A vida de minha avó me dá mais tristeza que sua morte
Para resgatar o significado da luta internacional das mulheres, publicamos aqui o forte depoimento da companheira Carla, militante do CIT no México, que, ao falar de uma mulher, fala de milhões. É por isso que lutamos, sem fraquejar um minuto sequer.
A vida de minha avó me dá mais tristeza que sua morte. Ela levou uma vida tão difícil quanto a de milhares de mulheres neste país.
Minha avó, como muitas outras, foi raptada e obrigada a casar-se. Ela negra, oriunda da serra de Guerrero, um dos estados mais pobres. Ele branco e com algum dinheiro, ao menos o suficiente para comprar uma mulher nesse país.
Depois de anos de maus tratos e seis filhos, minha avó fugiu. Porém, teve que tomar a difícil decisão de deixar para trás o mais velho, que saia todos os dias com o pai para trabalhar. Minha avó prometeu voltar para ele algum dia, não imaginava que a cada ano que tentasse visitá-lo, ele nem sequer abriria a porta. Quando, com mais de 50 anos de idade, finalmente o fez, foi apenas para acusá-la e condená-la por todos os seus males.
Assim, minha avó chegou à cidade das oportunidades, com cinco filhos nas costas e novamente teve que enfrentar uma difícil decisão. Pediu asilo para três de suas filhas em uma casa para meninas. Prometeu voltar para elas, quando o fez imaginou que elas nunca a perdoariam. E assim foi.
Minha avó, minha mãe e seu irmão menor, buscaram uma casa para viver. Minha mãe, com apenas quatro anos, se encarregava de seu irmão. Desde então e até hoje, quando já passou dos 50, nunca deixou de cuidar de crianças.
Minha avó só encontrou trabalho onde se pode encontrar nesse sistema podre quando se é uma mulher provinciana, com filhos, pobre e fugitiva de um marido abusador. Minha avó trabalhou muitos anos fazendo limpeza em fábricas, escritórios, etc.
Acreditou ter encontrado o amor, mas não tinha tempo para ele. Quatro filhos mais, sua casa incendiada, dois filhos mortos (minha mãe quase não se salva), o remorso, o cansaço, a má alimentação. Finalmente a osteoartrite, o abandono, mais uma vez a má alimentação e o precário serviço de saúde consumiram sua vida. Agora finalmente encontrou descanso…
Adeus avó, por você e por muitas mais este 8 de março não será um dia qualquer, lutaremos por uma sociedade justa, contra o machismo, o patriarcado e a opressão…