A luta internacional por sindicatos combativos ganha novo impulso
Relato das discussões realizadas na Comissão sobre trabalho sindical da Escola do CIT 2013
Ao abrir a discussão da comissão sobre o trabalho sindical da Escola do CIT, Rob Williams (Partido Socialista da Inglaterra e País de Gales e presidente da Rede Nacional de Delegados Sindicais – NSSN, em inglês) disse que hoje em dia não podemos presumir que os trabalhadores, principalmente os jovens, têm a compreensão do papel da classe trabalhadora e dos sindicatos na transformação da sociedade. A desindustrialização, o declínio das filiações e atividades sindicais e as políticas de “parceria social” de muitos líderes sindicais ao longo das duas últimas décadas fez com que o movimento sindical deixasse de ser visto como uma força capaz de trazer mudanças.
Na Grã Bretanha, com exceção da greve dos bombeiros de 2002, não havia ocorrido nenhuma greve nacional significativa desde a derrota dos mineiros em 1985 até acontecer a grande greve do setor público sobre as aposentadorias. Vimos o mesmo processo na Irlanda, onde 25 anos de “parceria social” resultou em níveis de greve historicamente baixos.
No entanto, as greves gerais na Grécia, Espanha e Portugal, a greve dos mineiros sul-africanos e a do setor público britânico em 30 de novembro de 2011 colocaram de volta na agenda a ideia de sindicatos combativos como força transformadora.
Nosso destaque sobre o papel da classe trabalhadora não está presente por motivos românticos ou sentimentais, mas resulta de uma análise marxista sobre o papel de classe dos trabalhadores na sociedade capitalista. Os trabalhadores somente têm poder através da organização coletiva, geralmente através dos sindicatos, com os quais têm força para atacar os lucros dos capitalistas e, com a experiência da luta, desenvolver uma consciência socialista.
Portanto, é importante que o maior número possível de membros do CIT estejam ativos em sindicatos e/ou estejam orientados às lutas sindicais e dos trabalhadores. Isto começa no local de trabalho, conversando com os colegas trabalhadores, organizando o sindicato lá, tornando-se representantes sindicais e se apresentando como candidatos e candidatas às eleições sindicais locais.
Por sindicatos democráticos
Assim, é possível envolver-se no movimento mais amplo e na luta para construir organizações sindicais democráticas e combativas. A pressão dos patrões e do Estado sobre os líderes sindicais para negociar, junto com o fato de que eles geralmente recebem salários e benefícios muitas vezes superiores aos dos trabalhadores que representam, provocam um distanciamento da base e leva inevitavelmente os burocratas sindicais a fazer acordos e até a trair os trabalhadores sindicalizados. Na Bélgica, 70% dos trabalhadores são filiados aos sindicatos que, por isso, são potencialmente bastante poderosos, porém esse peso social faz com que a burocracia dos sindicatos seja bastante forte também.
Sascha Stanicic (SAV, CIT na Alemanha) levantou a questão da relação dos marxistas com a burocracia sindical, principalmente os dirigentes e funcionários dos sindicatos com posições mais à “esquerda”. Ele deu exemplos mostrando seus limites, no entanto disse que o CIT deverá trabalhar com eles onde for possível através de uma política de “frente única”, mas ao mesmo tempo mantendo independência política e o direito de fazer críticas a esses setores diante dos membros de base dos sindicatos.
Até os sindicatos de direita podem ser forçados a apoiar greves se a pressão vinda de baixo for suficiente. O sindicato UNISON na Grã Bretanha, cuja direção se vendeu na disputa sobre as aposentadorias, e que tem promovido uma caça às bruxas aos sindicalistas do Partido Socialista (CIT na Inglaterra e Gales), foi forçado a dar apoio oficial à greve nos hospitais de Mid-Yorkshire, liderada pelos socialistas.
Na Suécia, Sanna Tafke do Rättvisepartiet Socialisterna (RS, CIT na Suécia) que trabalha como organizadora do sindicato Kommunal (sindicato dos trabalhadores no setor público municipal) no setorial de saúde e bem-estar social em Estocolmo, descreveu como uma longa campanha que ela e mais três camaradas do CIT fizeram dentro desse sindicato de direita, apoiados pela campanha do RS e de nossos vereadores contra os lucros e a privatização dos serviços públicos, havia forçado o governo municipal a cancelar contratos com empresas privadas e agora somente empresas que fazem contratos coletivos com seus trabalhadores serão aceitas.
Na Grécia, Espanha e Portugal, as centrais sindicais foram forçadas a convocar muitas greves gerais, porém mais como “válvula de escape” do que para desenvolver uma estratégia para derrubar os governos que implementam os ataques ou para tomar o poder por parte dos trabalhadores.
Transformar os sindicatos
De forma geral, nossa política é de lutar para transformar os sindicatos existentes, assim como ocorreu com o PCS, sindicato de servidores públicos, e o RMT, sindicato de trabalhadores do transporte na Grã Bretanha, que anteriormente eram dirigidos pela direita. No ano passado os membros do Partido Socialista na Irlanda do Norte (seção do CIT) lideraram a oposição de esquerda que ganhou o controle do NIPSA, sindicato dos servidores públicos. Isso demanda paciência e trabalho árduo que, por vezes, pode durar anos, construindo alianças com forças de esquerda e organizando as forças do CIT para manter uma estratégia e perspectiva socialista.
Ibrahim, camarada da Nigéria, levantou a discussão sobre nossa atitude diante da organização de base nos sindicatos. Ele explicou que na Nigéria muitos trabalhadores são abandonados pelas lideranças sindicais oficiais. Durante uma greve no estado de Oyo no ano passado, os servidores estaduais elegeram nos congressos oficiais novas lideranças para tomar o controle da luta das mãos das direções oficiais. A Campanha por Direitos Democráticos e dos Trabalhadores que os camaradas do CIT haviam criado desde a época do regime militar, agora é procurado pelos trabalhadores em busca de apoio para suas lutas porque não esperavam muito da maioria das lideranças oficiais.
Nos locais onde a burocracia sindical se transformou em um obstáculo total para a luta, ou na prática se transformou em uma força reacionária, como no caso do NUM, o sindicato dos mineiros sul-africanos, táticas mais flexíveis são necessárias. Sebei (DSM, CIT na África do Sul) explicou como milhares de mineiros abandonaram o NUM depois do massacre de Marikana e o DSM ajudou a iniciar os comitês da greve dos mineiros e unifica-los para formar um comitê nacional de greve, sendo que essas entidades democráticas de base englobaram trabalhadores filiados e não filiados aos sindicatos. Na Grã Bretanha, o Comitê de Base dos Eletricitários reuniu os ativistas para lutarem contra a pauta patronal e ao mesmo tempo pressionaram o sindicato oficial, UNITE, a apoiá-los com uma postura mais combativa.
Abordagem dupla
Temos, portanto, uma abordagem dupla – lutar para transformar os sindicatos existentes e, ao mesmo tempo, trabalhar de baixo para cima, incluindo a construção de organizações de base e ações por fora das estruturas oficiais, que poderão ter impacto sobre as estruturas oficiais. Rob Williams deu o exemplo do papel da Rede Nacional de Delegados Sindicais (NSSN) na Grã Bretanha no sentido de conseguir combinar a organização de base pressionando a central oficial (TUC) a chamar uma greve geral de 24 horas.
Além de trazer os sindicatos para a esquerda, os camaradas do CIT devem sempre procurar ampliar a influência e o número de militantes de suas seções dentro dos sindicatos. Muitos exemplos foram dados como o recrutamento de mineiros sul-africanos, metalúrgicos brasileiros, funcionários do hospital Charité em Berlim, trabalhadores do transporte italianos e ferroviários belgas.
No caso da Bélgica, um camarada condutor de trem descreveu como durante três anos dirigiu a luta contra a privatização do transporte de carga ferroviário, envolvendo uma conferência de base de 480 condutores ferroviários, greves oficiais e não oficiais e uma conferência internacional de ferroviários, o que resultou numa vitória que protegeu os direitos adquiridos pelos condutores e barrou as terceirizações. Ao dar uma direção combativa ao movimento e divulgar o LSP (CIT belga) com panfletos e o site, agora temos cinco membros ferroviários na seção.
“Questões secundárias”
Até mesmo nas regiões onde não temos membros do CIT nos locais de trabalho ou que participam nas greves, nossas células locais podem fazer intervenções bem-sucedidas nas lutas. Sebei explicou como as pequenas forças do DSM na África do Sul haviam focado sua atuação na região de Rustenberg com a perspectiva de que iriam explodir greves no cinturão das minas. Porém, ele disse que para ganhar contatos iniciais “você terá de sujar as mãos, merecer o direito de ser ouvido”, o que quer dizer ajudar até nas questões aparentemente secundárias, mas que acabam sendo muito importantes para os trabalhadores envolvidos.
Johan (CIT na Venezuela) descreveu uma pequena greve dos trabalhadores de uma empresa de distribuição de gás. Ele perguntou aos trabalhadores: “Sua greve é sobre o quê? Como podemos ajudar?” Através de uma discussão, ele explicou o conceito de controle dos trabalhadores e os trabalhadores tiveram uma assembleia e ganharam algumas concessões e tiveram suas vozes ouvidas no trabalho. Johan explicou como os marxistas devem ter bons ouvidos e tentar não impor aos trabalhadores o que devem fazer.
Igualmente, Alistair Tice (Partido Socialista da Inglaterra e País de Gales) deu o exemplo de uma greve de motoristas da rede de supermercados Tesco em que os membros do nosso partido haviam apoiado os piquetes diariamente e, assim, construíram uma relação de confiança com os grevistas e delegados sindicais, o que abriu espaço para fazermos ações mais contundentes como barrar caminhões com piquetes e, com esse exemplo, dando confiança aos trabalhadores para fazerem por eles mesmos. Essa ação militante resultou numa melhora de 50% nas propostas de indenizações para trabalhadores demitidos e em um enorme respeito em relação ao partido Socialista.
Um jovem camarada da Ação Socialista, CIT em Hong Kong, relatou a intervenção da seção na greve de 40 dias dos trabalhadores portuários, a mais longa greve em Hong Kong desde 1922. O CIT apoiou ativamente a greve com piquetes solidários diariamente, levantando 36 mil dólares de Hong Kong para o fundo de greve, ganhando apoio internacional através do CIT, especialmente da Suécia, e produziu oito panfletos. No entanto, foram atacados por alguns líderes sindicais, ONGs e outros grupos de esquerda. Essa experiência deu a oportunidade aos camaradas de aprenderem muito ao se envolver com a luta de classes em vez de só comentar sobre ela.
Novo precariado
Desindustrialização, crescimento do setor de serviços, comércio e finanças, e privatização ampla significa que mesmo nos países de capitalismo avançado, uma grande parte dos trabalhadores está com empregos temporários, sem contratos, precários e com baixa remuneração – formando o que tem sido chamado de “precariado”. Nos países em desenvolvimento, o setor ‘informal’ pode chegar a compor metade da mão de obra. Esse setor não está organizado em sindicatos e é super-explorado, o que representa um novo desafio para o movimento dos trabalhadores e o CIT, muitas vezes demandando novos e imaginativos métodos de organização e luta.
George da Alternativa Socialista (CIT nos EUA) descreveu a luta nos setores de fast-food e comércio varejista “por 15 dólares por hora e um sindicato”. Sem serem filiados a sindicatos no início, pequenos grupos de jovens trabalhadores, com o suporte de campanhas sindicais, fizeram greve em locais como no Burger King, McDonalds e Walmart. Mesmo sem um impacto econômico sério, essas ações e a publicidade crescente têm demonstrado que é possível lutar e isso tem construído confiança nessa camada. Agora há planos para um dia de greve dos trabalhadores de baixos salários para o dia 28 de agosto.
Ann, uma jovem médica de Moscou, disse que a baixa filiação aos sindicatos na Rússia (remanescente da era stalinista de sindicatos de Estado) e novas leis proibindo “greves e protestos não sancionados” significou que os trabalhadores teriam de inovar na forma de construir sindicatos e lutar. Ela descreveu uma ação grevista dos médicos contra cortes de salário e um protesto no lado de fora do hospital.
Didi da LSR disse que no Brasil organizações sindicais tentam organizar o setor informal incluindo movimentos de sem-teto em campanhas pelo direito á cidade para a população pobre.
Na Grã Bretanha, a iniciativa Unite Community está procurando organizar os desempregados assim como os estudantes, portadores de deficiência e pensionistas, com diversos membros do Partido Socialista ajudando a construir núcleos.
Sindicatos e movimentos sociais
Há uma clara interação entre alguns desses movimentos sociais e os sindicatos. O movimento “Ocupe Wall Street” sem dúvida inspirou as primeiras greves dos trabalhadores de fast-food. O movimento dos ‘Indignados’ na Espanha foi seguido por uma greve geral. A Primavera Árabe no Egito resultou em milhares de filiações a novos sindicatos independentes. O movimento de justiça social em Israel dois anos atrás inspirou 20 mil novos membros de sindicatos. Os protestos em massa contra as tarifas de ônibus e a Copa do Mundo no Brasil foram seguidos por várias greves.
O CIT tem levado isso em consideração quando desenvolvemos nosso programa político. Na Grécia, Espanha e Portugal, principalmente, o CIT defendeu “plenárias de sindicatos, partidos de esquerda e movimentos sociais” para organizar as greves gerais e mobilizações de massa incluindo ocupações em locais de trabalho e praças. Essas ações poderão dar suporte não só para derrubar os regimes de austeridade, mas também para que governos dos “trabalhadores e pobres” tomem o poder. O que o CIT sempre enfatiza é o papel chave da classe trabalhadora e como a classe deve manter-se independente dos partidos burgueses enquanto constroem alianças com movimentos sociais e outros movimentos dos oprimidos.
É fundamental que, para isto, lutemos pela união dos trabalhadores contra divisões nacionais, religiosas e sectárias. Suheir, militante palestina do CIT em Israel, inspirou os participantes da comissão explicando como ela, como membro da Executivo do sindicato dos assistentes sociais, havia se pronunciado contra a discriminação e pela união dos trabalhadores em um protesto do lado de fora do Knesset (o parlamento israelense). Seus companheiros palestinos ficaram surpresos com a reação positiva de todos os trabalhadores, o que mostra o potencial da luta de classes em superar até as divisões mais profundas. Da mesma forma, na Irlanda do Norte, mesmo com tensões sectárias crescentes, os membros do Partido Socialista (CIT) conseguiram aprovar resoluções no NIPSA e Unite (sindicatos do setor público) apoiando os trabalhadores que fizeram greve contra ameaças e ataques sectários.