Catatau, presente!

A esquerda socialista e o movimento dos trabalhadores no Brasil e internacionalmente acabam de perder o camarada Paulo Aguena, o Catatau, ou simplesmente Cata, como muitos o chamavam. 

Desde o final de 2021, Catatau vinha lutando com garra, consciência e dignidade contra um câncer que acabou por ceifar sua vida na noite de ontem, 5 de dezembro de 2022. A notícia provoca um profundo choque e tristeza em todos nós.

A perda de Catatau é irreparável no afeto de amigos, familiares e companheiros, mas também no debate político dos difíceis tempos em que vivemos. Lamentamos e choramos por isso. Sabemos, no entanto, que Catatau estará presente nas centenas de militantes que, de uma forma ou outra, ele ajudou a formar e servirá sempre como inspiração e exemplo de dedicação à causa do socialismo.

Catatau foi militante e dirigente trotskista por mais de 40 anos. Atuou na corrente ‘morenista’ desde a velha Convergência Socialista, ajudou a fundar o PSTU em 1994 e, desde 2016, jogou um papel fundamental na construção do que hoje é a corrente Resistência – PSOL. 

Catatau foi um militante internacionalista, sempre preocupado e atuando na perspectiva da construção de um projeto internacional para a esquerda brasileira. Atuou na LIT-QI no Brasil e na Argentina, além de incidir sobre o trabalho em outros países. Nos últimos anos buscava intervir no processo de reorganização da esquerda socialista internacional.

Sempre tivemos debates e divergências, em meio também a muitas concordâncias. Mas, o exemplo de Catatau está marcado em minha trajetória e de muitos que tiveram o privilégio de conhecê-lo. É muito importante que as novas gerações de militantes conheçam sua vida e, a partir das especificidades dos vários pontos de vista, mantenham vivo seu legado.

Catatau foi uma espécie de modelo de uma geração de militantes socialistas, em especial trotskistas, no Brasil do ascenso das lutas operárias, populares e da juventude na virada dos anos 1970 e 1980. Já no início dos anos 1980 começou atuando no movimento estudantil, militou no movimento operário, mas essencialmente foi um dirigente e construtor de ferramentas de luta política revolucionária.

Meu contato inicial com ele se deu em uma época muito especial, no contexto da luta de massas da juventude que, em 1992, levou à derrubada de Fernando Collor, o primeiro presidente eleito no país depois do fim da ditadura militar. Nos bastidores ou no palco central, Catatau foi uma força vital na construção de um polo de esquerda na UNE e no movimento pelo “Fora Collor”. 

Para um jovem militante como eu, nesse período de grande efervescência política, a convivência com Catatau e a camarada Genilda em particular, uma dupla incrivelmente potente, foi particularmente marcante.

Foi nesse processo que nasceu o movimento pró-PSTU, resultando na unificação de várias correntes políticas e na formação de um novo partido de esquerda depois da expulsão da Convergência Socialista do PT em meio ao processo de direitização desse partido nos anos 1990. 

Na época, eu já fazia parte do primeiro núcleo de militantes no Brasil do que então se chamava Comitê por uma Internacional dos Trabalhadores (CIT-CWI) e hoje se denomina Alternativa Socialista Internacional (ASI), cuja seção brasileira é a LSR – Liberdade, Socialismo e Revolução. 

Fundado em 1994, o PSTU só viria a se filiar a uma organização internacional (no caso a LIT-QI) em sua Conferência internacional de dezembro de 1995. Enquanto foi possível, os militantes do CIT (atual ASI) atuaram no seu interior e travaram importantes debates sobre a complexa situação internacional imediatamente posterior ao colapso do stalinismo na União Soviética e Leste Europeu e as políticas a serem adotadas pela esquerda revolucionária.

Além de conviver com Catatau no trabalho de juventude e no Comitê Executivo do PSTU, junto com outros camaradas, tive também a oportunidade de percorrer muitas cidades Brasil afora debatendo diretamente com ele no processo pré-conferência internacional do PSTU. 

O debate das divergências entre as posições do então CIT (atual ASI) e da LIT-QI foi tratado de forma rigorosa por Catatau, sem exageros polêmicos deliberados ou meras manobras retóricas. No convívio informal durante essa experiência, era evidente o esforço real de Catatau no sentido de entender a posição divergente e dialogar com ela em busca de uma linha justa, apesar da lealdade em relação à sua própria organização.

Muito anos depois, grande parte das divergências de então diminuíram ou mudaram de caráter no processo de revisão política e balanço que Catatau e seus camaradas fizeram e que acabou por resultar em sua ruptura com o PSTU e a LIT-QI. 

Esse processo, por um breve período, nos reaproximou e voltamos a debater de perto a situação internacional, a relação de forças mundial, as políticas e táticas da esquerda revolucionária e os caminhos para a construção de uma Internacional revolucionária.

Mesmo que os processos políticos nos tenham novamente afastado, Catatau continuou sendo um interlocutor incontornável – seja pelo rigor de sua postura no debate, seja pelos pontos e questionamentos que sempre levantou, seja pela energia dedicada ao contato com outros setores, seja também pela postura correta e leal na discussão e ação.

Dedicação de uma vida inteira à luta dos trabalhadores e ao socialismo revolucionário, máximo de energia empregada na luta concreta, integridade na postura militante, rigor no debate político, respeito na convivência com o diferente, saber aprender dos erros e lições do passado. Esses são alguns dos legados que todos devemos tentar carregar e passar adiante a partir do exemplo do camarada Catatau.

Em meu nome e em nome da LSR – Liberdade Socialismo e Revolução e da ASI – Alternativa Socialista Internacional, expresso nossos sentimentos e solidariedade a todos (as) familiares, amigos e camaradas do grande Catatau e rendemos nossas sinceras homenagens a ele.

Camarada Catatau, presente!