Egito: manifestantes e exército se enfrentam pelo controle das ruas

Defender a revolução! Pela luta de massas para derrubar o governo do exército!

Milhares de ativistas travaram imensas batalhas com as forças de segurança pelo controle da Tahrir, Cairo, no fim de semana passado e no começo dessa semana. Pelo menos 33 pessoas foram mortas e mais de 1.750 feridas. Também houve grandes manifestações em Alexandria, Suez, Mansoura e outras cidades. As lutas de rua continuaram na última noite no centro de Cairo, transformando partes da cidade em uma “zona de guerra”. Hoje, segunda feira, 21 de novembro, são relatados choques enquanto forças armadas do Estado tentam limpar a Praça Tahrir de manifestantes. 

“Os militares prometeram que entregariam o poder em seis meses”, disse um manifestante. “Agora, 10 meses se passaram e eles ainda não fizeram isso. Nos sentimos enganados”.

Na sexta, 18 de novembro, ocorreu uma enorme manifestação na Praça Tahrir – a maior em vários meses. A maioria que participa nesses protestos segundo informes são apoiadores dos partidos islâmicos. Mas à noite centenas de jovens armaram uma nova ocupação na rotatória central. As forças estatais lançaram um brutal ataque contra o acampamento no sábado de manhã. Isso levou dezenas de milhares de manifestantes de volta à praça para defender seu direito a protestar. “O povo exige a derrubada do regime”, era o slogan cantado, como era antes do antigo ditador, Hosni Mubarak, cair no início desse ano. Indicando algumas divisões na cúpula sobre como responder a esses protestos de rua, o Ministro da Cultura Emad Abu Ghazi se demitiu em protesto com a resposta do governo aos manifestantes. 

O jornal Guardian (Londres 21/11) descreveu a cena: “No domingo de manhã, após 24 horas de ferozes lutas de rua e a conquista da Tahrir pelos revolucionários, a mobília do levante anti-Mubarak foi mais uma vez desenrolado na capital. Barreiras de civis encheram a praça, placas de aço corrugado foram arrancados para fazer barricadas, e o hospital de campo provisório…

“Quando finalmente veio o ataque dos militares, dissolvendo de uma vez por todas quaisquer ligeiras diferenças nas mentes dos manifestantes entre o exército de um lado e a odiada polícia de choque que simbolizava o aparato de segurança de Mubarak de outro, foi brutal e efêmero…” Mas “em inferioridade numérica e derrotados, os soldados fugiram, não antes que alguns fossem capturados pelos manifestantes. Tiros foram disparados em todas as direções, mas a Praça da Libertação – o nome da praça em Árabe – foi mais uma vez libertada, embora por quanto tempo ninguém se atreve a prever. 

‘Ficaremos aqui até morrer, ou até que o regime militar morra,’ disse Mahmoud Turg de 27 anos, com uma determinação intensa.”

O Exército se agarra ao poder

Os eventos da semana passada eclodiram com a crescente raiva com o papel do Conselho Supremo das Forças Armadas (SCAF), que está tentando manter o controle. O conselho, liderado pelo marechal de campo Mohamed Tantawi, supostamente está encarregado de supervisionar a transição para a democracia depois de três décadas do regime ditatorial do Sr. Mubarak.

As eleições estão convocadas para 28 de novembro, mas está ficando cada vez mais claro para muitos que o SCAF fará tudo para manter o poder, quaisquer que sejam os custos. Ao invés de repelir as odiadas leis de emergência do Egito, os generais as estenderam, enquanto protegem seus próprios privilégios. Estima-se que 12 mil pessoas foram levadas a tribunais militares nos últimos 10 meses, um número mais alto do que sob os 30 anos de Mubarak.

Pedidos para a renúncia de Tantawi foram ouvidos durante o fim de semana. A BBC relatou que as demandas dos manifestantes “mudaram ao longo do fim de semana”. As multidões reunidas na última sexta exigiam que os militares marcassem uma data para a entrega do poder, mas agora “elas querem que os líderes militares renunciem imediatamente e deem lugar a uma administração civil”. 

Os mais longos protestos de rua desde que o presidente Hosni Mubarak foi removido em fevereiro levantaram a questão de se ocorrerão as eleições marcadas para a próxima semana.

Vários partidos de oposição declararam que não tomarão parte dessas eleições. Mohamed ElBaradei, uma figura de oposição pró-capitalista, ofereceu-se para liderar um “governo de salvação nacional”. 

As cenas de manifestantes na Praça Tahrir sendo brutalmente atacados por cassetetes policiais, gás lacrimogêneo (feitos nos EUA), munição de caçadeiras e balas de borracha eram reminiscências dos dias seguintes à manifestação de 25 de janeiro. Foram essas manifestações que começaram o movimento de 18 dias que expulsou o antigo presidente, Hosni Mubarak.

Nos últimos meses, houve tensões profundas e insustentáveis entre o regime do SCAF e as massas em busca de direitos democráticos e uma vida melhor. Agora essas profundas e mutuamente incompatíveis diferenças explodiram na superfície, no que muitos ativistas estão chamando “a Segunda Revolução”. Como outras revoluções, a revolução egípcia não é um ato único, mas um processo. As massas lutaram duro para tirar Mubarak, ao custo de muitas vidas. Depois que ele foi derrubado, explodiram greves em muitos setores e os protestos continuaram com os jovens, estudantes e outras camadas. Boa parte da população, esgotada pelas lutas e ansiando pela “estabilidade”, botou esperanças no novo regime para supervisionar eleições democráticas e uma vida melhor. Mas agora grandes setores da população concluíram corretamente que o SCAF está tentando continuar o regime de Mubarak em novas roupagens e que é preciso um novo levante revolucionário para conquistar direitos democráticos verdadeiros e duradouros e mudanças sociais e econômicas fundamentais. 

Em setembro, houve grandes greves – greves nacionais de professores e dos correios, 62 mil trabalhadores do transporte público do Cairo – e mesmo de policiais de baixa patente, que protestavam contra a corrupção e os privilégios dos altos oficiais. Os trabalhadores estavam tirando a conclusão de que não podiam confiar no novo governo e apenas melhorariam seus padrões de vida e teriam verdadeiros direitos democráticos se organizando e entrando em ação.

Em 9 de outubro, houve ataques a uma igreja copta que levaram a uma manifestação de protesto de 10 mil pessoas à Maspero, o centro da TV estatal. Os manifestantes foram atacados por carros blindados do exército, que mataram dezenas deles. As notícias da TV culparam os manifestantes pela violência. Os processos militares contra adversários civis do regime foram realçados pela prisão do blogueiro Alaa Abd El-Fattah por relatar o papel dos militares no ataque em Maspero.

Enquanto isso, Michael Nabil Sanad continua sua greve de fome em protesto com a sentença de três anos de prisão que recebeu em abril. Ele escreveu um artigo acusando o novo governo de continuar com a corrupção e as práticas antidemocráticas de Mubarak.

Em 27 de outubro, um prisioneiro, Essam Atta, foi horrivelmente torturado até a morte. A foto do cadáver foi uma horrível lembrança de Khaled Said, um jovem blogueiro morto por dois policiais em Alexandria em 2010. O grupo do Facebook ‘We are all Khaled Said’ foi um dos movimentos que chamou a manifestação de 25 de janeiro. Muitos esperavam que tais cenas tivessem acabado com o fim do governo de Mubarak.

No fim de semana de 19/20 de novembro, houve enormes protestos no delta do porto de Damietta contra a poluição da fábrica de fertilizantes Mopco. Vinte mil pessoas bloquearam o porto e as estradas para a cidade. Elas foram atacadas pelo exército e a política, com duas pessoas mortas. No outro extremo do país, em Aswan, um comício de massas de núbios protestou contra a morte a tiros de um barqueiro núbio nas mãos de um policial. 

Mesmos métodos de repressão do regime Mubarak

Esses incidentes mostram que o SCAF está usando os mesmos métodos de repressão que o velho regime. Isso já era esperado, já que esses mesmos altos oficiais serviram Mubarak por décadas. Eles possuem enormes interesses econômicos, com grandes companhias de propriedade das forças armadas. Eles estão determinados a proteger esses interesses, assim como os do resto da classe dominante egípcia. 

É por isso que o CIT defendeu em 11 de fevereiro, o dia da queda de Mubarak, que a classe trabalhadora e a juventude não deveriam ter “Nenhuma confiança nos chefes militares!” e precisavam construir um movimento independente que lute por “um governo de representantes dos trabalhadores, pequenos agricultores e pobres!”

As próximas eleições serão para a câmara baixa do parlamento, que redigirá uma nova constituição. Dois terços dos mandatos serão eleitos com base em listas locais, com indivíduos eleitos para os mandatos remanescentes. O processo eleitoral irá fortalecer os apoiadores do velho regime, muitos dos quais estão concorrendo como “independentes” ou membros da “oposição leal” que era permitida por Mubarak para dar um verniz democrático a seu regime.

O governo agora declarou que o novo parlamento não terá controle sobre as forças armadas, que continuariam a controlar seu próprio orçamento e política. Depois do protesto inicial, o SCAF se “comprometeu” e disse que prestaria contas a um Conselho Nacional, metade do qual seria eleito pelo parlamento e metade pelo SCAF, e presidido pelo presidente da nação. Isso deixaria as forças armadas com o efetivo controle de si mesmas. 

Embora espera-se que os islâmicos se tornem o maior bloco no novo parlamento, seus apoiadores estão divididos em vários partidos. O maior é o “Partido da Liberdade e Justiça” da Irmandade Muçulmana, que afirma se espelhar no AKP, que compõe o governo turco. 

Membros da Juventude da Irmandade Muçulmana romperam frustrados com a liderança mais velha, refletindo a pressão dos jovens ativistas com quem trabalharam depois da revolução de 25 de janeiro. Esses jovens foram expulsos da Irmandade Muçulmana e criaram quatro novos partidos. Um crescente de islâmicos conservadores apoiam os vários partidos salafistas islâmicos linha-duras. 

O apoio eleitoral aos partidos islâmicos se baseia em seu histórico de obras de caridade, que preenchia alguns buracos das políticas sociais sob Mubarak, assim como seu histórico de oposição a ele e aparente falta de corrupção. Houve relatos desses partidos doando carne e remédios pela metade do preço em alguns comícios eleitorais. Ocorreram disputas sobre as listas de candidatos entre esses diferentes partidos nos últimos meses. Com o crescente conflito de classe, alguns dos partidos islâmicos refletirão diferentes interesses de classe. 

Revolução sequestrada

As manifestações por todo o Egito esse fim de semana mostram que um crescente número de jovens e trabalhadores entendem que o SCAF pretende sequestrar sua revolução. Os jovens e trabalhadores estão corajosamente resistindo ao exército e à polícia nas ruas do Cairo e outros lugares. O movimento precisa urgentemente criar comitês eleitos e dirigidos democraticamente de lutas de massa e defesa contra a repressão estatal. As fileiras do exército podem ser ganhas, com um firme e decisivo apelo para que se unam ao levante. As queixas dos soldados com os baixos salários, más condições e o tratamento de seus altos oficiais precisam ser ouvidas pelo movimento de massas, ao lado da demanda pelo direito dos soldados de organizar um sindicato livre e independente, comitês de soldados e a eleição de oficiais. Isso pode ajudar a ganhar as fileiras do exército e setores da polícia para o lado das massas. A ação de massas dos trabalhadores, incluindo uma greve geral, para derrubar o marechal de campo Mohamed Tantawi, o Supremo Conselho das Forças Armadas e todo o regime podre e brutal, precisa ser organizada ao lado de uma ofensiva para mobilizar e organizar as massas como base para um governo formado por representantes dos trabalhadores, jovens, pequenos agricultores e pobres, que possa tomar uma ação imediata contra a contrarrevolução e por direitos democráticos, passos imediatos para melhorar os padrões de vida e romper com o capitalismo.

As massas se opõem instintivamente a uma constituição aprovada ou redigida pelos militares. O CIT chama por uma rápida eleição de um verdadeiro parlamento democrático, uma assembleia constituinte revolucionária, que não apenas aprove regras para as eleições, mas também um programa para mudar as condições das massas egípcias. Tal parlamento pode ser convocado – para realmente representar a maioria da população – apenas sob o controle democrático de comitês de locais de trabalho e bairro. Os representantes dos trabalhadores e agricultores pobres devem formar a maioria neste parlamento ou assembleia constituinte. 

Uma verdadeira mudança no interesse dos trabalhadores e jovens exige uma genuína mudança democrática. Comitês populares democráticos nos locais de trabalho e bairros pode voltar a se desenvolver no caldeirão dos eventos que agora tomam conta das ruas. Tais órgãos, ligados a nível municipal, regional e nacional, podem formar a base para uma assembleia constituinte revolucionária e um governo com maioria dos trabalhadores e pobres. 

Um governo dos trabalhadores e pobres introduziria genuínas reformas democráticas, incluindo eleições regulares para representantes com o salário médio de um trabalhador e sujeitos à revogação se agirem contra os interesses dos trabalhadores e pobres. Ele também garantiria o direito de organizar sindicatos independentes, o direito de greve e o direito de organizar partidos políticos.

Estes são necessários para a luta por salários e condições de trabalho decentes, garantia de empregos, e também por habitação, educação, saúde e previdência social. Os recém-formados sindicatos independentes precisam construir seu próprio partido independente dos trabalhadores para lutar por essas ideias.

Tal governo nacionalizaria todas as grandes companhias e bancos sob controle democrático dos trabalhadores, para que a economia possa ser planejada no interesse da grande maioria da população, ao invés de ser dirigida em beneficio dos ricos.

A luta entre revolução e contrarrevolução continua, enquanto a classe trabalhadora luta para completar o que começou em 25 de janeiro – plenas liberdades democráticas, sociais e econômicas. Um partido dos trabalhadores apresentando um programa socialista, ligada às necessidades diárias de milhões de trabalhadores e pobres, poderia ganhar um apoio de massas, e cortar a falsa alternativa da Irmandade Muçulmana. Ligando-se aos trabalhadores e jovens de toda a região, tal movimento de massas poderia levar a uma federação de Estados socialistas democráticos, acabando com a pobreza, corrupção e opressão. 

O CIT defende:

  • Defender a revolução: Derrubar o Marechal Mohamed Tantawi e o Supremo Conselho das Forças Armadas.
  • Nenhum acordo com os velhos remanescentes do regime – não ao governo dos chefes militares ou da elite.
  • Nenhuma confiança em qualquer regime de “unidade nacional” baseado nos interesses da classe dominante e do imperialismo.
  • Pela urgente formação de comitês de luta de massas e defesa contra a repressão estatal, democraticamente eleitos e dirigidos. 
  • Não ao sectarismo – pela unidade de todos os trabalhadores, além das divisões religiosas
  • Fim imediato do estado de emergência. Libertação imediata de todos os prisioneiros e detidos políticos. Nenhuma perseguição dos ativistas da revolução.
  • Plena liberdade política. Liberdade de publicar e se organizar. Controle democrático sobre a mídia estatal e a abertura da mídia estatal para publicar as opiniões de todas as tendências políticas que apoiam a revolução. 
  • Nenhuma restrição do direito de greve e outras ações sindicais. Plena liberdade de formar sindicatos e ações sindicais. Por sindicatos combativos e democráticos. 
  • Formação de comitês de base democráticos nas forças armadas e na polícia. 
  • Prisão e julgamento perante tribunais populares de todos os envolvidos na repressão e corrupção do regime do SCAF. Confisco dos bens dos saqueadores e corruptos. 
  • Por eleições imediatas a uma assembleia constituinte revolucionária supervisionada por comitês de trabalhadores, pobres e da juventude.
  • Por um governo de representantes dos trabalhadores, jovens, pequenos agricultores e pobres.
  • Nacionalizar as maiores companhias e bancos sob controle democrático dos trabalhadores, para que a economia possa ser planificada no interesse da grande maioria da população, ao invés de ser dirigida em benefício dos ricos. 

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