China desencadeia pânico nos mercados globais
Foi a “segunda-feira negra”, exclamou a agência oficial de notícias chinesa Xinhua após a queda de 8,5% nas bolsas de valores no país no dia 24 de agosto. Isto provocou as mais acentuadas quedas nos mercados de ações mundiais desde a crise financeira de 2008, sobre crescentes temores de uma recessão global impulsionada pela China.
Em 2008, o epicentro da crise financeira mundial foi Wall Street, com o colapso bancário dos EUA. Desta vez, é a crise econômica da China desencadeada pela visível perda de controle sobre a situação do seus líderes. A “minidesvalorização” do yuan, a moeda chinesa, em 11 de agosto foi um choque que derrubou a falsa sensação de segurança da maior parte do mundo capitalista, que acreditava que Pequim “tinha um plano” para lidar com a desaceleração cada vez mais acentuada do país.
Desde então, os mercados de ações perderam mais de US$ 5 trilhões de valor, o dobro do PIB do Brasil. Esta destruição em massa de riqueza no espaço de poucos dias prova que o capitalismo é um sistema econômico louco e moribundo.
O ex-ministro de finanças dos EUA Larry Summers twittou: “Como em agosto de 1997, 1998, 2007 e 2008, podemos estar na fase inicial de uma situação muito grave.”
Queda dos preços das commodities
Além da queda nas bolsas de valores ao redor do mundo, os preços de matérias-primas como petróleo, cobre, alumínio e níquel caíram para os níveis mais baixos desde o início da crise global em 2008. O preço do petróleo caiu de US$ 115 por barril um ano atrás, para US$ 43 agora. A situação se agrava para produtores de petróleo, como Rússia e Venezuela, que já estão em recessão.
A China tem sido o principal motor do crescimento mundial nos últimos anos, contribuindo com cerca de um terço do crescimento global em comparação com 17% dos EUA. O país consome cerca de metade dos metais do mundo e domina o mercado de outras commodities (matérias-primas), incluindo produtos agrícolas. As quedas acentuadas dos preços dessas commodities afetou o crescimento em muitos países exportadores, como Brasil, mas também está aumentando as pressões deflacionistas em toda a economia mundial.
Enquanto a queda dos preços pode fornecer um impulso de curto prazo para países que importam commodities, a economia começa patinar, já que uma deflação prolongada ameaça paralisar o crescimento econômico e exacerbar os problemas da dívida, que estão crescendo mundialmente, incluindo na própria China. Isto é o que aconteceu no Japão, que entrou em uma crise deflacionária em 1990 – marcada pela estagnação econômica e níveis crescentes de dívida – do qual nunca saiu. A China, e até mesmo a economia mundial, exibem muitas características semelhantes às do Japão da década de 1990.
Choque cambial
Quando a China desvalorizou o yuan há duas semanas, algo que o regime tem sido historicamente relutante em fazer, isto abalou o sistema capitalista global. Confirmou as suspeitas de que o mal-estar econômico chinês é muito pior do que Pequim tenha admitido ou relatado em suas estatísticas oficiais, que são adulteradas e enganosas. A desvalorização, mesmo ainda sendo mínima, aumentou o medo por uma chamada “guerra cambial”, com outros países seguindo o exemplo.
A maneira confusa em que a desvalorização da China foi executada deixou comentaristas capitalistas coçando a cabeça em descrença. A depreciação da moeda – por 3 por cento em relação ao dólar até agora – é pequena demais para ter qualquer impacto real sobre as exportações da China. Além disso, o regime e o banco central da China tiveram de intensificar as suas intervenções cambiais para apoiar o yuan, ou arriscar uma fuga ainda maior de capital da China. Inéditos US$800 bilhões deixaram a China nos últimos cinco trimestres, com especuladores chineses e estrangeiros buscando um “refúgio seguro”.
A desvalorização é vista como “o pior dos mundos”. A decisão criou caos nos mercados globais e desencadeou uma reação em cadeia de queda das moedas, mas sem dar qualquer impulso real para a economia da China. As moedas da Malásia e Indonésia caíram para seus níveis mais baixos desde a crise asiática de 1998, em meio a uma tendência de queda geral das moedas asiáticas (com exceção do iene japonês, que é visto como uma moeda “refúgio seguro”). O rublo russo, o rand sul-africano e a lira turca atingiram os seus níveis mais baixos da história.
Erros espetaculares
O regime chinês tem lidado espetacularmente mal com o colapso do mercado de ações, gastando US$ 1 trilhão em medidas de apoio durante as últimas dez semanas, sem efeito nenhum. A grande queda do dia 24 de agosto, a pior dos últimos oito anos, levou os preços das ações abaixo do nível de 8 de julho, quando a operação de resgate do governo foi lançada.
Estes eventos marcaram um ponto de inflexão de como o regime é visto. Até recentemente, os líderes chineses eram apontados como “tecnocratas ideais”, saudados pelos principais representantes do capitalismo global.
Uma sucessão de medidas fracassadas nos últimos meses – primeiro, inflar uma bolha do mercado de ações insustentável, em seguida, tentar sustentá-la depois que ela tinha estourado, culminando em uma desvalorização da moeda hesitante e em pânico – têm detonado a autoridade dos economistas de Pequim. Agora, foi a falta de medidas de sustentação que agravou a queda do dia 24 de agosto. O regime percebeu evidentemente que não pode sustentar tanto o mercado de ações como a moeda e optou por se concentrar no último. Estas medidas demonstram os limites do poder de Pequim de controlar a economia.
A queda das bolsas de valores era inteiramente previsível, já que os preços das ações perderam qualquer conexão com a economia real. Os dados econômicos recentes confirmaram a gravidade dos problemas da China. A produção industrial caiu por cinco meses seguidos e agora está no nível mais baixo em seis anos. Setores como smartphones e carros inteligentes, em que a China se tornou o maior mercado do mundo, agora estão contraindo.
Apesar de uma recente “estabilização” dos preços de imóveis, o início de novas obras de construção caiu 16,8% nos primeiros sete meses deste ano. Nos últimos anos, a China foi responsável por metade da construção global – assim, numa base anual, isso se traduziria em uma queda de 8% na construção mundial. Além disso, algumas das maiores empresas dos EUA perderem bilhões de dólares em valor por causa de sua dependência do mercado chinês. Isso inclui a Apple, General Motors, Yum Brands (KFC e Pizza Hut), que vendem mais produtos na China do que nos EUA.
Crise global do capitalismo
O CIT e sua seção chinesa já avisaram que a próxima fase da crise capitalista global pode ser “Made in China” – uma perspectiva que está se tornando cada vez mais provável. Mas os problemas da economia chinesa têm suas raízes no impasse histórico do capitalismo global.
Em 2008, quando a crise mundial ameaçou a levar a um colapso nos moldes da depressão dos anos 1930, o regime chinês lançou um gigantesco programa de estímulo com base em um aumento sem precedentes do crédito. Isto produziu inicialmente efeitos impressionantes com o PIB da China acelerando e parecendo escapar da recessão global.
Stephen King, economista-chefe do banco HSBC, descreveu a China como “o amortecedor para a economia global”. Hoje seu papel foi revertido a uma fonte de choques para o capitalismo global, já que o crescimento foi baseado em uma acumulação insustentável de dívida. As dívidas totais do país quadruplicaram de US$7 trilhões em 2007 para US$28 trilhões hoje. Isso reduziu a capacidade do regime em sair da crise através de novos estímulos.
O problema da dívida é mundial
Os problemas da China refletem o crescimento da dívida global. A economia mundial entrará na próxima recessão em situação muito pior do que entrou na última. Mesmo com a instável “recuperação” econômica dos últimos anos, setores inteiros da economia capitalista só respiram por aparelhos, dependendo de suporte dos governos e bancos centrais, especialmente através do “afrouxamento monetário” (injeção de enormes quantidades de dinheiro na economia), de que a economia não tem sido capaz de libertar-se. Se as taxas de juros permanecem em níveis historicamente baixos de hoje (perto de zero, ou em alguns casos, até negativo) significa que os capitalistas terão ainda menos armas à sua disposição com a qual a enfrentar uma nova recessão.
Ao mesmo tempo, a classe trabalhadora tem enfrentado austeridade ininterrupta desde o início da crise em 2008, sofrendo quedas acentuadas do padrão de vida em muitos países, o que significa que uma nova recessão vai desencadear movimentos políticos sem precedentes e desafios aos governos capitalistas. É esse medo que está impulsionando a turbulência nos mercados globais.