O Fórum Social Mundial e a experiência venezuelana

O Fórum Social Mundial, desde a sua primeira edição em 2001, se propõe a ser um espaço para discussão e troca de experiências entre ativistas de todo o mundo que em vários países e em diferentes continentes enfrentam os mesmo inimigos: o imperialismo americano, o militarismo, as multinacionais, a deterioração do meio ambiente causada pelo capitalismo predatório.

Seis anos se passaram e o FSM tem mostrado seus limites. Na etapa das Américas do VI FSM policêntrico, realizada na Venezuela, Hugo Chávez declarou para milhares de ativistas reunidos no Poliedro de Caracas, que o Fórum não poderia se “limitar a ser um mero espaço de turismo de esquerda, mas que deve elaborar políticas globais concretas de resistência”.

Apesar de ocorrer em um país onde está havendo um processo intenso de lutas e transformações a chamada “revolução bolivariana”, a VI edição do FSM foi a de mais baixo comparecimento e mais diretamente dependente em ajuda estatal. O governo de Hugo Chávez deu todo o apoio em termos de infra-estrutura para os participantes do Fórum.

Avanços e limites da revolução bolivariana

Os ativistas que foram até lá puderam ver pessoalmente os resultados concretos da “revolução bolivariana”, assim como os seus limites.

Um exemplo positivo acontece na questão das comunicações. Lá, a Constituição garante financiamento público para quem quiser montar uma rádio ou estação de TV comunitária. Nas mãos de um forte movimento popular, esta pode ser uma poderosa arma para a divulgação das idéias socialistas e revolucionárias.

Outro ponto é que os programas sociais do governo, vistos pela população como uma conquista, estão elevando o nível de vida das pessoas dos bairros pobres, e em especial várias comunidades indígenas, como os Guayuros, que estão tendo pela primeira vez acesso à educação, saúde e moradia. O problema é que estes programas dependem da alta do preço internacional do petróleo e qualquer caída ou mudança do governo pode significar o fim destes programas.

O CIO (Comitê por uma Internacional Operária) esteve no Fórum com uma delegação de companheiros da Irlanda, Inglaterra, EUA, Chile e Brasil. Pudemos conversar com pessoas que foram despertadas para a vida política com a mobilização social criada pelo chavismo, mas que têm críticas e vêem pela sua experiência prática os limites do processo atual.

Corruptos e oportunistas no governo

A principal e mais comentada entre elas é a corrupção que gira em torno do governo. Políticos profissionais, muitos deles originários dos velhos partidos burgueses, aderiram ao partido de Chávez (MVR) para fazer carreira. É muito provável que estes oportunistas tentem frear e frustrar a radicalização dos trabalhadores venezuelanos.

A insatisfação com a corrupção se manifesta por enquanto em algumas candidaturas alternativas aos candidatos oficiais do chavismo. Em alguns bairros pudemos ver pichações do tipo “nem oportunistas nem corruptos, queremos socialistas de verdade”. Isso leva à questão da representação política dos trabalhadores venezuelanos.

Na coalizão governamental, estão os partidos de esquerda tradicionais, o PCV (Partido Comunista Venezuelano) e o PPT (Pátria Para Todos), que praticamente se tornaram correias de transmissão do governo, sem se apresentar com um perfil próprio ou que aposte na auto-organização da classe trabalhadora para consolidar as conquistas obtidas por ela. A falta de organizações próprias é um problema para o movimento popular venezuelano.

Participação limitada de ativistas venezuelanos

Um sintoma disso é a que a participação de venezuelanos no FSM poderia ter sido muito maior. Na manifestação de abertura, tanto os partidos quanto a nova central sindical UNT não estavam presentes de forma organizada. Apesar do setor classista no seu interior, a própria UNT não tem levantado a questão de organização independente do governo.

O papel dos trabalhadores e dos pobres, organizados nos círculos bolivarianos, foi essencial para derrotar a tentativa de golpe e o paro patronal de 2002. Mas o próprio Chávez jogou um papel ruim durante estes eventos, chamando a população a permanecer calma e confiar no governo, fazendo com que este começo de auto-organização da classe retrocedesse.

Pressionado pelos acontecimentos, Chávez tem dado passos em direção à esquerda. No começo de seu governo, ele insistia que sua revolução era nacional, “bolivariana”, e nas poucas vezes em que se manifestou, ele era extremamente antipático à idéia de socialismo ou marxismo como o caminho para a Venezuela. Após as tentativas de reação da elite nativa e do imperialismo americano, ele tem radicalizado em seu discurso, chegando a citar Marx e Trotsky.

Mas, não há avanços concretos no sentido da estatização dos grande meios de produção e o controle dos trabalhadores sobre a economia, condições básicas para qualquer socialismo do século XXI.

Chávez defende Lula e Tabaré Vasquez

No plano externo Chávez tem feito a defesa de governos que continuam aplicando na prática o neoliberalismo, como Lula no Brasil e Tabaré Vasquez no Uruguai, e sua alternativa ao plano imperialista da ALCA é a ALBA (Alternativa Bolivariana das Américas), uma medida que se der certo não passará de um fortalecimento das burguesias nativas, sem apresentar uma ruptura com o capitalismo.

Mesmo assim, medidas como a do gasoduto para a Bolívia ou a Telesur, a Rede de TV Latino-Americana, reacendem o sentimento anti-imperialista e a necessidade de uma união dos países latino americanos. Não está descartado que Chávez possa ir mais além do que planejado no rompimento com o imperialismo.

Para que isso ocorra, um requisito essencial é que os trabalhadores venezuelanos construam suas próprias organizações independentes, com o fim de assegurar e aprofundar os ganhos da revolução.

Existe um grande potencial para que as idéias socialistas e marxistas possam se fortalecer junto ao povo venezuelano e aos ativistas anti-capitalistas em sua busca por uma alternativa ao imperialismo brutal e desumano.

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