Formando militantes socialistas em todo o mundo

Entre 04 a 09 de agosto de 2008, realizou-se na cidade de Gent na Bélgica, a anual Escola Internacional de quadros do CIO (Comitê por uma Internacional Operária).

Foi a maior escola de quadros dos últimos dez anos com cerca de 350 camaradas de 22 países. Ao todo o CIO está presente em cerca de 40 países e o Socialismo Revolucionário (SR) é sua seção brasileira.

A escola debateu a crise econômica americana, o processo de acirramento da luta de classes na América Latina, a situação de formação de novos partidos da classe trabalhadora na Europa e os conflitos na China e no Oriente Médio. Houve também um ato em comemoração aos 70 anos de fundação da IV Inter­nacional.

Os assuntos debatidos na Escola serão alvo de várias discussões organizadas pelo SR no Brasil. Estamos também iniciando os preparativos para uma nova Escola de quadros latino-americana do CIO no início do próximo ano.

Não é possível resumir aqui os diversos assuntos discutidos. Nesse espaço chamarei atenção especialmente para a questão da crise econômica e a experiência de novos partidos de esquerda, em especial o caso da Refundação Comunista na Itália.

 

Reflexões sobre a crise econômica mundial

 

Através da falas dos companheiros dos EUA, percebe-se que a crise imobiliária nos EUA não se encerrou. A crise atinge agora a Flórida e a Califórnia. Em Cleveland, 90 mil pessoas saíram de suas casas porque não podiam pagar seus empréstimos imobiliários e pela primeira vez 16 Estados americanos anunciaram que estão em crise econômica.

A crise financeira nos EUA levou a falência três grandes bancos americanos, o que obrigou o governo americano a estatizar esses bancos para segurar a crise. Os preceitos neoliberais demonstram-se equivocados no que diz respeito ao bem estar da população.

Depois do exemplo da Argen­tina, que seguiu o neoliberalismo a risca e por isso quebrou economicamente em 2002, os EUA estão sendo obrigados hoje a intervir na economia contrariando seus ideais de livre comercio e de não intervenção do Estado na economia.

A intervenção estatal americana tenta segurar a crise econômica que já é uma realidade instalada. O tema econômico tornou-se o principal da disputa presidencial americana e o debate sobre a ocupação no Iraque passou ao segundo plano.

A crise começa a se espalhar internacionalmente. Nesse cenário é provável que todos os países tomem medidas protecionistas para fugir da crise, o que deve gerar conflitos internacionais.

Prejuízo de 3 trilhões de dólares

Porém, esta não é uma crise econômica que a burguesia não possa controlar. Não é o fim do sistema capitalista, mas também não é uma crise qualquer facilmente superável. O prejuízo da burguesia não é mais de 400 bilhões de dólares como no ano passado, mas de 3 trilhões de dólares, e por isso não será facilmente resolvida pelo governo dos EUA.

Seria um exagero comparar essa crise com a de 1929, quando o Estado não interveio na economia. Agora, os governos vão intervir na economia como fez o governo americano e existe a possibilidade de um longo período de estagnação econômica.

Esta crise é o fim de uma época, fim do período de crescimento muito rápido desde 1990. E como na conferência de Dohan em 1973, quando os capitalistas não tinham nenhuma idéia de como superar a crise do petróleo e a solução só ocorreu a partir de 1980 com a política neoliberal de Margaret Thatcher e de Ronald Reagan, a crise atual não possui uma solução imediata.

Há economistas que apontam a China como a solução para a crise. De fato, a economia da China é a que teve o maior sucesso na década de 1990, mas esse bom período está ficando para trás. A China hoje tem grandes contradições por causa de sua economia mista.

China depende das exportações

As razões fundamentais do crescimento chinês foram os investimentos em até 50% na área produtiva, e isso só pode ocorrer em um Estado que controla a economia fortemente. Além disso, há um forte atrelamento da economia chinesa às exportações para os EUA, o superávit do comércio externo chinês subiu de 3,6 em 2004 para 11,6 em 2007.

Com uma economia cada vez mais globalizada a crise tende a afetar todos os países. Por isso vemos o investimento de um país para evitar a crise de outro, para evitar uma quebradeira geral dos países capitalistas e da economia globalizada.

Estamos entrando em um novo período. Desde a queda do muro de Berlim muitas dificuldades se colocaram para o crescimento do CIO. Neste momento, nossa organização cresceu e poderá crescer mais. Porém, a crise econômica não significa que os trabalhadores vão virar socialistas, mas significa que teremos mais contatos potencializando a construção de um partido mundial.

 

Brasil e Itália: as experiências de reorganização da esquerda

 

Outro momento importante da Escola de Quadros foi a troca de experiências entre companheiros socialistas. Uma das mais interessantes foi sobre os dilemas da construção de novos partidos da classe trabalhadora.

Um paralelo interessante pode ser traçado, com semelhanças e diferenças, entre a reorganização da esquerda no Brasil através da formação do PSOL e da reorganização da esquerda na Itália através do Partido da Refundação Comunista.

O PRC italiano nasceu como resposta à direitização do velho Partido Comunista italiano que se transformara no Partido Democrático de Esquerda (PDS). Mais de uma década depois, o PSOL nasceu como resposta à degeneração do PT.

A degeneração e direitização do PDS aprofundou-se levando o partido a unificar-se com setores da Democracia Cristã formando o Partido Democrático. O novo partido tentou se apresentar como alternativa democrática burguesa à extrema direita de Silvio Berlusconi. Porém, o governo de Romano Prodi, do Partido Democrático, não deixou de aplicar as mesmas políticas neoliberais.

Depois de anos recusando-se a aceitar a chantagem de unir-se ao PDS para evitar a vitória de Berlusconi, a ala majoritária de Fausto Bertinotti na direção do PRC enveredou por um caminho completamente oportunista. Passaram a compor com o PDS, participaram do governo Prodi e planejavam dissolver o PRC numa formação política difusa muito distante de uma linha política de esquerda baseada nas lutas dos trabalhadores.

Nas eleições gerais de abril de 2008, que levaram à vitória de Berlusconi depois do fiasco do governo Prodi, o resultado não poderia ter sido pior para o PRC. Apresentando-se como parte da coligação “Arco íris de esquerda” (Sinistra Arcobaleno), obtiveram apenas 3% dos votos e não elegeram nenhum parlamentar.

Pela primeira vez desde o governo fascista de Benito Mus­solini na década de 1920, a esquerda italiana ficou fora do parlamento. A coligação com partidos burgueses tirou a possibilidade de diferenciação política do PRC e o fiasco eleitoral foi inevitável.

Giro à esquerda no Congresso do PRC

O impacto do fracasso completo da política oportunista de Bertinotti na direção do PRC foi fulminante quando do Congresso do partido na última semana de julho.

A ala direita do partido apoiada por Bertinotti e encabeçada por Nichi Vendola tinha a expectativa de vencer o Congresso e implementar sua política de liquidar o PRC numa formação do mesmo estilo oportunista do “Arco íris de esquerda”. Porém, o resultado final foi uma impactante derrota desse setor diante da unidade dos demais setores do partido.

O resultado do Congresso foi um giro à esquerda do partido. As resoluções votadas rejeitam a dissolução do partido e a aliança nacional com o partido Democrata e falam ainda em reconstruir o PRC com base nas lutas sociais e na oposição combativa à Berlusconi.

O novo secretário-nacional do PRC é Paolo Ferrero, um dirigente que já foi favorável á aliança com o Partido Demo­crata e foi até ministro de Prodi. Ferrero, porém, foi obrigado a girar à esquerda no processo do Congresso do partido diante da enorme pressão da base.

Nesse contexto sua unidade com Bertinotti e Vendola levaria a uma crise e ruptura de sua própria corrente. Isso o obrigou a se colocar como alternativa de direção fazendo concessões à esquerda. A ala direita de Vendola e Bertinotti dá sinais de que pode romper com o partido no próximo período.

A crise econômica que começa a atingir duramente os trabalhadores italianos pode abrir caminho para um período de intensas lutas e ajudar a evitar um novo giro à direita do PRC.

Os militantes do CIO na Itália participaram de todo esse processo de luta no PRC em colaboração com outros setores, em particular aqueles organizados no coletivo ‘Controcorrente’ que cresceu muito nesse processo.

Lições para o PSOL

Todo esse processo pode trazer algumas reflexões importantes para analisarmos o processo atual vivido no PSOL.

O Campo majoritário (MES, APS e MTL) com auxilio do ENLACE aprovou aliança com pequenos partidos burgueses (PV, PSB…) na última conferencia eleitoral do PSOL.

Isso foi um tremendo retrocesso na política do PSOL, e nós do SR defendemos independência de classe, contra a aliança com partidos burgueses e fomos derrotados.

Formamos o PSOL para combater essa política e vamos lutar internamente ate as ultimas conseqüências para reverter esse processo. O exemplo extremo dos erros na política do PSOL em Porto Alegre aponta o risco de o partido seguir um caminho como o do PRC. É preciso impedir isso. O próprio PRC é um exemplo das possibilidades de uma resistência da base contra uma política oportunista da direção.

A experiência de fazer parte de uma organização que está presente em 38 países, proporciona ao SR um balanço internacional do que esta acontecendo com a classe trabalhadora e seus partidos. Essa experiência nos permite travar com mais força e clareza a luta por uma política de independência de classe que ajude os trabalhadores a enfrentar a burguesia e continuar a batalha na luta pelo socialismo.

Você pode gostar...