PSOL: Partido de militantes classistas ou de “homens e mulheres de bem”?

Em artigo recente de Roberto Robaina, membro da executiva nacional do PSOL e presidente estadual do partido no Rio Grande Sul, com o título “Depoimento de Protógenes Queiroz: A operação Satiagraha não foi desmontada!”, publicado no site da Fundação Lauro Campos em 10/04/2009, o autor atenta contra preceitos básicos que balizaram a constituição política e programática do Partido Socialismo e Liberdade.

O artigo procura fazer um balanço do depoimento dado pelo delegado da PF que comandou a operação Satiagraha à CPI dos Grampos, mas na ânsia em defender Protógenes Queiroz e capitalizar para o partido a bandeira da ética na política, Roberto Robaina escorrega e adentra num terreno perigoso que compromete o futuro do partido se for adotada como linha política.

Para RR “O povo ainda não tem entrado em cena para transmitir a força necessária para que delegados honestos e corajosos assumam de peito aberto a defesa da verdade, mesmo que acima dos ritos e trâmites legais”. Ou seja, RR admite que delegados “honestos e corajosos” utilizem métodos ilegais, ao arrepio da lei para investigar e prender corruptos. “A verdade, mesmo que quebrando as leis.” RR se esquece que delegados e policiais “honestos e corajosos” entre todas as instituições policiais do país, agem há muito tempo ao arrepio da lei utilizando-se de métodos ilegais contra o movimento dos trabalhadores com escutas telefônicas, prisões com provas forjadas, assassinatos e etc, haja vista a campanha lançada atualmente contra o MST. A apologia em que os fins justificam os meios, onde a tortura e os espancamentos são justificados desde que se esteja do lado da verdade não ajuda os lutadores.

Não basta dar uma carta branca a delegados “honestos e corajosos” para que investiguem e prendam políticos corruptos. É necessário que as polícias estejam sob controle democrático dos sindicatos, movimentos sociais e populares, entidades estudantis, organizações de direitos humanos e etc. Assim, sempre que investigações desvendassem grandes esquemas para saquear o dinheiro público, como é o caso da Satiagraha, não seriam os investigadores que seriam penalizados, mas sim os corruptos. Ao mesmo tempo, o controle democrático poderia por um breque na intensificação da criminalização da pobreza e dos movimentos sociais.

RR lamenta que “Ainda são apenas os poderosos ricos, capitalistas e corruptos que dão de ombros às leis e fazem o que bem entendem, protegidos, impunes”. O que RR quer dizer? Que chegou a hora dos “honestos e corajosos” darem de ombros às leis? Publicar uma opinião como essa num site do partido é no mínimo ingenuidade e não prevê as conseqüências políticas de tal opinião, inda mais quando ditas por um membro da direção nacional do partido.

A luta contra a corrupção e o apoio a Protógenes Queiroz

Está correta a posição do partido em exigir a prisão de todos os corruptos indiciados pela operação Satiagraha. Esta operação só vem confirmar o quanto banqueiros, empresários, advogados, juízes, policiais, políticos do governo e da oposição estão envolvidos no saque desenfreado do dinheiro público e da riquezas do país.

O “erro” do delegado Protógenes foi a de levar suas investigações até o fim, desvendando uma cadeia de corrupção que abarca todas as instituições da república e a maioria dos partidos, onde Daniel Dantas jogava o papel de principal articulador. A unanimidade em condenar Proteges só pode ser explicada pela raiva e preocupação desses senhores bandidos em serem descobertos. A forma encontrada para desmoralizar Protógenes e a Operação Satiagraha é questionando os métodos utilizados pela PF, fazendo assim com que o feitiço se volte contra o feiticeiro. Nesse contexto, está correto o apoio dado pelo partido ao delegado Protógenes.

A operação Satiagraha demonstra os limites dentro do sistema para se apurar e prender os culpados por corrupção. A própria CPI dos Grampos foi instalada com o único objetivo de levar as coisas em banho-maria até que caia no esquecimento.

Deveríamos sim defender uma Comissão Popular de Inquérito independente formada por organizações populares, já que os representantes dos partidos e do estado estão atolados até o pescoço neste mar de lama. Essa CPI garantiria a todo funcionário público, bancário ou popular que trouxessem elementos que ajudassem nas investigações, teriam garantido seus empregos.

No entanto, a direção nacional do partido se equivoca ao girar todo o partido para a luta contra a corrupção e da defesa de Protógenes.

Os socialistas entendem que a corrupção é inerente ao sistema capitalista. Não há capitalismo sem corrupção! Portanto, os socialistas quando denunciam a corrupção, o fazem como parte da crítica geral a sociedade burguesa que explora o conjunto da classe trabalhadora, que é incapaz atender as necessidades básicas da maioria da população. Cabe ao partido e aos parlamentares socialistas a utilização do parlamento para desmascarar a banca do congresso e a hipócrita moral burguesa, explicando pacientemente que as instituições estão a serviço da manutenção do domínio dos ricos e poderosos em detrimento dos pobres.

É obrigação do PSOL e de seus parlamentares mostrarem que são honestos, que combatem a corrupção, mas fundamentalmente, que estão a serviço dos trabalhadores na luta por um governo socialista controlado pelos debaixo. Não é tarefa nossa, dos socialistas, serem vistos como os que querem moralizar o parlamento. Nosso papel deve ser o de explicar e demonstrar às massas que o regime burguês e suas instituições, ou seja, dos grandes ricos, não pode ser regenerada e nem moralizada.

As correntes que hoje dirigem o partido elegeram a questão da corrupção e a defesa de Protógenes como a campanha central. O argumento mais enfatizado é que esta campanha dá mais visibilidade ao partido na mídia, o que não deixa de ser verdade. O problema é que há um desequilíbrio enorme entre denunciar a corrupção e organizar a militância e armar o partido para intervir de forma contundente para enfrentar os efeitos da crise que assola as condições de vida dos trabalhadores provocando desemprego e aumento da miséria. O partido deve ser enfático em afirmar que quem provocou essa crise foram os grandes ricos e que eles devem pagar por ela.

Não há dicotomia entre organizar e politizar a luta dos trabalhadores e denunciar a corrupção. O problema é girar a militância do partido para uma campanha em defesa da bandeira da ética absolutamente descolada da luta real, com o único fim de tornar o partido viável eleitoralmente e nos credenciar para 2010.

A eventual vinda de Protógenes para o PSOL deve ser vista como uma vitória do partido, se ele concordar com a necessidade de uma alternativa socialista. Mas se a entrada de Protógenes em nosso partido tem como único fim sua candidatura a deputado federal em decorrência de um possível “apelo popular” e não sua aceitação ao programa e a luta pelo socialismo, só provocará mais confusão na militância.

Protógenes está sendo assediado pelo PT e PDT, entre outros. Vale lembrar que participou no ato de 1° de Maio da Força Sindical e recorrentemente faz elogios ao presidente Lula.

Partido de “gente descente”?

RR diz que “O desafio, portanto, segue sendo o mesmo: manter firme as bandeiras. Não desistir. Não recuar. Confiar no futuro. Convocar os homens e as mulheres de bem a se juntar na empreitada. Manter aberta as portas de nosso partido a todos os que queiram combater a corrupção dos capitalistas e seus políticos. Dizer a Protógenes que estamos lado a lado nesta marcha. E que venceremos.”

RR diz que as portas do PSOL estão abertas aos homens e mulheres de bem que querem combater a corrupção dos capitalistas e seus políticos. Mas só isso é suficiente para ingressar nas fileiras do partido?

Se lemos com atenção o estatuto do PSOL em seus artigos 6° e 7° e comparamos com o artigo de RR, veremos que há uma proposta , mesmo que inconscientemente, de mudança na natureza do partido:

Art. 6º – O Partido SOCIALISMO E LIBERDADE desenvolverá ações com o objetivo de organizar e construir, junto com os trabalhadores do campo e da cidade, de todos os setores explorados, excluídos e oprimidos, bem como os estudantes, os pequenos produtores rurais e urbanos, a clareza acerca da necessidade histórica da construção de uma sociedade socialista, com ampla democracia para os trabalhadores, que assegure a liberdade de expressão política, cultural, artística, racial, sexual e religiosa, tal como está expressado no programa partidário.

 Art. 7º – Coerente com o seu Programa, o Partido SOCIALISMO E LIBERDADE é solidário a todas as lutas dos trabalhadores do mundo que visem à construção de uma sociedade justa, fraterna e igualitária, incluindo as lutas das minorias, nações e povos oprimidos.

Está claro que aquilo que pode parecer ser uma artigo escrito de forma irrefletida, reflete a priorização da política moralista anticorrupção. Se pegamos o slogan da campanha de Luciana Genro em Porto Alegre que era “Gente Decente”, a aliança com o PV e a aceitação do dinheiro da multinacional Gerdau, demonstram inequivocamente um grande passo atrás no projeto inicial que deu origem ao PSOL e revela que a corrente que dirige o PSOL no estado é vanguarda numa mudança de rota do partido.

Em agosto ocorrerá o 2° Congresso Nacional do PSOL e como é natural, o programa e o estatuto do partido serão alvo de debate. É fundamental que a militância do partido reafirme o PSOL como um instrumento de luta contra o capitalismo e que apresente uma clara alternativa socialista. Um partido democrático onde suas instâncias de base tenham controle sobre sua direção. Um partido que esteja com as portas abertas aos trabalhadores do campo, da cidade e da juventude e a todos aqueles que querem lutar para transformar a sociedade. 

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