Tática eleitoral: sobre o PSOL que precisamos!
No último DN, resoluções foram apresentadas sobre qual a melhor tática eleitoral para o PSOL. De forma democrática e diante de um debate aberto, algumas posições foram apreciadas sobre qual a melhor tática para o PSOL apresentar suas posições para o conjunto da sociedade, com quem poderia e deveria se aliar neste momento, e qual caminho tomar.
A conjuntura nos impõe uma dupla tarefa: derrotar o Bolsonarismo nas cidades e, ao mesmo tempo, nos apresentar como uma real alternativa, antissistêmica e socialista. Duas tarefas combinadas e igualmente importantes. Em síntese, na luta contra Bolsonaro precisamos ter uma nova esquerda, à altura dos desafios.
Para nós, da LSR, é imprescindível não capitularmos a oportunidade de falar com nossa classe, com nosso povo, por meio de um programa consistente e de cara própria. As eleições gerais de 2018 nos mostraram que o sentimento antissistêmico foi mobilizador de votos, levando inclusive Bolsonaro à vitória, uma vez que se apresentou com um falso, mas potente discurso, contra o sistema político, canalizando-o para a extrema direita, preconceituosa, ultraneoliberal e antidireitos sociais.
Hoje o PSOL é o único partido que possui condições concretas de construir este discurso e política antissistema, pela esquerda, como real alternativa. Abrir mão disso em nome de alianças que retirem nosso protagonismo no primeiro turno, poderá nos levar a anos de retrocesso e um apagamento histórico.
Vejam, de modo algum avaliamos ser simples o enfretamento do bolsonarismo no território. As últimas pesquisas do DataFolha mostraram que a base dos mais pobres se reaproximou destes diante do auxilio emergencial, que foi apresentado de forma mentirosa como uma política deste governo, já que a concretização do auxílio só foi possível graças ao empenho das forças de oposição no congresso, centralmente o papel do PSOL que garantiu uma ampliação dos recursos para as mães solo, por exemplo. De todo modo, isso nos coloca ainda mais desafios. Contudo, construir este diálogo e apresentar um programa de saída para a crise, só será possível se tivermos voz. Sobretudo no primeiro turno.
Para nós socialistas, o terreno das eleições sempre foi pantanoso e, também, um espaço de oportunidades e contradição. Mas nunca o fim em si mesmo. Lançar mão de alianças com os setores de posição ao congresso, abrindo mão de apresentar nosso projeto e dever de derrotar o bolsonarismo é um equívoco que atrasará as reais condições de nos construirmos como uma real alternativa de massas. O pragmatismo eleitoral poderá nos custar ainda mais caro neste momento.
Neste sentido, a resolução votada pela direção nacional permite situações como a de Recife/PE, Campinas/SP e outros, e portanto foi um erro, na nossa avaliação. Daí a necessidade da luta por um PSOL socialista, democrático e das lutas que não reproduza erros sectários ou oportunistas.
Discutindo a tática no concreto – o PSOL precisa ter cara própria
A disputa eleitoral nos munícipios, sobretudo em 2020 – diante da crise política, social e sanitária num governo de extrema direita – assume um papel de enorme importância. Será um teste. E para nós este teste teve ser encarado como uma trincheira importante também para organizar as lutas no próximo período, necessárias para defender as nossas vidas. Por isso, ações pragmáticas e meramente taticistas, descoladas do projeto, poderão apenas ampliar os nossos problemas.
Em Recife, o PSOL abre mão de uma candidatura com cara própria para apoiar Marília Arraes, fragiliza a possiblidade de potencializar a nossa intervenção na cidade, via mandatos combativos e lutas sociais dirigidas pelos nossos camaradas. O prefeito Geraldo Júlio, do PSB, conta com o PT no seu governo. O PT como cabeça de chapa se compromete a não criticar os “coronéis” do PSB, o que colocará o PSOL numa posição muito desconfortável, já que o PSB rachou e parte significativa votou pela Reforma da Previdência, além de implementar as políticas de ajuste e austeridade em Pernambuco. As chances de Arraes ir para o segundo turno estão colocadas, o que não impediria o PSOL de manter sua candidatura própria, através do camarada Paulo Rubens, e apresentar um debate sem amarras com a velha política sobre qual a saída e perspectivas nesta conjuntura. Esta decisão do Diretório Municipal poderá colocar o PSOL no background do processo de reorganização da esquerda em PE.
Campinas, principal cidade do interior de São Paulo, está numa situação similar a de Recife. Ter o PT como cabeça de chapa já no primeiro turno, poderá levar o PSOL a se tornar uma sombra do petismo, que em Campinas, diante de alianças duvidosas e nada programáticas, já perdeu muito espaço na cidade. Não podemos esquecer que o PT foi vice do Dr.Helio do PDT, o candidato que está na frente para concorrer a prefeitura em todas as pesquisas. A chave do programa antissistêmico não será manejada nestas eleições. Os riscos do melhorismo, ou ainda da ideia de sacrificar nossa construção em nome de uma política híbrida, não apenas não garante elementos para derrotar a direita na cidade e os Bolsonaristas, como impede que um programa realmente antissistema seja apresentado para o debate. A opção se deu em nome da possível eleição para vereança, em nome da construção de um projeto alternativo, mais coletivo, amplo e de luta.
Algo muito diferente acontece em BH, por exemplo, onde há inciativas para que se construa alianças com o PT, mas como vice na chapa. A então deputada federal Áurea Carolina representa um PSOL com cara própria, em que mulheres, negros e negras, têm espaço para construir este projeto alternativo. Há espaço para a construção de um programa que não seja mais do mesmo e que se oponha aos Bolsonaristas, não repetindo as vacilações do PT – que ao se aliar com setores da burguesia retirou direitos de servidores públicos, além de fechar equipamentos necessários de atenção à saúde e cuidados na cidade, como em São Paulo – ao mesmo tempo que indique uma real alternativa à esquerda, uma nova esquerda.
O Rio de Janeiro é um outro exemplo disso. Com a camarada Renata Souza na cabeça de chapa, o PSOL apresenta um perfil do novo, a cara do nosso povo, e mesmo dialogando com os setores petistas ou de posição, o faz sob outras condições, ou seja, o programa é o centro da disputa no momento. No RJ e em BH, nosso empenho deve ser de construir um programa sem amarras, capaz de responder ao desemprego, a crise de saúde publica e que paute a necessidade de uma outra economia. O povo deve sair às ruas para defender nosso programa e uma prefeitura que expresse suas necessidades.
Não podemos esquecer que neste ano há reais condições do PSOL ganhar prefeituras. Para nós da LSR, estas devem ser ferramentas de luta e organização da classe trabalhadora de conjunto. Edmilson Rodrigues em Belém está em primeiro lugar, com mais de 40% da intenção de votos nas pesquisas. Isso mediante a uma aliança nada simples com PT e PDT na cidade. A disputa é importante e a luta é válida, sobretudo, pela forte referência de luta de Edmilson na cidade. Contudo, é necessário que o nosso programa e política se construam no nível de radicalidade que a nossa classe necessita e que sejamos em Belém a expressão da nova esquerda.
A nacionalização de uma experiência
Em São Paulo, apesar de alguns debates infundados por parte dos que avaliavam que a chapa Boulos e Erundina não seria capaz de representar o PSOL, a pré-campanha tem indicado o caminho contrário a estas preocupações. Esta chapa é um exemplo de como é possível ganhar uma base mais ampla, sem renunciar à radicalidade. Mesmo durante as prévias internas, públicas, muitas pessoas que nem eram do PSOL declaram publicamente o apoio e simpatia. O debate sobre qual o papel de uma prefeitura socialista tem assumido o tom das falas de Boulos e Erundina.
As desigualdades territoriais, a expectativa de vida, trabalho e renda a partir do CEP têm sido denunciadas, indicando políticas concretas para o povo, que na sua maioria são negros e negras, e que precisam ser colocados como prioridade das políticas públicas. Isso tem gerado desconforto e movimentações internas no PT, que não possui candidato à altura e que tem produzido deslocamentos de sua base favoráveis a chapa do PSOL. O melhor cenário para disputar projetos no atual contexto.
A construção de um programa antissistema e socialista é nosso desafio atual, e deve ser construído de modo coletivo, levando em consideração as dificuldades de mobilidade do período de pandemia. É justamente neste sentido que o exemplo de São Paulo assume uma dimensão nacional: uma chapa capaz de ampliar a base mantendo a radicalidade, enfrentando a velha direita paulistana, a base Bolsonarista, assim como os limites da política focada no pacto social.
A discussão programática: a coluna dorsal da nossa intervenção
Como bem apontamos em outros documentos: Não morreremos nem de fome e nem de vírus. Na verdade, não queremos, mas isso tem sido a dura realidade que parte da nossa classe tem enfrentado no último período: a dor de perder pessoas próximas e queridas, assim como a falta de trabalho e renda, provocando despejos, remoções e fome. Não podemos naturalizar mais de 100 mil mortos. Não há nada de natural nisso. Mas precisamos ter política para impedir uma catástrofe ainda maior.
É no território que todas as desgraças do capitalismo são sentidas. No transporte amarrotado, espaço de maior contágio de Covid-19; no despejo diante da falta de dinheiro para o aluguel, nas doenças, humilhações, acidentes de trabalho que os entregadores de aplicativos têm vivenciado no ultimo período; em casa, com o aumento da violência doméstica e LGBTfóbica durante a pandemia; nas fábricas e locais de trabalho, sem quarentena e com ainda mais precarização; ou ainda com a ausência de equipamentos para garantir a educação à distância imposta pelas secretarias de educação, sem que seja garantida estrutura, alimentação e manutenção destas crianças já apartadas de uma educação realmente de qualidade.
É violento ver o recente despejo da população quilombola do seu território pelo Zema em Belo Horizonte. Ou ainda ver como a polícia recebe moradores e militantes sem teto com gás de pimenta e balas de borracha em uma manifestação legítima que objetivava discutir e conversar sobre os despejos durante a pandemia, ou ainda como a polícia e a prefeitura do RJ organiza ações na favela, uma verdadeira guerra aos pobres, terminando com morte e extermínio da juventude negra. Isso sem falar nos dados que revelam que a população negra representa mais de 59% das mortes por Covid no país, mesmo que 31% das notificações não contar raça.
A resposta para este caos passa pelo não pagamento da dívida pública, a derrubada da lei de responsabilidade fiscal, e de forjar um orçamento capaz de salvar vidas e de protegê-las. Ao não pagar a dívida, sobrará dinheiro para um orçamento capaz de inverter prioridades nas cidades, olhar para maioria. Com mais recursos será possível ter mais creches, mais escolas, mais UBS, fazendo com que a população de fato entenda qual política nos serve. Um passo importante para discutirmos na concretude quem decide e quem lucra com a pobreza.
Não existe saída dentro da ordem, ou mesmo melhorias possíveis dentro do neoliberalismo. Priorizar a classe trabalhadora significa defender a geração de empregos, assim como recursos novos para educação e saúde, e isso nos obrigará, no próximo período, a trazer ao centro o debate da estatização de setores estratégicos e bancos. A vida precisa estar acima do lucro, e se não formos nós a fazer, ninguém fará!
Certamente, independente do resultado, é possível constatar que o PSOL tem chances de crescer e se postular como uma alternativa radical a este sistema. Além de que partilhamos a avaliação de que devemos aumentar a bancada do PSOL nos municípios, com as candidaturas proporcionais. Aliás, um importante avanço do Partido é a repartição do fundo eleitoral, ao considerar que além das mulheres, negros(as), indígenas, LGBTQI+, também devem receber mais verbas como forma de entender as disparidades assimétricas na sociedade. Nossa tarefa é de grande responsabilidade nesta conjuntura e, por isso, os atalhos ou recuos programáticos não garantirão a defesa das nossas vidas, não nos enganemos. A burguesia, juntamente com a velha e nova direita, está se reorganizando e se preparando para as eleições municipais. Já vimos que não devemos subestimá-los e, para tanto, precisamos estar à altura dos desafios colocados.