Capitalismo em crise – uma explicação marxista

2007-2008: a bolha estoura

Crise imobiliária: Fannie Mae e Freddie Mac

Fannie Mae, fundada em 1938, e Fredie Mac, fundada em 1970, são os dois gigantes do mercado imobiliário dos EUA, com cerca de 45% do mercado, num total de US$ 5,3 trilhões de US$ 12 trilhões. Os dois tinham um caráter semi-público. Eram empresas de ações, mas com uma garantia implícita do governo federal. O papel dessas duas empresas era garantir o fluxo de crédito para o sistema imobiliário. Elas fazem isso comprando as dívidas dos bancos e institutos que fazem os empréstimos, e revendem esses em forma de títulos (securities). Isso libera os credores originais a fazer novos empréstimos.

Mas já em agosto de 2006, o índice de construção de casas tinha caído 40% comparado com o ano anterior. Com o início da crise dos empréstimos imobiliários, as duas empresas começaram a ter uma parcela ainda maior do mercado, já que outros bancos e financiadoras ficaram mais restritos a conceder novos empréstimos. Em 2008, as duas bancavam entre 60% e 80% dos novos empréstimos.

Mas com sua base de capital muito pequena, US$ 81 bilhões, comparado à enorme quantidade de créditos e preços imobiliários em queda, os temores cresciam sobre o futuro das duas.

A crise foi desencadeada por um relatório colocando que as duas precisariam de mais US$ 75 bilhões de capital para fortalecer suas reservas, já que as inadimplências aumentavam. Isso levou a fortes quedas nas ações das duas. No dia 11/07, a ação da Fannie perdeu 45% do seu valor e Freddie perdeu 47%. Comparado com o preço máximo atingido no ano passado, a queda já era de 88% e 85% respectivamente.

Uma falência das duas seria uma catástrofe global. Os títulos da Fannie Mae e Freddie Mac têm sido um investimento popular para os bancos centrais, principalmente os asiáticos. No total, eles tinham títulos no valor de US$ 979 bilhões (o equivalente ao PIB da Coréia do Sul).

O Wall Street Jornal, porta-voz dos capitalistas do centro comercial de Nova Iorque (Wall Street é equivalente a Avenida Paulista em São Paulo), foi um dos que começou a propor ao governo que assumisse o papel de proprietário das duas:

“Não nos tornamos socialistas de repente. O que os contribuintes dos EUA precisam entender é que Fannie e Freddie já praticam socialismo, mas de uma forma desonesta. Seus lucros são privatizados, mas os riscos são socializados. Nos propomos uma forma mais honesta de socialismo, com a perspectiva de reforma em longo prazo.” Ao longo prazo, propunham diminuir os empréstimos e fechar as duas empresas, mas até lá o governo ficaria com os lucros.

No dia 7 de setembro o governo anuncia um pacote de resgate de US$ 200 bilhões para as duas empresas e assumem o controle delas.

Bancos e especuladores no mundo inteiro investiram no mercado de papéis lastreados no setor imobiliário dos EUA. Um exemplo foi o banco britânico Northern Rock, o primeiro a ser nacionalizado pelo governo para evitar um colapso.

Exemplos da crise imobiliária

The Economist conta a história de Casay Serin, web-designer de 24 anos. Em 2006, ele comprou 7 casas em 5 meses, mentindo sobre o seu salário, e sem precisar pagar nada de sinal à vista. A intenção dele era revender as casas e reembolsar o lucro. Ele agora tem dívidas de US$ 2,2 mi e perdeu três das casas.

A Folha de São Paulo (25/08/2007) conta a história de como a crise afetou um brasileiro nos EUA:

“Os brasileiros e os clientes ‘subprime’ em geral tinham a expectativa de, passados três ou quatro anos, renegociar o empréstimo, pegando mais dinheiro vivo, diminuindo o valor da prestação e estendendo o prazo dos 30 anos habituais para 40 ou 50. Eles só não contavam que os juros subiriam e o valor dos imóveis despencaria.

Foi o caso de Fausto da Rocha, 47, diretor do Centro do Imigrante Brasileiro em Boston. Em 2001, ele comprou uma casa por US$ 240 mil. Deu 10% de entrada e financiou o restante, pagando uma prestação de US$ 1.200. No primeiro refinanciamento fez uma retirada de US$ 70 mil e sua parcela passou a US$ 2.500. Depois, refinanciou novamente, pegando mais US$ 50 mil para saldar dívidas dos seus seis cartões de crédito e dos dois carros que havia financiado – a mensalidade subiu para US$ 3.300.

Fausto estava com a documentação pronta para outro refinanciamento no início deste ano, quando foi surpreendido pela desvalorização da sua casa: o seu saldo devedor pulou para US$ 364 mil, e no mercado o imóvel podia ser vendido por menos de US$ 300 mil. Nesse contexto, o banco não quis mais conceder um novo empréstimo…”

Em julho 2007 Ben Bernanke sugeriu que as perdas totais no mercado subprime seriam menos que US$ 100 bilhões. Em agosto 2008 já tinha ultrapassado US$ 500 bilhões e continuava crescendo.

A crise de crédito e bancos

O economista Nouriel Roubini, professor da Universidade de Nova Iorque, que ficou famoso como o “profeta do apocalipse” por ter feitos as melhores previsões da crise atual, escreveu em fevereiro: “A recessão de 2008 vai ser mais severa por várias razões: Primeiro, temos o maior estouro de bolha imobiliária na história dos EUA, com os preços das casas provavelmente caindo de 20% a 30%. Segundo, por causa de uma bolha de crédito que foi além das hipotecas e por causa da inovação financeira e securitização imprudente, o que resultou num aperto de crédito severo. Terceiro, porque as famílias estadunidenses – cujo consumo corresponde à 70% do PIB – têm gastado bem além dos seus recursos por anos, e agora estão empilhando um montanha de dívidas, de hipotecas e outros. O aperto de crédito vai ter um efeito no consumo privado bastante sério e prolongado… As casas nos EUA vão perder entre 20% e 30% do ser valor mais alto durante a bolha e isso vai queimar de US$ 4 a US$ 6 trilhões da riqueza doméstica. Enquanto o derretimento do subprime provavelmente levará a vendas forçadas de 2,2 milhões de casas, com queda de 30% do seu valor, isso implicará que 10 milhões de domicílios terão um ativo negativo” (o valor das casas será menor que a dívida hipotecária).

A crise imobiliária desencadeou a crise financeira. George Soros chamou o que aconteceu de um “ataque cardíaco” no sistema financeiro. A mercado de crédito ficou congelado.

Calendário da crise financeira – 2007

O primeiro sinal mais grave no sistema financeiro foi quando o banco de investimentos Bear Sterns no dia 16 de julho revela que dois fundos hedge, os quais investem em subprime, perderam quase todo o valor. O pequeno tremor que antecedeu o terremoto não impediu o índice Dow Jones da bolsa de Nova Iorque atingir um novo recorde histórico em 19 de julho com 14.000,41 pontos.

No dia 24 de julho, a Countrywide Financial, subsidiária do Bank of America com 20% das hipotecas dos EUA, anuncia que o lucro caiu 33%. O governo alemão injeta US$ 4,8 bilhões para salvar IKB Deutsche Industriebank e fica claro que os bancos europeus também estão sendo atingidos pela crise.

Em agosto, dados mostravam que 20% dos possuidores de empréstimos subprime já tinham deixado de honrar os pagamentos e um milhão tinha perdido suas casas nos EUA. No dia 9 de agosto o banco francês BNP Paribas congelou 3 fundos que investe em subprime, dizendo que “… é impossível avaliar alguns ativos corretamente”.

O sistema de crédito interbancário nos EUA e na Europa está paralisado por causa da incerteza de quem estava afetado pela crise.

Novos bancos alemães tiveram problemas e precisaram de empréstimos emergenciais: Deutsche Postbank, Deutsche Bank e Commerzbank.

9, 10 e13 de agosto: Diante do crédito paralisado e pânico nas bolsas os bancos centrais da União Européia, EUA e Japão injetam US$ 355 bilhões no mercado (mais que o PIB da Argentina e Venezuela conjuntos!). Essas injeções de crédito ficaram algo que ia se repetir regularmente.

Paulo Krugman (economista, colunista do New York Times, professor da Universidade de Princeton, que acabou de ganhar o prêmio Nobel de economia esse ano) comentou: “O que vem acontecendo nos mercados é algo que realmente assusta os economistas monetários: a liquidez secou… As origens do atual esmagamento estão nas loucuras financeiras dos últimos anos, que foram tão irracionais quanto a bolha da internet. A bolha imobiliária foi apenas uma parte delas; de modo geral, as pessoas começaram a agir como se o risco tivesse desaparecido.”

Novos dados preocupantes do mercado imobiliário dos EUA mostram que a crise é generalizada, não só do subprime. O preços das casas caem pelo 4º trimestre seguido. A construção de novas casas em julho caiu em 21% comparado com julho de 2006, e está no menor nível desde 1997. “Trata-se de um dos maiores pânicos que já vi em meus 55 anos no setor de serviços financeiros”, disse Angelo Mozilo, presidente da Countrywide Financial. “Não vejo a luz no fim do túnel, por enquanto”.

23 de agosto: O banco central dos EUA, o Fed, lança uma linha de socorro aos bancos, para tentar destravar o crédito. 4 grandes bancos, Citigroup, JPMorgan Chase, Bank of America e Wachovia tomam empréstimos de US$ 500 mi “como apoio” da política do Fed.

28 de agosto: Pesquisa da Nabe (Associação Nacional de Economia e Negócios) mostra que a crise do subprime é visto nos EUA como a maior ameaça no curto prazo à economia americana (foi de 0% em março para 32% em agosto, ultrapassando o “terrorismo” que foi de 35% para 20%).

14 de setembro: O banco britânico Northern Rock recebe um empréstimo de emergência do Bank of England. O medo de que o banco quebre leva os clientes a uma “corrida ao banco”, com milhares em filas nas agências tentando tirar o seu dinheiro.

Loucuras do mercado: “Notícia” antiga derruba ação

Em períodos de crise, a bolsa reage em cima de qualquer boato. United Airlines é a segunda maior linha aérea do mundo. Ela entrou em crise em 2002 e ficou durante anos se reconstruindo. No dia 8 de setembro, a empresa teve um choque quando suas ações em algumas horas despencaram 75%!
Por trás dessa queda estava uma notícia num boletim que dizia que a empresa seria chamada a um tribunal para discutir uma reconstrução. Essa notícia baseava-se em um artigo de 2002, que um jornalista achara via Google e não percebera a data do artigo…
Depois de um tempo, a empresa divulgou uma correção e as ações se recuperaram, mas ainda fecharam com uma queda de 11%.

Calendário da crise financeira – 2008

No dia 23 de janeiro, Bush anuncia um pacote de reembolso de impostos para estimular o consumo, valendo US$ 168 bilhões. O pacote tem efeito limitado, já que muitos usaram o dinheiro para pagar dívidas, mas ajudou a economia dos EUA e ter um crescimento de 2,8% no segundo trimestre.

22 de fevereiro: Northern Rock é nacionalizado. Até as vésperas do colapso, um corretor chamava pessoas a comprar ações no banco “Compre. E diga a suas crianças, a sua avó e a seu peixinho-dourado que também devem comprar”. Gordon Brown, primeiro-ministro da Grã Bretanha, que hoje é louvado por ter lançado a linha de que os governos devem comprar ações nos bancos ao invés de só pagar as dívidas podres, resistiu até o último segundo uma nacionalização. Na verdade o partido conservador (os “tories”), partido da Margareth Thatcher e símbolo do neoliberalismo nos anos 80, exigia nacionalização do banco, enquanto o partido trabalhista (“labour”), recusava.

14 de março: Bear Sterns é vendido para JPMorgan Chase por US$ 1,2 bilhões, com a ajuda de um empréstimo de US$ 29 bilhões do Fed, que cobriria os papéis podres do Bear Sterns. “O dia em que o sonho do capitalismo de livre mercado mundial morreu”, escreve depois Martin Wolf, comentarista do Financial Times. Bear Sterns era o quinto maior banco de investimento. Tinha capital de US$ 11,8 bilhões e dívidas de US$ 395 bilhões! Bear Sterns era um dos principais vendedores de credit default swaps (um derivativo para assegurar contra perdas em outros títulos), usados para dar garantia aos títulos que envolviam empréstimos de subprime.

11 de julho: um relatório negativo colocando que a Fannie Mae e a Freddie Mac precisariam de mais US$ 75 bilhões de capital par fortalecer suas reservas, faz as ações despencarem. Fannie Mae com -45% e Freddie Mac -47%.

Uma carta do senador estadunidense Charles Schumer de 26 de julho, citando a possibilidade do colapso do banco IndyMac, leva a uma corrida ao banco. Em 11 dias, os clientes fazem saques de US$ 1,3 bilhões, o que leva à falência do banco, a terceira da história até aquela data.

No dia 7 de setembro é lançado o pacote de ajuda ao Freddie Mac e Fannie Mae de US$ 200 bilhões (mais que o PIB da Nigéria, com 140 milhões de habitantes!), que são de fato nacionalizados. Nos 12 meses, terminando em agosto, os preços dos imóveis em 20 maiores cidades dos EUA caíram 16,6%, um recorde.

15 de setembro: começa a fase mais aguda da crise financeira, com o pior dia das bolsas no mundo desde 11 de setembro de 2001.

Lehman Brothers, o quarto maior banco de investimentos, pede concordata. Lehman Brothers tinha uma alavancagem de 35 vezes os seus ativos.

Merrill Lynch, o terceiro maior banco de investimentos, é vendido ao Bank of America. Merrill Lynch tinha perdido US$ 52 bilhões durante o último ano.

AIG (a maior seguradora do mundo) recebe empréstimo de US$ 85 do Fed, com 80% das ações como segurança; uma nacionalização de fato. A crise da AIG aconteceu quando uma agência de notas de crédito (classificação de risco) rebaixou sua nota, o que ameaçou uma onda de vendas de suas ações. A AIG fazia com Bear Sterns negócios em credit default swaps, usados para garantir “grau de investimento” (boa nota) para títulos, como os títulos de hipotecas (que incluía subprime), títulos corporativos, títulos municipais etc. A AIG tinha papéis desses com valor de US$ 447 bilhões. Uma nota rebaixada da AIG significava automaticamente um rebaixamento das notas que ela assegurava. Se a AIG entra em falência, a quantidade de papéis podres no mercado aumentaria dramaticamente.

Os bancos centrais injetam mais US$ 500 bilhões de liquidez durante a semana nos mercados.

19 de setembro: o Secretário do Tesouro (ministro de finanças dos EUA), Henry Paulson, anuncia um pacote de US$ 700 bilhões para salvar os bancos, comprando títulos podres.

Muitos criticam o pacote, que simplesmente doava o dinheiro aos bancos, sem contrapartida. O pacote falha em dar ânimo ao mercado. “Depois de passar um ano e meio dizendo a todo mundo que as coisas estavam sob controle, o governo Bush agora afirma que o céu está caindo e que, para salvar o mundo, temos de fazer exatamente o que eles estão dizendo, e já!”, diz Paul Krugman.

George Soros: “O histórico de Paulson não inspira a confiança necessária para que lhe sejam concedidos plenos poderes sobre US$ 700 bilhões”.

22 de setembro: O Fed aprova os planos de Goldman Sachs e Morgan Stanley de se tornarem bancos comuns. Os dois eram o primeiro e segundo maiores bancos de investimento. Com a queda anterior de Merrill Lynch, Lehman Brothers e Bear Sterns, não restou nenhum dos grandes bancos de investimento. Esse bancos jogaram um papel importante nas grandes privatizações pelo mundo inteiro, mediando e organizando as vendas, e bancando a credibilidade dos negócios.

Nouriel Roubini comenta: “A semana que passou determinou o fim do sistema bancário paralelo criado nos últimos 20 anos. Por causa de uma regulação maior dos bancos, a maior parte da intermediação financeira na últimas duas décadas cresceu dentro de um sistema paralelo cujos membros são corretoras-operadores do mercado, “hedge funds”, grupos de “private equity” (fundos privados de participação em empresas), títulos complexos e obscuros, fundos mútuos e empresas de créditos hipotecários não bancárias.”

24 de setembro: o Congresso dos EUA aprova um pacote de US$ 25 bilhões para ajudar as três grandes montadoras.

24 de setembro: FMI eleva para US$ 1,3 trilhões a projeção do prejuízo causado pela crise no mercado mundial.

25 de setembro: Washington Mutual (fundado em 1889) quebra: a maior bancarrota de um banco na história dos EUA (US$ 328 bilhões). Isso depois de 10 dias de corrida ao banco, na qual os clientes retiraram US$ 16,4 bilhões do banco, 9% de todos os depósitos. JPMorgan Chase compra o banco.

29 de setembro: A Câmera de Representantes do congresso dos EUA rejeita o plano do Paulson. Muitos deputados votaram, não apenas por medo de uma reação dos eleitores nas eleições em novembro. Mas porque também havia muitos entre os mais à direita, que achavam que qualquer intervenção do estado é “socialismo”.

01 de outubro: Uma versão modificada do pacote de Paulson é aprovada pelo congresso estadunidense. O pacote é expandido à US$ 850 bilhões, incluindo cortes de impostos e incentivos fiscais. Os bancos que recebem ajuda vão ter que limitar os pagamentos dos executivos e o governo assumirá ações nas empresas socorridas.

06-10 de outubro: novas grandes quedas nas bolsas de valores. Nas três maiores economias do mundo, as bolsas tem as maiores quedas da história durante uma semana: EUA (-18%), Japão (-24%) e Alemanha (-24%). No dia 10 de outubro, seis bolsas não abrem: Islândia, Rússia, Ucrânia, Indonésia, Áustria e Romênia.

07 de outubro: EUA anuncia que vai comprar papéis diretamente das empresas, os chamados “papéis comerciais”. O mercado desses papéis, que financia grande parte do dia a dia das empresas, estava praticamente parado. Empresas menores começaram a ter problemas para pagar salários. O Governo britânico anuncia que usará US$ 87 bilhões para comprar ações de bancos.

08 de outubro: Em uma ação coordenada inédita, os bancos centrais de EUA, UE (zona euro), GB, Suécia, Canadá e Suíça anunciam corte de 0,5% dos juros.

A Grã Bretanha anuncia pacote de US$ 867 bilhões (equivalente ao PIB combinado da Indonésia, África do Sul e Nigéria, com uma população de 423 milhões!) para socorrer o sistema bancário.

10 de outubro: Ministros das finanças do G7 fazem um pronunciamento seguindo a linha adotada por Gordon Brown, dizendo que os governos devem comprar também ações dos bancos como uma maneira de injetar capital, não só títulos podres.

Primeiro colapso do setor financeiro japonês. Seguradora Yamato, com interesses no mercado imobiliário no estado Nevada (EUA) quebra.

Silvio Berlusconi, primeiro ministro da Itália, revela que se discute suspender o comércio nas bolsas até que novas regras sejam definidas para a economia mundial.

13 de outubro: os governos da União Européia anunciaram medidas que totalizavam US$ 2,5 trilhões. Nunca na história do capitalismo os governos intervieram com tanta força, a não ser durante as guerras.

O governo britânico começa a comprar bancos em crise, com compra de ações no Royal Bank of Scotland, Lloyds e HBOS.

O governo dos EUA também começa a compra de ações. US$ 250 bilhões dos US$ 700 bilhões do pacote de Henry Paulo destinado a ajudar os bancos serão usados na compra de ações. A metade disso o governo usará para comprar parte dos nove maiores bancos para dar “credibilidade” ao esquema. Na prática, significa dar dinheiro para bancos que não precisam, sem ter controle sobre eles.

16 de outubro: Até bancos suíços, símbolo de solides bancária, tem grandes problemas. O UBS, o maior banco suíço e o mais renomado gerenciador de fortunas do mundo, teve que receber ajuda do governo, que comprou 9,3% das ações, por US$ 5,25 bilhões e poderá transferir ao governo ativos de risco em até US$ 60 bilhões. Durante o terceiro trimestre do ano, os clientes (muito deles ricos), retiraram cerca de US$ 44 bilhões de suas contas no UBS!

19 de outubro: Na Coréia do Sul, o governo anunciou um pacote de US$ 130 bilhões (13% do PIB de 2007). A moeda, o won, desvalorizou 35% ante o dólar o os bancos estão com dificuldades para cumprirem o pagamento de empréstimos feitos em dólar.

21 de outubro: O Fed anuncia que vai financiar com até US$ 540 bilhões a rolagem de dívidas de bancos e empresas que estiveram vencendo em até três meses, e também injetará dinheiro em fundos de investimento. Essas medidas não fazem parte do pacote de US$ 700 bilhões.

27 de outubro: a bolsa de Tóquio atinge o menor nível desde 1982.

29 de outubro: O Fed abre empréstimos de US$ 120 bilhões para quatro países: Brasil, México, Coréia do Sul e Cingapura para fornecer dólares.

30 de outubro: O governo japonês anuncia o segundo pacote para estimular a economia em dois meses. Os dois pacotes conjuntos são de US$ 400 bilhões (o equivalente à 9% do PIB).

Só durante o mês de outubro as ações negociadas nas bolsas do mundo perderam US$ 5,8 trilhões em valor, quatro vezes o PIB brasileiro, segundo Standard & Poor! Durante o ano inteiro a perda é de US$ 16,2 trilhões, o equivalente a um terço do PIB mundial!

Nesse período, mais grandes bancos caem, são comprados, precisam de ajuda emergencial dos governos, ou são nacionalizados nos EUA, Grã Bretanha, Bélgica, Alemanha, Suécia, Coréia do Sul, Rússia, Islândia…. Na Alemanha, uma pesquisa do jornal “Frankfurter Allgemeine Zeitung” diz que 48% dos alemães não confiam no seu banco.

O governo chinês lançou no dia 09 de novembro um grande pacote de US$ 586 bilhões para estimular a economia nos próximos dois anos. Isso mostra como o governo está desesperado para manter o crescimento, temendo as conseqüências sociais.

10 de novembro: Circuit City, a segunda maior rede dos EUA de varejo de eletrônicos, pede concordata. O governo dos EUA anuncia que vai ampliar a ajuda à AIG de US$ 85 bilhões para US$ 150 bilhões, já que a AIG ainda estava com grandes problemas e estava sendo forçada a vender ativos abaixo do valor do mercado

14-15 de novembro: O G20 se reúne, mas apesar de declarar 47 medidas, a maioria é retórica, já que não existe organismo internacional com poder em cima dos governos. Se fala de dar mais poder ao Sul, aos países emergentes, mas não resta dúvida que os países ricos vão querem jogar o maior peso possível da crise em cima dos países mais pobres.

15 de novembro: o FMI aprova empréstimo de US$ 7,6 bilhões para Paquistão, que está em profunda crise.

20 de novembro: O pânico faz nova visita ao mercado financeiro. Os juros do título do governo dos EUA com vencimento em três meses, voltou a 0,03%, o mesmo nível que depois de 15 de setembro, que era inédito desde a 2ª Guerra Mundial. Isso significa que o mercado estava buscando um lugar seguro para guardar o dinheiro no curto prazo, mesmo se o rendimento era zero.

O governo francês lança um pacote de US$ 26 bilhões para ajudar empresas francesas, para evitar que as indústrias francesas caem em mãos estrangeiras. “No dia em que não construirmos mais trens, aviões, carros e navios, o que restará da economia francesa? Memórias… Não vou deixar que a França vire uma reserva turística”, disse o presidente Sarkozy.

23 de novembro: O Citibank, o segundo maior banco dos EUA, com US$ 2 trilhões em ativos e mais de 200 milhões de clientes em 106 países, esteve em apuros nas últimas semanas. O banco acumulou perdas de US$ 20 bilhões desde o último trimestre de 2007. Na semana 17-21 de novembro as ações caíram com 60%, levando o valor de mercado do banco à US$ 20 bilhões, comparado com US$ 274 bilhões no fim de 2006. O banco tem US$ 306 bilhões em ativos podres e sem ajuda poderia ir a falência. O governos dos EUA foi forçado a uma nova intervenção para salvar o banco. O governo vai comprar ações por US$ 20 bilhões no banco, mas também garantir até US$ 269 bilhões para cobrir perdas com ativos pobres do banco. Isso além da ajuda de US$ 25 bilhões já implementada antes. O governo dos EUA fica assim com 7,8% das ações e se torna o maior acionista. Mas na verdade o governo já poderia ter a maioria das ações no banco, se tivesse comprado ações ao preço de mercado.

O banco anunciou que vai demitir 52 mil dos seus 352 mil funcionários no mundo inteiro.

O Citybank era o maior credor da dívida externa brasileira em 1987, quando José Sarney, então presidente, decretou moratória (suspensão do pagamento) da dívida externa. Os executivos da Citybank pressionaram, além de Sarney, os presidentes Collor, FHC e Lula a cortar gastos no orçamento para pagar a dívida. Na verdade, o banco nessa crise continua na mesma linha, pegando grandes quantias de dinheiro público, mas agora para não quebrar!

24 de novembro: O presidente eleito, Barack Obama, diz que está preparando um grande pacote de investimentos em infra-estrutura, reforma de escolas e meio ambiente com a meta de gerar 2,5 milhões de empregos até 2010, além de auxílio à classe média, extensão de benefícios a desempregados e ajuda a governos estaduais e municipais. Se fala que esse pacote vai ser uma nova edição do “New Deal” dos anos 30. Barack Obama não diz quanto vai ser investido, mas senadores do partido democrata falam de US$ 700 bilhões.

Obama também anuncia que seu Secretário do Tesouro (ministro de finanças) vai ser Timothy Geithner, o atual chefe do Fed em Nova Iorque. Larry Summers, ministro de finanças durante Bill Clinton, vai ser seu principal conselheiro em assuntos econômicos. O mercado se anima com essas notícias, junto com a notícia do pacote de resgate do Citibank e tem um dia de forte altas.

O governo britânico, também no dia 24 de novembro, anuncia um pacote de estímulo da economia, principalmente um desconto do equivalente ao ICMS, de US$ 32 bilhões. O déficit do orçamento britânico é calculado de chegar a 8% do PIB em 2010 e ser o maior do G7.

A emissora de TV paga CNBC publica um levantamento do total de dinheiro público gasto ou comprometido para salvar o sistema financeiro até esse dia. O total é de US$ 4,6 trilhões, mais do que o dobro do que os EUA gastou durante a 2ª Guerra Mundial (US$ 2 trilhões, ajustados ao valor de hoje)!

No dia seguinte, 25 de novembro, o Fed anuncia um novo pacote, de US$ 800 bilhões. US$ 200 bilhões irão para instituições financeiras com papéis baseados em títulos de dívidas de consumo (como dívidas de cartões de crédito, por exemplo), para aumentar o crédito ao consumidor. US$ 600 bilhões irão para comprar títulos lastreados em hipotecas, mostrando que a crise imobiliária continua a gerar problemas.

26 de novembro: A União Europeia anuncia um pacote de estímulo a economia de US$ 320 bilhões.

G7: grupo composto pelos 7 países mais ricos do mundo: (EUA, Japão, Alemanha, Grã Bretanha, França, Itália e Canadá), que se reune desde 1976

G8: Desde 1997, a Rússia foi convidada para as reuniões da G7, formando uma “G8”
G20: Grupo mais amplo formado em 1999. Inclui o G7, mais África do Sul, Arábia Saudita, Argentina, Brasil, China, Coréia do Sul, Índia, Indonésia, México e Turquia e a União Européia. Esses países têm em total 88,7% do PIB mundial.

União Europeia: Anteriormente chamada Comunidade Econômica Europeia (CEE) e Comunidade Europeia (CE). Bloco de 27 países da Europa. 15 desses adotaram uma moeda comum, o euro, esses 15 países compões a Zona Euro.

O exemplo Islândia

Os bancos islandeses só foram privatizados no início dos anos 2000, mas rapidamente se adaptaram ao cassino internacional. Levantando crédito fizeram grandes negócios, comprando empresas na Escandinávia e na Grã Bretanha. Os três maiores bancos agora têm dívidas que totalizam US$ 6 bilhões, um valor três vezes maior que o PIB do pequeno país, com 300 mil habitantes.
Com a crise internacional, a bolha estourou. Os 3 maiores bancos foram nacionalizados: Glitnir, depois Landsbanki e, por fim, o maior, Kaupthing. A nacionalização fez as ações perderem valor o que afetou os 10% dos habitantes que tinham ações nos bancos, mas também afetou os fundos de pensão, mais de 100 municípios na Grã Bretanha e 300 mil britânicos (o equivalente à população total da Islândia!) que tinham investido US$ 1,6 bilhões nos bancos islandeses! O governo britânico acusou a Islândia de agir ilegalmente e usou a lei anti-terrorismo para congelar os ativos dos bancos islandeses na Grã Bretanha.
O primeiro ministro, Geir Haarde, anunciou na TV que o país estava ameaçado de “bancarota nacional”. No mês de outubro, a bolsa permaneceu fechada durante grande parte do tempo. Quando ela abriu durante um dia, o índice caiu 76%, totalizando uma queda de 81,2%.
O valor da moeda, que era 85 coroa por um euro no ano passado, caiu para 160 coroas por um euro no início de outubro, e no dia 9 de outubro colapsou para 340 coroas por um euro!
A inflação está em 20-25% e recentemente o governo elevou a taxa de juros de 12% para 18%, para tentar estabilizar a moeda. A previsão agora é de uma queda de 10% do PIB.
Vários comentaristas apontaram para o fato de que a crise foi causada pelas ações de 20-30 pessoas, o que mostra como o sistema é antidemocrático.
A Islândia também é um exemplo de como os representantes da economia capitalista são incapazes de prever o andamento do seu próprio sistema. Pouco antes da crise, o FMI soltou um relatório elogiando a economia do país dizendo que a Islândia tinha “perspectivas de dar inveja”.