Grécia: Syriza recua sob ameaças da Troika

No dia 20 de fevereiro, negociadores gregos concordaram em uma extensão por mais quatro meses do atual programa de resgate com seus credores (a “Troika” – UE, FMI e Banco Central Europeu). Foi relatado que a delegação grega foi sujeita à chantagem aberta do eurogrupo (ministros de finanças da zona do euro) – o governo do Syriza foi informado que seria forçado a implementar controles de capital dentro de dias caso não concordassem.

Os elementos chave desse acordo são que a Grécia passa a aceitar os fundamentos do “memorando” (acordo de austeridade) para os próximos quatro meses: o país terá o próximo pagamento de resgate cumprido apenas se for avaliada “positivamente” pela Troika, a Grécia precisa pagar toda sua dívida a tempo e está comprometida em usar a maior parte do dinheiro arrecado pelo programa de austeridade para pagar a dívida e não tomará qualquer “ação unilateral”.

Está claro que o acordo significa um grande recuo para o governo grego.

O acordo de quatro meses pode ter impedido que a Grécia saia imediatamente do euro, mas vem com um preço muito alto. Apesar da avaliação positiva do Primeiro Ministro Tsipras, Atenas fez grandes concessões, incluindo renegar os pedidos de redução das enormes dívidas da Grécia.

O Syriza alega que conseguiu o “melhor” dos maus acordos em oferta sob pressão de fuga de capital dos bancos gregos e a ameaça de uma corrida caótica aos bancos. “Nós ganhamos tempo”, alegam eles. Mas, tempo para que? O acordo viu Atenas tendo que propor reformas aceitáveis para seus credores. As propostas do Syriza precisam ser aprovadas pelo eurogrupo e pela Troika, com abril estipulado como prazo final. A menos que o Syriza aceite essas determinações, o governo não irá receber o empréstimo que precisa para evitar uma moratória da sua dívida de €320 bilhões (cerca de R$ 1 trilhão).

Está tudo perdido?

Isso significa que “tudo está perdido”? Isso depende do clima de luta entre as massas trabalhadoras gregas. Os movimentos dos trabalhadores e sociais lutarão para estender sua vitória eleitoral sobre o establishment ao plano sindical, enquanto a Troika tentará conter o Syriza dentro da estrutura capitalista da União Europeia. O governo será fortemente espremido entre essas duas pressões. Onde esse cabo de guerra vai terminar é algo que não podemos prever, porque é uma batalha de forças vivas.

O Syriza deveria falar a verdade ao povo grego. Se o governo fez concessões a fim de ganhar tempo para implementar um plano estratégico para derrotar a austeridade, o povo entenderia e se integraria à batalha. Mas falhando nisso irão, infelizmente, mostrar que o caminho que o governo grego está tomando é de conciliação de classes com a União Europeia e a elite local, aceitando sua agenda.

O Syriza não apresenta um programa geral socialista. Seus líderes prometem ficar dentro da eurozona capitalista, não importa como. Isso significa aprisionar os trabalhadores gregos dentro da camisa de força dos patrões capitalistas da União Europeia e aceitar a lógica do “mercado único” e as ordens da Troika.

O ministro de finanças grego Varoufakis alegou que o acordo permite à Grécia variar a sua meta fiscal esse ano, para que ele possa executar um baixo superávit e que há uma “ambiguidade criativa” dos superávits primários gregos requeridos para além de 2015. O governo grego disse que isso permitirá realizar algumas “políticas humanitárias”. É verdade que alguns poucos bilhões de euros poderiam aliviar as terríveis tensões naqueles setores da população grega que foram fortemente atingidos. Isso pode ser visto como um progresso para os trabalhadores, no momento, pelo menos comparado ao péssimo desempenho do último governo.

Os riscos não poderiam ser maiores

Mas isso não será suficiente para pagar pela série de reformas para a classe trabalhadora e para o tipo de investimento público massivo desesperadamente necessário. As partes principais do “Programa de Salonica” do Syriza, que por si só é um recuo diante dos programas anteriores do partido, serão adiadas, talvez indefinitivamente. Não irá chegar nem perto de desfazer o dano da perda de 25% do PIB dos últimos cinco anos. E, se o governo do Syriza acordar com os termos draconianos e condições demandadas pelo capitalismo alemão, isso será visto pelos trabalhadores gregos, cedo ou tarde, como uma mudança de rumo e capitulação do Syriza.

Líderes do Syriza já estão publicamente oscilando sobre algumas promessas políticas, como no restabelecimento da emissora estatal ERT. O governo já cedeu e aceitou manter as privatizações “em curso” e discutir a possibilidade de envolvimento de empresas privadas para “desenvolvimento” de novas instalações.

Ainda assim, há um suporte público para um programa radical anti-austeridade. Mais de 100 mil pessoas estiveram no centro de Atenas no dia 15 de fevereiro, em apoio às posições iniciais de negociação do Syriza. O clima foi combativo. O fascista Aurora Dourada e o nacionalismo reacionário foram empurrados para o escanteio por causa do novo clima anti-Troika e anti-imperialista. Sessenta por cento dos eleitores do Aurora Dourada disseram concordar com a posição do governo Syriza. Isso mostra um grande apoio ativo que pode ganhar em uma luta corajosa contra a Troika em um claro programa anti-cortes e socialista, incluindo o repúdio da dívida, fim de toda austeridade, controle de capitais, monopólio estatal do comércio exterior e da propriedade pública democrática das grandes empresas e bancos, ao encontro das necessidades da maioria e não de poucos – junto com um apelo classista internacionalista aos trabalhadores do resto da Europa.

Mesmo se o Syriza apenas travar corajosamente seu Programa de Salonica, os trabalhadores e os pobres na Grécia iriam entusiasticamente mobilizar-se em apoio da sua implementação, com suporte ativo dos trabalhadores por toda a Europa, desafiando seus próprios governos que também implementam cortes e austeridade.

Se a esquerda falhar em apresentar uma saída e a classe média e grandes setores da classe trabalhadora caírem em frustração e desmoralização, isso abrirá caminho para a Nova Democracia e outros partidos pró-austeridade para o poder, ou mesmo um renovado crescimento do Aurora Dourada. Os riscos não poderiam ser mais altos para a classe trabalhadora grega e europeia.

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