Flavio Dino quando ainda estava no PCdoB e teceu elogios a Mourão. Ele continua seguindo nessa toada hoje no PSB junto com seus novos companheiros.

É evidente que estamos a favor da queda de Bolsonaro em qualquer situação, incluindo obviamente o impeachment. Isso representaria um avanço e melhoraria as condições da luta mesmo que signifique a posse do vice Mourão. Mas, não podemos dourar a pílula de Mourão e contribuir com sua estratégia.

É por isso que a defesa da palavra de ordem de “Fora Bolsonaro e Mourão” é fundamental. Estamos a favor de qualquer medida que faça cair Bolsonaro, mas o papel da esquerda é disputar os rumos desse processo, usando o peso da classe trabalhadora organizada, para sua política.

Da mesma forma, devemos denunciar o projeto neoliberal que continua sendo defendido pela oposição de direita. O mesmo Rodrigo Maia que foi visto como um aliado por partidários de Ciro Gomes e do PT e PCdoB, deixou a presidência da Câmara para assumir uma secretaria no governo Doria com o único objetivo de promover privatizações, incluindo a da Sabesp em plena crise hídrica – um crime contra o povo.

O ‘Plano A’ para os militares continua sendo manterem-se ao lado de Bolsonaro, preferencialmente com ele vencendo as eleições de 2022. Nesse processo eles também podem ser levados a envolver-se em aventuras autoritárias e golpistas provocadas pelo bolsonarismo.

A cúpula militar brasileira não tem nenhum comprometimento sólido com as instituições da democracia burguesa. Fazem cálculos políticos sobre a ocasião em que devem usar a maquiagem de democratas e aquelas em que devem endurecer o tom ao estilo “poder moderador”. Não se pode ter nenhuma confiança neles.

O Sete de Setembro

O 7 de setembro é um dia decisivo para o projeto bolsonarista. O presidente repudiado pela maioria do povo e isolado politicamente precisa demonstrar força. Essa demonstração pode servir como meio de chantagem sobre aqueles que ameaçam seu mandato no STF. Pode servir também como acúmulo de forças para aventuras golpistas futuras.

Ao mesmo tempo, não interessa ao governo passar do ponto agora. Qualquer ação que resulte num ataque físico direto ao STF, por exemplo, por parte de manifestantes ou mesmo setores do aparato repressivo do Estado, provavelmente provocaria uma resposta dessa instituição num tom ainda mais duro, até por instinto de sobrevivência.

Bolsonaro não tem força hoje para fechar o STF ou algo do estilo. Sequer conseguiu encaminhar o pedido de impeachment do ministro Alexandre Moraes no Senado. Não encontraria respaldo nem no “Centrão”.

Uma coisa é o “Centrão” barrar um processo de impeachment contra o presidente. Outra bem diferente é bancar o fechamento de um poder da república e dar sustentação a um golpe de Estado. Não e trata de serem “democratas” convictos, pelo contrário. Mas, são pragmáticos, querem garantir sua parte, seus privilégios e ‘mamatas’.

Bolsonaro não tem respaldo nos meios de comunicação, na maioria das forças políticas, na maioria do povo e nem mesmo da maioria da classe dominante. Não teria nem mesmo o apoio do imperialismo estadunidense, o maior articulador de golpes de Estado na região.

É verdade que Biden acena com uma normalização das relações com o governo Bolsonaro, mas sabe que um golpe de Estado seria uma aventura com consequências potencialmente trágicas que não lhes interessa agora.

Se estamos descartando um golpe de Estado clássico no dia 7, isso não significa que Bolsonaro, se acertar o tom das mobilizações, não possa sair dessa ação com mais força do que entrou e com alguns ganhos. Somente por mostrar que pode fazer estragos grandes (sem necessariamente fazê-los já), Bolsonaro já ganharia tempo e condições para tentar se recompor para 2022.

Se a ação da ultradireita nas ruas não encontrar resposta à altura, ganharão confiança para ações cada vez mais ousadas.

A resposta à altura não virá de um João Doria, governador de São Paulo, ou de Luiz Fux, presidente do STF. Ela só pode vir da mobilização de massas dos trabalhadores, da juventude, do movimento de mulheres, indígenas, camponeses e todos os explorados e oprimidos.

João Doria permitiu que a ultradireita utilizasse a avenida Paulista no dia 7 e tentou proibir o Ato da esquerda e dos movimentos sociais no mesmo dia. Fracassou, mas isso mostra que tipo de oposição a direita tradicional faz a Bolsonaro. Se dependermos deles, estamos perdidos.

Diante da criminosa insubordinação de um coronel da Polícia Militar, comandante da corporação na região de Sorocaba (SP), que mobilizava para o Ato do dia 7, Doria apenas o afastou. Nenhuma punição mais severa foi adotada.

As Polícias Militares estaduais representam uma base importante do bolsonarismo e um perigo real para as liberdades democráticas. As PMs são hoje uma ferramenta da ditadura racista e contra os pobres que já existe nas periferias, morros e favelas nas grandes cidades do país. Herdeiras da ditadura, são instituições que continuam mantendo, e de forma impune, as práticas de chacina, tortura e abuso de antes.

Existem hoje 650 mil PMs da ativa no Brasil. Um estudo do FBSP aponta que pelo menos 120 mil desses policiais são adeptos ativos do discurso autoritário e golpista, algo que não se restringe a um apoio a Bolsonaro, mas a uma postura geral antidemocrática. Segundo uma pesquisa do Instituto Atlas, existem 140 mil policiais a favor de uma ditadura militar no país.

Parte dessa base estará nas ruas se manifestando no dia 7 e buscará adotar uma postura intimidatória em relação à esquerda e aos movimentos sociais.

A resposta a isso por parte dos movimentos sociais deve ser com firmeza e convicção ao mesmo tempo em que deve ser consciente, bem planejada e organizada. Deve-se evitar as provocações que virão sem que se recue no direito legítimo de se contrapor a manifestações antidemocráticas e reacionárias venham de onde vierem.

Por isso, foi correta a decisão dos movimentos sociais e da esquerda de manter as mobilizações antes planejadas para o 7 de setembro. Infelizmente, uma parcela significativa da oposição dita “progressista” tem contribuído para desestimular a mobilização no dia 7 ao invés de ajudar a organizá-la de forma adequada.

Na prática adotam a lógica de apostar tudo em uma saída por dentro das instituições e nas eleições de 2022. Não aprenderam nada do golpe de 2016 e das manobras nas eleições de 2018.

O período que se abre depois do dia 7 deve ser encarado como de mobilização permanente. Um ousado plano de lutas deve ser levantado pelos movimentos sociais, a Frente Povo Sem Medo, as Centrais sindicais e demais frentes de mobilização e o movimento pelo ‘Fora Bolsonaro’.

Nesse plano de lutas, a consideração sobre as possibilidades de se preparar uma greve geral não pode ser descartada. É uma proposta que dever ser discutida com seriedade.

A barbárie social em que nos encontramos exige isso e cria condições para que seja possível esse tipo de ação enérgica, desde que haja uma postura resoluta por parte das organizações da classe trabalhadora e do povo oprimido.

2022: há espaço para uma terceira via burguesa?

A classe dominante brasileira, apesar das enormes dificuldades, ainda não desistiu de construir uma terceira via na disputa eleitoral de 2022. Para isso continuarão a bater em Lula, mas sem fechar as portas para um possível diálogo. O centro de sua política, no entanto, é tentar liberar o espaço mais à direita para tentar emplacar um nome seu.

Isso significa que bater em Bolsonaro tem que ser parte de sua política prioritária. A linha tem sido fazê-lo sangrar sem matar, mas se isso não mostrar efeitos concretos, podem apertar o torniquete sobre o presidente.

Não ter Bolsonaro na disputa eleitoral abriria enorme espaço para um candidato de direita mais moderado ou uma alternativa que se fantasie de centro-direita. São muitos os nomes que disputam esse espaço.

Além de Doria, Eduardo Leite, o ex-bolsonarista Mandetta, o camaleão Datena e agora o presidente do senado Rodrigo Pacheco, também Ciro Gomes disputa na mesma raia.

Todos querem ser o meio termo entre Lula e Bolsonaro. Nenhum tem demonstrado base de apoio suficiente para isso. Todos querem ser agraciados com o apoio da grande mídia e do grande capital, mas nenhum ainda foi o escolhido pelos donos do dinheiro.

Nessa disputa com poucas chances de sucesso, Ciro Gomes do PDT, que se coloca em terceiro lugar nas pesquisas, joga um papel particularmente nefasto. Embora continue pregando um novo projeto de desenvolvimento de corte neokeynesiano, ele aceita de bom grado os compromissos neoliberais que a burguesia exigir, como privatizações, contrarreformas como a da previdência etc.

Suas alianças políticas se voltam para a direita neoliberal incluindo velhos desafetos do PSDB e do DEM. Bater em Lula tão forte quanto bate em Bolsonaro seria uma forma de tentar atrair apoios entre a classe dominante.

Mas, o mais provável é que só consiga com isso desmoralizar-se no campo mais à esquerda sem conseguir grande apoio entre os setores mais à direita.

Muita coisa ainda vai acontecer até outubro de 2022 e o cenário pode se embaralhar. Mas as chances de que uma terceira via emplaque ainda são pequenas. A tendência é que mesmo entre a classe dominante exista uma divisão entre aqueles que tapam o nariz para engolir Bolsonaro e queles que fazem o mesmo com Lula.

A aposta do Lulismo

Junto com a pandemia, a recuperação dos direitos políticos de Lula representou um ponto de inflexão na situação política nacional para todos os setores políticos e para o bolsonarismo em particular.

Nos últimos anos, o PT perdeu muito espaço no cenário político e entrou em uma crise que não era apenas conjuntural. Ela marca um processo mais profundo de reorganização da esquerda no Brasil a partir do balanço dos governos petistas, da derrota experimentada pelo golpe de 2016 e da crise existencial do PT.

Nesse processo vimos perdas eleitorais importantes do PT, como em 2016, 2018 e 2020. Vimos também a disputa pelo espaço da esquerda, e até mesmo o avanço importante do PSOL em cidades importantes como São Paulo e Belém.

Essa crise reflete a transição de um ciclo histórico de hegemonia na esquerda brasileira e deve ser retomada no futuro, com o PT vencendo ou não as eleições.

Mas, Lula ainda é um fator chave, com um peso central na conjuntura. Além da base tradicional petista e lulista, a derrocada do país desde que Dilma Rousseff foi apeada do poder por um golpe institucional fez com que amplos setores diminuíssem a rejeição ao PT e vissem em Lula a única alternativa possível contra Bolsonaro.

Tendo ocupado a maior parte do espaço no campo popular, Lula volta-se agora para garantir as articulações e acordos com os setores que até bem pouco tempo ajudaram a tirar o PT do poder e foram coniventes com o golpe de 2016.

A prioridade do PT é, além, de consolidar sua base, ganhar o apoio ou a anuência da elite econômica e política. Esse é o sentido das declarações de Lula contra a taxação das grandes fortunas, de sua fala admitindo a possibilidade de abrir o capital da Caixa Econômica Federal, de Furnas e da Eletrobras. Sua ausência das ruas, até agora, nas manifestações contra Bolsonaro, reflete a mesma lógica.

Lula quer construir uma aliança ampla em torno de sua candidatura, incluindo setores da direita e do empresariado. Não passa pela sua cabeça a constituição de uma frente de partidos de esquerda apenas e muito menos a adoção de um programa mais à esquerda do que adotou quando esteve no governo.

Evidentemente, um governo de Lula seria melhor para a classe trabalhadora e o povo do que um governo de Bolsonaro ou da direita tradicional. Mas, fazem um mal para o processo de consciência dos trabalhadores e do povo aqueles que fomentam ilusões de que seria possível termos de volta a estabilidade que vigorou na maior parte dos anos de governo do PT.

Existe o risco de que, ao adotar posturas conciliatórias e moderadas sem fazer transformações estruturais no sistema econômico e político, um governo de Lula empurre a esquerda a uma nova desmoralização. Se não houver uma alternativa de esquerda ao Lulismo, isso pode acabar abrindo espaço para uma recuperação da direita ou extrema-direita.

É por isso que a luta contra a extrema direita no Brasil não pode limitar-se ao processo eleitoral. Ela é uma luta social e política que se dá nas ruas, nos bairros, nos locais de trabalho e estudo, na ação direta dos trabalhadores e o povo. Ela deve ser assim agora e depois de outubro de 2022, seja qual for o resultado.

A derrota efetiva da extrema direita, seja ela bolsonarista ou não, só acontecerá na medida em que avance uma alternativa dos trabalhadores que questione abertamente o sistema que criou o bolsonarismo e as misérias existentes. Uma alternativa de classe, que seja anticapitalista e socialista.

A responsabilidade do PSOL

O projeto de construir essa alternativa de esquerda está na certidão de nascimento do PSOL. O partido nasceu para se contrapor, no campo da esquerda, às vacilações do PT e sua adaptação à ordem burguesa. Fez isso com grandes méritos durante os anos em que o PT, no governo, recusava-se a romper plenamente com a lógica neoliberal e o sistema capitalista.

O PSOL sempre foi oposição de esquerda aos governos do PT ao mesmo tempo em que combatia a direita e a extrema-direita. Quando um golpe institucional derrubou o PT do governo, o PSOL denunciou a manobra antidemocrática sem que isso significasse um apoio ao governo de Dilma Rousseff que, naquele momento em particular, aplicava uma política de duro ajuste fiscal e ataques aos trabalhadores.

Diante de Bolsonaro, o PSOL corretamente chamou à unidade na luta de toda a esquerda e as organizações dos trabalhadores, mulheres, juventude etc. Mas manteve sua postura independente e diferenciada das vacilações do PT no terreno eleitoral.

O PSOL corretamente apresentou Guilherme Boulos como candidato a presidente em 2018 e isso serviu para que se acumulasse forças para os embates que viriam. Corretamente o partido chamou o voto em Fernando Haddad do PT contra Bolsonaro no segundo turno.

Em 2020, já sob o governo de Bolsonaro e em plena barbárie da pandemia, o PSOL também apresentou Guilherme Boulos como candidato a prefeito da maior cidade do país, São Paulo, diferenciando-se do PT, que também tinha candidato próprio. O PSOL cresceu muito nessa oportunidade, ocupou o espaço do PT e chegou ao segundo turno na disputa contra o PSDB, onde obteve 40% dos votos.

A pergunta que fica é: por que o PSOL não deveria manter, diante do PT, essa postura de golpear juntos o mesmo inimigo e marchar separados? A construção de uma alternativa de esquerda que supere o PT no Brasil e adote uma orientação, programa e estratégia socialistas é uma necessidade histórica da classe trabalhadora brasileira.

Uma estratégia de luta e um programa socialista

A corrente Liberdade, Socialismo e Revolução – LSR defende que o PSOL deveria levantar um programa da classe trabalhadora e de todos os oprimidos como saída para a crise. Um programa capaz de vincular os problemas atuais com a necessidade da superação do capitalismo e por uma alternativa socialista.

Deveria também adotar uma estratégia que priorize a organização e a luta dos trabalhadores e não apenas as disputas no interior das instituições do regime burguês. Isso não significa renunciar às disputas no interior do sistema político, mas fazê-lo a partir do que é central – a mobilização dos oprimidos e explorados.

Para defender essa política é fundamental que o PSOL tenha cara e voz nas eleições de 2022, incluindo uma candidatura própria em aliança com outros setores da esquerda socialista e movimentos sociais combativos.

Sabemos que uma candidatura própria do PSOL encontraria dificuldades. Muitos setores tenderão a secundarizar programa e estratégia diante de uma saída aparentemente mais fácil para o inferno bolsonarista – votar em Lula.

Evidentemente, em um segundo turno das eleições, será correto chamar o voto crítico em Lula contra Bolsonaro. O PSOL deveria dizer que fará isso desde já, diante desse cenário. Poderá inclusive dizer que se existir alguma ameaça de que o segundo turno não aconteça ou que seja disputado apenas por forças de direita (cenários muito pouco prováveis), admitiríamos a possibilidade de abrir mão de nossa candidatura antes mesmo do segundo turno.

Apesar das dificuldades conjunturais, ao se colocar com cara própria no processo eleitoral, o PSOL acumulará força política para os embates que virão em seguida e estará mais forte para se colocar como ferramenta de luta consequente dos trabalhadores.

Se renunciar a essa tarefa, o partido adentrará em uma perigosa crise existencial como já aconteceu com novas formações de esquerda que surgiram em outras partes do mundo.

É preciso evitar isso, sem sectarismo e sem oportunismo. É preciso que se construa um polo socialista e revolucionário no PSOL e nos movimentos sociais, sindicais, da juventude capaz de levantar a bandeira do programa e da estratégia socialista. É para isso que trabalha a LSR.

  • Fora Bolsonaro, Mourão e a agenda neoliberal e autoritária!
  • Unir as lutas por direitos, empregos, salário, terra, liberdades democráticas e pela vida!
  • Por um plano de lutas que construa as bases para uma greve geral!
  • Por uma saída anticapitalista e socialista da classe trabalhadora para a crise!

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