Revolta do Busão: A luta continua em Natal!

Algumas lições para avançar na luta contra aumento da tarifa e demais ataques contra o povo.

O aumento da tarifa de R$2,65 para R$2,90 foi repentino e isso claramente dificultou a mobilização. Seguindo o caminho de várias outras capitais e grandes cidades do Brasil, o aumento está dentro dos ataques promovidos para colocar nas costas dos trabalhadores o preço da crise.

No dia 1º de fevereiro ocorreu o primeiro ato contra o aumento da tarifa de ônibus em Natal. Convocado por meio de uma plenária virtual ocorrendo através de cinco grupos de whatsapp, o movimento conhecido como Revolta do Busão reuniu diversos ativistas, organizados em partidos, coletivos, autonomistas e independentes.

Diferente de outras manifestações que reuniram massivamente pessoas até mesmo antes do horário, dessa vez as pessoas chegaram aos poucos. Às 17h, todos comentavam a forte presença do aparato policial, e só uma hora depois da concentração, por iniciativa de militantes do PSOL, deu-se início a uma plenária de avaliação, com cerca de 200 pessoas ali presentes.

Após uma longa plenária, o movimento dirigiu-se para o Via Direta para fazer roletaço para a população, mas a PRF logo fechou a BR impedindo que ônibus passassem no local. Nesse momento, um impasse estabeleceu-se. Alguns queriam seguir até o Midway, proposta que perdeu na plenária. Outros defenderam a ida até o outro lado da avenidapara fazer roletaço. Outros ainda defenderam encerrar naquele dia e realizar outra ação na quarta feira.

Parte, então, tomou iniciativa e saiu em direção ao outro lado da BR. Em poucos minutos a PRF reprimiu com gás lacrimogênio o setor do movimento que atravessava a BR. Assim, o movimento, já dividido, logo dispersou. As conclusões que permeiam as redes sociais são de que a culpa foi dos partidários e da burocracia, que geraram uma longa plenária e fizeram com que pessoas saíssem e que depois houvesse uma grande enrolação na frente do Via Direta.

Excesso de burocracia? Um diálogo com os autonomistas

Para nós, o problema não se dá por um excesso de burocracia, mas sim pela falta de organização do movimento. A desconfiança entre partidários e não partidários é um dos elementos que impede que o movimento avance. A máxima “não se deve jogar o bebê junto com a água suja” é muito válida para entender esse processo, que surge desde os Fóruns Sociais Mundiais, esteve presente nas jornadas de junho e continua aos dias de hoje. Há uma reação aversiva às organizações políticas de esquerda após traição de Partidos que eram referência, e que ao chegar no poder aplicaram golpes atrás de golpes, como é o caso do Partido dos Trabalhadores no Brasil, e entidades governistas como é o caso da UNE, CUT, etc.

Trata-se de uma nova geração que não admite que isso se repita. Esse alerta é bom, e provoca a juventude, a classe trabalhadora e o povo a estarem ativos nas lutas em curso, sem confiar cegamente a uma cúpula qualquer. No entanto, isso não pode ser motivo para jogarmos fora importantes lições sobre organização popular.

A Revolta do Busão é um movimento plural e supra-partidário, que reúne diversos partidos, coletivos, entidades, autonomistas e ativistas em prol da redução do aumento da tarifa de transportes. Para garantir a democracia interna, é necessário uma organização mínima. Em nossa avaliação, o problema foi que a falta de unidade e a desconfiança impediu que houvesse uma plenária presencial antes da manifestação. A realização da plenária antes do ato gerou um desgaste que poderia ter sido evitado, e se agravou pelo fato da plenária não ter elegido pessoas para coordenar e assim garantir que ela fosse feita de forma mais ágil. Estabelecer tempo de fala, inscrição, orientação para que as falas fossem propositivas diminuiria o tempo necessário e permitiria uma organização mais efetiva do que fazer.

Ainda que a passos lentos, conseguimos sistematizar as propostas e fazer a votação. A maioria defendeu o roletaço. No entanto, após a votação, uma companheira do Levante Popular no megafone anunciou que por ter sido poucos votos de diferença, deveríamos seguir as duas propostas de açäo, e orientou todo mundo para ir para o Via Direta fazer o roletaço e em seguida caminhar até o Midway.

Para nós, isso foi um erro e mostra como, quando o movimento não elege uma direção, uma pessoa ou organização assume sem necessariamente representar a vontade da maioria! Isso é deseducativo para o movimento. A própria plenária deveria ter eleito uma comissão de segurança e uma comissão de organização, antes de irmos para o Via Direta. Essa comissão deveria representar a pluralidade do movimento e, no momento em que aparecesse um contratempo – como foi o caso da PRF se antecipar e mudar o percurso dos ônibus – essa comissão poderia definir a próxima ação.

Rumos do movimento

O aumento da tarifa de transporte foi só um ataque de muitos que estão vindo e que virão nesse contexto de crise econômica. A juventude, os trabalhadores e o povo devem estar unificados e solidários nessa luta. Devemos continuar buscando mobilizar mais setores para construir grandes atos da Revolta do Busão. Afinal, a correlação de forças foi sim um elemento fundamental para as vitórias que adquirimos em 2012 e 2013. Para além da juventude, precisamos convocar mais entidades dos trabalhadores. A participação do SINTEST no primeiro ato deve servir de exemplo para demais organizações sindicais combativas.

No entanto, lutar contra o aumento da tarifa é pouco. Para conseguir tarifa zero, melhor qualidade de transportes, o fim da dupla função dos motoristas e até mesmo outras conquistas no setor da saúde, da educação, no funcionalismo público, precisamos unir as nossas forças. Espaços como o Espaço Unidade de Ação, a Frente Povo Sem Medo e qualquer outra iniciativa de frente social e política dos trabalhadores, da juventude e do povo, independente de governos, devem ser fortalecidas.

Em relação a desconfiança, não existe uma receita. Vivemos em um processo de reorganização de uma nova camada de lutadores e lutadoras, e precisamos reaprender muitas coisas. Nesse processo, precisamos saber o que é preciso descartar. Um exemplo disso é o movimento entender como as opressões se fazem presentes mesmo nesses espaços, e a preocupação com a participação das mulheres, negros e negras, LGBTs foi algo bastante citado na plenária. Garantir que as mulheres falem e sejam ouvidas é um avanço. No entanto, precisamos salvar métodos de organização e de luta que historicamente comprovaram-se como eficazes para atingirmos nossos objetivos. Fóruns como a plenária da Revolta do Busão, em que decidimos coletivamente e democraticamente os rumos do movimento, devem ser incentivados.

A vacina contra oportunistas do movimento não pode ser outra que não o fortalecimento da democracia interna e a participação ativa de todos e todas ali presentes. O oportunismo não pode ser combatido com posturas autoritárias, nem de partidários nem de autonomistas, tampouco com a divisão do movimento, pois separados não conseguiremos obter vitórias.

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