Sri Lanka: Fim sangrento da guerra, não do conflito nacional

Socialistas continuam a lutar contra a ditadura de Rajapakse

 O governo do Sri Lanka se engajou no que vê como sua batalha final para derrotar as minguadas forças dos Tigres Tamis no norte do país. Ele ignora todos os apelos, inclusive agora das Nações Unidas, de suspender os combates para garantir a segurança de milhares de homens, mulheres e crianças.

A horrível guerra civil no Sri Lanka, travada há mais de 25 anos, parece estar terminando no que um membro da Cruz Vermelha Internacional chamou “Nada exceto uma catástrofe”. À medida que o exército transpôs o que parecia ser as últimas defesas dos Tigres de Libertação de Tamil Eelam em 20 de abril, dezenas de milhares de aterrorizados civis fugiram em uma massa atordoada.

Centenas de milhares, incluindo estimadas 50.000 crianças, foram encurraladas em uma estreita faixa de terra, eufemisticamente chamada pelo governo de zona “sem combates”, mas descrita por um diretor do Human Rights Watch como “um dos lugares mais perigosos do mundo”.

Hospitais e igrejas onde os sobreviventes se protegiam foram bombardeadas. Médicos que lutavam para tratar dos horrivelmente feridos e que se atreveram a levantar suas vozes contra a carnificina e o bloqueio de ajuda médica e alimentos, enfrentaram uma ação disciplinar. As Nações Unidas reportaram 4.500 mortos nos primeiros três meses deste ano. Centenas mais foram chacinados na cruel ofensiva do exército do Sri Lanka ao norte de Mullaitivu, com o objetivo de “esmagar” o LTTE e forçar seus líderes a uma rendição completa e incondicional.

“A maneira em como a guerra vai termina será crítico para o futuro do Sri Lanka”, alertou Robert Temple, do International Crisis Group. Se for em um “massacre sangrento”, sua memória “será usada para incitar mais décadas de guerra e terrorismo”. No mesmo número do Independent em 22 de abril, o especialista em assuntos asiáticos, Charu Lata Hogg, previu: “A vitória no campo de batalha será vazia; uma amargurada minoria em casa e uma amargurada diáspora no estrangeiro farão com que a paz continue ilusória do Sri Lanka”. É duvidoso que qualquer tamil – dentro ou for a do Sri Lanka – esquecerá algum dia estes últimos meses de completa carnificina ou esquecerá os ministros e generais responsáveis.

O inferno vivo para aqueles que perderam suas casas, familiares, seu sustento, não terminará logo. Mães famintas ainda são incapazes de alimentar seus bebês. Crianças continuarão a morrer de doenças trazidas pela desnutrição. Homens e meninos, algumas vezes meninas, continuarão a ser tirados a ponta de armas de suas famílias. Arrebanhados em campos de concentração, cercados por arame farpado, inadequadamente alojados, alimentados ou cuidados, milhares mais de tamis morrerão e milhares mais perderão a esperança de terem uma vida normal.

Organizações humanitárias e agências de ajuda ainda lutam para entrar na área, assim como jornalistas e equipes de TV. A mídia e as figuras de oposição no Sri Lanka que se atrevem a dizer a verdade sobre a ditadura de Rajapakse e sua frenética “guerra ao terror” se tornam alvos de assassinos em motocicletas ou em vans brancas que fazem o serviço sujo do estado. Muitos deixaram o país para sobreviver.

Os socialistas no Sri Lanka estão vivendo um dos períodos mais sombrios de sua história. Líderes do Partido Socialista Unido (USP, em inglês), filiado ao Comitê por uma Internacional Operária, alertaram continuamente que uma derrota militar dos Tigres Tamis não trará um fim ao longo conflito nacional no Sri Lanka. Comentaristas capitalistas, como Mark McDonald, reportando de Colombo para o International Herald Tribune, dizem o mesmo. A raiva com “décadas de marginalização oficial, o ressentimento com as políticas educacionais discriminatórias e a supressão da língua tamil por administrações dominadas pela maioria budista cingalesa tardarão a desaparecer…” (Os tamis constituem cerca de 17% da população de 21 milhões, e os cingaleses, 74%.) Como ele aponta, outras questões acercam-se dos tamis oprimidos pela pobreza nas áreas centrais de plantações, assim como no Norte e Leste devastados pela guerra. São necessários massivos investimentos governamentais em escolas, infraestrutura, habitação e criação de empregos, junto com uma genuína autonomia política e fim da discriminação.

Mas o capitalismo no Sri Lanka, em seu estado mais fraco e mais endividado desde a independência, é incapaz de cumprir essas demandas. A maioria dos trabalhadores cingaleses e pequenos fazendeiros não sentem nenhum benefício de ser parte de uma maioria favorecida. As vastas somas necessárias para financiar a guerra causaram selvagens flutuações nos preços das mercadorias básicas, com a inflação alcançando cerca de 30% em alguns períodos. Elas também estão por trás do agudo aumento no número de trabalhadores desempregados do setor publico e privado.

Jogo de potências regionais

O ‘fim’ da guerra há muito tem sido prometido pela gangue de Rajapakse no poder. Este ano ele seria em 4 de fevereiro – o Dia da Liberdade, que marca a independência dos britânicos, e um bom dia para celebrar a liberdade do terrorismo! Então, foi remarcado para o Ano Novo no Sri Lanka – 13 e 14 de abril, ou em tempo para afetar o resultado do próximo turno das eleições provinciais em 25 de abril. Agora, parece, a guerra teve que ser remarcada para o fim de abril, para qualificar o país para um enorme empréstimo de 1,9 bilhões de dólares do Fundo Monetário Internacional. Se o empréstimo for obtido e a guerra continuar, a moeda estrangeira será usada para a compra de mais armamentos – de Israel, Irã, Paquistão… Se não, será usada para o pagamento de 900 milhões de dólares em empréstimos já tomados para a guerra. Uma das condições exigidas pelo FMI é uma desvalorização de 50% da rúpia, o que significará massivos aumentos no custo de vida.

O capitalismo internacional tem exigido um fim na guerra civil no Sri Lanka por suas próprias razões. Principalmente, para voltar ao negócio de fazer lucros com o comércio e a indústria, mas também para capturar lucrativos contratos para reconstrução e desenvolvimento. Isso aplica-se especialmente à Índia, que agora possui vastos interesses no Sri Lanka.

Satya Sivaran, um ‘frequente visitante do Sri Lanka’ em nome de sua Igreja, escreveu à ‘Campanha contra o massacre dos Tamis’, expondo a verdadeira razão do apoio da Índia ao governo assassino de Rajapakse: a Ashok Leyland e a Tata Mercedes desfrutam de um quase monopólio para veículos pesados e a Bajoj para riquixás motorizadas é a única marca disponível no país. Recentemente, a Indian Oil Corporation contratou o prestigioso e estratégico porto Trincomalee para ancorar seus navios-tanques.

Abbey Naidoo escreveu em fevereiro no South African Post: “A Índia revelou uma duplicidade e colaboração assassinas com o regime genocida no poder em Colombo. Não apenas faz ouvidos moucos aos apelos e gritos de sua própria população tamil para intervir nessa ofensiva assassina, ela ajuda ativamente o regime no fornecimento de equipamento militar, no treinamento de pilotos, no fornecimento de especialistas e de conselheiros militares”.

Na opinião do Financial Times de 26 de fevereiro, um dos fatores por trás da iminente derrota militar dos Tigres Tamis foi “a competição entre a Índia e a China por influência regional, [o que] o que levou a um enorme influxo de dinheiro e armas chineses – com nenhum murmúrio sobre o apavorante histórico do Sri Lanka em direitos humanos”. Mas, ele afirma, as sementes foram semeadas cinco anos atrás, com a defecção do comandante dos Tigres no Leste, Karuna, que levou metade de seu exército para o lado do governo.

Reação chauvinista

Dois anos depois, atiçando a reação ‘patriótica’ anti-tamil, Rajapakse chegou ao poder. Ele teve o apoio do chauvinista cingalês JVP (Frente de Libertação do Povo) e da organização de monges budistas JHU. Pela primeira vez na história do Sri Lanka, um presidente foi eleito apenas com os votos dos cingaleses. Ele agiu para romper um cessar-fogo de quatro anos acordado com LTTE por meio de emissários noruegueses, e perseguir implacavelmente seu objetivo de se tornar o primeiro governante cingalês de um estado “unido” do Sri Lanka.

O LTTE, liderado por Velupilai Prabhakaran, já controlou quase todo o Norte e o Leste da ilha. Havia não apenas um tipo de serviço público e controles de fronteira das forças do LTTE. Havia cobradores de impostos, polícia e até mesmo polícia de trânsito dos Tigres. Eles tinham pelo menos 12.000 quadros de combate – força terrestre, naval (os ‘Tigres Marinhos’), uma marinha mercante e uma primitiva “força aérea” capaz de realizar bombardeios a Colombo das selvas de Wanni. A tática de usar seres humanos para bombardeios suicidas foi uma invenção horripilante mas mortal do LTTE e realizado pelos venerados “Tigres Negros”. Foi mostrado um enorme heroísmo e abnegação por estes jovens combatentes, mas os métodos políticos e militares empregados causaram terríveis conseqüências. Um de seus erros foi instruir os tamis a não votar na eleição presidencial de 2005 – uma tática que permitiu que o raivoso chauvinista Rajapakse derrotasse o líder do UNP (Partido Nacional Unido), Ranil Wickeramasinghe, por uma pequena margem.

Eles já foram mortalmente feridos pela defecção de Karuna, que agora é completa – unindo-se ao governante SLFP (Partido da Liberdade do Sri Lanka) e sendo recompensado com o posto de ministro da integração nacional! Com ele, perdeu-se de fato toda a parte oriental do território reivindicada como parte da pátria Eelam.

Os Tigres imaginavam que pudessem ganhar uma vitória militar total contra o estado do Sri Lanka e os 50.000 soldados enviados contra eles. Eles fizeram avanços espetaculares furiosos nas primeiras etapas, mas foram severamente estorvados com o banimento de sua organização na Europa, EUA, Canadá, Índia e outros países, e seus efeitos sobre os fundos e fornecimentos. No fim sua força de combate provavelmente chegava a pouco mais de mil em seu último reduto perto de Mullaitivu. Mas uma volta da guerra de guerrilhas é inevitável enquanto o povo tamil fornecer a água em que o peixe possa nadar com segurança.

Direito de autodeterminação

“A ausência de guerra não é paz!”, como o New York Times foi lembrado recentemente por um general aposentado do exército indiano. Ashok Kumar Mehta participou na malfadada missão de paz de seu país no final dos anos 1980 (Esse envolvimento das tropas do governo indiano foi condenado severamente na época pelos membros do Partido Nava Sama Samaja que depois se tornaram a Tendência Marxista dos Trabalhadores, antecessora do Partido Socialista Unido de hoje, e pela direção internacional do Comitê por uma Internacional Operária. Tragicamente, confirmou-se que os interesses da burguesia indiana não eram os dos trabalhadores e pobres tamis. Eles acabaram atirando e matando as próprias pessoas que supostamente vieram defender e muitos deles mesmos pereceram).

Os socialistas sustentam que os conflitos nacionais, alimentados pelo imperialismo e exacerbados pelas privações e incapacidade do capitalismo, não podem ser superados em uma base capitalista. A luta pelo socialismo inscreveu em sua bandeira a demanda democrática básica do direito das nações à autodeterminação. O antigo líder trotskista do Sri Lanka Colvin De Silva alertou que não dar à língua tamil o mesmo status oficial que o cingalês engendraria um ressentimento nacional capaz de dividir as duas comunidades. Ele adotou a fórmula “Duas línguas para um país, uma língua para dois países”, que infelizmente não foi implementada.

O Partido Socialista Unido tem defendido inabalavelmente o direito do povo tamil do Sri Lanka a viver sem medo de opressão ou discriminação. Ele também inscreveu em sua bandeira o direito do povo tamil à autodeterminação, incluindo até a separação e a independência, se quiser. Nenhum governo do Sri Lanka permitiu que o povo expressasse livremente o que achava como o melhor acordo para proteger seus direitos. Os “Tigres” sempre afirmaram representar o povo tamil e têm um amplo apoio. Mas eles nunca testaram totalmente seus sentimentos políticos em um referendo genuinamente democrático e algumas vezes se mostraram intolerantes com a oposição política.

De outro lado, há aqueles que na esquerda do Sri Lanka desistiram de defender o direito à auto-determinação, sem falar da idéia do socialismo. Alguns terminaram no campo do atual governo chauvinista e anti-classe trabalhadora de Rajapakse. Outros se aliaram nas eleições, de um modo sem princípios, com partidos capitalistas como o Partido Nacional Unido.

Quando foi necessário formar uma frente temporária com algumas dessas forças em uma questão única como a campanha ‘Pare a Guerra’ ou contra os poderes ditatoriais, isso tem sido feito pelo USP de um modo principista e cuidadoso, mantendo um programa independente pela luta contra o capitalismo. Marchar separadamente, golpear juntos.

O USP também apresentou a ideia de que, se um estado separado ou uma grande medida de auto-governo fosse estabelecida, dentro dele deveria haver garantias de direitos para as minorias, incluindo até áreas autônomas para os muçulmanos e cingaleses. Nas eleições no Leste da ilha, o USP foi o único partido que teve candidatos de todas as três principais comunidades – tamil, muçulmano e cingalês. Lá e no interior montanhoso, os ativistas do USP alertaram contra os falsos amigos dos pobres e trabalhadores na forma dos líderes sem princípios do Congresso Muçulmano e do Congresso dos Trabalhadores do Ceilão, que tendem muito a ficar do lado de quem ganhar! Por causa disso, os candidatos e ativistas do USP foram atacados fisicamente e também presos sob falsas acusações.

Na atual situação no Sri Lanka, com nenhum dos grandes problemas resolvidos, nenhuma força externa pode mudar a situação. O Conselho de Segurança das Nações Unidas finalmente discutiu, em 22 de abril, como pôr um ponto final ao pesadelo humanitário no Sri Lanka. Mas, como fiéis representantes de suas próprias elites dirigentes, como sempre, não se chegou a nenhum acordo para “interferir” nos assuntos internos do Sri Lanka. Poucas semanas atrás, o Novo Trabalhismo da Grã-Bretanha finalmente decidiu mandar um enviado, Des Browne, ao Sri Lanka. Ele nem mesmo foi admitido no país – sua missão foi rejeitada pelo governo Rajapakse como uma “desrespeitosa intrusão” nos assuntos do Sri Lanka!

Impunidade com os assassinatos

O assombroso silêncio das grandes potências permitiu que o governo Rajapakse literalmente ficasse impune de assassinato – assassinato em massa! E sem nenhuma testemunha. Apenas quando é tarde demais para salvar as vidas de milhares de homens, mulheres e crianças, os governos ocidentais começar a se fazer ouvir suas fracas vozes. E apenas quando centenas de milhares de furiosos tamis apareceram em protestos de massa por todo o mundo e quando jovens desesperados em Londres, Austrália, Canadá e Índia se mostraram preparados para morrer, através de greves de fome ou auto-imolação, a fim de obter justiça para seu povo.

Na Índia foi a pressão de manifestações de massas, algumas vezes violentas, em Tamil Nadu – de estudantes e advogados em greve – que finalmente levou aos moderados pedidos de Sonja Gandhi e de um ou dois líderes do governo para que Rajapakse concordasse com um cessar fogo permanente. Mas ele ainda confia no apoio da maioria no Sri Lanka, incluindo alguns tamis, que simplesmente querem o fim da guerra.

O ditador-presidente do Sri Lanka governa por decretos, com o uso de vastos poderes de emergência e também da absoluta bandidagem. A fadiga da guerra não foi suficiente para garantir-lhe o tipo de vitória que queria nas eleições provinciais de 25 de abril em Colombo. Relatou-se que ele ordenou a soltura de gangsters condenados das prisões para irem às áreas tamis e eliminassem o apoio tradicional para o principal partido burguês de oposição – o Partido Nacional Unido. No momento, esse partido defende a paz. Seu líder, Ranil Wickeramasinghe, quando o UNP estava no poder, foi instrumental na manutenção do cessar-fogo de 2002, permitindo algum respiro para a minoria tamil e para as forças armadas do Sri Lanka. Ele estava sob enorme pressão, especialmente do imperialismo dos EUA, para terminar com a custosa guerra e continuar a abrir a economia do país a mais investimentos e exploração do capital estrangeiro.

Contudo, foi esse partido que estava no poder no início dos anos 1980 quando a guerra em escala total começou. O UNP teve uma vitória esmagadora em 1977, com 140 mandatos para oito do SLFP. No norte, a Frente Unida de Libertação Tamil ganhou claramente todos os 18 mandatos, concorrendo com o programa de um estado tamil separado. Estes dois eventos vieram na onda das traições à classe trabalhadora e aos pobres pelos governos de frente popular do SLFP capitalista com partidos de esquerda, mas o brutal ataque do UNP aos ganhos do passado, e seu rebaixamento das condições de vida, provocaram uma greve geral do setor público em 1980. Depois que esta terminou em derrota e demissões em massa de sindicalistas e membros de partidos de esquerda, o governo voltou a perseguir uma guerra civil contra os Tigres de Libertação do Tamil Eelam.

Em 24 de julho de 1983, os corpos de 13 soldados mortos pelos Tigres foram desfilados pelas ruas de Colombo. Gangues receberam proteção militar e veículos do governo para agirem. Até 4.000 tamis foram chacinados em apenas alguns dias. Mais de 18.000 casas foram atacadas e danificadas e mais de 100 locais de trabalho e 20 fábricas de roupas destruídos. 150.000 perderam seu emprego e mais de 100.000 viraram refugiados. O presidente Premadasa justificou essa tragédia dizendo que o povo cingalês deveria ter o devido respeito, mas que de qualquer forma os pogroms contra os tamis tinham sido organizados pelos partidos de esquerda!

Hoje o Partido Nacional Unido posa como amigo dos trabalhadores, dos tamis e de todos os cidadãos amantes da paz. Eles criticaram a guerra mas fizeram pouca coisa para organizar uma real oposição de massas contra ela. O mais próximo que ele chegou foi na época do funeral do editor de jornal assassinado, Lasantha Wickeramatunge e não foi bem nas recentes eleições provinciais.

Eleições

O governante Partido da Liberdade do Sri Lanka ganhou decisivamente. No Leste ele teve a ajuda de outro renegado do LTTE, Pillayan e seus facínoras. Na área de Ratnapura e nas montanhas centrais, onde os tamis de origem diferente daqueles do Norte são a maioria, Rajapakse ainda foi capaz de ter grande votação. Corrupção e intimidação são endêmicas nas eleições do Sri Lanka, mas a promessa de um fim rápido da guerra e de sua drenagem de recursos e emoções levou a melhor. Familias cingalesas com filhos no exército, muitos como conscritos econômicos, ansiavam por um fim dos combates. Cada aldeia no Sul teve bandeiras brancas de luto tremulando pelos numerosos soldados perdidos nas décadas de conflito.

O Partido Socialista Unido relutou em concorrer nas recentes eleições que, nas circunstâncias, são uma farsa e servem apenas para fortalecer a camarilha belicista de Rajapakse. Mas o USP tem a responsabilidade de verbalizar a angustia do povo tamil, de defender seus direitos e fazer campanha por uma ação de massas unificada para mudar a sociedade em linhas socialistas.

Quando a guerra supostamente acabar, não haverá solução a longo prazo sob esse governo. O JVP e o JHU chauvinistas, que nunca propuseram qualquer tipo de autonomia, pode muito bem sair às ruas para criar uma triunfal atmosfera comunal (no sentido de intolerância étnico-religiosa). Eles e o governo até mesmo podem se sentir fortes o suficiente para realizar ataques físicos aos tamis e adversários políticos.

O governo pode também realizar eleições repentinas na área de Jaffna para afirmar que a guerra acabou e o povo tamil pode ter alguma medida de escolha sobre seus representantes. Ele irá querer instalar políticos tamis submissos e recusará qualquer elemento verdadeiro de autogoverno, especialmente se isso significar implementar a “13ª emenda” (para um acordo de cessar-fogo anterior) que ligasse o norte e o leste como uma só entidade. Mas depois do “fim” sangrento do mais longo conflito na Ásia, o povo tamil, se consultado, não concordaria com a integração em um estado unitário.

As eleições que ocorrerem nestas condições serão uma farsa. A idéia do governo é agir rapidamente para repetir a experiência no Leste, onde uma vitória militar foi seguida por eleições fraudulentas e violentas para se colocar uma administração local submissa no poder. Fala-se de planos do governo de organizar assentamentos cingaleses nas áreas devastadas pela guerra do Norte, assim como os assentamentos judaicos foram “plantados” na Cisjordânia, Palestina, por exemplo.

Quaisquer que sejam as manobras, estratégias e poderes de emergência com que Mahinda Rajapakse tenha se cercado, no final, o alívio com o fim da guerra dará lugar a novas inquietações – com a falta de um acordo sobre o conflito nacional, mas também com os custos estratosféricos e as condições de vida. A guerra consumiu vastos recursos – até 5 milhões de dólares por dia. Antes da guerra civil, em 1982, o gasto em defesa era de apenas 0,5% do PIB do país. Hoje ele toma mais de 5%, pondo o Sri Lanka na lista dos 20 maiores gastos militares do mundo. O total passou de 96 bilhões de rúpias para 200 bilhões em dois anos. O atual déficit em conta corrente do país passou de 1,5 bilhões para 3,6 bilhões rúpias. Os preços dos alimentos básicos e combustível dispararam. Os salários caíram vertiginosamente.

Em seu apelo por uma ação de solidariedade em 8 de abril, o Secretário do USP, Siritunga Jayasuriya, pontuou que já se sentem os efeitos da recessão global: “Mais de 300.000 pessoas de uma força de trabalho total de 6,1 milhões empregados no setor privado perderam seus empregos, com mais de 50.000 sendo demitidos nos últimos três meses. Mais de 50 companhias e fábricas foram fechadas devido à atual situação de crise, e o Ministro do Trabalho tem feito pouco para proteger os que perderam seus empregos”.

Os trabalhadores do Sri Lanka resistirão a pagar o preço pela crise e do enorme fardo da guerra. O povo tamil mais diretamente afetado pela guerra irá querer ver alguma retribuição por seus enormes sacrifícios. O movimento dos trabalhadores e as forças socialistas serão reconstruídos para revidarem. E o fim da guerra e uma paz duradoura podem ser conseguidos apenas através de uma luta de massas unida da classe trabalhadora e dos pobres de todas as comunidades – cingalesa, tamil e muçulmana – por uma harmoniosa sociedade socialista.

 
 

  

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