O sistema é mais podre que a carne

O escândalo da carne levanta temas importantes de como funciona, e não funciona o sistema econômico e político brasileiro. O Brasil é o maior exportador de carne do mundo e a maior frigorífica do mundo, a JBS Friboi, é brasileira. A podridão desse “orgulho nacional” veio à tona a partir da operação “Carne Fraca” da PF, que revelou um amplo esquema de corrupção, onde fiscais eram subornados para deixar carne de baixa qualidade, vencida e até podre, passar pela inspeção.

No dia 17 de março, 1,1 mil policiais federais participaram no que foi a maior operação da história da PF, cumprindo 309 mandados em seis estados e no DF.

Os mandados expedidos pela Justiça foram 27 de prisão preventiva, 11 de prisão temporária, 77 de condução coercitiva e 194 de busca e apreensão, envolvendo mais de 30 empresas. Mais de 20 unidades foram interditadas e vários países barraram imediatamente a importação de carne.

Alguns países já voltaram a permitir a importação de carne brasileira, menos das unidades interditadas. Há mais de 4,800 unidades de processamento de carne no Brasil e as unidades fechadas são uma pequena parcela, mas esse escândalo levanta dúvidas sobre a indústria como um todo.

Embora o governo e setores da imprensa tenham embarcado numa crítica ao alarmismo da PF sobre o caso, pois segundo o governo, o setor é “sério”, vários frigoríficos têm sido interditados nos últimos dias pelo Ministério da Agricultura, só que sem a mesma espetacularização.

Nesta semana, estourou também a operação Carne Fria, levada a cabo pelo Ibama, onde frigoríficos criavam gados em áreas desmatadas para este fim. O que demonstra que os frigoríficos atuam na ilegalidade para além dos estados do Sul e Centro-Oeste.

As grandes marcas, como JBS Friboi e BRF, têm investido pesadamente para construir uma imagem da carne brasileira como sendo de primeira qualidade, com propagandas com Tony Ramos, o vegetariano Roberto Carlos e ator americano Robert De Niro.

Agora esta imagem, construída com cenas de fábricas clinicamente limpas e brancas, está ruindo.

A indústria frigorífica cresceu rapidamente durante os governos do PT, seguindo a política de beneficiar o agronegócio, que tem inúmeros vínculos com os partidos que eram da base de sustentação do PT, e a construção de “campeões nacionais”. JBS Friboi se tornou a maior empresa frigorífica do mundo, em termos de faturamento, através de investimentos de cerca de 11 bilhões de reais do BNDES nos anos 2005-2014. Além de empréstimos de 2,5 bilhões, o BNDES comprou ações por 8,5 bilhões de reais na empresa e tem agora, junto com a Caixa, 25% das ações da JBS Friboi.

A segunda maior empresa, a BRF, surgiu através da fusão entre Sadia e Perdigão, também financiada pelo BNDES.

Mas esses investimentos foram feitos nos marcos de um sistema político podre de corrupção. O fluxo de dinheiro é definido por laços de influência regados de subornos e favores.

O crescimento da JBS Friboi veio casado com um grande aumento de doações eleitorais. A empresa passou de uma pequena doadora para ser, disparadamente, a maior doadora eleitoral nas eleições de 2014, com 391 milhões de reais para pelo menos 16 partidos. Isso equivale a 39,5% do lucro total da empresa em 2013! Além de doar dezenas de milhões para Dilma, Aécio e Marina Silva, a JBS ajudou a eleger 12 senadores, 18 governadores e 190 deputados!

O envolvimento do ministro da justiça de Michel Temer, Osmar Serraglio, apontam também para um entranhado esquema envolvendo políticos do PMDB que estão à frente do Ministério da Agricultura no últimos anos.

Os empréstimos e doações eleitorais podem ter sido todas dentro da lei, mas é apenas a superfície legal que descansa como uma camada fina de verniz em cima do mar de lama da corrupção. Essa corrupção não vai sumir através da proibição, que foi uma medida acertada, de doação de empresas para campanhas eleitorais. A corrupção é uma parte intrínseca do sistema capitalista. As propagandas das empresas tentam passar a ilusão de que a missão deles é de colocar carne de melhor qualidade na mesa da família brasileira, mas no final das contas, tudo se trata de quanto dinheiro conseguirão exprimir dos consumidores e trabalhadores, às custas dos trabalhadores, animais, meio ambiente e nossa saúde.

A ideia passada por alguns defensores mais árduos de tudo que os governos petistas fez e diz, de que tudo se trata de uma conspiração contra as empresas brasileiras para abrir as portas para capital estrangeiro, não se sustenta. O capital estrangeiro já tem grandes investimentos nas “campeãs nacionais” e não estamos escolhendo entre um capital mais ou menos corrupto. A participação de empresas multinacionais em escândalos de corrupção, da Parmalat a Alstom, mostra que o capitalismo é o mesmo, independente de nacionalidade.

Quem vai pagar?

Para termos o verdadeiro quadro da totalidade do problema, será necessário uma comissão de inquérito independente, com representantes dos consumidores, sindicatos e movimentos sociais, que tenha acesso a todas as informações. Não aceitamos que os trabalhadores das frigoríficas paguem pela crise através de demissões. São os donos e diretores das empresas, os inspetores corruptos e políticos beneficiados que devem pagar e prestar conta.

Tudo isso levanta a necessidade de lutar para que as grandes empresas sejam estatizadas sob o controle e gestão democráticos dos trabalhadores. Nossos alimentos são importantes demais para permanecer nas mãos de empresas sedentas por lucro e de políticos corruptos.

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