Greve das universidades federais, unidade para combater o peleguismo e o governo

Em 17 de agosto, a maior greve da história de docentes das universidades federais completará 90 dias.  Desde então, dezenas de outras categorias de servidores públicos federais (SPFs) entraram em greve e hoje o governo Dilma está sendo desafiado por centenas de milhares de trabalhadores que não aguentam mais precárias condições de trabalho e a intensa política de arrocho salarial aplicada ortodoxamente por Lula e Dilma.

O início da greve dos SPFs não foi um raio que surgiu em um céu azul. De fato, nunca se gastou tão pouco com servidores públicos federais. Em 1995, Fernando Henrique Cardoso, gastava com pessoal, 56,2% da Receita Corrente Líquida do governo federal. Hoje, após 10 anos de governos do PT, esse gasto é de 32,1%. Isto só foi possível com uma política de arrocho salarial contra a qual os SPFs estão, no atual movimento grevista, lutando.

As razões da greve

Não é somente contra a política de arrocho salarial que os docentes das universidades federais estão lutando, mas também contra as péssimas condições de trabalho criadas pela expansão precarizada das universidades federais e contra um plano de carreira apresentado pelo governo que transformará o trabalho docente e os rumos da universidade brasileira. A precariedade da expansão da universidade pública ocorrida durante o governo Lula ficou ainda mais clara durante o governo Dilma. Diversas obras iniciadas não foram concluídas, professores estão dando aula ou realizando pesquisas dentro de containers, banheiros são usados como laboratórios e faltam materiais básicos para o funcionamento da universidade. Junto com a expansão precarizada, há dois elementos que contribuíram para o surgimento de uma greve tão forte: os impasses nas negociações sobre a carreira docente e a política salarial aplicada pelo governo. Apenas nos últimos três anos, os docentes tiveram uma perda salarial de mais de 16%.

Junto com isso, o governo está, desde agosto de 2010, tentando enfiar goela abaixo uma reestruturação da carreira docente que busca, mediante um conjunto de mudanças, retirar direitos históricos – como a autonomia universitária e a isonomia na carreira – e, ainda por cima, realizar uma “mini-reforma” da previdência criando obstáculos para os professores alcançarem o topo da carreira e, ao mesmo tempo, desvalorizar as remunerações de aposentados e pensionistas.

As negociações com o governo durante a greve

Até o início da greve os representantes do governo Dilma vangloriavam-se de não negociar com categorias em greve. Por exemplo, o ano passado os servidores técnico-administrativos passaram mais de 100 dias em greve sem que o governo recebesse representantes para escutar suas reinvindicações.  No entanto, esta postura truculenta apenas aumentou a revolta dos trabalhadores. A greve dos docentes chegou a atingir mais de 95% das instituições federais de ensino e obrigou o governo a abrir negociações com o movimento docente. No dia 13 de julho o governo recebeu representantes das entidades para negociar uma saída da greve.

Surpreendentemente, nesta data, o governo apresentou uma proposta que – além de não repor as perdas salariais dos últimos anos ou não abordar o problema das condições de trabalho – aprofundava os ataques do governo sobre a carreira docente. A proposta foi duramente rejeitada pela base que, em assembleias por todo o país, pronunciou um estrondoso “não” à proposta do governo. Após a rejeição da primeira proposta o governo, em nova reunião, apresentou uma segunda proposta para tentar dar fim ao movimento grevista. Nesta nova proposta o governo propôs gastar R$4,2 bilhões em reajustes salariais que seriam realizados até março de 2015 e as decisões essenciais sobre a carreira docente seriam remetidas para um novo Grupo de Trabalho constituído pelo governo, por representantes das reitorias e pelas entidades que assinarem o acordo.

Novamente, com exceção de duas universidades (UFSCAR e UFRGS), assembleias realizadas nas universidades em greve rejeitaram a proposta do governo. Em primeiro lugar, porque a proposta de reajuste salarial, além de não repor as perdas salariais dos últimos anos, resulta, para muitos docentes, em congelamento ou perdas salariais. Além disso, a proposta de gastar apenas R$4,2 bilhões é ridícula. Somente em 2012, o governo gastou, por dia, R$2,1 bilhões para encher os bolsos de banqueiros detentores de títulos da dívida pública.

10 bilhões para universidades privadas

Neste ano o governo também deixou de arrecadar mais de R$10 bilhões ao oferecer anistia fiscal para diversas instituições privadas da educação. Desta forma, ao oferecer apenas R$4,2 bilhões para o reajuste salarial, o governo Dilma, novamente, mostra para quem governa: megaespeculadores financeiros e empresários que lucram com a mercantilização da educação. Em segundo lugar, a proposta foi rejeitada porque ela coloca para um Grupo de Trabalho definir os itens essenciais da reestruturação da carreira docente. Ora, se foi precisamente a inoperância de um GT que resultou na greve atual, não há qualquer razão para achar que um novo GT atenderá os anseios do movimento docente.

Infelizmente, enquanto a base se mobilizava contra os ataques do governo, um conjunto de burocratas da Federação de Sindicatos de Professores de Instituições Federais de Ensino Superior (PROIFES) – uma entidade criada durante o governo Lula para dividir o movimento docente e desmantelar o sindicalismo combativo representado pelo ANDES/SN – se articularam com o governo para tentar derrotar o movimento grevista. Na última reunião de negociação – realizada em 01 de agosto – o PROIFES decidiu assinar o acordo proposto pelo governo. Outras três entidades presentes na mesa de negociação – ANDES/SN, SINASEFE e CONDSEF – explicaram que suas bases rejeitavam o acordo e que o governo não deveria encerrar as negociações.

PROIFES: Tentáculo do governo no movimento docente

O PROIFES representa entidades sindicais de apenas sete universidades. Destas, quatro (UFBA, UFC, UFG e UFMS) rejeitaram a proposta do governo e decidiram continuar a greve. Com isso, ao assinar o acordo, os representantes do PROIFES não apenas estavam desrespeitando as decisões das outras 52 universidades que essa entidade não representa, mas estava desrespeitando as decisões da maioria das universidades que representa.  Com essa ação, o PROIFES se mostrou como um tentáculo do governo no movimento sindical que fará de tudo para combater qualquer movimento sindical ou político que possa desgastar o governo Dilma.

A assinatura do acordo pelo PROIFES foi aproveitada pelo governo: este afirmou que as negociações estavam encerradas e iniciou uma ofensiva contra a greve. Porém, mais de 10 dias depois da assinatura do acordo, apenas duas universidades saíram da greve. Enquanto isso, docentes de 54 das 59 universidades federais brasileiras continuam em greve.

Hoje a greve dos docentes está sofrendo uma forte ofensiva midiática e política, além dos naturais desgastes criados por uma greve que se iniciou em 17 de maio. Desde a intensificação da greve dos SPFs o governo anunciou medidas como cortar o ponto de servidores grevistas e medidas (como o decreto 7.777) que possibilitam  a contratação de funcionários substitutos em situações de greve.

O Comando Nacional de Greve do movimento docente luta hoje pela reabertura das negociações e busca o fortalecimento da greve nacionalmente. De fato, somente a luta organizada dos docentes pode mudar a situação atual.

Lutar e fortalecer a unidade dos SPFs

Porém, uma vitória do movimento docente depende, fundamentalmente, do fortalecimento da unidade com os servidores públicos federais, pois os ataques contra as universidades públicas fazem parte de um projeto mais geral de desmantelamento do Estado, de austeridade fiscal e arrocho salarial de setores da classe trabalhadora que, minimamente, conquistaram alguns direitos.

Em outras palavras, a luta dos trabalhadores docentes hoje é parte das lutas da classe trabalhadora contra as políticas neoliberais que começaram com os governos de Collor e Fernando Henrique Cardoso e continuaram com Lula e Dilma. Por isso, só com o fortalecimento da greve e com o aprofundamento da unidade com as diversas categorias dos servidores públicos federais, o movimento docente pode obter vitórias contra os violentos ataques do governo Dilma à educação pública, gratuita e de qualidade. 

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