1 – A profunda crise global do capitalismo aberta em 2008, que vem gerando retração econômica, quebra ou paralisação de empresas, destruição de riqueza e recursos, milhões de desempregados, um aumento da desigualdade social e muito sofrimento humano, só comprova mais uma vez a total falência desse sistema como modelo de organização social. Ao contrário da propalada racionalidade de seus mercados e agentes, esta crise só demonstra a irracionalidade e a completa cegueira do capital na sua busca irrefreável por lucros a qualquer custo, mesmo que isso implique em mergulhar a humanidade na barbárie, como já o fez mais na Grande Depressão de 1929-36 e em suas sangrentas guerras mundiais.
A busca de valorização sem limites das montanhas de capital acumuladas nas mãos de poucos, ao lado da miséria de milhões, embalada por uma lógica individualista e consumista desenfreada, está levando também a um desequilíbrio ambiental global e à severa contaminação do meio ambiente, ameaçando a própria sobrevivência das muitas espécies de vida no planeta. A crise estrutural do capitalismo e a comoção humana que observamos neste início do século XXI reafirmam a urgente necessidade do socialismo com liberdade como única alternativa de organização para a sociedade humana e de sobrevivência da vida no planeta. Nesta direção, a corrente Liberdade, Socialismo e Revolução defende um programa e uma estratégia revolucionários, de mobilização contra o capitalismo e por uma revolução socialista no Brasil e no mundo.
2 – A LSR entende o socialismo como um governo que seja efetivamente dos trabalhadores, dos assalariados, um poder da maioria voltado para a maioria. Defendemos a construção de outra sociedade, de uma cultura diferente, baseada em valores de igualdade, justiça, humanismo e elevada solidariedade social, na qual sejam suprimidas a propriedade privada dos meios de produção, a desigualdade, a injustiça, a opressão e a discriminação de toda espécie. Uma sociedade baseada na propriedade coletiva, no uso racional e sustentável dos recursos naturais, no planejamento democrático, onde a ninguém seja dado o direito de explorar outrem e onde todos possam usufruir igualmente do produto social. Lutamos pela superação da secular divisão social do trabalho, onde uns pensam e decidem e a maioria apenas executa de forma alienada o processo de produção. Lutamos por uma sociedade de iguais, onde a todos seja dado o direito de decidir em igualdade de condições as alternativas do processo de produção social e os rumos da sociedade. Lutamos também contra a divisão sexual do trabalho, que o capitalismo se apropriou, usando um regime de opressão à mulher, mantendo-a no restrito espaço privado e submetida a uma dupla jornada de trabalho. A nossa luta é por isso também altamente ideológica, combatendo a ideologia burguesa, o individualismo, o personalismo, o consumismo, o egoísmo, o machismo, o racismo e a homofobia, que essa sociedade baseada na exploração e opressão tenta nos impor. Faz-se necessário resgatar entre os seres humanos, no dia a dia da luta dos trabalhadores, na relação entre as correntes revolucionárias e no convívio entre os militantes uma elevada moral, os melhores valores humanos de solidariedade, camaradagem, generosidade e respeito.
3 – A experiência do século XX deixou claro que é impossível construir o socialismo de forma isolada, em um só país ou mesmo região. O socialismo será mundial ou não será. O capital internacional atacará e nunca descansará enquanto não estrangular e derrotar uma formação assim. Isso é ainda mais válido em uma economia mundial cada vez mais integrada e interdependente como a atual. As revoluções nacionais podem apenas despertar uma virada global, que implante o socialismo em todo mundo; do contrário, isoladas, retrocederão, como se viu no Leste Europeu. Assim, a LSR defende que o internacionalismo é um dos pilares básicos de uma corrente realmente revolucionária.
Precisamos resgatar e estimular os muitos exemplos de solidariedade internacional concreta entre os trabalhadores ocorridos no século passado. Nesse caminho, desde hoje a LSR estimulará toda iniciativa positiva de reorganização internacional dos trabalhadores e a solidariedade à todas as lutas contra a exploração e a opressão imperialistas. Com esta concepção, a LSR soma-se também ao esforço de construção de uma organização internacional dos trabalhadores.
4 – Aprendendo com as experiências do século XX, defendemos o socialismo com democracia e liberdade, rejeitando os modelos burocráticos e ditatoriais de sistemas políticos erroneamente identificados com o socialismo, como o da ex-URSS, baseados no partido único, na brutalidade, na supressão de direitos democráticos básicos dos trabalhadores e na perseguição a qualquer oposição. Ainda que defendendo incondicionalmente as conquistas da Revolução Cubana contra qualquer agressão e contra o bloqueio imperialista e levando em conta as suas diferenças com o exemplo da URSS, também não consideramos como socialista o sistema político de partido único instalado em Cuba e nos opomos ao seu caráter ditatorial. Rever, reestudar a história do socialismo no século XX, submetendo-a a uma autocrítica rigorosa, é condição para poder renovar socialismo e reencantar a humanidade com nosso sonho. Mesmo que reconhecendo como progressivo o discurso antiimperialista de Hugo Chávez, também não consideramos como socialista seu regime político, através do qual conduz o país de forma autoritária com a atitude de um caudilho, reprimindo as mobilizações independentes dos trabalhadores e impedindo sua livre organização. Este não será o socialismo do século XXI.
5 – Rejeitamos também o reformismo e a conciliação de classe, que prega uma ilusória melhoria dentro dos marcos do sistema capitalista. Entendemos que só haverá avanço real para humanidade se ela se livrar do sistema atual, e que uma ruptura revolucionária só se dará com os trabalhadores organizados independentemente dos patrões e seus representantes. Não negamos a importância da luta institucional. Entretanto, entendemos que a participação de partidos socialistas e revolucionários nas eleições deve estar a serviço da luta dos trabalhadores, não o contrário. As transformações estruturais que os trabalhadores demandam e a construção do socialismo não virão por reformas no campo das instituições capitalistas, mas somente através da luta direta dos trabalhadores, dos povos e setores oprimidos. A experiência do PT repete o mesmo caminho que os partidos reformistas social-democratas trilharam há um século atrás, se adaptando ao sistema, se agarrando ao poder, se aliando a partidos burgueses até se tornar indistinguível deles, na corrupção e no burocratismo.
6 – O socialismo científico de Marx e Engels concebia antes de tudo uma nova sociedade altamente organizada e democrática, o poder disseminado das comunas livres da Comuna de Paris de 1871, não o poder concentrado em um partido, em um ditador ou em um caudilho. Concebemos o novo poder como o poder da própria sociedade auto-organizada em seus fóruns, o poder democrático de seus conselhos, assembléias, congressos de trabalhadores, dos sindicatos, centrais sindicais, ou seja, dos próprios movimentos e organismos sociais. Nosso socialismo é aquele visto nas frentes de luta da Revolução Espanhola, de alta solidariedade entre todos os revolucionários, fossem de qualquer nacionalidade, e na qual as decisões eram tomadas coletivamente. Nosso socialismo é aquele em que os trabalhadores tomam, eles mesmos, o poder em suas mãos, como nos sovietes revolucionários e nas vibrantes e massivas assembléias dos dias decisivos da Revolução Russa de outubro de 1917, que abalaram e encantaram o mundo.
7 – Reivindicamos o papel decisivo de uma vanguarda revolucionária e de partidos revolucionários na direção da luta dos trabalhadores, na ruptura com o capital e na construção da nova sociedade. O papel do partido bolchevique, por exemplo, foi fundamental para a vitória da Revolução Russa, como também o foi o de outros movimentos ou partidos revolucionários nas revoluções do século passado. A LSR busca construir, a cada dia, a ferramenta política revolucionária necessária aos trabalhadores, ou seja, construir um partido revolucionário. Entretanto, rejeitamos que qualquer partido ou corrente substitua os trabalhadores em suas tarefas e em seu poder. Negamos também a concepção de um partido único, dirigindo por cima a nova sociedade, pois acreditamos que não existe um único partido revolucionário e nenhum partido pode expressar sozinho os múltiplos interesses da classe trabalhadora, ainda mais em sociedades tão complexas como as atuais. O stalinismo foi para a lata do lixo da história com o colapso no Leste Europeu.
8 – Os partidos ou correntes socialistas terão um papel central na luta revolucionária, mas não podem concentrar o poder político, substituindo os organismos dos próprios trabalhadores nas decisões que cabem a eles mesmos, à toda sociedade. Disso decorre que, desde hoje, buscamos fortalecer e estimular o funcionamento autônomo das organizações sociais, sem nunca esvaziá-las e aparelhá-las, nunca colocando os interesses de recrutamento e construção de nossa corrente acima dos interesses coletivos, como fazem as organizações sectárias, que aparelham e assim destroem as organizações dos trabalhadores e da juventude. Combateremos com vigor as políticas das correntes oportunistas e sectárias e buscaremos atrair de forma ousada para nossas fileiras novos integrantes, mas colocando sempre o interesse e a unidade dos trabalhadores acima de tudo.
9 – Um novo socialismo com liberdade não pode renegar as conquistas democráticas e civilizatórias alcançadas pelos trabalhadores e pelos povos dentro do capitalismo. Pelo contrário, deve assegurá-las e alargá-las, garantindo o livre direito de expressão, de crítica, organização partidária e deslocamento à todos aqueles que se colocam ao lado da nova sociedade. As conquistas das sociedades alcançadas à duras penas dentro da democracia capitalista, com tantas lutas e que tantas vidas custaram, não são obras do capital, são antes de tudo conquistas dos trabalhadores, patrimônio da humanidade. O socialismo precisa propor-se superior ao capitalismo em todos os planos, especialmente quanto à tolerância, no respeito à imensa diversidade humana, à crítica, à livre organização política dos que estão ao lado do socialismo ou respeitam as decisões coletivas, aos direitos das minorias, ou seja, precisa mostrar-se como uma civilização mais elevada em todos os aspectos. Nesta concepção, também devem ser especialmente assegurados os direitos dos trabalhadores comuns, dos indivíduos, especialmente em relação ao Estado. Tais direitos não podem ser suprimidos em nome de um interesse coletivo genérico, como o foi nas experiências stalinistas, até porque o interesse coletivo só pode merecer realmente essa qualificação se contemplar a maioria dos interesses individuais.
Sem difundir isso categoricamente, não superaremos a barreira ideológica criada pelo stalinismo entre os socialistas e as amplas massas, que infelizmente vêem o socialismo como sinônimo de intolerância e violência.
10 – Rejeitamos enfaticamente a violência, a intimidação, a desqualificação dos oponentes, as manobras, as mentiras e calúnias como método de luta política válido entre os trabalhadores e as correntes revolucionárias. Uma nova democracia socialista deve se assentar antes de tudo na solidariedade de classe, na luta política leal nos organismos dos trabalhadores, na reconstrução da moral revolucionária destruída pelo stalinismo, no respeito às diferenças e à diversidade política do movimento socialista, dos trabalhadores e dos povos, enfim, no direito de todas as correntes do campo dos trabalhadores a se expressar livremente. Não descartamos a violência revolucionária como forma de se defender e derrotar as antigas classes exploradoras que agem com violência contra os trabalhadores. Mas as medidas de exceção devem ser aplicadas unicamente contra a minoria reacionária que ataca a revolução.
11. É essa concepção de democracia revolucionária, de respeito e tolerância para com as diferenças políticas e as minorias, que a LSR buscará praticar no movimento social e em seu interior. O socialismo não é apenas uma nova construção econômica e social, é também a passagem a uma nova dimensão moral, a uma nova cultura política de elevada solidariedade que precisamos praticar desde hoje. Agir com lealdade, honestidade, grandeza e magnanimidade na luta política não é apenas um capricho, é uma necessidade urgente e uma pré-condição para reconstruir a unidade e acelerar a reorganização das fileiras socialistas, depois de tantas décadas de brutalidade, sectarismo, falsificações, desmoralização e divisão introduzidas pelo stalinismo e pelas burocracias.