#MeToo avança para as ruas: construir uma campanha de massas para acabar com o assédio no trabalho!

 

Graças à indignação coletiva e à solidariedade expressas por milhões de pessoas na campanha #MeToo (#EuTambém), tem havido uma mudança importante na forma como o assédio sexual e a agressão sexual são vistos e tratados, pelo menos quando o agressor é famoso. A nova cultura de intolerância em torno da má-conduta sexual tem incentivado cada vez mais as mulheres a dar o primeiro passo e a expor os seus agressores. Embora devamos reivindicar uma vitória parcial nas demissões de ricos e poderosos no despertar das revelações de Weinstein, não paramos por aqui. O próximo passo é construir um movimento de milhões de pessoas nas ruas, de ação coletiva e ativismo estratégico que aponte para o assédio sexual nos locais de trabalho. E ainda precisamos de derrubar Trump, o “predador-chefe”.

Todo 20 de Janeiro é o aniversário das Marchas de Mulheres, e, nesse ano, o dia de maior protesto por todo o país nos últimos meses e o primeiro grande dia de protesto desde que a campanha #MeToo tornou-se viral. Milhões de pessoas estão legitimamente revoltadas com as políticas reacionárias de Trump, especialmente com os seus ataques racistas contra os imigrantes, também com a sua história de predador sexual. As marchas das mulheres deste ano podem reacender o movimento de protesto contra Trump, um pontapé de saída para trazer a #MeToo para as ruas.

Um novo e revigorado movimento das mulheres — como o movimento generalizado contra Trump —, para que seja capaz de conquistar vitórias que afetem a vida das mulheres da classe trabalhadora, precisará desenvolver as suas próprias organizações e estratégias. Time’s Up (Acabou o Tempo), uma iniciativa iniciada por mulheres de Hollywood, angariou aproximadamente 17 milhões de dólares para a defesa jurídica de vítimas de assédio sexual. Esse é um desenvolvimento bem-vindo, assim como a carta das signatárias da Time’s Up, que estende solidariedade às mulheres da classe trabalhadora, reconhecendo as mulheres trabalhadoras rurais que publicaram sua própria carta em apoio às atrizes de Hollywood em novembro.

Enquanto os fundos para defesa jurídica serão certamente úteis para as vítimas, o quadro legal existente para processar o patrão por assédio sexual é completamente inadequado. Mesmo quando as trabalhadoras ganham indenizações dos seus empregadores, os acordos que as instituem podem exigir que as vítimas de assédio sexual desistam dos seus empregos, que muitas vezes são os melhores empregos que conseguem obter – essa é a contrapartida por se submeterem ao processo extenuante de fazer uma denúncia e levá-la à Justiça.

Conquistando reformas reais

Como outros grupos oprimidos, as vitórias obtidas pelas mulheres foram historicamente conquistadas no decorrer da luta, e não como presentes vindos do topo. As proteções contra o assédio sexual previstas na Lei dos Direitos Civis através da Equal Employment Opportunity Commissios (Comissão para a Igualdade de Oportunidades de Emprego, EEOC), mesmo que inadequadas, existem apenas porque o movimento organizado das mulheres da década de 1960 montou uma campanha que combinou protestos nas ruas com estratégias mais legalistas. Exigiram que a EEOC aplicasse a lei da discriminação de gênero, como anteriormente prometeu fazer pela discriminação racial durante o Movimento dos Direitos Civis.

A táctica da vergonha utilizada na era de hoje pela #MeToo já foi usada eficazmente para fazer avançar a questão do assédio sexual. Contar as nossas histórias é uma forma de nos empoderar através a solidariedade que constrói, que, porém, não será suficiente para abalar a estrutura política e social machista até aos seus alicerces. É necessário um movimento organizado para conquistar reformas que possam facilitar a denúncia do assédio sexual e para proteger as vítimas de retaliações por parte dos seus patrões.

Defendemos que um novo sistema precisa de ser construído, no qual em cada local de trabalho haja um empregado responsável por apurar queixas, eleito democraticamente pelos trabalhadores e trabalhadoras e protegido federalmente contra a retaliação do empregador. O quadro legal também precisa ser revisto radicalmente. Isso inclui acabar com as cláusulas dos contratos de trabalho que encarregam as empresas de apurar e mediar as reclamações. Essa é a causa que impede que mais da metade das trabalhadoras estadunidenses sejam capazes de levar denúncias de assédio aos Tribunais.

Evidentemente que querer promulgar mudanças em nível federal, quando o sistema político é controlado pelo Partido Republicano anti-mulheres e pelos Democratas dominados pelo corporativismo, pode parecer ingénuo. Porém, a reforma também pode ser levada ao nível do Estado e ao nível local, assim como fez o movimento pelo salário mínimo de 15 dólares por hora. Os sindicatos também podem exigir a eleição de funcionários responsáveis por apurar queixas nas negociações dos seus contratos.

A única maneira de ganhar e manter reformas significativas é com uma campanha massiva e uma força de trabalho mobilizada e ativa, recusando retrocessos. Há 45 anos, quando o movimento operário era muito mais forte, a Occupational Health and Safety Administration (Administração de Saúde e Segurança Profissional) foi criada, salvando a vida de milhares de trabalhadores e trabalhadoras. Atualmente, os Estados Unidos corporativistas resistirão ferozmente a qualquer incursão no seu domínio sobre o local de trabalho, e uma reforma exigirá um empurrão massivo vindo de baixo. Em última análise, derrotar o sexismo requererá acabar completamente com o poder corporativo e o seu controlo sobre dezenas de milhões de vidas.

O papel da solidariedade

O assédio e o abuso sexuais são uma expressão de poder. Uma trabalhadora isolada, lutando contra um predador no local de trabalho, mesmo um que não seja o próprio patrão, tem pouca probabilidade de parar o abuso e obter justiça. Como Bonnie Castillo, uma líder da National Nurses United (União Nacional de Enfermeiros, NNU) escreve:

“a via legal geralmente é um beco sem saída para uma enfermeira num ambiente não sindicalizado. Sem a proteção dum sindicato, a enfermeira é identificada como desleal e espalha-brasas. Fora dos holofotes direcionados pelo #MeToo sobre a indústria do entretenimento e da arena política, o assédio sexual provavelmente continuará nos locais de trabalho não sindicalizados. Não haverá #MeToo para as enfermeiras não sindicalizadas que enfrentam o assédio sozinhas nos seus locais de trabalho.”

Fundamentalmente, superar o sexismo profundamente enraizado que mantém vítimas isoladas e impotentes exigirá a ação coletiva de uma força de trabalho unida, incluindo ações de greve, particularmente em ambientes tóxicos onde a administração se recusa a agir apesar destes problemas serem trazidos à sua atenção. Uma força de trabalho em que o assédio é tolerado estará dividida e enfraquecida. Uma força de trabalho em que os homens e as mulheres se solidarizam com todos aqueles que enfrentaram assédio estará muito mais unida e capaz de lutar em todas as outras frentes.

A NNU escreveu sobre o poderoso papel dos sindicatos na luta contra o assédio sexual no local de trabalho. O sindicato dos trabalhadores e trabalhadoras de hotelaria, UNITE-HERE, conquistou vitórias importantes em Chicago e Seattle, ao exigir que a gerência do hotel providenciasse às trabalhadoras da limpeza um botão de emergência. O movimento sindical como um todo tem o potencial de liderar a luta #MeToo e galvanizar milhões de mulheres da classe trabalhadora, quer estejam ou não em sindicatos. Os sindicatos poderiam convocar reuniões massivas e oferecer ajuda, como centros de organização para um movimento contra os patrões que são cúmplices no assédio sexual que ocorre local de trabalho.

Em contraste com o argumento da NNU, de que o caminho a seguir pelas mulheres da classe trabalhadora é através da ação coletiva no local de trabalho, existem muitas mulheres proeminentes nos negócios, no governo, no jornalismo e em outras instituições que nos dizem que somente precisamos de mais mulheres em altos cargos.

O capitalismo é um sistema que apenas obedece à lógica do lucro. Quando a escolha está entre erradicar o assédio sexual em todos os níveis de uma organização, não importando os custos para os acionistas, ou varrer o problema para debaixo do tapete, não podemos confiar em nenhuma corporação para decidir o que está certo, independentemente de quem seja o CEO. Quer seja Christy Walton, uma mulher chave nas decisões do Walmart, ou Marissa Mayer, CEO da Yahoo que proibiu o trabalho a partir de casa; é óbvio que ter mulheres em posições de poder não são garantia de melhorias para as mulheres trabalhadoras.

Dado o histórico abertamente anti-mulheres do Partido Republicano, partido de predadores sexuais acusados como Trump e Roy Moore, os Democratas estão se posicionando favoráveis ao combate ao assédio sexual, nas eleições de 2018.

O verdadeiro histórico dos Democratas sobre o assédio sexual é digno de análise. Têm protegido muitos políticos com uma longa história de alegada e comprovada má-conduta sexual, sendo Bill Clinton apenas o mais famoso. Ainda mais importante: qual é a estratégia do Partido Democrata para lidar com o assédio sexual nos locais de trabalho para funcionárias da limpeza e empregadas de mesa – profissões cujas trabalhadoras são majoritariamente mulheres negras e imigrantes – assim como milhões de outras mulheres trabalhadoras?

Eleger Democratas e mulheres Democratas no passado não foi garantia de ações para melhorar as condições das vítimas. Sobre habitação, saúde, trabalho, policiamento racista e várias outras questões, a elite do Partido Democrata tem sido um obstáculo para as principais mudanças que são necessárias para melhorar a vida da classe trabalhadora.

O discurso de Oprah Winfrey nos Globos de Ouro sobre agressão e assédio sexual gerou mobilizações e foi positivo na promoção da bandeira #MeToo, muitos agora esperam que se candidate à presidência. No entanto, embora Oprah esteja correta ao louvar as mulheres que contam as suas histórias, não tem nada a dizer sobre a ação coletiva ou a construção de um movimento de massas. Isso está em consonância com a elite do Partido Democrata, e é claro que, como bilionária, não critica o capitalismo.

Feminismo Socialista

A principal estratégia do capitalismo para manter a dominância dum pequeno grupo sobre milhares de milhões de trabalhadores e trabalhadoras em todo o mundo é dividi-los entre si nas categorias de raça, nacionalidade, religião e gênero. O feminismo socialista reconhece que a opressão das mulheres faz parte do sistema capitalista e não é simplesmente causado por más leis, atitudes antiquadas ou até pelos próprios homens. As feministas socialistas lutam por reformas que façam uma diferença real na vida das mulheres e que fomentem a solidariedade entre a classe trabalhadora. Ao mesmo tempo, reconhecemos que a libertação total das mulheres só é possível tendo como base uma transformação socialista da sociedade que elimine todas as formas de opressão.

Nós dizemos:

  • Sindicatos, organizações de mulheres e outras forças devem lançar uma campanha massiva contra o assédio sexual nos locais de trabalho.
  • Impugnemos o “Predador-Chefe”, assediador em série, Trump.
  • Construamos o próximo dia de ação no 8 de Março, Dia Internacional da Mulher, marchando ao lado das mulheres por todo o mundo.

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