Novo ano de crise e lutas na Europa

O foco da crise econômica mundial permanece na Europa e as dívidas continuam sem solução. O PIB da Zona do Euro (os 17 países que adotaram o euro como moeda) deve voltar a cair esse ano, confirmando o “duplo mergulho” da crise. Enquanto isso a crise social provocada pela política de cortes e austeridade se agrava à medida que os governos e bancos centrais tentam salvar o sistema financeiro desta situação, tudo isso à custa dos trabalhadores.

Recentemente 25 dos 27 países (todos menos a Grã Bretanha e a República Checa) que compõe a União Europeia (UE) adotaram regras mais rígidas para impor uma “disciplina” fiscal. Esse tratado impõe multas aos países que possuem um déficit nos orçamentos públicos acima de 3% do PIB.

Esse tipo de regra não é nova, mas sempre foram ignoradas quando os países mais ricos, como Alemanha e França, romperam com elas. Entretanto, para os países menores e em maiores apuros, com certeza a regra vai ser seguida à risca, com já vemos no caso da Grécia.

O novo tratado vai ser colocado em teste imediatamente. O primeiro ministro Mariano Rajoy da Espanha anunciou que esse ano o déficit público vai ser de 5,8% do PIB, ao invés do 4,4% prometido anteriormente. O desemprego na Espanha chegou aos incríveis 23,3%, tornando difícil para o governo acelerar os ataques.

Na Irlanda o novo tratado vai ter que passar por um plebiscito. A população da Irlanda já votou “não” duas vezes contra tratados da UE. Na última vez o Socialist Party (CIT na Irlanda) jogou um papel importante na campanha pelo não, o que impulsionou a eleição de Joe Higgins do SP ao parlamento europeu.

“Morfina financeira”

Mas se de um lado a política dos governos é de cortes, arrocho e austeridade para os trabalhadores, do outro os bancos centrais continuam a despejar dinheiro barato para salvar os bancos.

O Banco Central Europeu, sob a nova direção de Mario Draghi, fez duas enormes injeções de dinheiro no mercado financeiro nos últimos dois meses. Mais de 1 trilhão de euros foram emprestados a juros de 1% (abaixo da inflação) com prazo de três anos aos bancos. Isso para ajudar a recapitalizar os bancos e indiretamente os países com grandes dívidas (já que os bancos usam boa parte desse dinheiro barato para comprar títulos públicos).

A revista financeira britânica The Economist chama isso de “morfina financeira”, já que alivia a dor, mas não cura.

Além de ser uma tentativa salvar os bancos e estimular o crédito e consumo, essa política tem também outro efeito. Uma boa parte dessa enorme quantidade de dinheiro barato, que não é investido em produção (na verdade vemos uma literal greve do capital, por exemplo nos EUA, onde as grandes empresas tem US$ 2 trilhões nos cofres, que não são investidos em produção), acaba indo para países onde podem gerar mais lucros, como no Brasil, onde os juros são altos. Um efeito disso é que moedas como o dólar e o euro perdem em valor, o que beneficia a indústria dos EUA e da Europa. Assim a crise é exportada para aos países que sofrem com a valorização de suas moedas e com a perda de competitividade.

No momento, esse política de imprimir dinheiro em grandes quantidades está podendo ser implementada sem criar uma crise inflacionária generalizada. Isso corre devido a crise e a baixa demanda, somada ao excesso de capacidade nas principais indústrias (com o grande crescimento da indústria chinesa), limitar a capacidade das empresas a aumentarem os preços. Mas há outros efeitos inflacionários já existentes. A enorme quantidade de capital especulativo leva a criação de novas bolhas, em certas commodities, ou em alguns lugares no setor imobiliário, etc., que pode gerar novas crises financeiras. Num segundo momento a inflação pode voltar com força, o que novamente vai afetar principalmente os trabalhadores e pobres.

China anuncia crescimento menor

O principal motor da economia mundial começa a dar sinais de esgotamento do crescimento desenfreado. O governo chinês reduziu a meta de crescimento de 2012 para 7,5%. É a primeira vez desde 2004 que a meta é inferior a 8%, que é considerado o patamar mínimo para engolir o influxo de mão de obra para as cidades e evitar um aumento nos protestos. Um dos fatores é uma queda do crescimento das exportações, um dos principais motores da economia chinesa. Esse ano a estimativa é que o comércio com o exterior cresça somente em 10%, comparado com 22,5% em 2011. Mas em geral a China sofre com um excesso de investimentos especulativos e também na produção, como uma gigantesca bolha imobiliária que ameaça estourar, além do aumento da inflação.

Uma crise chinesa teria efeitos imediatos no mundo inteiro, incluindo o Brasil.

Lutas históricas – mas ainda falta alternativa

Essa política de ataques a classe trabalhadora não tem sido sem resposta. Desde o começo da crise vimos 20 greves gerais na Europa: 16 na Grécia (duas em fevereiro esse ano), 2 em Portugal (e mais uma convocada para 22 de março), 1 na Itália (e mais uma convocada para o dia 9 de março), 1 na Espanha, e 1 Bélgica (no dia 30 de janeiro esse ano). Além dessas vimos importantes greves e protestos em vários outros países, como Grã Bretanha e França.

Em cima disso vimos os movimentos da juventude, principalmente na Espanha, Grécia e Portugal. Nesse momento, os estudantes espanhóis estão travando uma grande batalha contra os cortes na educação. No dia 29 de fevereiro houve uma greve geral estudantil no país. O principal foco da luta tem sido em Valencia, onde o governo de direita (PP) cortou até o aquecimento das escolas, em pleno inverno!

O problema é que essas lutas ainda não se transformaram em uma alternativa política à altura das tarefas. A esquerda ainda está numa situação frágil, com as novas alternativas e partidos tendo uma postura muito tímida e recuada, em face dos ataques. Participar na construção das lutas, e ao mesmo tempo propor táticas, estratégia e um programa socialista para derrotar esses ataques e seus governos, levantando uma alternativa ao sistema capitalista como um todo – é o desafio e a tarefa dos socialistas.