Escola do CIT: Grécia em ebulição

A raiva em ebulição da classe trabalhadora e da juventude contra o establishment faz com que a elite política não possa mais ser vista nas ruas da Grécia sem ser cercada por manifestantes enraivecidos.

Um exemplo dessa raiva foi quando parlamentares gregos e vários colegas europeus almoçavam em um restaurante exclusivo da ilha de Corfu. A notícia de sua presença rapidamente se espalhou e em minutos um protesto de centenas de pessoas do lado de fora os obrigou a fugirem por helicóptero.

Andros, Secretário Geral do Xekinima (CIT na Grécia), forneceu na Escola de Verão do CIT um relato inspirador dos movimentos explosivos que avassalaram a Grécia no último ano em resposta à crescente crise econômica e as consequências do resgate da União Europeia/FMI para a classe trabalhadora e a juventude. 

Andros explicou que a razão por esse resgate não tinha nada a ver com proteger os interesses do povo grego, é um resgate aos banqueiros. Nada do dinheiro irá para apoiar os trabalhadores e jovens gregos, pelo contrário, irá direto para os bolsos dos bancos. O único interesse do governo e dos capitalistas europeus é minimizar as perdas dos bancos europeus e tentar proteger o futuro do euro. 

Incrivelmente, mesmo com o resgate e os sacrifícios que esperam que o povo grego faça, isso não fará nada para melhorar as perspectivas para a economia ou para o euro. O primeiro “memorando” foi assinado em maio de 2010 e previa que a dívida nacional aumentaria para 147% do PIB até o fim de 2013, e depois declinaria para 120% do PIB até o fim de 2020. Portanto, depois de 10 anos de uma avalanche de ataques, a dívida grega ainda seria de 120% do PIB. Essa era a perspectiva otimista – a realidade é que apenas um ano depois do primeiro resgate, está em 160%, rumando para 198% até 2015, e é por isso que precisam do segundo resgate. 

O novo resgate que está sendo celebrado pela classe dominante europeia não fará nada pelas massas gregas. Os ataques já iniciados como resultado do último resgate continuarão – mas, ao invés do povo grego ficar sob o tacão por 10 anos, ficará por 30 anos! 

Mesmo antes dessas medidas de austeridade começarem, as condições dos trabalhadores já eram bastante difíceis. O salário mínimo era de miseráveis 670 euros por mês, 65% dos aposentados recebiam menos de 600 euros por mês. 

Sob os termos do novo resgate, os salários serão cortados em 50%, as aposentadorias cairão para 500 euros por mês, o salário mínimo cairá para 520 euros por mês e o desemprego continuará a ser realidade para 17-25% da população. O governo também aprovará uma venda generalizada das companhias públicas, mas por 30% abaixo de seu valor. 

A classe dominante grega, numa tentativa de deter o crescente movimento da classe trabalhadora, também começará a atacar direitos sindicais básicos, como o direito de ação coletiva, como greves, e já tem havido ampla demissão de ativistas sindicais. 

Mas não se pode manter as pessoas sob o tacão por muito tempo sem que elas recorram ao instinto humano básico de “lutar ou fugir”. Como vimos, milhões de trabalhadores e jovens gregos tomaram as ruas e praças para protestar contra o devastador impacto que os cortes impõem às suas vidas. 

Em junho, 29% da população participou de duas greves gerais e mobilizações de massa, inspirados pelas revoluções do Norte da África e Oriente Médio, na Atenas central, e outras praças por toda a Grécia.

Houve uma enorme campanha de não-pagamento contra pedágios, taxas do transporte público e a nova “taxa de entrada” nos hospitais, que envolveu dois milhões de pessoas. O povo de Keratea, uma pequena cidade, esteve em revolta por quatro meses com a tentativa de construir um aterro sanitário na área, e ganhou uma vitória parcial. Vimos a luta dos motoristas de ônibus, que ficaram em greve por 3 meses, as ocupações da prefeitura de Atenas por terceirizados e uma greve de fome por 300 imigrantes. 

É claro que esses movimentos não vieram sem resistência, pelo contrário, algumas vezes encontraram uma repressão muito brutal. Andros descreveu como em 29 de junho, o governo decidiu “limpar a praça”, contra a ocupação da praça Syntagma, e como a polícia usou a política de “terror desencadeado” sobre manifestantes do lado de fora do parlamento. Mas a resposta no fim do dia foi a mobilização da maior assembleia de todas, com 10 mil pessoas.

Contudo, há policiais que apoiam o movimento. Andros descreveu como, no mesmo dia que o governo ordenou a “limpeza das praças”, um oficial de polícia na linha de frente da tropa de choque postada em frente ao parlamento, jogou fora seu escudo e cassetete e disse: “Me recuso a atacar o povo!” Ele foi severamente surrado por seus próprios colegas e forçado a ficar na linha de trás, chorando. Esse não foi um incidente isolado.

Movimento dos “Indignados”

O movimento dos “Indignados” – de jovens que ocupam as praças das cidades – é um movimento que vem de baixo. O CIT participou dos protestos desde suas etapas iniciais. O movimento tem um caráter muito contraditório. Ele pode ser antipolítico, antipartido, e bastante “patriótico”, mas também pode atrair as massas. Os camaradas do Xekinima querem influenciar o movimento com ideias classistas e socialistas, e não deixá-lo nas mãos dos nacionalistas. Contudo, os apoiadores do CIT não apenas intervêm nas ruas, mas também foram aos bairros, encorajando as pessoas a irem à praça. 

Ao participarem das discussões nas praças, os apoiadores do CIT foram muito habilidosos e concisos com suas ideias, programa e demandas para levar a luta adiante – não uma tarefa fácil quando você tem apenas 90 segundos para falar!

Na primeira etapa, os membros do CIT reivindicavam ligar os movimentos nas praças com os trabalhadores e o movimento grevista – e isso exigia um debate – e seu caso foi ganho. Os camaradas fizeram campanha sobre a questão da dívida e pela nacionalização dos bancos, e ao fim de um mês de intervenção e discussão, as assembleias concordaram com as seguintes demandas, que eram muito próximas das políticas do CIT grego:

  • Abaixo o novo (chamado “intermediário”) Memorando (imposto pela Troika para liberar o 5º parcela do resgate inicial)
  • Abaixo o governo
  • Ligar-se à classe trabalhadora – convidar trabalhadores grevistas à praça, expandir as assembleias para os locais de trabalho e bairros de trabalhadores
  • Não pagamento da dívida pública
  • Nacionalizar os bancos
  • Por a economia sob controle do povo, com propriedade e controle social

Andros descreveu como um aspecto de nosso programa, a demanda por um governo dos trabalhadores – que pode ser difícil de explicar, especialmente no contexto de falta de uma luta socialista de massas – com o crescimento das assembleias nas praças, se tornou amplamente compreendido e bem recebido. Os membros do CIT discutiram o papel das assembleias, defenderam a expansão das assembleias para os locais de trabalho e bairros, por assembleias locais para eleger pessoas a uma assembleia central para desenvolver a democracia. Os camaradas acrescentaram a questão de um “parlamento” de delegados eleitos da assembleia, aberto ao direito de revogação a qualquer momento – para ter os melhores lutadores e trabalhadores em tal parlamento representativo. 

Em último caso, esses movimentos falharam em impedir que o governo aprovasse as medidas de austeridade. Uma das fraquezas das assembleias é que elas não se expandiram para as comunidades de trabalhadores ou locais de trabalho. A classe trabalhadora não está representada adequadamente nas assembleias – não era possível ficar em assembleias que duravam quatro ou cinco horas por dia, quando as pessoas tinham que trabalhar!

Papel da esquerda

Na discussão plenária, um camarada grego falou sobre a falta de direção de partidos de esquerda e de dentro do movimento sindical. Não há um partido de esquerda de massas na Grécia que dê a direção política, que é vital para o movimento ir adiante. A formação de esquerda Syriza, na verdade, não existe desde o outono de 2010.

A tendência de majoritária Synaspismos do Syriza é muito fraca em relação aos movimentos da classe trabalhadora. Ela se recusou a apresentar um programa radical para o movimento, e embora apoie o cancelamento da dívida no mundo neocolonial, não apoia isso na Grécia. Na verdade, a maneira como atua demonstra que seu programa tem como objetivo o governo, não o movimento. 

O Partido Comunista Grego (KKE) deixou de participar nos movimentos, apenas caricaturando as ocupações de praça como “pequeno-burguesas”! O KKE, contudo, não gosta de participar de movimentos ou manifestações os quais não controla. 

Esse vácuo da esquerda e o ódio completo ao governo do Pasok se refletiram numa pesquisa recente, que mostrou que 40-50% das pessoas não votaria em ninguém. Isso mostra que a construção de um novo partido de massas da classe trabalhadora ainda continua uma tarefa vital.

A abordagem propositiva dos camaradas fez com que o CIT grego ganhasse dezenas de novas pessoas, de todas as idades, para suas ideias. Um trabalhador mais velho disse que “se filiar foi a coisa mais importante que eu já fiz em minha vida”.

Esses sucessos se devem à clareza política, à compreensão correta das perspectivas e à abordagem ao programa. 

Está claro que o resgate não resolverá os problemas da classe trabalhadora grega. Nas próximas semanas, meses e anos veremos a classe trabalhadora e a juventude enfrentarem mais ataques e entrando em lutas brutais.

 

  

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